Eles por ela e ela por gatos escrita por Airi


Capítulo 8
O “ele” dos meus pensamentos. Confusão




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  Por que. Alguém consegue realmente explicar porque diabos tudo isso está acontecendo? Vinicius não deveria ter vindo e muito menos falado comigo daquele jeito, tão...próximo. É, muitas coisas acontecem quando você não quer, e isso deu pra perceber. Acho que quando imaginamos algo fantástico acontecendo, imaginamos apenas as partes boas, como em um livro, dividido exatamente em três partes, o inicio, o meio e o final. Só que as coisas, na realidade, não acontecem desse jeito, elas são totalmente embaralhadas, sem essas três partes, e claro, sem o final esperado. Não sei porque estou pensando nisso, e nem porque essas coisas estão acontecendo em um momento repleto de confusão, mais como sempre dizem, tudo de errado que acontece é para aprendermos, mesmo eu não entendendo o que eu vou levar de experiência boa com tudo isso.

- Amelinha! – minha avó gritou do portão

  Parei imediatamente a bicicleta, quase caindo.

- Sim... – disse um pouco seca

  Mesmo estranhando ela prosseguiu.

- Está andando com isso ai a mais de hora, dando voltas e voltas no quarteirão... está tudo bem?

  Na verdade, nunca nada está bem, sempre tem algo para me atrapalhar. Porém, a mentira serve para isso, não é mesmo? Fiz uma cara de quem não entendeu a pergunta, e tentei abafar o caso. Como sempre.

- Não sei do que está falando vovó! Não posso andar de bicicleta?

- Ah...

  Derrotada, ela apenas balançou a cabeça e disse para mim voltar a me divertir.

  E foi o que fiz, voltei a andar de bicicleta, com um sorriso daqueles que engana qualquer um. Devia ser a quinta vez que eu estava dando a volta na esquina, quando me deparei com uma cena um pouco estranha.

  Dois meninos estavam chutando alguma coisa, e riam enquanto fazia aquilo. Parei a bicicleta na mesma hora e me aproximei deles, vendo que o que eles estavam chutando era um lindo gatinho branco. Aquilo me doeu. No mesmo momento, pensei que fosse Serafim, e um sentimento raivoso veio em mim, percorrendo todo o meu corpo, me fazendo tremer, enquanto gritava que nem louca, afastando os meninos.

- O que pensam que estão fazendo seus cretinos!

  Assustados, os meninos fugiram sem dar nenhuma explicação. Eu ia correr atrás, mais o gatinho estava tão maltratado que resolvi ficar.

- Hei, você está bem? – perguntei preocupada – Como ousa deixa-los bater em você hein, seu bicho burro!

  Quando olhei direito, levei um susto. Não era Serafim. Aquele gato era muito pequeno e delicado para ser ele, e ainda por cima, seus olhos eram esverdeados. Eu tinha feito uma boa ação, salvar um gato das mãos de meninos que se divertem com essas coisas é um ato muito nobre, mais porque estou sentindo essa sensação de vazio? Só porque não é aquele gato safado?

  Respirei fundo e peguei o gato no colo, que me olhava assustado, confuso.

- Meu deus!

  Escutei uma voz atrás de mim, em prantos.

- Você encontrou a cherry!

  Então, era uma gata? Ri um pouco, me virando e encarando um padre, que parecia muito feliz ao reencontrar a bichana, porém com um semblante muito preocupado.

- Estavam maltratando a pequena, não pensei duas vezes antes de tira-la de lá. Ela é sua?

  Vendo que era um Padre, minha voz saiu naturalmente fraca e bem doce. Não sei porque, mais velhinhos, padres, freiras e crianças não o meu ponto fraco, não tem como ser rude e nem fria, mesmo estando triste e pensativa.

- Sim, ela vive fugindo da Igreja – ele respondeu no mesmo tom – Mas você disse que estavam a maltratando, deixe me ver...

  Enquanto ele se aproximava para ver a gata, ela miou, um miado feliz e contente por reencontrar seu dono. Uma cena, que novamente tocou meu coração, já bem confuso e despedaçado. Fiquei até com vontade de chorar.

- Não parece que machucaram muito, acho que consegui chegar a tempo, mas, sendo sincera, era melhor o senhor leva-la ao veterinário.

- Acha mesmo? – ele perguntou inocente

- Sim, se quiser eu vou junto com o senhor, o veterinário não fica muito longe e eu moro aqui do lado!

  Lá íamos nós novamente. Eu com minha mania de boa ação e o padre, com sua gatinha. Chegando ao veterinário descobrimos que ela realmente não tinha nada, apenas um machucado pequeno na pata direita. A felicidade do Padre era tanta, que fiquei me perguntando o quanto um animalzinho vale na vida de uma pessoa. A solidão humana é tão grande e esses pequenos seres nos completam...mais o que eu estou dizendo?

  Voltando a situação da gata, voltei com o Padre até a Igreja, que fica logo ao lado da casa de minha avó.

- Nem sei como lhe agradecer minha filha – ele disse todo sentimental – O que você fez pela Cherry, deus há de te recompensar

- Não faço isso pelas recompensas senhor, apenas para não fazer injustiças.

- Você disse que morava aqui ao lado não é?

- Ah, sim, ali – disse apontando para a casa – É bem perto...

- Você é a neta da Marilia?

  A devota frequentadora.

- Sim, ela é que é minha avó!

- Você é a famosa Amélia então! – ele disse cheio de felicidade – Sua avó fala muito de você, porque não vem com ela as missas de domingo?

  Tá ai uma coisa que eu não faço a muito tempo e que não farei tão cedo. Sinto muito senhor padre, minha vida está um pouco complicada para vir à missas, então, hora do plano B!

- Infelizmente não posso e preciso ir senhor Padre – disse apressada – Está escuro e minha avó deve estar preocupada!

- Volte quando quiser

  E assim terminei a conversa rapidamente com o Padre.

  Voltei correndo para casa, entrando e dando de cara com minha tia, que começou com as perguntas preocupada, analisando tudo para ver se eu não estava machucada, e felizmente ela não encontrou nada de diferente. Entrei, levando uma bronca da vovó até ela descobrir que eu estava com o Padre. Após contar a emocionante historia do gato branco e seu dono, elas me deixaram subir, não antes sem perguntar aquilo que eu tanto temia.

- Amelinha, você vive sozinha em seu quarto, está tudo bem?

- Ah? – me fiz de desentendida novamente – Vovó, eu gosto de ficar perambulado pela casa, por isso eu sumo, é normal, se lembra de quando eu era pequena e eu vivia vasculhando tudo?

  A explicação fora bem plausível e finalmente consegui deixa-las calmas. Tenho certeza que minha avó estava sentindo que o trabalho dela não estava sendo bem feito, por isso vivia me perguntando. O que ela mais teme até hoje é que eu odeie ela, e não sei porque, ela pode as vezes ser chata e rabugenta, mais o amor que tenho por ela é tão grande que supera qualquer defeito que ela tenha.

  Subi as escadas sem muito animo, um degrau de cada vez. Com toda aquela agitação do gato eu tinha me esquecido das coisas que tinham acontecido e que estavam acontecendo, mas o que mais me intriga agora é porque tive aquela sensação protetora. Eu jurava que era Serafim, e me senti tão mal quando pensei que ele poderia estar machucado. Gostaria de saber o que está acontecendo comigo, porque, me importar com Serafim, eu sei que me importo, não tem jeito, mas o quanto que eu me importo é o que me assusta. Abri a porta do quarto, dando de cara com Serafim, sentado no chão, de braços cruzados, e apoiado na cadeira, dormindo. Porque este infeliz está sempre dormindo!?

  Me aproximei, sentando-me na frente dele e analisando novamente suas expressões faciais, a linha do rosto, o desenho dos olhos...tudo. É fascinante. Serafim é um ser diferente, complexo, arisco, estranho. Ele me fascina, me amedronta e as vezes, apenas as vezes...me ilumina. Como posso não entender o que é isso que eu sinto quando o vejo?

  Ele abriu os olhos lentamente, se desencostando da cadeira, bocejando, deixando a mostra os caninos ponte agudos e me olhando como um bebe.

- Amélia? Desde quando está ai me espionando hein?

  Respirei fundo, dando dois tapas de leve na cara dele.

- Apenas encarando essa sua cara de bobo – disse rude – Você está fazendo o que aqui?

- Estou com problemas para manter a transformação, ainda não entendo... – ele disse pensativo, se levantando.

- Nossa – disse sem muito animo – Você está com tantos problemas assim é?

- Do que está falando? – ele respondeu raivoso – Estou tentando solucionar seu problema, e isto é serio!

- Pois não é mais – disse por fim, seca – Eu, estou fora.

- Fo.. – ele parou, colocando a mão na cabeça - ...ah, tá, boa tentativa Amélia, tentando me enganar de novo não é?

- Não... eu estou fora... entendeu ou quer que eu soletre? – continuei no mesmo tom, abrindo a janela – Cai fora, vai sassaricar na casa de outra pessoa, aqui, você não fica mais...

- Você só pode estar ficando louca...Amélia, o que aconteceu? – ele perguntou preocupado

- Nada que seja da sua conta, vai, cai fora idiota!

  Perdi a paciência e gritei, apontando para a janela. Porém, Serafim não moveu um musculo, fez o contrario, sentou-se na cama e me encarou completamente emburrado.

- O que te fez mudar de ideia tão rapidamente?

- Agora você quer discutir isso né?

- Não sei a onde está querendo chegar...

  Serafim olhou para o lado, fechando os olhos e respirou fundo.

- Ninguém nunca sabe, esse é o problema, eu cansei, chega! – continuei – Eu sou apenas uma peça desse jogo, você me troca fácil, então vai, sai, sai!

- Te.. te trocar?

- Você mesmo falou que eu não tenho a coragem necessária para isso Serafim, disse que eu sou uma criança, e você tem razão, eu não aguento a pressão, eu não aguento gente dependendo de mim, pessoas sofrendo por minha causa, nada... – disse com a voz baixa - ...eu não consigo aguentar nada, além de medíocre eu sou fraca...

- Vai com calma, quem te disse tudo isso?

- Não se faça de sonso, você sabe que eu sou tudo isso...

- Você tem lido alguma coisa? Alguma das suas amigas quando veio te disse algo ruim?

- Não finja estar preocupado Serafim, para de fingir, você está livre, pode ir, esta é minha palavra final...

- Não

- O que? Não tem essa de “não”, cai fora!

- Você pensa que é assim? Que pode muito bem deixar essa responsabilidade jogada no ar assim, do nada? Você não pode desistir por você, pense nos outros, nas pessoas que não sabem sobre o que vai acontecer e estão em perigo. Sim, eu continuo achando que você não tem força necessária ainda... mais se você foi escolhida, tem uma questão maior, e eu não vou julga-la aqui, não mais...

- Eu...

  Quando me dei conta, ele já estava lá, na minha frente, secando uma de minhas lagrimas que caia de vagar sobre meu rosto. Quando foi que elas começaram a cair?

- ...estou morrendo de medo – disse baixo - ...não quero decepcionar mais ninguém, não suporto a ideia de mentir...

- Então era isso?

  Pela primeira vez senti afeto na voz de Serafim, ele parecia compreender meus sentimentos e de alguma maneira, ele estava agindo por ele mesmo e não pelo efeito dele beber meu sangue. Seus braços me envolveram fortemente, enquanto ele me aproximava do seu corpo quente e firme, me apertando, colocando sua cabeça sobre a minha.

- Mais o que...

- Tudo bem ter medo Amélia – ele disse calmo – Ele faz parte de todos os seres. Acha que eu também não tenho medo? Eu sou um covarde, não faço nada certo, deixo tudo pela metade. Agora que estou conseguindo levar um trabalho a serio, sinto muito se soar egoísta, mas você está me deixando...e...de certa forma não quero isso, quero terminar este trabalho, e junto com você

  Ele tremia um pouco enquanto falava aquilo. Aquelas palavras me deixaram dura e gelada, porém, meu coração era o que me mantinha aquecida, dizendo que estava tudo bem e que eu poderia acreditar naquelas palavras ainda sem sentido pra mim. Meu corpo continuou mole, sem reação, na realidade eu não sabia o que falar, não sabia como reagir. Se ria, se chutava ele, se chorava.

  Não demorou muito para varias lagrimas começaram a cair pelo meu rosto, uma atrás da outra, sem intervalo, me deixando ainda mais agoniada.

- A..amelia?

- O que... – perguntei manhosa e irritada ao mesmo tempo - ...você que começou com isso, agora aguenta!

  Ele riu, enquanto eu deixava o meu orgulho completamente ferido e inexistente de lado, o abraçando de volta. Era bom ficar daquele jeito, deixando minhas magoas tomarem conta de mim, soltando todo meu sofrimento sem ter que dizer uma única palavra. Ninguém nunca tinha feito isso por mim, sempre vinham com sermões, não deixando eu chorar de jeito nenhum, e confesso que isso sempre só me deixou ainda mais angustiada.

  Serafim sentou-se depois de um tempo comigo ali, me colocando em seu colo como um bebe, ainda me abraçando, mantendo minha cabeça contra seu peito, abaixo da cabeça dele, enquanto cantava algo que me pareceu ser uma canção de ninar, e muito bonita, diga-se de passagem.

- Você está tão apreensiva assim com essa situação?

 Não respondi direito, apenas mexi a cabeça positivamente, fungando.

- Tanta coisa te amedrontando e eu nem percebi, desculpe – ele respondeu culpado

  Mesmo neste estado esquisito que me encontro, não consigo entender o porque Serafim está tão compreensivo e amável comigo, me trata como se fossemos conhecidos a longos anos e o pior, não me larga de jeito nenhum. Isso me irrita, porque, querendo ou não, é confortante.

- Se..Serafim – disse baixo, com a voz rouca – Eu não consigo, sou péssima em tudo o que faço...

- Falando assim eu diria pra você se tratar, porque isso é depressão – ele disse irônico, rindo – Porém, como não sou nada normal, entendo que isso é medo de encarar as consequências, mas você pediu tanto mas tanto por isso e agora não quer?

- Não é que não quero... – continuei no mesmo tom, agora o encarando - ...eu só não confio em mim e tenho tantos problemas para resolver...

- É só pensar assim: Eu preciso de você pra terminar essa missão, sem você tudo está perdido para muitas pessoas, e como este problema é maior, o resolva primeira, depois você pensa nesse muleque...

- Quem disse que... – comecei irritada

  Porém, ele me calou com o dedo, me olhando serio.

- Eu sei que está chorando, também, por causa dele. A duvida que sente sobre ele gostar de você ou não é o que te mata por dentro – ele concluiu

  Pela primeira vez resolvi ficar quieta, sem retrucar. Serafim está certo e eu não posso fazer nada se tudo veio a tona na mesma hora, se embaralhando e me deixando sem saída a ponto de chorar minhas magoas para ele.

  O silencio que tinha voltado continuava não sendo constrangedor, mas meu coração batia tão forte que me assustei. A angustia tinha ido embora, totalmente, dando lugar a coragem e a calmaria que eu não teria se não fosse por aquele gato cretino, só que...

Olhei para cima, encarando aquele par de olhos azuis cintilantes que me vigiavam curiosos e preocupados, pela primeira vez vi Serafim de outro jeito, com certa doçura no pensamento. Ele pode ser safado, bobo, cínico, egoísta, esquisito, chato, convencido e estranho, mas não posso negar que ele é... NÃO!

  Virei o rosto para baixo e respirei fundo, mexendo a cabeça para os lados, confusa e o empurrei, me afastando dele, bem atordoada.

- O que foi? – ele perguntou irritado – Você é louca?

- Não, é só que... – respondi meio tonta - ...eu já melhorei, obrigada Serafim...

- Ah... acho que entendi – ele disse baixo, voltando a ser irônico como sempre – Você achou que não resistiria aos meus encantos, não é?

  Ele foi se aproximando sorrateiramente, quando percebi ele já estava bem próximo a mim, com sua respiração quase me sufocando, de tão perto que estava. O perigo estava olha-lo nos olhos, então simplesmente os fechei para que não pensasse mais besteira, mas Serafim levou aquilo como um convite e sem mais nem menos... colou seus lábios nos meus, iniciando o beijo mais errado de toda a minha vida.


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Notas finais do capítulo

Só um OBS, a descrição do beijo continua logo no inicio do proximo capitulo MUITO HOT, uHASUAHSUHASUAHSHU, obrigada por ler, e por favor, deixe seu comentario :3
Tenha uma boa noite! o/



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