Mentes Quebradas escrita por Nando


Capítulo 21
Problemas


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem!



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Nunca tinha visto a Marta daquela maneira. Depois de alguns dias sem falarmos um com o outro (apesar das minhas tentativas) e sem me responder, envia-me uma mensagem a pedir-me para ir ter com ela, e, assim que chego ao local do nosso encontro, limita-se apenas a pedir que a acompanhasse, sem me dizer o destino ou o motivo. Assim que lhe perguntei onde íamos ela limitou-se a responder:

            -Á esquadra.

            Á esquadra?! Porque raio ela queria ir á esquadra?! E porque é que eu tinha de ir com ela?! Estaria a ser perseguida por um stalker? Estaria a ser “atacada” na Internet? Ou seria que a mãe dela estaria a sofrer violência doméstica do pai? Várias perguntas passaram-me pela cabeça mas eu não lhe fiz nenhuma pois reparei que ela estava nervosa, e, devido ao seu comportamento, o motivo devia ser importante para ela, por isso limitei-me a acompanhá-la sem mais perguntas.

O autocarro chegou e quando ia estender a mão para pagar o bilhete, ela interpôs-se e pagou pelos dois, não aceitando qualquer argumento meu. Escolhemos um lugar mais ou menos a meio do autocarro, ficando ela do lado da janela. Agora que parava para pensar, nós os dois estávamos a passar cada vez mais tempo juntos desde o incidente com o Edward, até tínhamos começado a falar por mensagens levando-me a descobrir que a Marta afinal não era a pessoa arrogante que antes pensava que era, aliás, até havia vezes em que conseguia ser genuinamente engraçada… Passado algum tempo, ela quebrou, por fim, o silêncio:

            -Desculpa ter-te chamado assim sem aviso prévio mas não tinha mais ninguém para chamar…

            -Não te preocupes com isso, eu também não estava a fazer nada de importante… - Como assim ela não tinha mais ninguém para chamar? Isso é muito estranho - Mas… então a Alice estava ocupada, era?

            Marta hesitou um pouco antes de responder. Teria acontecido algo entre elas?

            -Eu pensei em chamá-la, mas nós temos andado um pouco distantes uma da outra…

            -Distantes? Como assim?

            -Lembras-te de quando a encontrámos perto da antiga casa do Edward?

            Acenei afirmativamente com a cabeça. Agora que recordava esse momento, de facto ela tinha agido de forma diferente do habitual. Lembro-me que tinha falado mal dos Unknowns e de como eles estavam envolvidos em coisas más. Ah, e também tinha referido que se tinha unido àquele grupo (chamavam-se Knowns se não estou errado) que causou alguma comoção no início mas que acabou por não originar problemas aos Unknowns, pois rapidamente se percebeu que tudo o que falavam não passavam de mentiras. Refletindo agora acho que foi a última vez que falei com Alice. Sem me sequer aperceber tinha ficado distante dela, e por algum motivo, isso não me causava muito transtorno, mesmo estando apaixonado por ela, levando-me a pensar se eu gostava mesmo dela… Deixando amores de lado, foquei a minha atenção em Marta, que continuava o seu discurso:

            -Bom nós claramente tínhamos posições opostas naquele assunto, tentei chamá-la á atenção, dizendo-lhe que os Unknowns não eram como ela os descrevia, mas ela não quis saber e pelos vistos ficou com a ideia que nós namorávamos, algo que não a agradou muito.

            -A sério que ela ficou com essa ideia? Ela bem sabia como nós não eramos os melhores amigos, e de como as nossas ideias eram totalmente opostas.

            Marta limitou-se a encolher os ombros:

            -Que queres? Ela pensou que lhe andávamos a esconder a nossa suposta relação. Provavelmente ela deve gostar de ti ou algo do gênero.

            A Alice gostava de mim?! Não, era uma conclusão um pouco precipitada, mas… isso dava resposta ao comportamento dela… Ou seja… Havia uma grande probabilidade de a pessoa de quem eu gostava gostar de mim também…

            -Não dizes nada… Eu pensava que ias ficar todo contente ou envergonhado por eu ter dito que ela gostava de ti – Disse Marta, interrompendo-me os meus pensamentos.

            Era verdade. Porque é que não estava mais feliz? A Alice gostar de mim era um sonho meu desde que a tinha conhecido. Muitas foram as vezes que tentei-lhe confessar os meus sentimentos, sem nunca conseguir terminar a primeira frase do meu plano.

            -Porque é que achas que ia ficar contente? – Perguntei.

            -Vais me dizer que tu não gostas dela?

            -Era assim tão óbvio?

            -Demais…

            -Mas se queres que te diga eu próprio não sei se ainda gosto dela… - Porque lhe estava a contar isto?

            -A sério? – Marta olhou-me, interessada.

            -Eu antes gostava dela, mas recentemente ficámos um pouco distantes um do outro e a atração que sentia por ela pareceu diminuir…

            -Hm… - Marta ficou pensativa por uns momentos, levando-me a refletir na nossa conversa e de um ponto em específico que Marta tinha referido.

            -Mas… Voltando ao que disseste antes, como é que tu tinhas tanta certeza que os Unknowns não faziam as coisas que ela dizia?

            Marta sobressaltou-se, como se tivesse sido apanhada de surpresa, e abaixou a cabeça fixando os olhos no chão. Será que era agora que ia ter a certeza de que ela era de facto a SilentWolf? Já tinha tido muitas evidências disso, mas nenhuma certeza.

            -Se não quiseres dizer não precisas, só achei estranho que… - Marta interrompeu-me antes de terminar.

            -Eu pertenço aos Unknowns!

            Aquela revelação apanhou-me de surpresa e a minha reação foi olhar para os lados para tentar perceber se alguém tinha ouvido, por sorte, ninguém estava a prestar atenção. Fixei outra vez a minha atenção em Marta:

            -Oh, estou a ver! Então é por isso que sabias como o grupo realmente era…

            Marta continuava um pouco embaraçada por me ter contado aquilo, dizendo-me uma e outra vez para não contar a ninguém. Será que lhe deva contar que eu sou o administrador do grupo? Não devia haver problema nenhum, ela não iria contar a ninguém… A voz de Albert ressoou na minha cabeça a dizer-me para não contar a ninguém, mas algo dentro de mim fazia-me querer contar a Marta. O que faço? Conto, ou não conto?

            No meio desta indecisão, o autocarro chegou ao nosso destino impedindo-me de revelar a Marta a minha identidade. Saímos e demos de cara com o edifício da esquadra. Sem hesitar, Marta abriu a porta principal, dando lugar a uma sala grande onde polícias fardados andavam de um lado para o outro, uns bebendo café, outros provavelmente em trabalho. Dirigimo-nos ao balcão e Marta tomou logo a iniciativa mostrando o seu cartão de cidadão á senhora no balcão, dizendo:

            -Vim ver a minha mãe, há problema?

            Viemos visitar a mãe dela?! O que raio teria acontecido para a mãe dela estar na cadeia?! Era uma informação demasiado chocante para assimilar daquela maneira… Como é que a Marta estava a lidar com isto tudo?! Se calhar era por isso que ela não me tinha respondido às mensagens…

            -Não há problema nenhum minha senhora – Disse a mulher no balcão, apontando de seguida para mim – Este senhor veio acompanhá-la?

            -Sim é o meu namorado, eu precisava de um apoio neste momento, sabe…

            Pelos vistos já tinha passado a ser namorado dela, mas conseguia compreender o motivo por ela ter contado aquela pequena mentira.

            -Podem entrar os dois, usem ambos estes cartões – Deu-nos um cartão para colocarmos á volta do pescoço - Têm vinte minutos para conversar, esperem só um pouco na sala ao lado, que ela já virá. Saliento já que vão estar vigiados por polícias dentro da sala. – Vendo o olhar de Marta, acrescentou – Não se preocupe, eu sei que isto pode ser difícil de assimilar para si, mas não se preocupe que as coisas vão mudar para melhor – Virou-se para mim – Vê lá se cuidas bem da tua namorada!

            Coloquei a minha mão no ombro de Marta em sinal de apoio.

            -Não se preocupe eu vou estar sempre ao lado dela em tudo o que ela precise.

            A senhora sorriu e Marta corou da cabeça aos pés:

            -É isso mesmo que eu gosto de ouvir! Vão com esse senhor que ele indica-vos a sala.

            O senhor em questão era um homem de quase dois metros e com músculos bem definidos. Seguimo-lo, e Marta aproveitou a ocasião para me falar ao ouvido:

            -Não precisavas de teres ido tão longe…

            -Claro que precisava! Eu não sei o que se passou com a tua mãe, mas não consigo suportar a ideia de tu teres que aguentar tudo sozinha! Porque é que não me disseste isto antes?! Eu estou aqui, p*rra! E podes contar comigo!

            Talvez tenha ido longe demais, mas a ideia de ela estar a suportar isto tudo não me agradava. Marta ficou parada a fintar-me, sem dizer nada, e mais corada do que estava antes. Embaraçada, virou-se para o outro lado e o resto do caminho foi feito em silêncio. Ao chegarmos ao destino, o polícia abriu-nos a porta e fez-nos sinal para entrar. Ao entrarmos deparamo-nos com um berro:

            -PORQUE É QUE TU TINHAS DE ESTRAGAR TUDO!

            A origem dessa voz levantou-se da cadeira onde estava sentada e saiu a correr, passando por nós de olhos tapados pelo seu braço que limpava as suas lágrimas. Só pude perceber que era uma mulher já com alguma idade. O polícia que nos tinha acompanhado dirigiu-nos a palavra pela primeira vez:

            -Esta senhora é esposa daquela senhora além – Apontou para uma mulher magra, do outro lado do vidro, com os olhos negros. – Eram uma família feliz com três filhos pequenos, adotados. Não tinham muito dinheiro, mas conseguiam sustentá-los. Até que aquela senhora – Disse apontado para a mulher do outro lado do vidro - Decidiu unir-se a uma manifestação na empresa em que trabalhava. Essa manifestação acabou por se tornar violenta, e alguns manifestantes ultrapassaram os limites sendo uma delas aquela senhora. A polícia foi convocada e ela foi presa por dois anos. A senhora que saiu a chorar agora não consegue ganhar o suficiente para cuidar dos filhos, tendo que ir por outros meios…

            Não nos disse quais eram os outros meios e não deu sinal de querer continuar a conversar. Olhei para a mulher em questão enquanto ela se levantava, com os olhos perdidos num ponto qualquer da sala, enquanto um guarda a levava, provavelmente, até á sua cela. O polícia que nos acompanhava indicou-nos uma cadeira no fundo da sala, mesmo á frente do vidro que nos separava dos presos. Devia ser ali que iríamos encontrar a mãe de Marta. Dirigimo-nos a essa cadeira, enquanto passávamos por pessoas a chorar, alguns gritos aqui e ali e muita tristeza. Bastante tristeza.

            Lembrei-me de quando perdi a minha irmã. Naqueles momentos só pensava: “Porque é que isto só me acontece a mim?”. Achava que era o único azarento no mundo inteiro e isso não era verdade. Só o estar dentro daquela sala provava exatamente o contrário.

            Chegámos ao nosso posto e outro polícia trouxe-nos outra cadeira. Sentámo-nos cada um em sua, observando o vidro em nossa parte. Tínhamos um espaço para permitir a troca de falas entre os dois lados, mas nada mais. Não havia nenhuma outra maneira de contacto.

            Marta agarrou-me a camisola, tremendo mais do que antes. Agarrei-lhe a mão e deixámo-nos ficar assim, sem trocarmos palavras. Não tinha mais nada para lhe dizer. E acho que não devia haver palavras para a livrar daquela dor.

            Por fim, a mãe dela chegou. Tinha o mesmo cabelo e os mesmos olhos de Marta, mas as suas feições tinham sido danificadas pelo tempo, mostrando-se cansada. Olhou para Marta e depois focou a sua atenção em mim, quebrando o silêncio:

            -Estou a ver que arranjas-te um namorado… Fico feliz, antes estavas sempre presa no teu quarto, só saindo para ver a tua amiga Alice. Fico mesmo feliz…

            Marta não respondeu e eu decidi não me meter na conversa. O que teria feito aquela mãe para parar ali?

            Ela, no entanto, não tinha desistido de se meter comigo:

            -Então mas contai lá como vos conhecestes? O quão longe já foram? Não me digas que já…

            -Podes tirar esse teu disfarce de uma vez!

            Marta interrompeu-me com uma voz autoritária, levantando a cabeça e encarando a sua mãe nos olhos. Camila, a mãe de Marta, olhou-a sem dizer nada. Marta continuou.

            -Eu sabia que andavas metida nalguma coisa. Saías tarde e nunca dizias onde ias. Comecei a achar estranho e decidi procurar nas tuas coisas algo que me desse uma resposta. Reparei que tinhas várias anotações sobre coisas do governo e sobre edifícios que tinham ou iam ser atacados por um grupo de terroristas. Após pesquisar no teu computador percebi que pertencias a esse grupo. Não quis acreditar e pensei que talvez fosses apenas um simples membro, que não participasses nos ataques violentos… Até que descobri uma peruca loura e umas lentes de contacto, vindo mais tarde a ouvir a história do Edward, liguei as peças todas e assim descobri a verdade…

            Camila ouviu tudo em silêncio. Eu fiquei pasmado por tanta informação nova. A Camila pertencia ao grupo de terroristas que tinha matado o pai de Edward?! Pior, tinha sido ela mesma a fazê-lo?! E todos aqueles ataques anteriores que eles fizeram?! Ela estava sempre lá?! Não posso acreditar… Eu tinha ficado contente ao descobrir que eles tinham sido presos, os Unknowns foram responsáveis em parte por isso ter acontecido. Quem diria que ela pertencia a esse grupo… E, espera… A Marta sabia de tudo isto?! Ou seja, ela ajudou a que a mãe fosse presa… Que reviravolta! Camila, no entanto, não se mostro incomodada, pelo contrário, estava até bastante calma:

            -Tens toda a razão! Eu sabia que ter deixado aquele rapaz escapar não tinha sido a minha melhor demonstração… Enfim… - Como é que ela podia dizer isso assim?! Que raio de monstro ela tinha-se tornado?! -  Mas mesmo assim, nunca pensava que tu terias coragem para entrar sem autorização no meu quarto e procurares nas minhas cenas… Nem o teu pai conseguiu descobrir nada, mesmo estando debaixo dos olhos dele… É verdade como é que está o teu pai? Ele nem apareceu para me ver…

            -Está cheio de problemas graças a ti!

            Marta estava a ficar cada vez mais irritada, e estava a apertar a minha mão com cada vez mais força:

            -Graças a mim? Desculpa querida mas a culpa é dos dois…

            -Como é que podes dizer isso? Graças a ti perdeu o emprego e ele já tentou enviar o seu currículo para outros sítios mas sempre o rejeitaram, não pelo currículo ser mau, mas sim por ser teu marido! Consegues compreender? E mesmo assim ele pede-me desculpa por tudo e por nada… Quando é que deixas de pensar só em ti?

            -Ele também nunca fez nada que queres? – Camila começou a levantar a voz – Mesmo depois da morte do próprio filho – Colocou enfase na palavra “filho” - ele continuou a trabalhar como se nada fosse… Eu tentei chamá-lo atenção para nos manifestarmos contra o governo e contra o facto de não terem feito nada para impedir que aquela tragédia acontecesse, com a posição dele talvez chegássemos a algum lado, mas tudo o que ele dizia era que não havia nada a fazer… Revoltei-me com ele e fui para a Internet expressar o meu desagrado através de um perfil falso mas tudo o que obtive dali foi o ódio das pessoas… Todos me começaram a chamar nomes, dizendo-me que não fazia ideia do que falava, tive até mensagens que diziam que o melhor que eu tinha a fazer era suicidar-me… Então pensei, o problema não está só no governo está na sociedade também! Acabei por descobrir esse tal grupo que falastes e juntei-me logo a eles, tinha encontrado alguém que pensava da mesma maneira que eu. Mas agora perdemos a batalha, não há mais nada a fazer, causámos algum dano na sociedade, mas não foi o suficiente, nada vai mudar… Tudo isto porque perdi um filho, consegues compreender a minha dor?! Se te tivesse perdido seria a mesma coisa…

            Marta não disse nada, estando provavelmente a pensar na dor que a mãe tinha sofrido. No entanto, para mim, o que ela tinha dito não justificava nada e decidi que aquele era o meu momento para intervir:

            -Mas isso não é motivo para andares a tirar a felicidade às outras pessoas!

            Captei a atenção das duas. Camila riu sarcasticamente:

            -E o que queres dizer com isso?

            -A mesma dor que você sofreu causou aos outros… Você mesma disse o quão doloroso é a alguém que amamos… Essas mesmas pessoas estão agora a sofrer uma dor terrível por sua causa!

            -E esse era o nosso objetivo! Eu percebo que foram coisas más aquelas que fizemos, imperdoáveis até… Mas alguém tinha de as fazer! As pessoas só aprendem através da dor e...

            Não a deixei terminar, estava farto daquela conversa, levantei-me para mostrar a minha posição.

            -Isso continua a não justificar nada! Você só está a criar mais ódio e, para piorar, está a criar ódio para o lado errado!

            -E como é que tens tanta certeza disso?! – Camila também se levantou encarando-me olhos nos olhos, levando as pessoas a fixar a sua atenção em nós e alguns guardas a prepararem-se para agir, caso a discussão ficasse mais séria – Tu sabes o que é perder um filho?!

            -Não, não sei! – Tentei manter a minha voz o mais controlada possível, não deixando que a minha raiva se notasse – Mas já perdi a minha irmã e foi o pior momento da minha vida... Também a perdi da mesma maneira que você perdeu o seu filho… Amaldiçoei esse assassino, amaldiçoei a polícia por não ter feito nada para impedir e amaldiçoei Deus, mesmo sendo católico! Mas percebi que isso não iria mudar nada, então criei a minha própria maneira de combater essa situação, assim como os meus pais e a minha irmã mais nova criaram a deles. Ficámos mais distantes uns dos outros, não somos a mesma família de antes, mas tenho plena consciência que tudo isto irá passar e vamo-nos erguer todos juntos para honrar a minha irmã!

            Camila observou-me atentamente, não esperando que eu tivesse tantas semelhanças com ela. Decidiu, no entanto, tocar num ponto que eu tinha referido:

            -Então e que maneira foi essa que tu crias-te para lidar com a situação?

            Sabia plenamente o que tinha de fazer, olhei para os lados e percebi que ninguém estava a prestar atenção naquele momento. Tirei o meu telemóvel do bolso e mostrei-lhe a prova definitiva de quem eu era. Marta também viu, mas eu já não tinha nada a esconder. Marta ficou estupefacta com a minha confissão e Camila limitou-se a sentar-se na sua cadeira, dizendo apenas:

            -Oh muito engraçado essa tua maneira… É pena eu estar presa aqui dentro porque gostava de ver até que ponto tu conseguirás manter esse grupo em ordem…

            Quando lhe ia responder ouvi um grito vindo da porta por onde tínhamos entrado. Alguns polícias juntavam-se para tentar impedir que um indivíduo tentasse entrar. Este debatia-se contra eles dizendo alto:´

            -Deixem-me ver essa p*ta! Tenho uma ou duas coisas a dizer-lhe!

            Percebi que ele tinha cabelo louro. Após observar melhor a sua anatomia percebi que era Edward. O que raio estava aquele gajo a fazer ali?! Marta também deve ter percebido porque disse:

            -Por favor deixem-no entrar! Ele é meu amigo!

            -Mas senhora…

            -Deixem-no, por favor, ele vai-se comportar!

            Com alguma relutância largaram Edward, mas sempre com os olhos postos nele. Edward, devido a ter conseguido o que queria, acalmou-se e dirigiu-se na nossa direção. Trocámos um olhar rápido mas nada dissemos um ao outro, pois Edward decidiu focar a sua atenção na mãe de Marta, no entanto, ela foi a primeira a falar:

            -Então também és amigo da Marta? Deixa-me que te diga filha estás com uns amigos muito interessantes…

            -Não voltes a dirigir a palavra a Marta!

            Edward foi autoritário, sobressaltando Camila:

            -Desculpa, quem és tu para me impedires de falar com a minha filha?

            -Assim como disse eu sou amigo dela! E eu não quero que a minha amiga fale com monstros sem sentimentos!

            Eu e Marta ficámos sem palavras por tanta ousadia de Edward! Camila limitou-se a ser sarcástica:

            -Quem diria que aquele rapazinho que deixou o próprio pai morrer teria tanta coragem escondida!

            Pensava que Edward iria perder a paciência, mas manteve-se firme:

            -É isso mesmo! Eu fui um autêntico cobarde e por causa disso o meu pai morreu… Mas em vez de encarar o problema tranquei-me em casa e não quis saber de mais nada. – Apontou para mim e para a Marta – Mas estes dois ajudaram-me a ver as coisas, a perceber que talvez fosse melhor encarar a realidade, por isso eles são muito importantes para mim…

            -É só isso que tens para dizer? – Camila parecia aborrecida.

            -Não. Quero desejar-te uma boa estadia na cadeia, e que nunca mais importunes estes dois pois, se os fizeres, nem este vidro te irá proteger…

            Camila não disse nada, apenas nos olhou aos três de cima a baixo. O polícia que nos tinha acompanhado veio-nos indicar que o tempo já tinha acabado. Despedimo-nos silenciosamente de Camila e viemos para a rua. Edward por fim dirigiu-nos a palavra:

            -Desculpa lá, Marta… Eu fiquei um pouco irritado e disse coisas que talvez não devia ter dito…

            -Não há problema Edward – Marta parecia um pouco cansada.

            -Mas mesmo assim quero agradecer-vos! – Virou-se na minha direção – Principalmente a ti, meu! Eu fui um pouco rude contigo por isso queria pedir-te uma coisa…

            -Que queres?

            Edward ficou rígido e fechou os olhos:

            -Dá-me um soco!

            -Ah? Estás-te a passar, ou quê? O álcool fez-te mal á cabeça?

            -Não é nada disso! Eu também te bati quando tudo o que estavas a tentar fazer era chamar-me á atenção, por isso mereço um soco bem dado!

            -Eu não te vou dar um soco.

            -Dá de uma vez! Deixa de ser uma menininha!

            -O que estás a dizer não faz sentido nenhum!

            -Claro que tem! Dá-me mais é um soco de uma vez, seu menino da mamã!

            Farto com a sua insistência dei-lhe um soco de leve, mas isso não pareceu ser o que Edward esperava:

            -Chamas a isso um soco? É assim que se faz – Dito isto dá-me um soco que me acertou em cheio no maxilar. Agora estava a pedi-las. Dei-lhe um soco na barriga e, sem sequer me aperceber, estávamos numa luta frenética. No entanto, parecia que, a cada soco que dava e recebia, um peso enorme estava-me a sair dos ombros. Agarrei-lhe pelo colarinho e ele fez-me o mesmo, mas a nossa troca de socos foi interrompida pelo riso de Marta. Nunca tinha visto a Marta a rir daquela maneira e mesmo Edward parou.

            -Vocês são mesmo otários! – Continuou a rir.

            Larguei o colarinho de Edward e ele fez o mesmo. Embaraçados, sorrimos um para o outro, e eu tomei a iniciativa estendendo-lhe a mão:

            -É bom ter-te de volta Ed!

            Ele apertou-me a mão, respondendo-me:

            -É um prazer!

            Ouviu-se uma voz rouca, ao longe:

            -Oh louro! Ainda demoras muito?

            Pude constatar que se tratava do senhor com quem eu e a Marta nos tínhamos cruzado quando íamos a ter com o Edward. O que estariam a fazer os dois juntos?

            -Calma aí, velhote! Só estava a resolver as contas com os meus amigos.

            -Nem sei como é que aguentam ser teus amigos…

            -E eu nem sei como é que a tua mulher te aguenta!

            -Quando chegares á minha idade vais ver…

            Que amizade mais estranha! Mas estava feliz por saber que Edward tinha mais alguém para o apoiar… Edward virou-se para mim e para Marta:

            -Vemo-nos por aí!

            E assim nos despedimos de Edward e do senhor que o acompanhava, mas continuámos a ouvir a sua discussão por um bom tempo. Sozinhos, Marta debruçou a sua cabeça no meu ombro, dizendo:

            -Obrigada por tudo!

            Sorri e respondi-lhe:

            -Sempre às ordens!


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Notas finais do capítulo

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