Superando o passado escrita por HungerGames


Capítulo 19
Capítulo 19




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Eu recebo a mensagem do Vítor dizendo que já está lá embaixo, saio do quarto e vou até o do lado, ele está parado no meio do quarto segurando dois cabides, quando me vê ele logo se vira pra mim.
— A roxa ou a azul? – ele segura duas camisas sociais, a roxa tem pequenos riscos em branco e a azul é escura com a gola branca, gostei muito mais da roxa, mas dou de ombros.
— Azul – uso meu melhor sorriso, ele joga a roxa em cima da cama e começa a vestir a azul, me sinto meio idiota fazendo isso, mas eu nem sei quem é a garota, então talvez ela nem mereça que ele esteja todo arrumado.
— O Vítor chegou – aviso tentando bloquear a briga que acontece na minha cabeça, ele termina de fechar a camisa, vai até a mesa de canto, pega a carteira, celular e um cordão com uma pedra azul clara, ele coloca no pescoço e então faz sinal pra que eu vá na frente.
— O que aconteceu com os vestidos de tirar o fôlego? – ele pergunta só pra implicar comigo, estou com uma calça branca rasgada nos joelhos, camiseta preta e uma jaqueta de couro preta.
— Não tô no clima – dou de ombros e abro a porta, ele me alcança e ele que fecha.
— Gosto mais assim...
— Então talvez eu devesse ter colocado o vestido – sinto o sorriso dele mesmo sem estar olhando pro seu rosto.
— Você ainda vai me dar valor – eu o olho e vejo o sorriso que imaginei que ele estaria – Pode apostar – mesmo querendo sorrir faço uma cara de entediada, então logo estamos saindo do elevador, Vítor está nos esperando do lado de fora do carro e vem ao meu encontro, Rafa passa por ele dando apenas um pequeno soco no seu ombro e logo entra no carro, se sentando no banco do carona.
— É o meu lugar – eu reclamo quando Vítor se aproxima de mim, ele olha pra trás e ri, mas não dá muita importância, ele apenas toca meu queixo e sorri.
— Você tá linda – dou um sorriso meio sem graça e aceito o beijo que ele me dá.
— Se forem demorar muito avisa que eu vou andando – Rafa grita pela janela do carro.
— Tô quase me arrependendo – Vítor fala rindo, eu sorrio e lhe dou mais um beijo, então ele abre a porta do carro pra mim e eu me escorrego no banco de trás.
— Esse era o meu lugar...
— Disse certo, era – Rafa sorri satisfeito.
— Tomara que ela tenha bafo – ele olha pra trás e ri.
— Sinto muito, amor, mas ela é bem gata – Vítor fala, mas tudo que eu consigo prestar atenção é no “amor” que ele disse da forma mais natural possível, como se ele dissesse isso sempre, mas não, essa foi a primeira vez que ele me chamou assim e eu só quero abrir a porta do carro e sair correndo, uma estranha sensação de estar no lugar errado começa a aumentar dentro de mim, Vítor liga o carro, fala mais alguma coisa e eu só o olho sem conseguir me concentrar.
— Ei! Relaxa ok? – Rafa fala se virando pra trás, quando olho pra ele sei que ele sabe o que está acontecendo dentro da minha cabeça, ele me dá um daqueles sorrisos que me dizem que tudo vai ficar bem, então ele me dá uma piscada – Eu tenho um estomago forte, se aguento sua comida, o bafo não é nada – ele fala e acaba me fazendo rir.
— Vai se ferrar – ele sorri orgulhoso e volta a olhar pra frente.
— Então, me fala aí da garota – ele pede e enquanto Vítor fala eu observo a reação dele, a alguns meses atrás ele estaria todo animado, fazendo todos os tipos de perguntas por mais inconvenientes que fossem, mas agora ele só escuta como se escutasse algum programa de tv qualquer, as vezes ele faz uma cara de impressionado como quando Vítor fala que ela dá aulas de pole dance, eu espero pelo comentário idiota em relação a isso, mas não tem nada e é quase como se eu tivesse olhando para uma outra versão dele, ao mesmo tempo ele ainda é aquele mesmo de quando chegou aqui, sei lá, é complicado e eu desisto de tentar piorar ainda mais o rolo que já está na minha cabeça.
Alcançamos o restaurante e Vítor abre a porta do carro pra mim, nunca vim nesse lugar antes, mas é muito bonito, bem colorido e com uma música de fundo gostosa de se ouvir, ele dá o nome na recepção e enquanto a recepcionista devora o Rafa com os olhos ele está batendo de leve no vidro de um aquário grande que fica na lateral parecendo um garotinho impressionado.
— Olha isso – ele fala chamando minha atenção – Será que dá pra ouvir lá de dentro? – ele bate os dedos mais uma vez e os peixes se agitam e nadam meio que desesperados e eu acabo rindo olhando pra ele.
— Quantos anos você tem? – ele dá de ombros e bate mais uma vez.
— É maneiro – eu acabo rindo de novo.
— Vamos? – Vítor passa o braço pela minha cintura e seguimos um garçom até nossa mesa, ele nos entrega uma cartela e Vítor avisa que ainda estamos esperando mais uma pessoa, mesmo assim ele escolhe um vinho, pede a garrafa pro garçom e assim que ele traz, a tal garota chega, Vítor sorri e cutuca Rafa, ele indica com a cabeça e Rafa se vira, ver a cara de impressionado que ele mal consegue disfarçar me irrita, tudo bem que a garota realmente é linda e até mesmo eu devo estar com a mesma expressão, mesmo assim sinto meu sangue esquentar. Ela é loira, nem muito alta e nem muito baixa, o cabelo está jogado apenas pra um lado deixando o piercing na sobrancelha bem aparente, ela está com um cropped vermelho e com um decote, uma calça pantalona  de cintura alta branca, Vítor e Rafa se levantam juntos, Vítor cumprimenta ela primeiro com um beijo rápido na bochecha.
— Essa é a Dani... Dani, essa é a Nathy – Vítor nos apresenta e eu recuso a me levantar, mas quando ela estica a mão, eu aperto forçando um sorriso.
— Ele não mentiu em nada quando disse que você era linda – forço outro sorriso – Adorei seu cabelo...
— Ah obrigada...
— Nathy, esse é o Rafael... Rafael, essa é a Nathy, uma boa amiga – Vítor sorri daquele jeito de quem está aprontando algo, então recua um passo e deixa os dois se cumprimentarem, Rafa sorri com toda a animação que ele não teve durante o caminho, coloca a mão na cintura dela e se inclina dando um beijo meio demorado demais nela.
— É um prazer – ele fala todo simpático e ela sorri toda oferecida.
— Acho que eles vão se dar bem – Vítor fala sorrindo todo orgulhoso quando se senta do meu lado e eu só queria não ter saído de casa, Rafa puxa a cadeira pra ela que sorri como se tivesse tendo um avc, reviro os olhos e respiro fundo me preparando para o resto da noite.
Precisei respirar fundo mais uma dezena de vezes durante as horas que se seguiram, por que Rafael passou praticamente o tempo todo babando em tudo que ela falava, e sinceramente não entendo por que de toda essa admiração, não acho que seja nada demais que ela seja a responsável por toda parte de publicidade da revista, nem que ela lute em alguns campeonatos dentro e fora da cidade, nem que ela faça pole dance desde os 15 anos e ainda arranja tempo pra fazer trilhas e escaladas... Tá, ok, eu admito, talvez seja um pouco impressionante que ela consiga fazer tudo isso e ainda ser linda pra caralho, mesmo assim é irritante que ela seja tão perfeita, apenas não gostei dela, só isso. Por isso fico aliviada quando Vinny pede a conta, ele e Rafa racham e logo estamos saindo do restaurante, quando alcançamos o carro eu coloco logo a mão na porta do carona.
— Dessa vez eu vou na frente – sorrio já me sentindo vitoriosa, mas ele dá de ombros.
— Pode ir, eu não vou com vocês – eu já estava confusa quando a tal estrelinha da noite se aproxima dele e lhe entrega uma chave.
— Acho melhor você dirigir, eu bebi vinho demais – ela sorri e suas bochechas estão coradas.
— Ótima ideia – ele sorri e pega a chave.
— Vê se leva ela direito ein – Vítor fala sorrindo todo bobo.
— Tá comigo, tá com Deus... – ele dá uma piscada pro Vítor e então olha pra mim – Tá tudo bem? - minha vontade é arrancar a chave da mão dele e enfiar ele dentro do carro do Vítor levando ele o mais longe possível dessa aprendiz de piriguete, mas ao invés disso forço meu maior sorriso.
— Só não esquece que amanhã é segunda feira ein – o sorriso dele não é tão grande quanto o que eu forcei, mas parece animado.
— Eu vou estar lá – dessa vez ele pisca pra mim e logo volta a atenção pra loira perfeita do lado – Vamos? – ela sorri e ele anda até o carro dela, abre a porta pra ela e dá a volta correndo.
— É oficial, eu sou o melhor cupido do mundo – Vítor comemora quando eles se vão e eu não espero que ele abra a porta pra mim, apenas entro no carro e coloco o cinto – Relaxa, ela é legal – eu o olho meio confusa – Eu sei que você tá preocupada com ele, mas ela é gente boa – agora a raiva que eu estava se transforma em culpa e só piora quando ele se inclina e me dá um beijo na bochecha – Você é sempre tão super protetora assim com seus amigos? – não consigo olhar pra ele, por que não sei o que responder, já que geralmente eu não me sinto assim, aliás, eu nunca me senti assim com nenhuma das garotas que Vinny já ficou, talvez um pouco com a Bianca quando começou a ficar sério, ainda assim era diferente – O que você acha? – ouço a pergunta e balanço a cabeça pra sair dos meus pensamentos.
— Desculpa, acho do quê? – ele ri.
— Passar um fim de semana lá na pousada... O Lucas tá enchendo o saco pra isso... – forço um sorriso.
— Acho que podemos ver isso algum dia – o sorriso dele diminui um pouco mesmo assim ele me dá uma piscada.
— Claro, a gente vê – alguns minutos depois e ele para na frente do prédio, sai do carro e abre minha porta – Eu adorei a noite – ele sorri daquele mesmo jeito de sempre e então me beija, eu deixo o beijo avançar o quanto ele quer, mas minha mente está longe, está se perguntando onde o Rafael e a tal da Nathy estão – Dorme bem – ele fala e me dá um selinho.
— Você também – sorrio e como sempre ele espera que eu entre no prédio pra sair com o carro.
Entro no apartamento e Vinny e Bianca estão rindo no sofá.
— E aí, como foi o encontro duplo? – ele pergunta todo curioso e quando eu fecho a porta ele parece confuso – Cadê o Rafa?
— Tenho cara de GPS? – pergunto sem paciência e jogo minha chave no móvel ao lado.
— Eita! Pelo mau humor o encontro dele deu super certo né? – ele fala escondendo um sorriso divertido.
— O quê que isso tem a ver com meu mau humor?
— Me responde você – ele levanta uma sobrancelha e me encara, então antes que eu perca o fio de paciência que me resta, eu saio pisando duro pro quarto, jogo a bolsa com meu celular em cima da cama, tiro a jaqueta e deixo em cima da cadeira, me apoio no guarda roupa pra tirar minha sandália e a jogo a apenas alguns centímetros de distância ficando praticamente no meio do quarto deixando-o mais bagunçado do que já está, então me lembro que essa semana mesmo Rafa reclamou da bagunça e isso me faz lembrar que ele mal conheceu uma garota e já foi sei lá pra onde com ela e isso me irrita, então não sei por que eu apenas pego meu celular da bolsa, me jogo sentada na cama, digito e envio a mensagem.
Eu: “Já pensei, o próximo fim de semana parece ótimo... Temos que avisar o Lucas ou simplesmente aparecemos por lá?”
Mesmo que eu tenha certeza que ele ainda não chegou em casa, em menos de 20 segundos chega a resposta.
Vítor: “Tá falando sério? Kkkkkkk Vou avisar ele agora mesmo!”
Assim que leio a resposta sinto tudo em mim se embrulhar, um arrepio estranho se espalha no meu corpo e eu me jogo deitada na cama encarando o teto e odiando cada segundo dessa noite.
Chego no escritório ainda com o óculos escuro na cara, me sento na minha cadeira e só então o tiro, meu nível de mau humor deve ser o maior que eu já tive até hoje e o fato de não ter tomado nem um gole de café só piora tudo, saí do apartamento o mais rápido que pude, antes que encontrasse o Rafael entrando com o sorriso orgulhoso pela noite maravilhosa que ele deve ter tido, definitivamente eu não suportaria nem uma gota de bom humor e ainda não suporto por isso assim que a porta do elevador se abre e eu o vejo, me levanto da mesa e sigo o corredor que dá para a segunda recepção, do Dr. Bragantes, Suzy, a secretária dele me recebe com uma pequena dose de bom humor, mas tolerável já que ela logo começa a reclamar de todas as planilhas que tem que terminar até a hora do almoço.
— Quer ajuda? – ela me olha meio confusa – Hoje tá tranquilo lá do outro lado, sem falar que agora o Dr Leones tem o novo aprendiz, então... – ela dá um sorrisinho.
— Ah é, fiquei sabendo que ele a Melissa da contabilidade andaram de rolo mas que já acabou, é verdade? – ela abaixa os óculos de grau com aro vermelho que ela sempre usa e eu dou de ombros.
— É, mas já tem alguns dias que terminaram – o sorriso dela aumenta.
— Eu sei que relacionamento entre o pessoal aqui é proibido, mas bem que eu arriscaria mudar de carreira só pra ter uma chance com ele – ela fala e eu a olho sem acreditar no que ela acabou de dizer.
— Tá brincando né? – ela sorri de um jeito malicioso, eu a conheço desde que começamos a trabalhar aqui e nunca a vi afetada por ninguém assim, ela é bonita, tem cabelos pretos cortado até ombro, olhos levemente puxados e está na faixa dos trinta anos, sempre foi mais controlada e agora sorri como uma adolescente cheia de hormônios – Ele não é tudo isso...
— Por que você mora com ele e já está vacinada...
— Eu não moro com ele, só divido o espaço
— Você entendeu! – ela parece não ver a diferença – E então... Ele tá saindo com alguém? – a pergunta devolve cada pingo do meu mau humor.
— Você vai querer ajuda com as planilhas ou não? – ela se distrai.
— Claro, quero sim, ainda preciso preparar a sala de reuniões – ela se levanta e me deixa sentar na cadeira dela, me mostrando a planilha que preciso organizar – Se o telefone tocar, você sabe o que fazer – ela avisa já correndo sobre os grandes saltos pretos, nosso trabalho é basicamente o mesmo, só que ela trabalha pra um sócio e eu para o outro, mas não tenho dificuldade nenhuma de fazer o trabalho até que depois de uma hora eu termino, ela foi adiantar algumas outras coisas e quando volta sorri agradecida – Você provavelmente salvou o meu pescoço – ela fala e eu devolvo a cadeira dela.
— Se precisar de alguma coisa... – dou um sorriso forçado e vou com os passos mais lentos que consigo até minha mesa, respiro aliviada quando vejo a mesa do Rafael vazia e já estava ligando meu computador quando a porta do Dr. Leones se abre e ele sai, seus passos vem rápidos até a mim.
— Onde você estava? – por mais que eu esteja odiando olhar pra ele ou escutar sua voz, decido que ele não precisa saber como estou, então coloco em prática todas as aulas de teatro que Lia me obrigou a fazer.
— Que foi? Sentiu tanto minha falta assim? – ele me olha meio confuso, então dá de ombros.
— Tive que atender seu telefone duas vezes...
— UAU! Talvez esteja na hora de pedir um aumento, são muitas responsabilidades – uso toda ironia que tenho, mas sem desviar os olhos da tela.
— Acho que não vou precisar pedir – sinto a voz dele meio misteriosa, mas como estou sem paciência e não fui a tantas aulas assim, apenas junto minha agenda e uma pasta de documentos e me levanto.
— Que bom, então – me afasto o mais rápido que consigo e vou até o outro corredor onde fica a maquina de cópias, agradeço mentalmente que está vazia e então xingo quando percebo que acabou a tinta – Mas que merda, será que quebra a porra da mão recarregar essa bosta? — reclamo comigo mesma usando minha raiva na maquina.
— Eita, ela não tem culpa – a voz me faz querer quebrar cada pedaço da maquina, Rafael entra no espaço que já é pequeno e começa a dobrar a manga da camisa – Eu cuido disso!
— Não pedi sua ajuda – devolvo irritada, sou mais rápida que ele e abro a porta do armário já pegando outro cartucho.
— Deixa de ser orgulhosa, eu faço...
— Você pode só voltar pra sua mesa, por favor? – peço ainda sem olhar pro seu rosto, por que não importa o quanto eu consiga fingir, olhar pra ele já é demais.
— Aconteceu alguma coisa?
— Aconteceu, você tá me irritando – sinto ele recuando um passo e me concentro em trocar os cartuchos, quando acabo e me viro ele não está mais por perto, solto o ar aliviada e volto a fazer as cópias, quando volto pra minha mesa, ele está falando no celular com um sorriso meio malicioso.
— Sábado eu não posso... É a inauguração do Food truck, eu te falei ontem... – então assim que as palavras saem da boca dele eu me lembro do que fiz ontem a noite, eu marquei de passar o fim de semana com o Vítor na pousada do Lucas, me esquecendo completamente da inauguração, me jogo na cadeira e me xingo mentalmente, até que ouço o resto da conversa dele – Então eu te espero lá sábado – qualquer culpa que eu tivesse desaparece e dá lugar a raiva, ele chamou uma garota que conheceu ontem para um dos dias mais importantes pra ele, então ele não tem direito de me cobrar nada, decido isso e me levanto da mesa de novo.
Passo o resto do dia praticamente fugindo dele, almoço mais tarde, faço todas as cópias que sempre peço pra ele fazer, volto a ajudar Suzy, vou até o Rh e mais qualquer outra coisa que me mantenha longe da mesa dele.
Quando acaba o expediente ele vai direto pra academia e eu vou pro apartamento, faço um sanduiche de queijo e presunto, pego uma lata de refrigerante e vou pro quarto. Estava assistindo ao final de um filme quando ele entra pelo meu quarto.
— A gente nem se falou direito hoje – ele fala normalmente enquanto se joga na minha cama e faz cócegas no meu pé, normalmente eu iria rir e me contorcer na cama, mas apenas puxo meu pé rápido demais e fecho a cara.
— Eu tô cansada – sinto ele me encarando, mas mantenho os olhos na tv.
— Não, você tá estranha! – reviro os olhos e pego o controle aumentando o volume, ele se estica tira o controle da minha mão e desliga a tv.
— Era o final!
— Ele morre – ele dá de ombros e então se senta virado pra mim – Agora fala, o que eu fiz dessa vez? – eu o encaro e ao invés de toda raiva só sinto um aperto na garganta como se eu fosse simplesmente começar a chorar, mesmo sem entender o por quê, então desvio os olhos dele, sinto-o se arrastando até a mim e sua mão para em cima da minha – A ultima vez que nós brigamos você disse que amizade é você falar e ouvir, certo? Eu tô pronto, pode falar – viro o rosto pra ele e o fato dele sorrir só aumenta ainda mais essa sensação estranha dentro do meu peito – Eu não quero ficar brigado com você, já passei por isso antes e foi uma merda, eu mal conseguia respirar, então, por favor, me diz o que foi que eu fiz de errado e eu juro que conserto... – a sinceridade na sua voz  e o seu olhar preocupado e nervoso só me deixam ainda mais confusa com meus sentimentos.
— Você não fez nada, é só que... – paro sem saber o que dizer, afinal o que eu posso dizer?
É só que eu surtei por você ter saído com uma mulher, ter rido com ela e provavelmente a feito rir com todas aquelas piadas idiotas ou pior ainda ter passado uma noite inteira com ela se beijando e fazendo sei lá mais o quê... NÃO, eu com certeza não posso dizer isso, por que isso nem faz sentido, nós somos apenas amigos, eu realmente não posso dizer nada disso – Eu tô mal humorada, é só isso... – forço um sorriso e ele sorri aliviado.
— Apenas mais um dia no paraíso – ele me cutuca com o braço – Bom, espero que esse mau humor todo melhore até sábado, não quero que você espante minha freguesia, aliás, eu queria até te mostrar os folders que eu fiz – antes que eu possa dizer algo ele sai do quarto correndo, procuro pelo meu celular e não o acho de jeito nenhum, corro até minha bolsa que eu joguei no canto do quarto quando cheguei do trabalho e no momento que eu o encontro, disco o numero do Vítor pronta pra pedir desculpa e desmarcar o fim de semana, mas dá ocupado.
— MERDA – volto a discar o número e Rafa aparece na porta do meu quarto com o celular dele no ouvido, ele escuta algo e me olha de um jeito que me deixa nervosa.
— Claro, eu vejo e depois te falo – sua voz é quase como se não o pertencesse, ele desliga e não desvia os olhos do meu – Então você planejava me contar antes ou ia ser uma surpresa?
— Quem era? – pergunto mesmo já sabendo a resposta.
— Seu namorado, ele queria saber de alguns filmes que você gosta pra ele separar pro fim de semana romântico de vocês dois... – sinto a decepção em cada palavra que ele fala.
— Eu acabei aceitando no calor do momento, mas eu tava ligando agora pra ele... – levanto meu celular e ele balança a cabeça.
— Vai ser um dos dias mais importantes da minha vida, provavelmente o mais importante, eu tô esperando isso há meses... Eu te pedi pra estar lá, eu praticamente implorei pra você estar lá, eu deixei absolutamente claro o quanto sua presença era importante pra mim e você simplesmente esqueceu? – a acusação é clara e eu nem ao menos posso me defender, ele está certo.
— Eu vou desmarcar! Eu já estava indo fazer isso...
— Não, não se incomode, não quero estragar os planos do fim de semana de ninguém, vai com ele, aproveita, eu espero que o fim de semana seja inesquecível, você merece – por um segundo enquanto ele me olhava eu podia jurar que vi seus olhos com lagrimas, mas antes que eu possa pensar em como pedir perdão, ele se vira e sai do meu quarto, ele vai para o lado oposto ao quarto dele e quando minha pernas me obedecem e chego no corredor ouço a porta do apartamento se fechar, não forte, nem com raiva e isso me apavora ainda mais, eu esfrego as mãos no rosto e volto pro quarto, pego meu celular e ligo pro Vítor, ele atende no segundo toque parecendo animado, então eu conto sobre a confusão das datas, mesmo que não tenha sido uma confusão, foi apenas minha raiva imbecil me cegando, Vítor aceita e peço desculpas, desligo e ligo pro celular do Rafa, no segundo toque ele desliga, quando tento de novo cai direto na caixa postal, jogo o celular na cama e me xingo por tanto tempo que não sobram mais xingamentos, então me jogo na cama, não consigo dormir e espero ele chegar, mas isso não acontece.
Quando chego no escritório saio apressada do elevador, a mesa dele ainda está vazia e eu me sento no meu lugar esperando por ele, mas as horas passam e nada dele aparecer, já estava indo procurar por ele quando o telefone que Dr. Leones usa pra se comunicar comigo toca, ele me pede pra ir até a sala dele e eu tenho que adiar minha procura pelo Rafa e levo minha agenda comigo, quando entro no escritório ele parece meio desapontado.
— Você sabe o que aconteceu com o Rafael? – pisco algumas vezes meio confusa.
— Acho que ele só se atrasou um pouco, mas deve estar chegando – ele nega.
— Ele acabou de se demitir e pelo telefone...
— Ele o quê? – não consigo segurar minha surpresa.
— Ele disse que aprendeu muito aqui, mas que não pode mais continuar...
— Eu... Eu não sei – o desespero começa a querer aparecer e eu preciso de muito auto controle pra não sair correndo dessa sala e atrás dele.
— Bom, eu realmente via um futuro pra ele aqui, é uma pena... Avise ao RH! – ele me dispensa e eu saio da sala sentindo como se o mundo tivesse virado de ponta a cabeça e ao invés de ligar para o Rh ligo para o Rafael, mas apenas chama até cair na caixa postal, me jogo na minha cadeira e fico olhando pra mesa ao lado, vazia, assim como eu me sinto nesse exato momento.

Depois de um dia que parecia não ter fim e de ter que me segurar durante várias vezes pra evitar sair correndo do escritório, eu finalmente chego no apartamento, abro a porta e dou de cara com a tal da Nathy, ela está com um vestido curto verde claro que deixa seu corpo bem desenhado, o cabelo está preso em um rabo de cavalo que parece muito melhor nela do que em mim.
— Oi! Tudo bom? Desculpa a invasão – ela sorri toda simpática e me beija na bochecha, eu apenas aceito ainda confusa – Eu só tô esperando o Rafa, ele foi trocar de roupa, disse que não demorava, mas já tem mais de 15 minutos – ela ri e eu tento forçar um sorriso mas sem sucesso, então ele aparece, está com a camisa roxa que ele ficou na duvida de usar no domingo e assim como imaginei ele está incrível, Nathy deve pensar o mesmo por que ela abre um sorriso totalmente afetado pela beleza dele.
— Demorei?
— Imagina – ela fala com ironia e me olha rindo, o som que sai da minha boca foi uma tentativa de risada totalmente fracassada.
— Vamos? – ele oferece a mão pra ela e é quase apavorante ver os dedos deles se encaixarem.
— A gente pode conversar? – minha voz sai pela primeira vez e é rouca e trêmula, ele desvia os olhos pra mim, vejo uma camada de coisas no olhar dele, mas ele apenas me força um sorriso.
— Pode ser amanhã? Nós temos uma reserva – ele olha pro relógio – E estamos meio que atrasados...
— Ainda bem que eu me arrumo rápido – ela fala rindo e ele faz uma careta pra ela, depois se inclina e lhe dá um selinho, eu sinto que posso simplesmente me desmontar a qualquer segundo, então apenas saio do caminho deles e ele abre a porta e sai.
Fico parada olhando a porta esperando que ela se abra e ele apareça, mas isso não acontece, dessa vez quando entro no meu quarto, me jogo na cama e começo a chorar, não sei exatamente por que mas só sinto que meu peito está sendo rasgado da forma mais dolorosa possível, uma dor muito parecida com a que eu senti quando soube que nunca mais veria o Lipe, por que de alguma maneira eu sei que acabei de perder o Rafa pra sempre, de uma maneira diferente da perda do Lipe, mas igualmente dolorosa, sinto os braços me envolverem e levanto a cabeça rápido demais sentindo a esperança aparecer, mas quando vejo os olhos do Vinny assustados só choro mais ainda, ele não diz nada, não me pergunta nada, assim como todas as vezes ele apenas me puxa pro colo dele e me deixa chorar e eu choro, choro até perder as forças, choro até não conseguir mais mover um único musculo do meu corpo e então só fico imóvel sentindo como se não existisse mais nenhum motivo pra me levantar da cama, fecho os olhos e imploro a qualquer Deus que exista que faça essa dor sumir, mesmo sabendo por experiência própria que ela não vai sumir, mas me recuso a abrir os olhos, falar ou sequer me mexer e em algum momento eu acabo dormindo.
Quando abro os olhos estou sozinha na cama, o despertador toca insistentemente e eu apenas me estico e o faço parar, continuo deitada e a porta se abre, Lia aparece e só de ver ela sinto as lagrimas querendo voltar, ela parece perceber e corre até a cama me abraçando forte como se soubesse do que eu preciso.
— O Vinny me ligou... O que aconteceu? – ela acaricia meus cabelos e eu levanto os ombros sem saber o que dizer, e eu realmente não sei, só sei de uma coisa.
— O Rafa me odeia – ela parece confusa e me olha esperando que eu continue – Eu fui uma imbecil com ele, eu... Ele pediu demissão do escritório e agora me odeia.
— Eu duvido muito que ele te odeie!
— Ele odeia – afirmo com certeza disso, ela passa a mão pelo meu rosto.
— E é por isso que você está assim? – levanto os ombros sem saber como explicar pra ela o quanto ter ele por perto é importante – Escuta, vocês vão se entender, eu tenho certeza disso... Eu não sei nem se vocês dois ainda sabem viver longe um do outro – e ela está certa, só que esse é o problema, eu não sei como vai ser – Além do mais ele só saiu do escritório, vocês ainda vão se ver todo dia aqui no apartamento...
— Não se ele estiver me odiando!
— Ele disse que te odeia? – eu nego e ela abre um sorriso – Então pronto, se ele não disse ele não odeia – ela fala como se fosse a coisa mais simples do mundo.
— Eu fui uma vaca!
— Dani, você é uma vaca com ele todo dia, ele mesmo diz isso – ela fala e é verdade, ele sempre diz isso – Agora levanta, toma um banho, se arruma e vai trabalhar, a vida não para e daqui a pouco vocês estão se irritando por aí... – ela fala puxando meu cobertor e não sei por que, mas o otimismo dela me contagia, talvez eu esteja mesmo só exagerando.  Deve ser a maldita TPM.
Entro no banheiro mantendo isso em mente, mesmo que uma voz interna diga que não tem mais volta. Saio do banheiro vestida e ela me olha aprovando.
— Muito melhor agora – ela sorri e eu forço um sorriso – Eu te dou uma carona – ela avisa e eu pego minha bolsa do chão do quarto.
O apartamento está vazio e saímos, em poucos minutos estou entrando no prédio, meu peito se aperta quando não vejo mais a mesa do Rafael ao lado da minha e engulo qualquer sentimento, aviso ao Dr. Leones que cheguei e me desculpo pelo atraso, ele não se importa muito com isso e logo me enche de trabalho.
O dia passa demorado como costumava ser antes do Rafa trabalhar aqui e eu mal consigo conter os passos até chegar no apartamento, entro apressada e vou direto até o quarto dele, a porta está aberta, mesmo assim dou uma batida antes de entrar, ele está remexendo no mural de fotos, uma rápida olhada e não encontro nossa foto lá, a espécie de dor que sinto faz todo o ar ser expulso do meu pulmão, ele se vira pra mim e espera que eu fale.
— A gente pode conversar?
— Claro, só não posso demorar muito – ele dá de ombros e vai até o guarda roupa, me dando as costas.
— Sobre o fim de semana, eu ia desmarcar com o Vítor, foi só... A noite tinha sido longa, eu estava cansada e acabei concordando sem nem me ligar na data...
— Tudo bem, sem problemas – ele fala com a voz mais distante possível, ele puxa um cabide, olha, faz uma careta e o coloca no lugar, já pegando outro.
— Rafa, me desculpa ok? Eu fui uma imbecil, uma babaca, a pior amiga do mundo, mas eu juro que eu nunca ia te deixar na mão, eu queria poder voltar no tempo e fazer diferente, mas eu não posso, eu só... Eu não sei mais o que dizer, só... Me perdoa? Por favor... Por favor, olha pra mim, Rafa – sinto o corpo dele ficar tenso quando encosto minha mão no seu ombro, mas ele não se esquiva – Rafa – então ele se vira.
— Está perdoada! – ele força um sorriso, nem de longe parece com um sorriso de “está tudo bem”, mas ele logo desvia os olhos de mim carregando o cabide com ele para o outro lado do quarto – Isso acontece, deve ter sido o vinho, além do mais, eu exagerei, o food vai abrir todo fim de semana, vocês podem ir a qualquer dia – a indiferença dele dói mais ainda do que se ele tivesse com raiva.
— Mas eu vou estar lá!
— Que bom! Eu tô bolando algo bem bacana...
— Por isso você se demitiu? Achei que tivesse dito que não ia sair de lá – tento evitar soar melancólica.
— É, a Nathy tá me ajudando nisso, ela saca essas coisas de publicidade e tal, ela disse que é importante quanto tá começando se concentrar só em uma coisa...
— Eu não sabia que ela tava te ajudando...
— É, nós conversamos, eu contei e ela se ofereceu pra me ajudar
— Então vocês se deram bem, né? – ele vira de costas enquanto veste a camisa, depois volta a se virar pra mim.
— Ela é incrível! Vou ficar devendo essa pro Vitor pelo resto da vida – a animação e o sorriso bobo que ele dá é como uma faca sendo enfiada no meu peito, ele sorri mais uma vez e vai até o banheiro, ouço ele espirrando o perfume e continuo parada no mesmo lugar, sem saber o que falar, mas sem querer sair daqui, por que eu tenho certeza que quando eu sair daqui é a confirmação que nada mais será igual, mesmo assim me obrigo a falar.
— Então nós estamos bem? – ele se vira pra mim e sorri.
— Estamos, eu só estou extremamente atrasado agora e a Nathy meio que é super pontual – ele sorri de um jeito afetado, eu forço meus lábios a sorrirem também e não sei de onde tiro força pra andar até a porta do quarto.
— Não quero atrapalhar – aviso e saio.
— Dani! – paro assim que ele me chama – Se você quiser ir pro fim de semana com o Vítor pode ir, eu vou ficar bem... – não tento rir, nem responder, apenas viro as costas e volto a andar, entro no meu quarto e fico parada encostada na porta olhando pra minha cama que está toda bagunçada. Eu o perdi. Essa conclusão é apavorante, a dor no meu peito é impensável, mas quando me lembro do sorriso dele falando da Nathy, percebo que ele está feliz e se ele está feliz isso tem que bastar, afinal, ele não disse nada sobre romper nossa amizade, ele disse que estamos bem, então não preciso me sentir assim, certo? Errado. Por que eu continuo sentindo que nada mais vai ser igual, mesmo assim respiro fundo e decido que nada disso é o fim do mundo, é só outra adaptação que eu vou ter que fazer na minha vida, nada que eu já não esteja acostumada, forço um sorriso e vou pro banheiro.

A semana passa tão demorada quanto uma lesma, as horas no escritório parecem dias e dentro do apartamento parecem semanas, Vinny e Bianca ficaram pelo apartamento a semana inteira, provavelmente por causa do meu espetáculo naquele dia, Vinny ainda perguntou se eu queria conversar, mas eu disse que era apenas TPM e ele e Bianca me fizeram assistir a filmes de terror, mas honestamente dessa vez nem me importei muito, Lia me ligou e eu disse que ela estava certa, eu apenas tinha exagerado, eu e Rafa estávamos bem, mas a verdade é que seja lá como estamos não tem nada de “bem” nisso, se trocamos mais do que duas frases foi muito, ele mal para no apartamento e eu mal consigo parar de sentir a falta dele, por isso na sexta feira me obrigo a fazer algo pra mudar isso, passo numa loja de bebidas e compro uma garrafa de vodca, compro também morangos e vou pro apartamento decidida a parar de choramingar e consertar as coisas entre nós, ele está na cozinha bebendo agua da garrafa mesmo.
— Foi a primeira vez que eu fiz isso – ele levanta as mãos em inocência e mesmo que a semanas atrás eu fosse reclamar, dessa vez não me importo.
— Olha o que eu trouxe – coloco a sacolas em cima da mesa, mostro a garrafa e os morangos – Achei que ia ser uma boa ideia pra acalmar as emoções pra amanhã...
— Ótima ideia, você podia ligar pro Vítor, eu preparo uns sanduiches, sei lá...
— Na verdade eu pensei em ser só nós dois, como nos velhos tempos – dou um sorriso animado.
— É que a Nathy já tá vindo pra cá, a gente ia assistir um filme ou comer qualquer coisa, sei lá, ela também cismou que eu preciso relaxar – qualquer animação que eu tinha desaparece por completo – Mas você pode ligar pro Vítor e a gente arruma alguma coisa por aqui mesmo, eu sou humanamente impossibilitado de dizer não a vodca – ele brinca e eu tento sorrir.
— É, eu sei...
— Liga pra ele! Eu vou ligar pra Nathy e peço ela pra passar no mercado e comprar algumas coisas – ele avisa já puxando o celular de cima do balcão e discando, me afasto e vou pro quarto, mas ainda consigo ouvir a voz toda melosa dele, deixo a porta bater e num acesso de raiva jogo tudo que estava em cima da cama no chão, depois encaro a bagunça sentindo meu peito subir e descer rápido demais.
— Eu pensei em... – ele para a frase olhando para os lençóis, travesseiros, roupas e papeis no chão – Eu achei que já tinha visto esse quarto bagunçado, mas você realmente se superou ein – Vinny fala me olhando impressionado.
— O que você quer?
— Eu e a Bianca vamos no cinema, quer ir? – então eu imediatamente agradeço aos céus por ter que fazer outra coisa a não ser ficar aqui.
— Que horas a gente sai? – ele sorri animado.
— As oito! Liga pro Vítor – ele avisa e sai do quarto, pego o celular e disco o numero, ele atende animado, diz que estava com saudade de ouvir minha voz, por que essa semana só nos falamos poucas vezes e por mensagem, faço o convite e ele aceita quase que instantaneamente, vou pro banheiro e depois começo a me arrumar, coloco um short jeans e uma camisa xadrez, calço minhas botas de cano curto e prendo o cabelo num coque meio desajeitado, mas que ficou até estiloso, passo batom e puxo minha bolsa na hora exata que Vinny aparece na porta do quarto me apressando, faço uma careta pra ele e o sigo.
— Ué, achei que a gente fosse acabar com aquela belezinha lá – ele aponta pra garrafa de vodca enquanto Nathy continua sentada com as pernas em cima das dele, coloco meu melhor sorriso no rosto.
— Acho que o casal merece aquela garrafa só pra eles – o sorriso dele não é muito animado mas o da Nathy vale pelos dois, então viro as costas e saio do apartamento.
— Tá tudo bem entre vocês? – dou de ombros.
— Tudo ótimo! – Vinny me olha daquele jeito que sabe que estou mentindo – Ele só tá namorando agora, o tempo fica curto, você sabe disso melhor do que eu...
— Mas nunca vai estar curto demais pra você, sabe disso né? – ele me abraça meio de lado apertado e eu sorrio.
— É como diz aquele ditado né? Fazê o quê – ele ri e me empurra pra fora do elevador assim que as portas se abrem.
Nós entramos no carro do Vítor por que vamos todos no dele pra facilitar, paramos na casa da Bianca e ela logo vem correndo, quando entra no carro ela e Vinny se beijam demoradamente e Vítor me olha sorrindo. Quando chegamos no cinema os meninos compram as entradas enquanto eu e Bianca escolhemos nossas badejas lotadas de chocolate, pipoca, refrigerante e nachos, conseguimos um ótimo lugar no meio exato da sala, a sessão não está muito lotada então está tudo perfeito.
— Seu cheiro é maravilhoso sabia? – Vítor fala com a boca encostada no meu ouvido, enquanto sua barba roça levemente o meu pescoço e a respiração quente na minha pele me faz perder qualquer interesse no filme, eu viro o rosto de frente pro dele e meus olhos se fixam na sua boca, sem eu precisar pedir, ele me beija, depois disso fica realmente difícil prestar atenção em alguma cena, quando olho pro lado acho que Bianca e Vinny estão com o mesmo pensamento que nós, então apenas desisto de tentar disfarçar e volto a beijá-lo como se não houvesse mais nada além dessa sala de cinema.
— O melhor filme que eu já vi na minha vida – Vítor fala de um jeito exagerado que faz Bianca rir, Vinny o ameaçar e eu ficar vermelha, mas ele logo passa o braço ao redor do meu corpo e me aperta nele beijando meu ombro e depois encostando o queixo nele e me olhando – Sorvete? – não finjo meu sorriso e nem minha animação e ele beija minha bochecha demoradamente.
Vinny e Bianca também aprovam a ideia e paramos na mesma sorveteria que Vítor me trouxe algumas vezes, minha taça é a mais cheia de todas e eu ainda assim eu pego um pouco do de cada um, Vinny reclama como sempre e eu faço uma cara de magoada, o que faz ele revirar os olhos e me deixar pegar mais, Vítor pelo contrário praticamente deixa que eu coma o sorvete dele todo e em agradecimento eu o beijo várias e várias vezes, nos sentamos na praça ao lado e ficamos conversando por um tempo, Vítor fala do restaurante dele, Bianca do restaurante do pai, Vinny da histeria do pessoal da banda com a aproximação do Festival que será daqui a dois meses e mal percebo o tempo passar, até que já são quase 2 da manhã e Vítor nos leva pra casa, Bianca fica no nosso apartamento e me despeço do Vítor com um longo e lento beijo, entramos com cuidado no apartamento e está silencioso, então vou direto pro meu quarto, tiro a roupa e acabo dormindo só de calcinha e sutiã.
Acordo na hora do almoço, coloco uma roupa e saio do quarto, Nathy e Rafa estão rindo descontroladamente na cozinha e eu paro no corredor respirando fundo e tomando coragem.
— Empacou? – Vinny pergunta já me sacudindo, olho rápido pra cozinha e eles não perceberam nossa presença, então recuo um pouco, Vinny me olha meio confuso e estica o corpo pra ver o que eu olhava – Eles parecem bem! – concordo e volto pro meu quarto – Isso é ruim? 
— É ótimo! – minto e vou pro banheiro.
— Você tá com ciúmes dele? – ele pergunta diretamente e eu olho espelho, seus olhos se fixam no meu reflexo.
— Eu não tenho por que sentir ciúmes dele – ele sorri de um jeito meio triste.
— Quando eu disse pra você fazer um esforcinho, eu não estava falando exclusivamente do Vítor, só do que te faz feliz, você sabe né?
— Eu não sei por que esse assunto, isso não tem nada a ver... Eu... Só não tem nada a ver – ele balança a cabeça concordando.
— Tudo bem, então vamos – ele me estica a mão e mesmo não querendo voltar pra lá, respiro fundo e pego sua mão, saímos do quarto e eu preparo meu psicológico, quando alcançamos a sala, Nathy e Rafa estão num beijo lento e apaixonado ainda na cozinha, Vinny para e olha pra mim se desculpando como se eu fosse acabar desabando a qualquer momento, ao invés disso eu uso meu melhor sorriso e finjo uma tossida.
— Desculpa atrapalhar o casal, mas minha barriga ta roncando – faço uma careta e esfrego a barriga, Nathy ri se afastando do Rafa e ele me olha meio sem graça – Mas vocês tem o resto do apartamento pra continuar – pisco pra ela e entro na cozinha abrindo a geladeira, tentando pensar no que pegar.
— Nós já estamos saindo, ainda falta comprar umas coisas pra hoje a noite – ela fala e eu olho pro Rafa, penso em dizer que eu deveria estar ajudando ele, que ele está sendo um idiota de me excluir, mas apenas sorrio de novo.
— Acho bom não faltar nada, por que eu quero atendimento completo – ela ri e faz sinal de continência, olho pra ele e ele não está olhando pra mim.
— Melhor a gente ir logo – ele apressa Nathy e os dois saem.
— Bife com batata frita? – pergunto com máximo de animação que consigo, mas Vinny só vem até a mim e me abraça apertado, afunda o rosto no meu cabelo e sinto o nó se formar na minha garganta, mas me obrigo a ficar firme – Relaxa ainda nem tá pronto – minha risada sai meio ridícula demais, mas é melhor do que começar a chorar.
— Eu amo você, muito, muito, muito, não esquece isso, ok?
— Eu sei – aperto meus braços em volta dele e quando sinto que já está ficando muito forte, me solto – Agora dá licença, que o bife não se faz sozinho – sorrio e começo a arrumar o nosso almoço.
Nós comemos uma travessa grande cheia de batatas e dois bifes cada e me sinto satisfeita, Vinny também e fica me zoando que eu melhorei na cozinha, mando ele se ferrar e ele vai lavar a louça enquanto eu me jogo no sofá assistindo um episódio de Grey’s Anatomy, ele se junta a mim, mas depois do terceiro ele dorme com a cabeça nas minhas pernas, sorrio e fico acariciando seus cabelos, até que a porta se abre e Rafael entra sozinho carregando várias sacolas, levanto a cabeça do Vinny com cuidado e a coloco numa almofada, então vou até o Rafa e o ajudo com as sacolas, coloco no balcão e ele agradece.
— Nervoso? – ele dá de ombros.
— Um pouco... A Nathy disse que é normal sentir que meu estômago vai sair pela boca, mas sei lá, é estranho – eu dou uma pequena risada e mesmo que as coisas tenham mudado entre nós, só quero que ele se sinta bem, então me aproximo mais dele.
— Não sei se ainda vale de alguma coisa, mas eu tenho certeza absoluta que hoje vai ser um sucesso! Eu poderia colocar minha mão no fogo por isso...
— Obrigado!
— Meu Deus, eu tive que dar duas voltas pra achar um lugar pra estacionar – Nathy fala entrando pelo apartamento e quando percebe minha cara confusa, Rafa se adianta em me explicar.
— Eu fiz uma chave reserva pra Nathy por que outro dia ela tinha que sair cedo e eu ainda tava apagado, espero que não tenha problema...
— Problema nenhum! Ela é sua namorada né? – ele desvia os olhos de mim pra ela.
— É! – um sorriso bobo aparece no rosto dele e eu apenas saio do caminho entre os dois, quando me viro Vinny tá sentado no sofá me olhando de um jeito que me faz querer correr pros braços dele, ao invés disso, eu vou pro meu quarto, entro e dessa vez tranco a porta, antes que eu me jogue na cama sinto a porta sendo forçada.
— Dani! – a voz é baixa, mas eu ignoro de propósito, fico encarando o teto até ele perder o sentido.
Quando escurece eu vou pro banheiro e demoro o máximo que consigo no chuveiro, mas saio de lá decidida a aceitar essa nova realidade, me arrumo e até perco bastante tempo passando maquiagem, me olho no espelho e me sinto satisfeita, coloquei um macacão tipo jardineira preto rasgado nas pernas, uma camisa cropped larginha embaixo, botei o boné florido deixando o rabo de cavalo preso na abertura dele, coloquei brincos de argola e o batom levemente rosa até que combinou bem, assim como os olhos marcados, quando saio do quarto Vinny e Bianca estão saindo do quarto dele.
— Achei que você não iria – ele fala meio confuso.
— E perder a boca livre? Não mesmo – sorrio e ele parece me analisar – Eu disse pro Vítor que encontro ele lá, posso ir com vocês?
— Isso não merece nem uma resposta – ele fala meio ofendido, mas eu mando um beijo no ar pra ele e logo saímos.
Chegamos na praça e o food truck já está lá mas ainda fechado, o lugar já está bem movimentado e muitas pessoas olham curiosas e apontam pro trailer, Vítor logo chega e quase me mata de susto quando me abraça por trás tirando meus pés do chão.
— Você tá bem gata assim, gostei desse estilo – ele fala sorrindo e eu lhe dou um beijo rápido, Lia e Bruno chegam e ela me abraça demoradamente.
— Eu vou lá ver se eles precisam de ajuda – eu falo e vou, já estava com a mão pra bater na porta que tem quando ela se abre, Rafa está com um boné personalizado com o nome escrito igual o do Food, um avental todo colorido e abre um sorriso nervoso.
— Nós já vamos abrir – eu sorrio de um jeito encorajador.
— Preparado pra todo sucesso desenfreado? – ele ri então os braços o envolvem por trás.
— Tá na horaaaa – ela fala empolgada, ela usa um boné e um avental igual o dele, uma espécie de magoa aparece quando paro pra pensar que aquele deveria ser o meu lugar, quer dizer, como melhor amiga dele, deveria ser.
— Tô pronto – ele garante e ela dá um beijo nele, eu me afasto e então ele desce do trailer e abre o balcão, Vinny ajuda a colocar a placa de quadro com os valores do lado de fora e nós ajeitamos as mesas e cadeiras e quando ele declara aberto as pessoas começam a se aproximar e logo estão se arriscando a pedir, eu sorrio orgulhosa vendo ele recebendo os primeiros clientes, Vinny desaparece e quando volta está com o violão, Bruno ajuda ele com uma pequena caixa de som e microfone, então ele se posiciona e começa a tocar, as pessoas se aproximam ainda mais e em uma hora ele tem um público considerável e Rafa dezenas de pedidos , duas horas depois e ele precisa encerrar por que acabou todo estoque, nós pegamos as ultimas cervejas e comemoramos num brinde animado, depois que guardamos as coisas e eu o vejo sozinho terminando de guardar o dinheiro, vou até ele.
— Eu não disse? – ele se vira pra mim e sorri – Sucesso absoluto! – aponto o food atrás de nós e ele abre um sorriso ainda maior.
— Obrigado!
— Mérito seu, você merece... Eu sei que as coisas estão meio estranhas entre a gente, mas... Eu tô na primeira fila torcendo por você, não esquece disso, ok? – em resposta ele me puxa pra um abraço apertado e assim que sinto seus braços em volta de mim me sinto no lugar certo pela primeira vez desde que nos afastamos, meu corpo relaxa quando sinto o cheiro dele e eu poderia passar o resto da vida aqui nesse mesmo lugar – Rafa, eu preciso te falar uma coisa... – ele me afasta apenas alguns centímetros e seus olhos são como um buraco negro que me atrai – Eu... Eu pensei muito nisso tudo, na nossa amizade e...
— AMOOOOOOR FOI UM SUCESSO – Nathy aparece, me viro pra trás e ela está de braços abertos vindo na direção dele, então me solto do seu abraço e lhe dou espaço, ela pula no seu colo, suas pernas se cruzando atrás dele e espalha vários beijos pelo seu rosto, ele ri e então eu me afasto.
— Vamos? – Vítor pergunta, sorrio e aceito sua mão.
Ele me deixa na frente do apartamento, nos beijamos e nos despedimos, vou direto pro meu quarto, tiro minha roupa deixando as peças caírem pelo caminho até o banheiro, tomo um banho rápido e visto um camisão do Vinny que eu roubei, me jogo na cama e a porta abre.
— Você não terminou de me falar o que queria, terminou? – Rafa me olha curioso, eu me sento na cama e nego, mas não posso dizer o que ia dizer antes, por que provavelmente seria um erro, ele está feliz assim e com aquele abraço eu vi que ainda podemos ser amigos de novo, então dou de ombros.
— Eu ia dizer que pensei muito na nossa amizade e só quero que você saiba que independente dessa nova fase da sua vida, eu ainda vou estar aqui torcendo por você... E pela Nathy, ela parece perfeita pra você... Eu tô muito feliz por você – sorrio o máximo que consigo, ele me olha por alguns segundos e então sorrir.
— E eu por você e o Vítor...
— É, parece que nós dois temos sorte
— Parece que sim
— Eu tenho que dormir... – ele concorda, então sai fechando a porta e eu encaro o teto sabendo que não posso admitir o que estava prestes a admitir hoje, tudo isso é só uma confusão da minha cabeça e eu só preciso em organizar de novo, só isso.


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