— Não enche! – Foi minha defesa, no momento em que Yoongi juntou-se a mim no refeitório para o horário do lanche da tarde.

         Eu não lembro da última vez que havia utilizado o refeitório. Mas hoje, me senti na obrigação de acompanhar um insistente Jimin, junto com uma calada May, para comermos juntos. Além disso, todos os outros pareciam dispostos a se juntar a nós. E foi exatamente aí que um debochado Yoongi encarava-me surpreso e prestes a dizer alguma coisa idiota sobre tudo isso.

— Eu não falei nada! – Se defendeu. Limitei-me a bufar. Eu sabia muito bem que ele iria comentar algo.

— Uhum... – Jin sorria para todos, empolgado. – Vejo que vamos precisar acolher mais uma bela moça em nosso grupo.

         É claro que ele estava falando da May, e por um segundo, me senti animada com a sua observação. May, mesmo amuada, era uma garota bonita, mesmo quando usava óculos grandes demais para seu rosto.

         Neste momento, suas bochechas inflaram, vermelhas, e Jimin riu.

— Ela é fofa. – Comentou, deixando-me cada vez mais empolgada. O sorriso já era nítido em meu rosto, é claro, saboreando com todo o gosto a limonada.

         Senti Taehyung me cutucar do lado direito, e tentei ignorar, mas era impossível quando o mesmo não fazia questão de ser discreto.

         Olhei para ele, curiosa.

— Ainda não me respondeu...— Eu engasguei, é claro. Chamando a atenção do grupo.

— Não precisa ficar com ciúmes, Jiwoo. – Jimin soltou.

— hm?! – Me recusei a acreditar que ele estivesse mesmo dizendo aquilo. Não precisei olhar para May e perceber que estava chateada com a colocação dele. Qualquer um pensaria errado com a situação.

— Yah, Jimin-ah! – Taehyung ralhou. – Não diga bobagens!

         E a brincadeira só cresceu com a algazarra do grupo na mesa. Mesmo com todo o constrangimento, eu tinha que admitir que era divertido vê-los tão empolgados. E eu também tinha que agradecer as interrupções do dia-a-dia. Mesmo sem querer, eu estava evitando problemas.

         Naquela mesma tarde, o clima entre eu e May estava ameno, e pude ver seu esforço em responder as minhas perguntas enquanto trabalhávamos juntas na atividade em sala. Eu fazia uma retrospectiva mental do quanto meu comportamento havia mudado drasticamente. De repente, me vi no lugar de Taehyung, ansiosa por interagir mais.

         May seria a última pessoa a qual eu pensaria outrora em me comunicar, depois daquela cena de suspense de sua abordagem no corredor. Mas felizmente, ou não, ela havia entrado em minha lista de possíveis amizades agora. Aquela péssima impressão havia sido extinta.

— Boa noite, appa! – Entrei a passos animada na sala, seguida de Taehyung que pouco conversou no caminho, e por muito pouco não entrou em outra discussão com Yoongi no carro.

— O que há? – Appa perguntou, curioso com minha atitude nada comum. Dei de ombros, me jogando no enorme sofá branco e estirando os pés por sob a mesa. Eu não podia explicar a sensação entranha e boa que vivenciava naquele momento.

— Boa noite, Sr. Miller. – Taehyung curvou-se minimamente ainda em pé ao lado do sofá.

— Kim, estive a sua espera! – Me pai estralou a língua, levantando-se, bastante empolgado. Tae parecia surpreso e assustado.

         Por um segundo, imaginei que ele fosse passar mal, até ser puxado, pelo meu pai até o escritório, onde iniciou uma conversa sobre os possíveis livros que o rapaz precisaria começar a estudar para entender como funciona o administrativo da empresa.

         Satisfeita por saber que me livraria do Taehyung a noite toda, isso implica não ter que dar-lhe resposta alguma sobre nada, corri escada a cima, trancando-me em meu quarto. Eu ainda precisava entender esse sentimento de empolgação que crescia em meu peito. Eu não poderia está entrando em colapso... poderia?

         Sentia-me agitada e ansiosa. É a mesma sensação de ter conquistado uma vitória. Mas não tinha certeza sobre o prêmio. De qualquer forma, eu não estava curiosa o suficiente para entender, e apenas me dediquei a finalizar minhas lições do dia. Mesmo eufórica, eu não podia esquecer-me de manter as minhas notas altas.

***

         A manhã inteira de aula, não houve qualquer novidade por parte dos rapazes, e até mesmo Taehyung parecia inerte. Após os estudos durante o almoço, que contou com a participação da May mais uma vez, tendo em vista que o próprio Jimin havia convidado a mesma para as aulas de monitoria, eu só conseguia pensar no qual fantástico estava sendo o meu plano. Eu nem ao menos parecia ter me esforçado para fazer os dois darem-se bem.  A sensação continuava igual.

— Jiwoo! – Ouvi a voz doce de Jin aproximar-se de mim naquele instante. Eu havia acabado de chegar na sala de estudos, local de reunião do clube da leitura. – Estava ansioso com a sua chegada. – E piscou.

         Sem graça, me limitei a sorrir, fingindo que ele não tinha direcionado aquela piscadinha intencional. Kim Seokjin era um sedutor, e eu não cairia em seus joguinhos, mesmo que ele fosse fofo e bastante amigável.

— Imagino que esteja ansioso para começar a oficina. - Neste momento, seus olhos seguiram a direção da minha direita, ao passo que notei uma fresta de sombra cobrir a pouca iluminação da janela que apontava para mim. Namjoon encarava Jin com muita determinação. Aquela voz grave trazia uma sensação completamente diferente da de Jin.

         Para ser sincera, ter os dois juntos ao meu lado, era assustador, e não só por causa do tamanho anormal que tinha de diferença para mim, mas o clima extremamente competitivo. Era nítido e arrepiante.

         Foi uma longa tarde de leitura e reflexões. Foi, de certa forma, agradável, tirando o fato de Jin, constantemente, chamar a minha atenção enquanto recitava algum poema, ou quando interprestava impecavelmente, a fala de algum personagem. Se eu não conhecesse Jin, diria que o rapaz era um excelente ator, e que estava no clube errado. Talvez eu dissesse isso a ele.

         Sua voz não era o incómodo aqui, mas a forma como Namjoon o cortava rudemente, na melhor parte que arrancava suspiros e empolgações alheias. Não poderia ser diferente, porque Kim Seokjin era o “príncipe” do colégio, e obviamente, chamava atenção em qualquer lugar, e em qualquer coisa que fizesse. Eu seria uma tola e mentirosa se negasse que estava inclusa nessa onda de admiração feminina.

         No término de todas as atividades, Jungkook, obviamente, procurou-me para confirmar a nossa saída até o festival de Kimchi, e para isso, tivemos que trocar números de telefone. Foi a primeira vez que um deles pediu o meu número, e isso não me deixou desconfortável.

         Já a noite, notei que Taehyung estava igualmente pronto para sair, e esperava-me no pé da escada.

— Jiwoo! – Gritou por meu nome. – vamos logo!

— hm?! – Desconfiada e confusa, eu não sabia o que ele esperava de mim.

— O festival de Kimchi. – Lembou-me, mesmo que eu estivesse ciente de que estava pronta para ir. O único problema, é que Taehyung não estava incluso nesse passeio, se não me falha a memória.

— Você também vai? – Perguntei, encabulada.

— É claro que sim. Estou tentando te convidar a dias, até descobrir que Jungkook foi bem mais esperto que eu. – Coçou a cabeça, como se estivesse sentindo-se ofendido.

         Jungkook havia sido claro quando disse que nenhum deles poderia ir. Porque de repente, Taehyung estava sem compromisso algum? Aquela história não estava me soando bem, e não era como se eu estivesse ansiosa para passar uma noite de diversão a sós com Jungkook, muito pelo contrário. Era um alívio saber que mais alguém iria. Talvez o moreno não tivesse tido tempo suficiente para avisar-me sobre isso.

— Vamos! – Taehyung puxou-me apressadamente porta a fora, sem esperar qualquer resposta.

         O festival do Kimchi ficava no centro de Hongdae, e não era tão longe do meu bairro, o que facilitava para irmos a pé. No caminho, Taehyung passou a tagarelar mais do que o normal, mesmo eu ainda não processando a informação. Meus pensamentos foram tirados de foco com a mensagem de Jungkook informando que estava próximo a fonte do parque.

         Não foi preciso ser uma perita para identificar que Jungkook não tinha absoluta ideia de que Taehyung estaria comigo, causando um clima completamente estranho e desconfortável.

— Deve está feliz por saber que um dos seus amigos está livro para te acompanhar no festival este ano. – Sorri, encarando o moreno que parecia extremamente sem graça.

         Bingo. Jungkook não tinha intenção nenhuma de convidar seus amigos para o festival e a ideia dele era um encontro. Eu fui tola em acreditar que isso não seria um encontro. Sinceramente, era muito idiota a forma como os homens pensavam. Pra falar a verdade, o ser humano era complexo em geral. Se um homem convida uma mulher para um encontro de forma direta, elas, geralmente, não gostam, e se sentem pressionadas. Quando inventam desculpas esfarrapadas para terem um encontro, acabamos por acha-los idiotas e sem um pingo de criatividade.  

         Em outras palavras, mulheres eram o problema. Mas neste caso, neste único caso, eu não era a mulher com expectativa, e portanto, algo assim, não me afetaria de forma alguma. Se Jungkook queria uma noite com os amigos, ele teria uma noite com os amigos, e isso implicava eu continuar no festival junto com esses dois até o final, aproveitando o máximo possível, porque TUDO isso, era uma simples distração.

         A notar pela cara de Jungkook, ele não estava satisfeito com a situação, e provava do próprio veneno. Quanto a Taehyung, parecia ainda mais satisfeito em ter atrapalhado a suposta noite do amigo. Eu, por outro lado, já começava a me divertir, antes mesmo da noite começar.

— Ow.. – Ouvi quando Tae apontou para uma barraca de tiro ao alvo. Não me fiz de rogada em acompanha-lo, fazendo com que Jungkook não tivesse outra escolha, se não jogar o mesmo jogo.

         Em meio a muita brincadeira e competição de ambos, percebemos que não éramos os únicos nos divertindo, e foi muita “coincidência” encontrarmos Jimin, Jin, Namjoon e Hosoek.

— Pelo visto, todos resolveram esquecer seus compromissos para vir até o festival. – Debochei, olhando expressivamente para Jungkook. É claro que ele havia percebido que eu não era boba. Ele apenas bufou em um misto de desagrado e vergonha.

— Mas olha só quem encontramos aqui. – Jin tocou suavemente em meu ombro, e sorria abertamente. Nenhum deles parecia mesmo surpreso em me ver, o que só colaborava ainda mais para a minha desconfiança.

— Podemos ficar TODOS juntos. – Hosoek sugeriu, empolgado.

         No fim das contas, todos concordaram quase que imediatamente. Cumpriam com muita seriedade a definição da palavra “juntos”. Eu nem mesmo conseguia falar algo sem que recebesse a resposta de todos ao mesmo tempo. E quando os jogos do festival eram puramente competitivo, a disputa ficava cada vez mais interessante, o que me fazia pensar o quão bobo os homens eram quando queriam parecer melhores, e as vezes, não precisava de motivo algum para isso. Isso só piorou quando decidiram ingerir bebida. Tive que lutar muito contra mus instintos para não beber junto com eles.

         A noite estava agradável até demais para um inicio confuso. E em algum momento, naquela noite, o grupo precisou se separar para realizar algumas coisas de seu interesse. Enquanto um decidia que tipo de Kimchi comeria, o outro estava bastante interessado no churrasco próximo. Hosoek já não aguentava de ansiedade para procurar um banheiro, e Taehyung e Jimin continuavam em uma disputa acirrada no tiro ao alvo. Sobrou, por alguns breves minutos, Jungkook e eu a sós em meio a um aglomerado de pessoas.

— Jiwoo.. – Ele mantinha uma das mãos na nuca, alisando a mesma como quem estava bastante sem graça em conversar. – Está chateada comigo?

— Eu? – Apontei para mim mesma, fingindo, é claro. – Porque eu estaria?

— Bom... – Ele bufou, juntando as mãos próximo ao rosto. – Eu menti para você, e agora estou me sentindo péssimo.

— Hm... – Ponderei sobre sua confissão. De certa forma, eu estava feliz por ele está sendo sincero comigo agora. – Tudo bem.

— Mesmo?! – Parecia surpreso.

— Sim. – Afirmei com a cabeça.

— Poxa. – Pós a mão no coração, nitidamente aliviado. – Eu fui um bobo em achar que você não perceberia a minha intenção.

         Nesse minuto, minha sobrancelha foi erguida, em surpresa. Ele estava mesmo fazendo isso...?

— Eu não saberia como me expressar... – Sim, ele estava se confessando para mim naquele minuto. Péssima hora, Jungkook, péssima hora! – Espera... – Ele fitou-me desconfiado. – A menos que também quisesse isso, não teria aceitado sair comigo a sós...

         Onde ele estava querendo chegar com aquilo?

— Ow... – Tentei negar o que quer que estivesse achando, mas fui interrompida por ele. Onde estava o Jungkook tímido? De repente, percebi que a única coisa que faria um tímido tagarelar tanta besteira, seria a bebida exacerbada. Jungkook estava bêbado, e era óbvio o suficiente.

— (...) não achei que seria correspondido, e pensei em tantas formas de conseguir ao menos um beijo. – Fez um gesto com um dedo, fazendo sinal de 1.

         Onde estavam os meninos? Eles precisavam cuidar do pacotinho deles aqui. Eu não daria conta de Jungkook neste estado.

         Senti as enormes mãos do moreno segurarem meu ombro com certa firmeza, e seu rosto aproximar-se do meu, parando no meio do caminho. Eu estava surpresa e assustada demais para se quer, tentar desviar. O cheiro da bebida invadiu minhas narinas, e com a recordação de um passado que eu gostaria de esquecer, fechei meus olhos, lutando contra a vontade de me entregar a esses fantasmas novamente.

         Eu pude sentir Jungkook se mexer bem a minha frente, e suas mãos voltarem a pousar em meus ombros, agora mais sutilmente. Eu estava alheia ao que me ocorria ao redor. Lábios quentes encostaram nos meus, e para a minha maior surpresa, era confortável demais para me afastar.

         Nunca pensei que um Jungkook pudesse despertar esse tipo de emoção em meu coração, até abrir os olhos e perceber que não era o moreno que me beijava naquele momento, e que o mesmo estava caído a minha direita, completamente assustado.  

          Era impossível controlar meu coração nesse momento, e duvidava que fosse capaz para isso. A sensação de prazer se misturava com o choque e a surpresa.

         Eu não podia acreditar de fato no verdadeiro autor daquelas emoções...