Do Outro Lado do Véu escrita por Miahwe


Capítulo 3
Histórias infantis


Notas iniciais do capítulo

Oe! Como estão?

Espero que gostem desde capítulo será bem movimentado :p.
Boa leitura ^^



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— Não é assim, menina preste atenção – Vovó Zeniba ralhou repetindo os movimentos de forma mais lenta com as mãos. Mostrando como dobrava-se a magia. – Sim, isso mesmo, não deixe os dedos tensos, relaxe os ombros. Isso, assim mesmo...

                                                           ***

— Mamãe, mamãe, olha meu novo amigo! - O garoto falou saltitante enquanto descia o escorregador do parquinho, para então correr até a mãe.

— Quem meu anjo? – perguntou a mulher de cabelos negros e longos com um sorriso contagiado pela felicidade do filho. Sempre o levava à tarde para brincar no parquinho, aproveitando os instantes de distração do filho para praticar crochê ou ler um bom romance.

— Aqui! – o garoto apontou para o lado indicando com entusiasmo. – O nome dele é Sayu.

—Querido? - A mãe perguntou confusa. - Não estou vendo ninguém.

                                   ***

            - O que? – Chihiro exclamou descrente enquanto saboreava o sorvete de morango sentada em um banco, junto com Kohakunushi, no centro da praça onde arbustos florais e árvores enchiam os canteiros, estatuas também se espalhavam e a água do chafariz respingava próximo a eles. Kohakunushi contava-lhe uma história, supostamente real, sobre um acidente que havia ocorrido há seis anos atrás o qual a tinha feito entrar no Mundo Espiritual onde ela trabalhou em uma Casa de Banho de uma bruxa que havia lhe roubado o nome. – Você realmente está dizendo que meus pais viraram porcos?

            Ele assentiu sério, como se não estivesse inventando aquela loucura.

            - Você não lembra, Chihiro? Do Kamaji ou da Rin?

            Negou com a cabeça enquanto enchia a boca de sorvete. – Acho que esquecer de um homem com vários braços não seria fácil.

            Ficaram em silêncio por uns minutos. Kohakunushi apoiou os cotovelos nos joelhos e cobriu o rosto com as mãos. Parecia desesperado, Chihiro notou. No entanto, o que ela mesma poderia fazer? Aquela história não havia como ser real, não podia ser, era impossível um mundo como aquele existir.

            Youkais, deuses, bruxas, uma casa de banho para ambos, um rio que se torna mar e cobria cidades. Quando menor, escutara histórias fantásticas sobre deuses e o folclore japonês, mas eram apenas contos e mitos. Não tinham como realmente existir.

            - Hey – chamou o garoto que ainda olhava para o chão. Por algum motivo vê-lo tão exasperado lhe deixava mal. – Por que me contou essa história?

            - Não é uma história qualquer, Chihiro, foi real – pausa. – Acredite em mim.

            - Por que deveria? Nem se quer o conheço.

            Os olhos verdes a fitaram por alguns segundos e Chihiro jurou ter visto algo passar por eles. – Porque você está em perigo. – Por segundos a frase foi deixada no ar. - A um véu que divide os dois Mundos e ele está caindo, você é provavelmente a única pessoa capaz de ajudar a pô-lo de volta e existe alguém atrás de você para impedir isto. Entende? – ele recuperou o fôlego. – Acredite em mim.

            Chihiro o encarou sem saber o que achar daquela conversa toda. - Não faz sentido, ok? – respondeu terminando o sorvete e o jogando na lixeira ao lado do banco. – Você só me chamou para contar essa história? Vai me dizer que é um deus? Um youkai?

            - Eu sou um youkai.         

            Chihiro piscou duas vezes e soltou uma risada descrente. – Olha, - disse levantando-se – eu acho que você está meio gira da cabeça1, entende? Nada do que você me contou faz sentindo, Kohakunushi. Desculpe, mas não tem como ser real. E já está ficando tarde, preciso ir – falou e levantou do banco, mas antes de começar a andar virou-se para o rapaz e disse: - Se precisar conversar comigo não tem problema, não precisa inventar essas histórias, mas foi divertido escutá-la, da próxima vez, se quiser, pode contar outra.

            Ele não respondeu e Chihiro começou a se afastar. A cabeça girando em pensamentos irônicos e relembrando da história que lhe foi contada. Fora tudo tão estranho que no percurso para casa se pegou pensando na possibilidade ser verdade.

            Não, não tem como...

            - Cheguei! – gritou quando entrou no domicilio.

            - Bem-vinda, Chihiro – escutou a mãe gritar na cozinha. – O jantar estará pronto em quinze minutos!

            - Certo! – gritou enquanto subia as escadas até o banheiro. Tomou um banho quente para relaxar os músculos, lavou os cabelos suados da caminhada e anteriormente do trabalho na escola, jogou a roupa no cesto de roupa suja e enrolou-se na toalha antes de sair do banheiro deixando rastros de água no piso de madeira.

            Vestiu uma calça folgada e uma camisa que ia até metade da coxa estampada de borboletas. Então, quando se dirigiu a escrivaninha para pôr o telefone para carregar viu um boneco de papel no centro da mesma. Franziu a testa, não fora ela quem fez, não tinha coordenação motora para tal feito. Pegou-o curiosa e notou que tinha algo escrito.

Cuidado, Chihiro.

                                               K.N.

            - Cuidado, Chihiro – leu em voz alta e franziu o cenho. Conhecia aquela frase, lá no fundo sua mente sentia que já tinha escutado aquelas palavras, mas onde? O sentimento de dejavu a invadiu e logo foi substituído pela frustração de não conseguir lembrar de onde vinha aquela frase. – K.N.? Quem... – começou e então franziu a testa – não pode ser. Como ele entrou no meu quarto?

            Soltou o boneco de papel na escrivaninha e se pôs a procurar o rapaz maluco em todos os lugares possíveis, desde debaixo da cama até dentro do guarda-roupa e embaixo da mesa. Como ele tinha entrado? Não gostou disso.

            - Chihiro! Desça logo ou vai ficar sem jantar hoje! – a mãe gritou do andar de baixo e Chihiro ainda desconfiada saiu do quarto, trancando a porta no processo.

            - Estou indo!

            Devo estar louca.

            Mais tarde quando voltou no quarto não viu o boneco de papel, deitou na cama e disse para si mesma que fora imaginação.

                                               ***

            Estava sentada em meio ao intervalo quando Misaki puxou uma cadeira e sentou-se ao seu lado com um sanduiche em mãos. – Hey, conte-me, o que aquele garoto queria?   

            - Ah, está curiosa? Por que não ficou lá comigo?

            - Ele queria falar com você a sós, e eu pensei na possibilidade dele ir se declarar.

            - Eu nem o conhecia! Por que um estranho se declararia para mim?

            - Não importa, quem sabe não pode se um admirador secreto.

            - Mas o que... Não fale coisa absurdas.

            - Absurdas?

            - Sim, você acha que aquele garoto, logo aquele iria ter uma paixão por mim?

            - Não se desvalorize. Ele era bonito, não quer dizer que só goste de garotas bonitas.

            - Você me chamou de feia?

            - Não – Misaki tentou se defender. – Não foi essa a intenção, você sabe.

            - Obrigada pelo elogio – falou sarcástica.

            - Chihiro! – A amiga exclamou a censurando.

            - Tudo bem, - falou mostrando a língua mostrando que estava apenas brincando – ele realmente era bem bonito. Diferente eu acho, e um pouco estranho também.

            - Certo, voltamos ao foco da conversa, agora me responda Chihiro Ogino a minha primeira pergunta: o que ele queria?

            Chihiro a encarou e revirando os olhos respondeu:

            - Ele só me contou uma história folclórica.

            - Que? Está falando sério?

            - Sim, - falou e terminou o próprio lanche – na verdade, eu acho que ele só queria alguém para conversar, porque nada do que ele disse fazia sentido.

            - Que pena...

            - Que pena, o que? – A voz de Mugi surgiu atrás de Misaki que levou um susto.

            Chihiro riu da reação sobressaltada da amiga junto com o namorado da mesma e não demorou para que Misaki também risse. – Ok, ok – Mugi falou parando de rir. – O que aconteceu? Eu perdi algo?

            - Um garoto apareceu ontem e pediu pra falar a sós com a Chihiro – Misaki falou ainda com um sorriso no rosto.

            - Sobre?

            - Ela disse que ele apenas a contou uma história folclórica.

            Chihiro franziu as sobrancelhas e disse: - Não falem de mim como se eu não estivesse aqui.

            - Ah, então você estava ai? – Mugi indagou com um toque de sarcasmo característicos. – É tão baixinha que nem a vi.

            - Ha-ha. Muito engraçado.

            O sinal tocou e Misaki despediu-se dos dois para ir para a própria sala.

            - Qual é o nome do garoto que veio falar com você ontem? – Mugi perguntou enquanto sentava-se no próprio lugar ao lado de Chihiro, onde antes a namorada havia sentado.

            - É... Kohakunushi... Nigihayami... sim, é esse mesmo. – falou pensativa. – Conhece?

            - Ah, não. Nome diferente: Kohakunushi – Mugi comentou. – Ei, o nome daquele rio que corta o Grande Parque não é Kohaku?

            Chihiro assentiu pensativa. – Não tinha notado, deve ser em homenagem.

                                                           ***

Caminhava calmamente pelas ruas da cidade. A mochila pesava em apenas um ombro, os tênis All Star marcava os passos silenciosos e o casaco preso abaixo da cintura esvoaçava como o passar da brisa.

Não queria ir para casa cedo naquele dia, não iria fazer nada lá de toda forma e andar a fazia pensar melhor. Misaki tinha ido almoçar com Mugi em comemoração a dois anos de namoro, então Chihiro estava sem companhia naquela tarde.

Haviam se passado três dias desde que vira Kohakunushi, três dias que continuava recebendo bilhetes na forma de bonecos de papel, estes que desapareciam assim que ela desviava o olhar. Antes pensara que estava ficando maluca, que o cansaço a estava manipulando, mas os pesadelos tinham parado e já não podia mais culpá-los pelos estranhos acontecimentos.

Nos bilhetes, os mesmo avisos: Chihiro, cuidado. Mas uma das coisas que a incomodou foi bilhete que recebera naquela manhã, estava dentro do caderno: Não saia sozinha hoje à noite. K.N.

Perguntou-se se deveria obedecer, se fazia algum sentido. Imaginava que se houvesse contado a Misaki ela diria que eram sinais e que deveriam ser observados, mas Misaki sempre fora muito mística e Chihiro achava certas coisas de forma demasiadamente exagerada.

“Não saia sozinha de casa”? Pensou enquanto parava em um carrinho de pipoca e comprava um pacote de tamanha médio. O que hipoteticamente poderia acontecer? Então enquanto entrega o dinheiro para o vendedor uma criança passou por si, correndo e chamando pela mãe, Chihiro jurou ter visto uma sombra atrás da garota, uma sombra sem corpo físico que fez os pelos dos braços da mesma eriçarem.

Chihiro não pensou duas vezes e correu em disparada atrás da menina. - Espere! Cuidado, não pode ir por ai! - gritou enquanto a menina ia em direção a pista onde os carros trafegavam em alta velocidade.

A menina, felizmente, não atravessou, virou a direita e continuou correndo pela calçada. Chihiro a imitou, pedindo desculpas e licença a cada pessoa que lhe aparecia pela frente. - Ei!

Viu a garotinha virar em um beco e então gritar de forma desesperada. Ao entrar no beco Chihiro a viu encolhida em um canto cheio de lixo, com lágrimas manchando o rosto inocente e infantil, a boca ocupada com soluços e os olhos fechados de forma persistente.

—Ei… - falou agachando-se ao lado da menina. - O que houve? Onde está sua mãe?

A garota a abraçou de repente fazendo com que a pipoca caísse no chão, mas Chihiro não se importou. Inicialmente ficou sem saber como deveria reagir, por fim levou a mão a cabeça da garota e lhe bagunçou os cabelos carinhosamente. - Tudo bem… O que foi?

A garotinha aos poucos parava de soluçar. Olhou para Chihiro lacrimosa e então analisou o restante do beco. Então soltou-se do abraço e respirou fundo.

— Tinha um monstro atrás de mim, você não viu?

— Não vi nada atrás de você. – Quer dizer... Podia ser a sombra de um pássaro, certo?

— Eu juro, eu vi… - falou tentando reprimir os soluços e limpou o nariz com a manga do blusão vermelho que vestia.

— Deve ter sido imaginação. – Eu espero que sim.

—Não… foi. Era bem grande e tinha penas azuis e uma máscara triste e assustadora.

Chihiro não soube o que responder.  Levantou e estendeu a mão para a menina. - Tudo bem, se diz. Vou deixá-la com a sua mãe, sabe onde ela está?

A menina assentiu incerta e segurou a mão de Chihiro.

—Qual seu nome? Me chamo Chihiro Ogino.

— Yume Hayashi…

—Bonito nome - comentou.

Depois que achou a mãe da garota, o que demorou um pouco já que a mesma estava desesperada atrás da filha, e explicou o que houve, notou o quanto tinha ficado tarde e o quanto estava faminta. Sentiu uma real saudade da pipoca que mal havia saboreado.

— Gostaria de carona para casa, Chihiro? - A Senhora Hayashi tinha perguntado.

— Não, obrigada - foi o que respondeu, pegar carona com estranhos era a última coisa que faria naquele dia.

Ouviu e sentiu a barriga implorar por comida, colocou a mão dentro da bolsa em busca de dinheiro. O que tinha não dava para nada, além de doces e isso não a alimentaria. Não comia desde de manhã quando saíra para a escola. Não deveria ter deixado a pipoca cair no chão. Suspirou e se arrependeu de estar tão longe de casa.

Olhou para a rua por onde seguiria e começou a caminhar, afinal, quatro quilômetros não vão ser percorridos sozinhos.

As luzes começavam a acender conforme o sol se punha ao longo das ruas.

                                   ***

18:00.

Chihiro subia a ladeira que a levaria para a parte alta da cidade onde morava, alguns carros percorriam por ali com seus faróis fortes. Mordeu o lábio cansada e parou a subida quando escutou um barulho vindo das árvores que cercavam os dois lados da ladeira.

Sentiu um arrepio subiu-lhe pela espinha arrepiando os cabelos da nuca.

— Tomara que seja apenas um animal - pediu em um lamurioso murmúrio.

Então o barulho apareceu novamente, como se algo estivesse preso aos arbustos e Chihiro, imóvel, encarou o local. A respiração presa na garganta e antes que a recuperasse um animal saiu dos arbustos ferozmente e a pôs a encarar.

Não, aquilo definitivamente não era um animal.

Encarava uma coisa ao qual o corpo era disforme, coberto inteiramente por um tipo de manto verde e roxo, o rosto era negro quase se misturando a noite com traços brancos que definiam os olhos estáticos e a boca em linha onde algo vermelho escarlate escorria. Era uma expressão terrível que fez Chihiro perder o que tinha de fôlego em um grito e, quando voltou a sentir as pernas, disparou ladeira a baixo, deixando que a gravidade a fizesse correr o máximo que podia.


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Notas finais do capítulo

1- Gira da cabeça: maluco, doido, entre outros sinônimos.

:3 Até o próximo, potinhos de danone sz.



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