A Fera escrita por MileFer


Capítulo 10
A Cura - Parte I


Notas iniciais do capítulo

Olá, amores!

Andei pensando sobre o capítulo passado e devo dizer que ainda estou bem chocada com essa fúria de Jeniffer. Fiquei surpresa com a atitude dela e, por isso, decidi mudar um pouco o rumo das coisas por aqui rsrs

Esse aqui é um capítulo extra, que decidi escrever de última hora - tudo só para que vocês conhecessem também esse lado dela. Mas não se preocupem!

Esse cap não mudará muita coisa nos próximos - é até opcional rsrs

Enfim, espero que gostem ♥

Boa leitura!



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Para a sorte de Marion, Adélia era garota ridiculamente magricela e pequena – o que facilitou muito quando a mesma tomou a decisão de arrastá-la até o andar de baixo, para um ponto estrategicamente escondido dos olhos curiosos da mansão, no jardim.

—Rápido! – Vociferou para o velho, que carregava o corpo adormecido da garota sob os ombros. – Está me fazendo perder tempo!

Adélia havia acordado apenas uma vez durante o caminho, obrigando Marion a feri-la detrás da cabeça. Não era seu real objetivo deixar marcas em seu corpo – o que significava mais trabalho para si.

O velho apenas a encarou feio, mas não disse nada. Estava, no fundo, com medo. Com medo dela, de sua própria filha.

Não sabia o que Marion faria a Adélia, e tampouco se atreveria a perguntar. Fordy conhecia muito bem a verdadeira natureza de Marion, e não moveria um dedo para contrariá-la naquele momento. Por isso que, muito discretamente, ele fez uma prece pela alma que carregava.

Estava tremendo, na verdade. Tremendo de medo por Adélia, que estava tão indefesa e inocente como nunca estivera antes. Temia também por Rafael, alheio a tudo aquilo e, por fim, temia por Adam.

Principalmente por Adam.

Era ele a verdadeira vítima. Era Adam que provaria do veneno de Marion, no fim das contas. 

—Não entendo o motivo para puni-la – ele murmurou, entre um suspiro e outro, cansado. – Ela não fez nada de errado ao se negar a participar disso, Jeniffer. Ela não é a vítima.

—Marion – ela corrigiu, seca. Parou e encarou Fordy de forma penetrante, como se pudesse ver através de sua carne.

Fordy sabia o que significava pronunciar aquele nome em voz alta, principalmente em um momento como aquele.

—Não vou lhe dar mais poder – ele sussurrou, quando a mulher deu-lhe as costas e afastou-se a passos curtos, analisando o ambiente.

Estavam quase próximos aos portões que levava ao jardim de entrada da mansão, e Fordy reconheceu rapidamente as árvores que os cercavam.

Diante de si, havia um círculo de tamanho mediano, onde nada crescia. O chão era coberto por uma terra avermelhada e fétida, e bem no centro havia um desenho talhado profundamente na terra.

Não ousou se aproximar e ler os símbolos que o cercava sem autorização de Jeniffer – ou Marion, a verdadeira mulher parada diante de si. Ele se perguntou a quanto tempo aquele desenho estava ali, e o modo como a terra estava agitada e as árvores murchas e cobertas de musgo espanhol ao redor fez um frio percorrer sua espinha.

—Aqui – ela murmurou, apontando para o chão e indicando com a cabeça para que o velho se aproximasse com Adélia.

Fordy encarou muito atentamente o espaço vazio que estava no centro do desenho, tomando cuidado para não pisar e nem olhar para os símbolos desenhados que compunham o círculo.  Uma risada suave o fez perder a concentração, e ele quase se desequilibrou ao apoiar o corpo adormecido no chão.  

—Olhar não tira pedaço, querido – Marion riu atrás de si, zombeteira. – A propósito, ande logo com isso! Estou com pressa.  

Fordy se afastou rapidamente daquele show de horror, detendo-se até estar apoiado em uma das árvores. Sua vontade era ir correndo para dentro, mas, ao encarar o corpo inerte e inocente jogado em meio àquela sujeira, seu coração se comprimiu de forma violenta.  

A marca permanente em seu antebraço queimou em resposta a seu medo, enquanto cada um de seus nervos se acalmavam e seu corpo ia relaxando aos poucos. Era uma sensação de paz e proteção que o tranquilizava aos poucos, enquanto as palavras de seu juramento voltavam vívidas para a ponta de sua língua.  

Não estaria somente traindo a Rafael, mas a seus votos de custodiam caso fosse embora.  Adélia agora era tão parte daquela história quanto ele seria, e abandoná-la naquele momento lhe renderia uma punição pior do que receberia se seu único erro fosse propagar os sete pecados capitais.  

Ele observou, enojado, enquanto Marion usava o próprio sangue para desenhar um outro símbolo menor na testa de Adélia, enquanto sussurrava palavras incompreensíveis em uma espécie de oração que ele não conseguia entender.  Ela o encarou no mesmo instante, lançando um sorriso diabólico e cúmplice. 

—Venha – chamou, sua voz doce e convidativa atraindo-o para perto. – Venha, papai!  

Por um momento, as lembranças do seu passado inundaram sua mente: quando nada aquilo exista, quando Marion ainda era uma jovem doce e sensível – antes de conhecer Adam, antes dele partir seu coração... Fordy se aproximou, mas não ousou pôr os pés dentro o círculo. Ele tinha total noção de que aquele tempo nunca mais voltaria – sua querida filha não existia mais, e aquela bruxa em sua frente não era mais sua família.  

Fordy continuou parado ali, assistindo a tudo aquilo tenso e enjoado.  Sua postura frouxa fez Marion rir, mas  sua gargalhada logo sessou quanto um movimento acompanhado de um gemido chamou sua atenção. Adélia estava acordando novamente, o que significava que Marion tinha que agir rápido.  Se a garota acordasse, tudo estaria perdido.  

Ela se afastou do invocatio suavemente, pondo-se de pé. Marion observou o corpo inerte de Adélia diante de si, ridiculamente puro e intocável. Suas pernas quase ultrapassavam o desenho, e seu rosto estava pálido e doentio.  Sua vontade era deixa-la lá para que as bestas a devorassem, mas seria muito descuido. Já estava quebrando regras demais ao abrir sua mente para Rafael; não podia vacilar por conta do próprio ódio que sentia no momento. 

Marion fechou os olhos e ergueu as duas mãos diante de si, pondo-se a movimentar-se diante de Adélia. Ela representava cada frase com um símbolo de invocação diferente, que fazia com as mãos. Haviam coisas demais naquele lugar, e ela mal conseguia se concentrar.  Ela podia sentir e ouvir os ossos de Fordy tremendo de medo, o coração de Adélia batendo em seu peito e até o calor que emanava do corpo de uma coruja que estava a exatos duzentos metros de distância.  Ela podia sentir Rafael; àquela distância, era impossível saber o que se passava em sua mente. Mas o modo como seu corpo estava rígido, ele parecia preocupado.  

Preocupado com Adélia?  

Sim, tudo o que fazia sua mente funcionar naquele momento era ela. Até seu coração batia de forma diferente quando pensava nela.  Aquilo distraiu Marion, obrigando-a a parar para recobrar o fôlego.  

Seus olhos pousaram sobre o velho que assistia tudo encostado em uma árvore, abraçando-a como se sua vida dependesse daquilo. Ela mal se lembrava de vê-lo agir de forma tão ridícula e humana. 

Um suspiro alto vindo sob seus pés chamou sua atenção novamente, e ela observou Adélia se remexer agoniada.  Estava tudo por um triz.  Se Adélia acordasse...  Marion vociferou, sentando sobre o corpo dela. Adélia voltou a se remexer, mas a mulher segurou seu rosto entre as mãos com força, até seus narizes se tocarem.  

Ferozmente, ela sussurrou aquelas palavras. O sangue na testa da garota secava rapidamente a cada frase, liberando um cheiro fétido e típico. Marion podia sentir a pele de Adélia esquentar sob seus dedos, e a medida em que ela ficava cada vez mais inquieta e gemia de dor, mais alto Marion sussurrava.  

De repente, uma sensação de terror fez a pele da mulher se arrepiar, enquanto uma imagem de si mesma sufocando-a prendeu-se em sua visão. Como num sonho, ela sentiu a dor do aperto em seu pescoço e falta de ar; sentia o pânico causado pela falta de oxigênio, o coração disparado de susto e a adrenalina causada pela antecipação da morte.  

Adélia pensou que iria morrer?  Aquilo quase fez a mulher cair na gargalhada, mas já estava profunda demais na mente da garota para se distrair.  E então, uma nova sensação fez aquela memoria turvar-se. Marion sussurrou mais alto, apertou com mais força o rosto de Adélia, mas não conseguiu ver o que era. Fosse o que fosse, havia dado a garota algo próximo a esperança.  

Um segundo mais tarde e tudo aquilo desapareceu – no exato momento em que ela desmaiara durante dois segundos.  Quando voltou a si, foi no momento em que Fordy parecia erguê-la nos braços. Marion reviveu a lembrança de uma conversa dela e do velho.  

“...deveria se controlar”, Fordy dizia, eufórico. As imagens e as vozes apareciam de modo entrecortado, quase impossível de entender o que se passava.  “Apagar a memória dela...” ela se ouviu dizer, em um lugar distante, “... ou terei que matá-la? ”.  

Assim que ouviu a frase, na lembrança, Adélia se agitou – o que chamou a atenção imediata da mulher, que acertou um golpe violento em sua cabeça, desmaiando-a.  Adélia não poderia vê-la como inimiga – foi um erro mortal tê-la atacado. Se aquelas memorias permanecessem, tudo estaria acabado, como o próprio Fordy dissera.

Naquele instante, Marion concentrou toda a sua atenção nas memorias que viu. Não seria fácil, mas ela não poderia desistir.  

Marion selou seus lábios com os de Adélia e respirou fundo, sugando para si tudo o que tinha visto. As memorias atingiram sua língua com um gosto amargo, entrando em seu corpo como um jato de vento seco. Logo elas se transformariam em seu pior pesadelo, mas era uma punição suficientemente boa pelo o que fizera a Adélia mais cedo.  

Quando sentiu que seus pulmões iriam explodir, Marion parou e deixou que a cabeça de Adélia pendesse de seu toque.  Substituir aquelas memorias não seria algo tão difícil – tinha milhares de histórias para cobri-las.  Infelizmente, para isso, Marion teria que voltar a ser Jeniffer.


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