Quando o relógio bateu três da tarde, magicamente o escritório todo começou a se mobilizar. Cadeiras eram empurradas com estrondo pelo chão de madeira polida, tão brilhante quanto um espelho, balões eram enchidos e pessoas se posicionavam ao redor da grande mesa branca, onde fora improvisado um lanche bem generoso para todos os funcionários.
Era aniversário do chefe e ele tinha trazido comida para compartilhar com todos e nós, em contrapartida, tínhamos juntado algum dinheiro e comprado um presente. Também, sem deixar de fazer as típicas brincadeiras de aniversários, tínhamos enchido o bolo com velinhas multicoloridas e palitinhos que faiscavam, indicando que ele era bem mais velho do que na realidade. Alguns balões também tinham sido feitos especialmente para aquela ocasião, e vários deles mostravam o rosto do chefe, com a escrita “Já fez aquele relatório?”, abaixo da fotografia.
Era uma brincadeira arriscada, mas por sorte, ele tinha mais senso de humor do que todos nós juntos. No aniversário de Anne, ele tinha forrado toda sua mesa, cadeira e computador com três camadas de papel alumínio, o que levara a manhã toda para retirar, mas pelo menos ela tivera uma desculpa por atrasar na entrega dos seus prazos.
Sentamos ao redor da grande mesa repleta de comida cheirosa e ficamos comendo e jogando conversa fora até o final do expediente. Ninguém parecia estar com muita vontade de trabalhar, tampouco o chefe, que tirava fotos e mais fotos dele perto dos balões que tinham seu rosto impresso.
Eu me sentei um pouco afastada, concentrada no prato de salgadinhos e no copo de refrigerante, trocando algumas palavras ocasionais com alguns colegas de trabalho. Infelizmente, com quem eu mais queria conversar, não estava. O dono dos olhos castanho-esverdeados tinha tirado folga naquela tarde e só lembrara de me avisar meia hora depois que eu começara a trabalhar, pedindo se eu conseguiria cobrir alguns prazos que venceriam naquele dia.
Após todos terem batido o ponto, eu ajudei Fred, o guarda, a fechar algumas janelas e colocar as mesas de volta em seus devidos lugares. Não fazia parte da minha função e eu não fazia aquilo para paparicar o chefe, eu só odiava ver as coisas fora de seus devidos lugares.
Assim que termino, abraço a montanha de pastas que iria levar para casa, me despeço de Fred e rumo até a saída, tomando cuidado para não tropeçar nos degraus com o salto alto que eu usava. Chegando na rua, paro na calçada, saco o celular do bolso e o uso para mandar uma mensagem para a minha carona, Lene. Ela era minha vizinha de prédio e trabalhava em uma grande corretora de imóveis ao lado do escritório. Desde que nos conhecemos, vimos várias vantagens em fazer um revezamento de carros para economizar gasolina e cada semana, uma de nós vinha com o seu carro, trazendo a outra para trabalhar.
Quando o carro esportivo para na minha frente, tocando uma música animada no rádio e com todos os vidros abaixados, eu entro no veículo, tomando cuidado para não derrubar minha bolsa ou as pastas com trabalho. Cumprimento Lene, que está com um notável bom humor, aparentemente, ela tinha conseguido vender um apartamento de luxo na beira do mar para um rico esnobe, e isso significava que ela teria uma comissão bem grande para receber junto com o seu salário.
Com a promessa de comprar um champagne quando recebesse a comissão para nós duas comemorarmos, ela me deixa na frente do prédio azul claro onde eu morava e ruma o carro para o estacionamento do prédio do lado, buzinando uma última vez para mim.