Um Conto de Páscoa - Gabriel precisa de heróis escrita por Drids
Notas iniciais do capítulo
Acho que esse é o penúltimo capítulo.
Depois do encontro com os costureiros, o dia de Gabriel Agreste seguiu cheio de afazeres em seu escritório. Já era final da tarde de sábado, quando Nathalie bateu a sua porta. Mesmo sendo, dentre os funcionários da mansão, a mais próxima do chefe, a assistente queria fazer um pedido de interesse pessoal, e estava temerosa.
− Senhor Agreste, podemos conversar?
− Entre, Nathalie. O que você quer?
− É que minha mãe e minha irmã virão a Paris para o feriado.
− Sua irmã não estava doente?
− Ainda está. Eu nem queria que ela viajasse nas condições dela, mas ela insistiu. Acha que essa pode ser sua última páscoa em família. E eu disse que não poderia sair da cidade, então elas decidiram vir me ver. Chegarão amanhã. Eu sei que tanto o senhor quanto Adrien estão com projetos importantes... mas eu gostaria de saber se posso ir para casa nesse feriado.
− Folgar dois dias seguidos?
− Se o senhor não se importar. Adrien não requisitou ajuda para o evento. Nem o senhor...
− A mansão vai ficar abandonada! Adrien e eu estaremos fora.
− Mas senhor...
− Ah, Nathalie, tire a folga. Do contrário Adrien virá me importunar e me chamar de carrasco.
− Muito obrigada, Sr. Agreste!
− Já pode ir agora mesmo. Mas esteja aqui na terça-feira cedo. E não ouse desligar seu celular nesses dias.
− Certo. Até terça. Feliz páscoa, Sr. Agreste!
“Para você, com certeza!”, resmungou Gabriel, para si mesmo. Não queria deixar a mansão sem alguém de confiança, mas preferia não ter mais problemas com Adrien. O rapaz se apiedava de qualquer pessoa, o que lhe causava ao mesmo tempo medo e admiração.
Depois de um pouco mais de trabalho, Gabriel finalmente foi dormir. Aquele sábado tinha sido muito agitado – principalmente pela manhã com Ladybug. E de tão cansado que estava, embalado pelas lembranças de seu primeiro encontro com Amélie, ele dormiu tranquilamente e, novamente, acordou bem disposto. Apesar de ser domingo, muito trabalho o esperava, então ele precisava acordar cedo. Mas esqueceu que Nathalie não estaria lá para despertá-lo. Então, quando finalmente acordou, virou-se para o relógio, já aos pulos:
− Essa não! Já são dez horas! Como pude dormir tanto?
− Relaxa, pai. Hoje é Domingo de Páscoa – respondeu Adrien.
− Filho, o que faz no meu quarto?
− Notei que o senhor ainda não tinha acordado. Então vim para chamá-lo. Trouxe seu café, mas não sei como gosta.
Gabriel se levantou e olhou para o lanche bem servido sobre a mesa. Estava mais farto que o de costume. Pegou a xícara de chá e provou:
− Tem pouco açúcar – disse seco, mas conteve-se para não ser excessivamente crítico ao filho que o serviu com tamanha cordialidade. – De resto, está bem. Obrigado.
− Disponha!
Adrien sorriu em retribuição e saiu do quarto. Mas, em seguida, voltou empurrando uma cadeira de escritório com rodinhas. Sobre ela, um conjunto de pires e xícara, com café.
− O que está fazendo? – questionou Gabriel, estranhando.
− Eu deixei meu café lá fora esperando. Se o senhor não me agradecesse, eu voltaria com minha xícara para a cozinha. Mas, como o senhor agradeceu, vou aceitar isso como um sinal de que podemos nos falar novamente.
− Nós deixamos de nos falar?
− Pensei que o senhor ainda estivesse com raiva, pelo convite.
− Eu tinha até esquecido desse seu devaneio. Estive tão ocupado!
− Então deixa eu te mostrar o verdadeiro convite que foi distribuído. E, aproveito para reiterar que o senhor ainda está convidado.
Adrien entregou o convite na versão original. Enquanto o pai o lia, ele se sentava e tomava seu café. Gabriel deixou o convite sobre a mesa e se serviu de torrada. Pai e filho comeram juntos, como não faziam há anos. Mas não trocaram mais qualquer palavra durante a refeição. Adrien sabia que com o seu pai precisava ir aos poucos e respeitar seu e espaço. Terminado o café-da-manhã, o jovem se levantou e recolheu a louça na bandeja, para se retirar. Mas antes de sair, quis se certificar que estava bem com seu pai.
− Pai, espero que o senhor tenha percebido que foi só um mal-entendido.
− Claro, claro – respondeu o estilista, demonstrando pouco caso.
− Hoje não terá mais ninguém em casa, fora seus seguranças. O senhor se vira com almoço?
− Não sou uma dondoca, Adrien. Já morei sozinho, sabia? Até já cozinhei.
− Eu sei. E o senhor não vai precisar cozinhar só esquentar algo no microondas. Isso o senhor sabe, né? – riu o filho, provocando o pai. − Vou almoçar com o pessoal do desfile. Estamos terminando os últimos detalhes. Até amanhã, pai.
− Não conte comigo em seu desfile. Não terei tempo!
Assim que Adrien saiu, Gabriel terminou de se aprontar, desceu as escadas e dirigiu-se até a mesa de Nathalie, onde estaria algum dos seguranças de plantão. Ao chegar, deparou-se com um rapaz não muito grande ou forte, com um uniforme estranho. Gabriel não se lembrava de ver seus vigilantes vestidos assim – na verdade ele gostava de vê-los o mais discreto possível e aquele rapaz parecia espalhafatoso. Até quepe usava! Isso precisava ser corrigido.
− Rapaz, não sei que tipo de orientação Nathalie lhe passou, mas meus vigilantes não podem se vestir assim. – Gabriel já se aproximou falando, nem esperou o rapaz, que estava de costas, se virar.
− Calma lá! Eu não sou SEU vigilante – o rapaz respondeu com tom petulante. – Eu sou um vigilante de Paris. Aliás... eu sou um HERÓI de Paris! – e o rapaz virou-se já levantando da cadeira, arremessando o quepe longe e revelando ser Chat Noir.
− Mas... o que você faz aqui? Foi Nathalie quem o recrutou? Como ela...
− Nada disso, Seu Gabriel – Chat Noir respondeu com seu sorriso de lado. – Quem me recrutou foi o seu novo amigo, o Mestre Fu.
− Ah, sim, já ia me esquecendo. O segundo visitante.
− Em carne, osso e ronronar, a seu inteiro dispor – Chat Noir se curvou em reverência exagerada e teatral.
− Imagino que você queira me levar a algum lugar do passado.
− Não. Eu vou acompanha-lo é pelo presente mesmo. Pra você conhecer a páscoa pelo olhar de outras pessoas, que também têm problemas ou até em situação pior! Sabe como é, pra treinar humildade, empatia... pensando bem, acho que vou levá-lo na biblioteca, para que você possa consultar um dicionário.
− Mas que insolente!
− Brincadeirinha, Seu Gabriel. Relaxa e aproveita a viagem. Segura aqui no meu ombro.
− Vamos acabar logo com isso – Gabriel revirou os olhos e suspirou, seguindo o comando de Chat Noir.
Chat Noir pegou seu bastão e o esticou. Alavancou a si e Gabriel pela janela. Depois correu com seu “passageiro” nos braços, a uma velocidade impossível para um humano (normal) alcançar. O homem mal conseguia entender por onde estava passando, e não reconhecia nada do pouco que via. E seguiam correndo quando, abruptamente, o gato parou. Mas a inércia não foi tão piedosa com Gabriel, que foi arremessado alguns metros a diante e se estatelou contra o chão.
− Foi mal aê, Seu Gabriel. Mas é que chegamos ao nosso destino.
− Ai... onde estamos?
− No Le104.
− E o que encontraremos aqui?
− Ora, entre e veja.
Os dois foram entrando pelo famoso centro multicultural. Ao fundo do amplo espaço aberto, uma alta e larga cortina branca isolava uma parcela da galeria. Chat Noir rumou para esse lugar e, como um fantasma, atravessou a cortina. Gabriel o seguiu, mas enroscou-se no tecido.
− Oh, Seu Gabriel. O senhor não é um holograma! – Chat ria, enquanto puxava o estilista pelo braço, para ajuda-lo.
− Como você.... Por que eu não...
− Mistéééério! Pare de enrolação e vamos! Olha quem está ali!
Chat Noir apontou para uma mesa improvisada, com umas quinze pessoas sentadas a sua volta. Em uma das pontas estava Adrien, conversando animadamente.
− Esse seu filho é bonitão, hein?
− É um menino lindo! – Gabriel o fitava com olhar meigo. − Muito inocente, mas comprometido e apaixonado por tudo o que faz. Está se tornando um homem do bem.
− Mas o senhor não fala isso pra ele, né? – questionou Chat, encarando o homem.
− Não... – Gabriel baixou o olhar, envergonhado.
− Tudo bem. Vai ser nosso segredinho. – Chat riu de lado, dando uma piscadela marota.
Aproximaram-se, de forma que puderam ficar ao lado de Adrien e ouvir sua conversa com Marinette e Chloé.
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− Adrien, você acha que seu pai vem? – perguntou Marinette.
− Infelizmente eu não tenho muita esperança, Mari.
− Ai, Adrikins, me desculpa, mas seu pai é osso duro de roer! Ele é um estilista famoso e precisamos do meu pai, que nem é mais prefeito, para conseguir um lugar para o desfile. Seu pai nem precisava ajudar com dinheiro, só com contatos e influência! – comentou Chloé, enquanto se sentava.
− É, eu sei – o loiro coçou a nuca, com indisfarçável constrangimento. – Eu simplesmente não consigo convencê-lo da importância de um evento como o nosso. E, se ele ao menos viesse e visse com os próprios olhos, talvez se convencesse.
− Seu pai tem um coração de pedra, amigo. Mesmo que ele viesse, acho que isso não mudaria. – disse a loira, torcendo o nariz.
− Vocês não conhecem meu pai. Ele sempre foi muito sério e discreto, mas não é esse homem inatingível que parece. Antigamente a gente se divertia, viajava, conversava. Mas é que ele está deprimido há quatro anos. Não deixa eu me aproximar pra me poupar de vê-lo sofrer. E, infelizmente, eu não consigo ajuda-lo – O loiro pausou por um instante, mas logo abriu um sorriso. – Tenho esperança de conseguir reergue-lo. E não vou desistir tão fácil. Vou continuar o amando e buscando a felicidade dele. Alguma hora eu vou acertar.
Todos olhavam Adrien com alguma consternação, mas sorriam em apoio. Marinette, então, se levantou com seu copo de suco na mão e saudou o modelo.
− Sendo assim, um brinde a Adrien Agreste. Que sua missão tenha sucesso!
− E que seu pai apareça e o deixe feliz – continuou Chloé, também se levantando e batendo o copo com o da mestiça.
− Um brinde a meu pai. E a sua recuperação! – levantou-se Adrien, e repetiu o gesto com suas amigas.
E todos os demais ergueram seus copos para o trio, brindando.
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Gabriel tocava o próprio peito, como se sentisse uma fagulha de calor humano lhe aquecendo o coração.
− O senhor tem razão, Seu Gabriel. O Adrien é mesmo apaixonado e comprometido com tudo e TODOS que ama, né?
− Nem sei o que dizer.
− Então não diga nada. Porque precisamos ir a outro lugar. Siga-me!
Chat Noir se virou rapidamente, mas acertou a cabeça Gabriel, que estava distraído, com seu bastão. O homem deu um grito de dor e caiu no chão, desacordado pelo golpe!
− Seu Gabriel! Seu Gabriel, acorda! – Chat dava leves tapas no rosto do mais velho, que começou a despertar.
− O que houve?
− Foi mal. Foi muito mal mesmo! Mas acho que não vai ficar com galo.
− E onde estamos? − Gabriel se levantou, ainda tonto.
− Ah, essa é a casa da Nathalie.
− Será que o próximo visitante vai me causar um traumatismo craniano para de mudar de cenário? – Gabriel alisava a cabeça um pouco dolorida.
− Eu não duvidaria. Mas vamos ao que interessa. Olha só. – Chat apontou para as duas mulheres à frente, que conversavam com notável tristeza.
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− Mãe, qual é o verdadeiro quadro da Agnes? A químio não deu resultado? – Nathalie perguntou para a senhora.
− Essa semana ela recebeu a notícia de que a metástase está muito adiantada. O prognóstico é de, no máximo, seis meses. – A Senhora Sanscoeur secava as lágrimas dos olhos.
− E como eu posso ajudar?
− Você já está ajudando, Nathalie. Está nos recebendo e passando esse dia com ela.
− Então vamos voltar para a sala. Me ajuda a levar os petiscos?
Nathalie seguiu para a sala de estar com sua mãe, munidas de bandejas de frios, torradas e patês. Lá encontraram sua irmã Agnes, o marido dela e os dois filhos do casal.
− Nossa, como estão agitados esses meninos! – Nathalie sorria para os sobrinhos que corriam em volta da mesa.
− Eles queriam muito ver a tia Nati. Estavam doidos pra viajar – respondeu Agnes.
− Agnes, você se arrisca muito viajando assim. – Nathalie não disfarçou a preocupação.
− Eu também achei arriscado – concordou o cunhado.
− Mas eu sobrevivi e estou aqui para curtir o feriado em família. E agora, família completa. Nunca conseguimos arrancá-la de Paris, então viemos. E pronto. A partir de agora, só assuntos alegres! – Agnes mantinha a expressão leve e feliz. – Nathalie, sabia que seu cunhado foi promovido na empresa? Que tal brindarmos a isso?
Agnes suspendeu seu copo de água e Nathalie apressou-se em preencher os demais copos sobre a mesa, para que todos pudessem brindar a oportunidade de estarem juntos.
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Gabriel via aquela cena, boquiaberto. A irmã de sua assistente parecia ser uma mulher forte e otimista, mesmo estando muito doente.
− Como alguém se mantém assim, diante a morte?
− O que não tem remédio, remediado está, Seu Gabriel. Ela optou por se arriscar numa viagem e aproveitar o tempo que ainda tem de vida. E o senhor, o que tem arriscado? E o que tem aproveitado?
Gabriel permitiu-se refletir em silêncio, cabisbaixo.
− Vamos voltar agora. Juro que dessa vez será indolor!
Partiu de Chat agarrar Gabriel pela cintura, esticar seu bastão e, aos impulsos, sair de cena quase voando. Em um arremesso, o gato e o estilista estavam voando pelos ares. De repente, Chat solta Gabriel que sai em disparada em direção a uma janela de um prédio desconhecido.
− Tchau, Seu Gabriel. Se cuida.
Quando se deu conta, Gabriel caiu deitado... em sua cama. Dessa vez nem tentou entender. Tomou fôlego, se levantou e olhou o relógio.
− Como assim, dezoito horas? Se com Ladybug passei apenas alguns minutos fora?
Então ouviu seu celular vibrar. Ao pegá-lo, havia chegado uma mensagem de um número desconhecido: “É porque dessa vez viajamos pelo presente. Então o tempo correu normalmente. Até a próxima, Seu Gabriel.”
− Um dia desperdiçado e uma enxaqueca do inferno. Melhor nem tentar sair da cama! – Gabriel afrouxou a gravata e recostou-se no travesseiro, caindo em sono pesado.
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Até o próximo capítulo.