Tóxico escrita por Bia


Capítulo 2
Capítulo II




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Lily acordou com o despertador de seu celular que estava provocando nela uma forte dor de cabeça, ainda não aprendera a beber, só tomava o cuidado de não beber até desmaiar, fora isso, não seguia nenhuma recomendação específica que deram por aí, como beber um copo de água entre uma garrafa e outra.

Ela alcançou o celular depressa, desligando o som irritante que ele produzia. Uma vez colocou sua música favorita para tocar, para que ela acordasse sempre de bom humor. Algo não poderia ter dado mais errado, a música que mais amava tornou-se, em poucos dias, a pior já inventada na face da terra. Quando ela ouvia na rádio ou em algum outro lugar, a raiva lhe subia a cabeça, fazendo-a querer socar alguma coisa.

Na verdade havia sido justamente por esse forte temperamento que a mãe decidira colocá-la em aulas de artes marciais, para fazê-la gastar energia e se manter mais calma, o que deu certo por um longo período, até ela ter sido expulsa da academia, muito depois da morte de sua mãe. A menina não procurara nenhum outro lugar para praticar e acabou ficando por isso mesmo, mas ela ainda tinha um saco de pancadas em seu quarto o qual utilizava quando estava com raiva ou muito estressada.

A menina lutou contra o desejo intenso de permanecer na cama e caminhou até o banheiro. Dependurado no boxe estavam as roupas que usara no dia anterior. Ela tomou o cuidado de lavá-las a mão durante o banho e deixar secando ali mesmo, para que não corresse o risco de seu pai ter uma vontade louca de lavar roupa e acabar se deparando com um conjunto de roupa de festa da filha com forte cheiro de álcool.

Olhou-se no espelho, não havia um pingo de maquiagem presente em seu rosto, o que deixava a menina com a pele pálida, com poucas sardas e olheiras marrom. Os cílios claros, no mesmo tom de seu cabelo ruivo, destacava seus olhos verdes. Seu cabelo estava um ninho.

Suspirou enquanto prendia-o em um coque bem apertado, como queria ser uma daquelas pessoas que acordava com o cabelo arrumado. Parecia que ela tinha ido a um lava a jato e passado pela secadora de carros.

A menina pegou o celular enquanto levava suas roupas para o varal, seu pai não notaria uma roupa a mais outra a menos ali, poderia pensar que foi colocada para lavar há dias, mas só agora estava limpa. O que podia ser facilmente justificado pelo fato da faxineira ir à casa apenas uma vez por semana, fazendo uma faxina geral toda vez.

Antes de voltar para o quarto, tomou uma aspirina para a dor de cabeça, certificou-se de que seu pai ainda dormia e pegou um prato com uvas para comer durante a manhã.

Era sábado, mas Lily não tinha nada programado para aquele fim de semana. Especialmente pelo fato de seu pai estar em casa, gostava de aproveitar a sua companhia antes que o visse partir novamente. Acontece que o senhor Evans gostava de dormir até tarde, devido a sempre precisar acordar cedo durante suas viagens a trabalho, compensava os sonos interrompidos quando estava em casa. Isso não significa que o período que passava em casa eram suas “mini férias”, apenas que não precisaria trabalhar a maior parte do dia, como quando estava fora.

Lily tinha consciência de que logo o seu pai acordaria e passaria praticamente a tarde resolvendo coisas em seu escritório na casa. Ela não era mais pequena, não precisava mais daquela atenção especial que seu pai tinha com a caçula, mesmo a diferença da presença da sua mãe, que agora estava em outro lugar, se é que existia em outro lugar.

A menina comia as uvas enquanto meditava sobre sua cama, o sol não estava muito forte, ainda estava cedo, talvez ela saísse para correr, mas apenas quando seu pai acordasse e ela pudesse lhe comunicar sobre sua saída, caso contrário ele poderia ficar paranóico achando que ela passou a noite fora (o que não seria completamente mentira) ou ido se encontrar com algum namorado. Lily lembrava-se muito bem de quando Petúnia arranjara um namorado antes de ir para a faculdade, ali dentro era um inferno, o senhor Evans não sossegava e limitou ainda mais a liberdade que as duas filhas tinham. Sim, as duas, pois se a mais velha, que era o exemplo, havia arranjado um namorado, o que seria de sua pequena Lily?

Ela tentou ignorar a dor de cabeça e tentou estudar um pouco, ler alguma matéria, mas foi incômodo demais, assim como assistir alguma série ou olhar pra qualquer aparelho eletrônico.

Pegou uma pequena mochila, colocou um caderno e uma caneta dentro, além de uns dois livros e seu celular acompanhado de fones de ouvido e deixou em um canto. Vestiu uma roupa que a possibilitasse fazer exercícios sem desconforto, pegou a mochila e saiu do quarto.

Percebeu que seu pai estava na cozinha, o primeiro lugar que ia quando acordava, depois do banheiro claro. Lily parou a poucos centímetros de aparecer no campo de visão dele, passou despercebida até a porta da frente de sua casa e escondeu sua mochila ali, depois fora para a cozinha.

— Bom dia, pequena! – A menina devolveu o cumprimento – Para onde vai toda arrumada? – Ele a analisou de cima a baixo, fazendo com que Lily olhasse para as próprias roupas.

Ela não enxergava nada demais ali, estava apenas com um shorts, moletom e tênis. Mas para seu pai aquilo poderia significar alguma coisa.

— Pensei em correr um pouco. Ajuda a me concentrar melhor quando eu tô estudando – a ruiva falou casualmente, dando de ombros.

A expressão dele se suavizou um pouco.

— Bem, já que é assim… Você vai ao menos tomar café da manhã comigo?

A menina pegou uma caneca e colocou um pouco do café fumegante que seu pai acabara de fazer, a cozinha estava inundada por aquele cheiro. Ela soprou antes de colocar o líquido na boca, mas ainda assim o contato queimou a ponta da sua língua e seu lábio superior. Ela depositou a caneca sobre a mesa para esperar que esfriasse um pouco.

— Você tem conversado com a sua irmã? – seu pai perguntou, ao que Lily balançou negativamente a cabeça em resposta, mantendo o olhar sobre a caneca.

O senhor Evans suspirou alto, não entendia o por que das suas filhas não se esforçarem para se darem bem.

— Ela vem para casa no dia 17 de dezembro pra passar o natal.

Lily permaneceu o olhar baixo.

— Quando você viaja? – a voz da menina era baixa e triste.

— Em duas semanas… – O silêncio se instaurou por alguns momentos, até que seu pai tomou fôlego para juntar coragem e admitiu – E só vou voltar no dia 22…

A ruiva virou a cabeça rapidamente para o seu pai, surpresa.

— O que? Você vai me deixar aqui sozinha com ela?

— Lils… Ela é sua irmã, não pode ser tão ruim assim. – Ele tinha o olhar triste, como queria que fossem uma família unida, como a queria de volta, ela saberia lidar com as duas filhas que praticamente se odeiam.

— Certo, mas se você voltar e encontrar a casa em chamas, não diga que eu não avisei! – A menina tomou metade de seu café de uma só vez e derramou o resto na pia, colocando a caneca na lava-louças.

Seu pai ainda falava sobre eles serem uma família e elas não se esforçarem o suficiente desde que sua mãe se fora. A menina não se deu ao trabalho de responder, pegou sua garrafa de água na geladeira e seguiu para a rua, pegando sua mochila no caminho.

Lily colocara os fones de ouvido e começara a correr, para se manter longe dali o mais rápido possível. Já correndo, ela guardou a garrafa dentro da bolsa e a colocou nas costas.

Claro que não ficaria perambulando por aí sob o sol que começara a esquentar, iria para o seu lugar, que seu pai estivesse em casa ou não, ela não deixaria de ir lá.

Correu alguns quilômetros, quando seus pulmões começaram a queimar, exigindo uma pausa para água e oxigênio. Ela diminuiu a velocidade do passo, caminhando lentamente, respirou fundo e bebeu grandes goles de água, o coque de seu cabelo já frouxo, ela o soltou apenas para prendê-lo novamente, dessa vez mais firme.

Voltou a correr enquanto guardava a garrafa na mochila, antes que tivesse oportunidade de fechar a mochila, acabou esbarrando em uma superfície dura e caiu no chão.

— Droga. – ela murmurou enquanto tirava os joelhos do chão, eles queimavam, observando melhor percebeu que arranhara, o que recebeu o impacto maior estava esfolado, sangrando.

— Olha por onde anda, ruiva.

Seu corpo paralisou para receber a raiva, que azar o dela. Ela sabia que não tinha bebido o suficiente para alucinar e de longe aquilo não era um pesadelo, pois o incômodo em seu joelho era bem real. A menina sentiu seu rosto ferver em raiva e olhou para cima. Havia um garoto a olhando de cima. O mesmo que esbarrara nela na noite anterior derramando álcool em sua roupa. O mesmo que vira se drogando do lado de fora do colégio.

Ela notou suas coisas espalhadas pelo chão, sua visão caçou seu celular, encontrando-o a poucos centímetros de onde sua mão caíra, ela o pegou apressada, certificando de que não houvesse nenhum arranhão. Houve. Mas por sorte foi na película sobre a tela, bastava trocar, mas isso ia lhe custar da sua mesada, a mesada que usava pra se manter viva dentro de casa, que seu pai deixava para ela comprar comida e pagar transporte. A raiva pelo menino aumentou.

Quando se deu conta, ele estava agachado a sua frente, ajudando-a a recolher seus pertences. O mínimo de educação que se exigia de uma pessoa.

Ele segurava sua mochila em uma das mãos e um livro na outra, os olhos dele miravam a capa do livro.

— A Vênus das Peles – ele leu em voz alta o título.

A menina olhou rapidamente para ele, o vermelho da sua pele já não era mais completamente por causa da raiva. Lily tomou o livro das mãos deles, o colocando rapidamente na mochila, junto às suas outras coisas.

O livro que o menino havia pego tinha uma capa sugestiva, uma mulher parcialmente nua, o que incentivou a imaginação do garoto a buscar explicações do que poderia conter nas palavras daquelas folhas.

— Qual é o seu problema? Não consegue mesmo prestar atenção por onde está andando? – Lily controlava-se para não gritar, mas sua voz saiu um pouco alta.

Ela já estava de pé, mas o menino ainda se levantava, o que a fez desejar chutá-lo, mas se segurou. A bochecha do menino já estava marcada com o soco que ela lhe dera na noite anterior. Ela reprimiu o sorriso ao constatar o estrago que fez.

O menino a olhou incrédulo.

— Eu? Você esbarra em mim duas vezes e ainda me bate por isso e sou eu quem tenho problemas? – Ele apontou o indicador para o próprio peito, enquanto forçava uma expressão inocente – Talvez você que seja um pouco temperamental, não, ruivinha?

— Eu não sou temperamental e não me chame desse jeito! Agora, se me der licença… – Ela passou por ele, batendo com força em seu peito.

— Ei, mas o que é isso? Vai dizer que eu que esbarrei em você agora? – Ele gritou, pois ela se afastava depressa, sem virar para olhá-lo.

Ela já voltara ao seu ritmo de corrida, enquanto ele parou por alguns segundos para admirá-la.

Lily correu direto para o bosque que continha algumas trilhas, ela seguiu por uma bem conhecida, o cheiro de terra e plantas invadindo seus sentidos. Sua mãe lhe ensinara essa trilha. Quando chegou em um ponto bem conhecido, saiu do caminho usual e percorreu alguns metros por dentro da mata até chegar em uma cabana. Ou melhor, em uma casa na árvore, só que não era na árvore. Ela era toda construída de tábuas de madeiras, estava ficando velha, mas a menina não se importava, a madeira não estava velha o suficiente para provocar algum perigo.

Ela entrou e sentou-se em um canto, o local estava completamente vazio, era basicamente um cubo oco. Tinha um cheiro forte de terra e coisas mais… Naturais. Poderia ser desconfortável, mas a menina ia ali quase diariamente, estava acostumada. Gostava de ir ali para ler, escrever ou simplesmente fugir das pessoas e da sua realidade. A outra única pessoa que sabia sobre aquele lugar estava morta.

Lily mal vira o tempo passar ali dentro, apenas quando ouviu o celular tocar se deu conta do quanto havia permanecido naquele lugar. Era o seu pai, preocupado onde a filha estava, mas aliviado por ela ter atendido logo. Ela não era idiota de não atender a primeira chamada que seu pai fizesse a seu telefone.

Ela guardou suas coisas novamente e voltou correndo para casa. Dessa vez sem pausas, sem interrupções.

 

 

Já estava no fim da tarde e a ruiva nem se lembrava que havia dado seu número para alguém quando seu telefone apitou. Não era uma ligação, era uma mensagem de texto.

Desconhecido: Ei! Remus falando!

Desconhecido: Eu vou me juntar a alguns amigos pra uma social. Tá a fim?

 

A menina olhou para a mensagem. O que ela estava fazendo? Nada. Não tinha planos e seu pai não notaria se saísse novamente.

Lily: Que horas?

Remus: 22, mas você pode chegar depois :)

Lily: Posso aparecer

A mensagem seguinte era o endereço, Marlene estava errada sobre ele, ele não só ficara com ela na noite anterior como estava convidando-a pra sair logo no dia seguinte! Ela não procurava por nada sério, só estava a fim de uma coisinha para passar o tempo, mas ela não fazia ideia do que ele estava atrás.

A menina jantou com seu pai, eles assistiram TV juntos, até que ele subiu para o quarto, a deixando sozinha. Ela esperou mais alguns momentos e foi se aprontar para sair.

Iria ter um pouco de diversão naquela noite…


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Notas finais do capítulo

Oi, pessoas! O que acharam do capítulo?



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