Flores também crescem em torres. escrita por Gabriel Ábila


Capítulo 2
A Descoberta.


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem e opinem.



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      Mais um dia naquele lugar lindo, onde Ginny era obrigada a chamar de lar. Era bem difícil ver o sol nascer quando se estava na Ilha dos Perdidos. O céu era nebuloso demais, cheio de nuvens negras que cobriam a ilha fizesse chuva ou sol. Não se sabe se era alguma conseqüência da barreira, se era o excesso de maldade acumulado ali, ou se era pura coincidência, mas as nuvens nunca se afastavam dali.
      É claro que isso aumentava dez vezes o desânimo de Ginny para ir à escola, mas isso atribuía muito mais pontos negativos no seu histórico escolar. Queria terminar o ano com o histórico péssimo, assim como todos.
      Quanto mais pontos negativos no histórico, mais rebelde e vilanesco era o aluno, e esse era o propósito da Dragon Hall, formar uma nova geração de vilões piores ainda.
      Gothel gritava para que Ginny acordasse. Usava sua mesma voz cantante de sempre.
      - Ginny, está na hora de irmos. Levante-se e vista-se!
      Ginny, ainda com sono, levantou bufando de mau humor. Jogou todas aquelas roupas que estavam na cama para o alto, olhou pela janela, e viu o dia nebuloso que fazia, como todos os outros. Fez uma careta revirando os olhos. “Terra de urubus” pensou enquanto remexia a cama procurando alguma roupa para vestir.
      Não vestiu nada além do comum. Um vestido de couro escarlate com alguns detalhes pretos e dourados, uma meia-calça escura, botas pretas, e só para completar, uma gargantilha vermelho-sangue que mais parecia uma coleira.
      Muitas filhas de vilões paravam por aí (às vezes nem trocavam de roupa, iam com o pijama mesmo), mas Ginny, não. Todos os dias, passava maquiagem, e não era algo simples. Tentava sempre fazer com que seu rosto parecesse o mais jovem possível. Quer dizer, uma garota de treze anos tinha a aparência jovem com ou sem maquiagem, mas Ginny fora influenciada pela paranóia de sua mãe desde pequena. Gothel era uma das pessoas mais velhas do mundo, mas passou a vida se escondendo atrás de uma falsa juventude dada pelos poderes da flor, que depois, viraram os poderes do cabelo de Rapunzel. Sua sorte foi ter sido ressuscitada na Ilha dos Perdidos na sua forma jovem, porque se estivesse em sua forma real, já teria virado pó. Provavelmente, nem ela mesma sabia exatamente quantos anos tinha, de tão velha que era. Da última vez que voltou à sua verdadeira forma, o resultado não foi nada bom, por isso, depois que ressuscitou, seu pavor à velhice só aumentou, e foi um dos grandes motivos pelo qual resolveu abrir um salão de beleza. Assim poderia se cuidar, e ganhar dinheiro cuidando da beleza dos outros.
      Ginny olhou para o espelho, tremeu só de ver as imperfeições do rosto, e começou a se maquiar. Era uma maquiagem demorada, Gothel sempre ficava impaciente esperando-a.
      - Ginny! – gritou mais irritada dessa vez – Eu sei que quer que o atraso vá para o seu histórico, mas nós precisamos ir. Já estou velha de tanto esperar...

      - Eu já vou! – gritou irritada de volta. Muitos na ilha tinham medo de seus pais e os achavam tenebrosos, mas não era o caso de Ginny. Gothel não a intimidava mais como quando ela tinha sete anos de idade. Ela batia de frente com a mãe, e não dava a mínima importância para as possíveis consequências.
      Finalizando a maquiagem, passou um batom cor de vinho. Olhou para o cabelo bagunçado e não quis penteá-lo, achava que ele tinha um charme natural. Era bonito e cacheado, só não tão cacheado quando o de Gothel. Decidiu apenas prendê-lo num rabo de cavalo e depois o jogou sobre o ombro esquerdo.
      Quase acabando, passou mais um pouco de rímel só para demorar um pouco mais e irritar a mãe.
      - Ginny Gothel Flurtangler! Venha agora, ou eu jogo essas maquiagens no poço das maldições!
      - Estou aqui, mamãe querida! – respondeu ironicamente. Não sabia o porquê, mas sentia tanto prazer em irritar sua mãe.
      - Você está pensando que eu sou o que para me fazer esperar assim? – perguntou braba.
      - Ué, foi você quem disse que o nosso dever é nos atrasar e quebrar as regras – respondeu.
      - Já estamos atrasadas. Não precisamos da sua demora passando maquiagem. Toda vez que você se maqueia, eu tenho vontade de me descabelar!
      - Quanto estresse! – Ginny respondeu zombando – Cuidado com as rugas, hein?
      Aquele assunto era delicado. As pupilas de Gothel se dilataram e ela se olhou no reflexo de uma torradeira velha que estava em cima da mesa, foi o primeiro objeto que fazia reflexo que ela encontrou. Sabia que não tinha ruga nenhuma no rosto, mas era tão traumatizada que não conseguia se controlar. Lançou um olhar amedrontador para Ginny e disse:
      - Vamos. Já nos atrasamos o suficiente.
      - Tchau, pai! – Ginny falou, mas logo viu que seu pai ainda estava dormindo no sofá com um pote de sardinha no peito. Só acordaria daqui a umas cinco horas, e só saía de casa de vez em quando para furtar ou assaltar.
      Gothel era professora na Dragon Hall. Lecionava Introdução ao Egoísmo, assunto que ela dominava totalmente. Quem poderia ser mais egoísta do que uma mulher que mentiu a vida inteira para uma menina inocente só porque precisava dos poderes do cabelo dela para benefício próprio? 
      As duas caminharam até a escola, desdenhando todos os conhecidos que encontravam pelo caminho. Todos na ilha se conheciam.
     Ao avistar a escola, Ginny fechou os olhos e pensou em como odiava aquele lugar. Não conseguia saber se estava certa por ser uma vilã que odeia ter que cumprir obrigações como esta, ou se estava errada por menosprezar um lugar que ensinava apenas o mal. Entrou e viu aquele pessoal que ela tanto detestava.
      - Você vem comigo? – Gothel perguntou.
      - Ah, não, eu só vou para a sua aula depois, agora eu tenho artes das trevas.
      - Então tá bom. – Disse Gothel abraçando a filha – Até mais, minha florzinha enrugada.
      Ginny ficou olhando para a mãe, mas nem se importou com a piada. Na verdade, aliviou-se por saber que Gothel ia dar aula e não testaria sua paciência por um tempo.
      Andou até seu armário, de cara fechada para todos à sua volta. Abriu a porta e pegou seus cadernos de desenho, e quando fechou, deu de cara com o seu capacho.
      - Bom dia, Ginny! – disse a garota.
      - Aham, Nora – respondeu – Muito bom mesmo... para quem está a fim de morrer.
      Nora era uma garota tímida que usava óculos e tinha cabelos curtos castanhos. Estava sempre por aí segurando livros  e estudando, uma típica nerd. Pouca gente sabia, mas Nora não era uma filha de vilão. Nasceu e cresceu em Auradon, mas, há cinco meses havia cometido um crime leve, e foi condenada a cumprir sua pena passando um bom tempo na Ilha dos Perdidos. A única que suportava ela era Ginny. As duas não usavam o termo “amigas”, mas sim, “capacho” e “madame”.
      - Ah, também não precisa falar assim... Você pode muito bem aproveitar o seu dia pregando peças em alguém. Ah, já sei, pode trocar as mochilas dos alunos de lugar, vai confundi-los bastante.
      - Nossa, Nora! – Ginny olhava para ela como se a garota tivesse dito uma besteira tremenda (e realmente tinha) – Vem cá, como é que você consegue ser tão imbecil?
      Nora fez um sinal de que não sabia. Tentava sempre ao máximo ser cruel, mas não conseguia.
      - Me diz uma coisa. – Ginny continuou – O crime que você cometeu para vir pra cá foi esse? Trocar mochilas de lugar? Esse povo de Auradon é uma piada...
      - É claro que não, né, sua bobinha! Eu já te falei que eu apenas furtei um...
      - Eu já sei! – Interrompeu – Furtou um queijo do palácio para dar para uma família que estava passando fome. Eu estava sendo irônica, você já me contou essa historinha ridícula umas noventa vezes.
      - Tá bom, estressada. Ei, você por acaso estudou para a prova de hoje?
      Ginny riu.
      - Olha só para a minha cara. Eu tenho cara de quem estuda para alguma coisa?
      - Pois deveria! Se quiser se tornar uma vilã de verdade, precisa aprender tudo o que os professores passam.
      - Professores? – debochou – Isso é só um bando de vilões decaídos que falharam com os planos e agora estão aqui. Quer que eu aprenda com eles? E você não é má, por que está interessada em aprender maldade?
      - Eu quero saber como as coisas funcionam aqui. Sou uma aluna dedicada, onde quer que eu esteja.
      - “Sou uma aluna dedicada” – disse uma voz atrás de Nora zombando-a, como muitos faziam sempre – Se liga! Você é uma otária dedicada!
      Era Mal. Filha de Malévola, a soberana da Ilha dos Perdidos. Todos obedeciam à Malévola sem contestar, e consequentemente, obedeciam à Mal também, que na escola, metia tanto medo quanto a mãe.
      Nora deu um pulo para trás. Não era qualquer pessoa que estava mexendo com ela.
      - Como é que é? – Ginny perguntou com os olhos semicerrados.
      - Como é que é o que, Ginny? Eu não estou falando com você, fique na sua. Falei com  essa piada ambulante aí.
      Aquilo para Ginny era demais. Qualquer um podia zombá-la à vontade, mas que deixassem Nora em paz. Nora era seu capacho, e de mais ninguém, só ela podia caçoar da menina.
      - Eu sei que você não estava falando comigo. Eu posso ser louca mas eu não sou burra. Por que você não dá o fora daqui antes que eu te dê um corretivo?
      Mal começou a dar risada. Aquela garota, dar um corretivo nela? A filha de uma obcecada por juventude contra a filha da rainha do mal? Só podia ser brincadeira.
      - Ginny, fique quieta! – Nora disse nervosa – Você sabe quem é a mãe dela? Você sabe o que ela já fez tanto em Auradon quanto aqui?
      - Nora, cala a boca! – Ginny respondeu – Eu sei o que eu faço. Fica na sua e não se mete, o papo não é com você.
      - Vai me dar um corretivo, é? – Mal perguntou ainda rindo – E o que vai fazer?  Pegar uma escova no seu salão de beleza falido e despentear o meu cabelo?
      Ginny olhou para aquele cabelo roxo ondulado e não sentiu vontade de despenteá-los, mas sim de arrancá-los com um só puxão.
      - É, até que é uma idéia legal. – disse Ginny – Depois eu te enfio a escova pela garganta até arrombar a sua traquéia. Tá a fim?
      Mal se irritou.
      - Com quem pensa que está falando? – Mal perguntou dando um empurrão em Ginny.
      - Eu não penso, tenho certeza de que estou falando com uma idiota que se acha só porque é filha de uma chifruda verde, mas não se enxerga porque a mãe não está nem aí para ela.
      O sangue de Mal ferveu. Não podia aturar aquilo. Explodiu sua raiva e avançou em Ginny, que puxou seus cabelos roxos. Uma verdadeira briga de tapas e socos se formou no pátio, e todos os estudantes se juntaram ao redor vibrando e incentivando mais ainda a discussão.
      - Agora eu acabo com você, imbecil! – Ginny falou indo de volta ao armário. Rapidamente pegou uma tesoura e a abriu nos dedos – Vamos dar um trato nessa palha roxa?
      Sem mais nem menos, Ginny pulou em Mal e conseguiu cortar umas duas mechas, até que foi interrompida. Os alunos saíram de perto e voltaram a andar normalmente. O Diretor Facilier estava parado vendo o que estava acontecendo e seriamente disse:
      - As duas, na minha sala. Agora.
      Mal e Ginny se olharam, fuzilando uma à outra com os olhos.
      - Boa sorte. – Nora disse baixinho para Ginny.
      - Quieta, Nora. – Ginny respondeu.
      As duas seguiram o Diretor Facilier e ao entrar na sua sala,sentaram-se nas duas cadeiras que ficavam de frente para a sua mesa. Ele também se sentou e as encarou.
      - Eu vou perguntar uma vez só. – ele disse sério – Quem começou essa briga, e por que a começou?
      - Foi ela, diretor! – disse Mal rapidamente – Ela me ameaçou e disse que ia acabar comigo. E ainda ofendeu à minha mãe. É muita coragem, não é?
      Facilier assentiu concordando e virou a cabeça para Ginny.
      - E por que fez isso, Ginny?
      Ginny estava de cabeça baixa olhando para o sorrisinho maquiavélico de Mal.
      - Ela apareceu para incomodar a Nora e eu me irritei. Você é folgada, né? – perguntou, virando-se para Mal.
      Mal mudou a expressão e lançou um olhar raivoso para Ginny.
      - Ah, então foi isso! Você estava defendendo uma “amiga”! – disse o Diretor Facilier mudando a postura – Mal, pode ir.
      Mal saiu sorrindo e acenando ironicamente para Ginny. Adorava o fato de fazer maldade e ser adorada por isso.
      - Senhorita Ginny, o que fez é inadmissível. Defendeu uma colega bem no meio do pátio. Tem noção do que fez?
      - Cara, ela nem é daqui! – falou inconformada – A garota veio lá de Auradon. Eu sei que o nosso dever é zelar pelo desconforto de todo mundo, mas olha para a cara da Nor. Quem olha, já percebe que não é daqui
      - Não me importa! – disse mais alto e firme – Isto o que você fez foi bondade, senhorita Ginny! E eu não vou tolerar isso na minha escola. Eu sinto muito, mas terei que colocar um ponto positivo no seu histórico.
      - O que? Mas...
      - Sem mas! – interrompeu – Deveria ter pensado antes de ser bondosa.
      Ginny saiu batendo os pés e bufando de raiva. Mal estava no corredor rindo com seu amigo Jay, e assim que Ginny apareceu, perguntou a ela:
      - E aí, coleguinha? Como foi a conversa com ele? Ele pegou leve com você?
      - Vai pro inferno! – Ginny respondeu sem parar de andar e sem olhar para o rosto de Mal.
      Nora correu até ela preocupada.
      - Ginny, está tudo bem?
      - Não! – disse irritada – E a culpa é sua!

      Ginny passou a manhã irritada. Foi para as aulas em dizer uma palavra e não prestou atenção em uma palavra dos professores. Ignorou Nora completamente, e durante a prova, queria se descabelar quando Mal ria olhando para ela em uma carteira distante.
      Gothel foi para casa antes da filha como de costume, e Ginny, como sempre, foi embora acompanhada de Nora.
      - Então... – Nora tentou puxar assunto – Gostou da aula hoje?
      Ginny olhou para ela revirando os olhos.
      - É sério, Nora? Sério mesmo? Vai tentar conversar comigo pra quebrar esse clima?
      - Eu ainda não sei o que eu fiz.
      - Você não fez! – disse alto – Eu que fui burra. Mas por sua culpa!
      - Por que é minha culpa? – perguntou sem entender. Já havia desistido de tentar raciocinar aquilo tudo.
      - Nada, não é nada, esquece. Deixa pra lá. Você não teve culpa de nada. – respondeu calmamente.
      Ginny não podia negar que sentia pena de Nora. Não era uma menina qualquer. Será que era certo sentir pena de alguém? Pior ainda, alguém de Auradon.  
      - Bom, de qualquer forma, me desculpe... Mas vamos deixar essa conversa de lado. Será que eu podia passar na sua casa para procurar um esmalte laranja? Eu estava sentindo uma falta de pintar as unhas do jeitinho de Auradon, aqui costumam usar umas cores meio diferentes...
      - Pode levar os esmaltes todos se quiser. Vem, vamos.
      As duas entraram pelo salão e viram todos os empregados lá trabalhando, exceto por Gothel, que sempre estava lá mandando em tudo. Imaginaram que deveria estar pegando algo lá em cima, mais especificamente, no quarto de Ginny.
      Subiram as escadas e passaram pela sala escura e mofada, onde Godofred ainda dormia e roncava feito um trator. Gothel ouviu o barulho de gente em casa.
      - Ginny, é você? – perguntou de outro cômodo.
      “É, ela está mesmo no meu quarto”, pensou. Foi com Nora até a porta do quarto e a abriu.
      - Sim, mãe, estou aqui. O que você quer?
      - Eu posso saber o que é que isso estava fazendo em baixo do seu travesseiro?
      Gothel estava com a mão estendida mostrando para Ginny o retrato de Rapunzel. O retrato que a intrigou a vida inteira, e que fez Gothel pensar que o havia perdido. Ela não estava com uma expressão nada feliz.
      Ginny gelou incrédula ao ver aquilo, e Nora apenas observava sem entender. Sua mãe nunca chegava nem perto daquela cama. Por que de repente resolveu vasculhar?
      Gothel mencionava Rapunzel de vez em quando, mas nunca quis se aprofundar quando o assunto era ela. Será que agora Ginny finalmente tiraria as dúvidas sobre a “irmã”?


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