30 dias sem ela escrita por Luah


Capítulo 2
O prenúncio da ausência




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CAPÍTULO 2

O PRENÚNCIO DA AUSÊNCIA

 

(…)

— Como ele está? — Pergunto de cara amarrada, logo que Naruto atende a porta.

— Pateticamente depressivo — murmura ao me observar cruzar o espaço entre a porta de entrada e a cozinha, a caminho da sala de estar.  

De onde estou é possível escutar o barulho que Gaara faz. O coitado parece estar morrendo no banheiro no fim do corredor.

— Eu esperava esse comportamento de você. Não dele — admito ao me escorar ao batente entre a cozinha e a sala, as sobrancelhas unidas em uma descrença sutil.

 

Meu irmãozinho e eu somos definitivamente bem diferentes. Ao contrário de mim, que sou moreno e tenho cabelos e olhos em uma cor escura como a noite, ele é levemente mais pálido, loiro dos olhos azuis e talvez um pouco mais alto que eu, apesar de ser mais novo.

 

Naruto encolhe os ombros com ar culpado antes de me lançar um sorriso cheio de dentes.

— O que posso dizer; tristeza não é mesmo comigo, tô certo! — Exclama mais do que confiante.

Reviro os olhos e sinto meus dedos coçarem para lhe acertar um tapa por ser capaz de mostrar tanto poder vocal a essa hora da noite, mas não me atrevo a discordar. Se precisassem de outra definição para felicidade, meu irmão seria a primeira opção da lista.  

— E o que houve com aquele papo de “sem ela por perto nunca mais serei feliz!”, senhor rei do drama? — O encaro com uma sobrancelha arqueada, tom debochado e expressão mais do que zombeteira.

— Eu a convenci a voltar mais cedo — retruca contente.

Arregalo os olhos em sua direção completamente surpreso, uma leve inveja chegando para me fazer companhia.

Ou Naruto tem mais lábia do que eu consigo me lembrar, ou Hinata é duplamente mais boba do que se considera humanamente possível. Resolvo apostar na segunda opção, tendo em vista que meu adorável irmãozinho não seria capaz de convencer nem mesmo uma criança a fazer o que quer que fosse.

— Quão mais cedo? — Pergunto na esperança de que sua resposta diminua um pouco do recalque que me domina em silêncio.

— Hm... Daqui uma semana — dá de ombros sem muita certeza.

— Hm — é tudo o que me limito a murmurar, uma raiva invejosa me corroendo por dentro.

— O que foi Sasuke, está com inveja por que minha namorada vai voltar mais cedo só para ficar comigo?

— Calado! — Alerto entredentes.

Ele dá de ombros em deboche e meus olhos imediatamente percorrem o cômodo a procura de algo que possa atirar nele sem machucá-lo muito.

— Ha. Há! Eu sou mais importante para a Hina-chan do que o trabalho dela!

— É melhor você ficar calado...

— Mas não posso dizer o mesmo sobre você e a Sakura-chan!

— Eu mandei você calar a boca, perdedor! — Lhe desfiro um cascudo na cabeça antes que consiga me conter.

— Au — choraminga com a mão sobre o galo recém-adquirido. — Você não sabe mesmo brincar, não é teme?!

— Não sou criança e nem palhaço! — Retruco com os braços cruzados.

— Vou contar para a mamãe! — Faz bico.

Lhe mostro o dedo e gesticulo com a mão livre, acusando-o de falar demais. O loiro revira os olhos gargalhando brevemente com os ombros largos em movimento até que seus olhos se estreitam e uma seriedade repentina se apossa de sua postura.

— O que foi agora, Dobe?

— Não está... quieto demais? — Pergunta apreensivo.

Uno as sobrancelhas em concentração até dar-me conta do que ele quer dizer: em algum momento desde a minha chegada Gaara simplesmente parou de gemer no banheiro no fim do corredor. Boa coisa não pode ser.

Bufo e encaro meu irmão caçula com um ar entediado, derivado de minha clara inaptidão para ser babá.

— Vamos ver se ele ainda está vivo — me arrasto atrás do idiota de cabelos loiros.

— Ah cara, fala sério! — Naruto berra ao pôr somente a cabeça para dentro do pequeno cômodo.

— É tão ruim assim? — Pergunto em dúvida sobre querer realmente uma resposta.  

— Ele está dormindo em uma poça do próprio vômito! — Explica enojado, o rosto assumindo uma coloração estranha e doentia como se fosse ele o próximo a começar a vomitar.

— Tem certeza de que ele só tomou uma garrafa? — Lhe dirijo uma careta enquanto ele dá de ombros e respira fundo adentrando o ambiente por completo.

Aproximo-me do batente de entrada, o rosto contraído em desgosto.

— Acho melhor darmos um banho nele — Naruto comenta enquanto encara o ruivo desmaiado ao lado do vaso sanitário com uma reprovação calculada.

Sinto minha deixa e lhe viro as costas antes que o idiota solte mais alguma sugestão brilhante. Nem morto dou banho em outro marmanjo, não importando as circunstâncias.

Ouço meu irmão berrar meu nome algumas vezes, mas simplesmente o ignoro enquanto me acomodo ao sofá na sala de estar e ligo a TV num canal a que não me atenho, apenas para ter uma desculpa para ignorar todo o resto. Se Naruto está mesmo afim de bancar o bom amigo, fará tudo sozinho.

 

Revoltado, meu irmãozinho aparece alguns minutos depois, o rosto vermelho de raiva e as roupas cobertas por respingos d'água.

— Valeu pela ajuda, viu? — Murmura de modo irônico.

— Disponha — dou de ombros em deboche.

— Vá para o inferno — retruca mal-humorado, as mãos a sacudirem as gotículas de água que se encontram firmadas em seu cabelo.

Lhe dirijo um sorriso de canto, que não tarda a sumir de meu rosto quando percebo que a manha de meu irmão não sumirá tão cedo.

— O que deu nele, afinal? — Pergunto.

— Não faço ideia. Entrou em choque, talvez — dá de ombros. — Quando aterrissaram e a Ino resolveu ligar para contar quanto tempo ficaria fora os dois brigaram. Ele surtou.

Faço uma careta involuntária e repasso em silêncio a memória de meu comportamento matinal.

— Sabe como Garra é dependente. Imaginar 30 dias inteiros sem a maluca da Ino não deve ter feito muito bem a ele.

Sinto pena e uma vontade enlouquecedora de dar um soco no ruivo carente. Opto por revirar os olhos e bufar.

— E onde a bebida entra na história? — Apoio um cotovelo sobre a perna direita e descanso a cabeça entre as mãos com ar entediado.

Gaara nunca foi de beber.

Naruto parece pensar por um instante antes de sinalizar para que eu o siga e assim eu o faço.

— Quando nos falamos pelo telefone ele disse algo sobre precisar se livrar da dor para ficar só com a inspiração. Na hora não fez muito sentido, mas dá uma olhada — abre a porta do ateliê do ruivo, indicando o interior com um meneio de cabeça.

Ao passar o pescoço pela porta arregalo os olhos, surpreso. Há uma verdadeira zona de guerra preenchendo a sala. De um lado, uma mesa virada ao contrário, restos de tinta pelo chão e paredes, cacos de vidro formando uma pequena montanha a um canto. Do outro, duas garrafas de vodca, pelo menos cinco esculturas de Ino mal-acabadas, um busto grego quebrado, canetas espalhadas pela bancada de granito. Tudo disposto tão aleatoriamente pelo cômodo que tenho a nítida impressão de que um furacão habitou o ateliê por horas.

 

Gaara No Sobaku tornou-se um artista plástico muito conceituado ao longo dos anos. Capaz de esculpir até em diamante, alguns ousam dizer para inflar o seu ego.

 

— Credo! — Murmuro em meio a uma careta de desgosto. — É Ino demais para minha cabeça — passo as mãos por meus cabelos ligeiramente perturbado.

Naruto concorda com um ar, ao mesmo tempo assombrado e divertido.

— Estou seriamente inclinado a ter pesadelos com isso.

Limito-me a uma careta engraçada.

— Aonde ele está?

— No banho — responde como se fosse óbvio.

Arqueio uma sobrancelha e o encaro com ar debochado.

— O quê? — Coloca uma mão sobre o peito. — Você não pensou que eu ia dar banho nele, pensou? Eu posso ser um bom amigo, mas não curto nudez masculina!

Rio pelo nariz e nego com a cabeça.

— Já fiz muito em ligar o registro, acordá-lo e colocá-lo lá dentro — murmura na defensiva. — Duvido muito que ele faria o mesmo.

— Eu não faria — comento com naturalidade e recebo um olhar descrente e indignado. — Se o banho for quente não vai adiantar — lembro.

— Cuidei disso também!

— E desde quando você entende de hidráulica, Naruto?

— Não entendo! — Retruca convicto. — Eu só fucei o registro até a água ficar fria — pisca de modo gaiato.

— Idiota! — Reviro os olhos.

Fecho a porta do ateliê e começo a voltar pelo corredor com meu irmãozinho estúpido em meu encalço.

— Naruto! — Ouvimos Gaara gritar ao passarmos pela porta. Com só a cabeça para fora da cortina que tampa o chuveiro, ele parece mais que furioso. — O que você fez com o meu encanamento?

— E eu é que vou saber? — Dá de ombros.

Cubro o rosto com as mãos e volto a negar com a cabeça enquanto sigo caminho com os dois a discutirem as minhas costas. Meu irmão não tem jeito.

 

Correndo como uma criança alguns poucos minutos depois, Naruto se joga sobre o sofá em que eu estivera mais cedo e descansa as mãos sob a cabeça em uma posição relaxada.

Abandono a posição ao lado da janela, escoro-me à parede mais próxima e cruzo os braços fingindo prestar atenção na TV. O ruivo deve acabar com nossa falsa paz a qualquer momento.

 

— Você vai pagar o meu prejuízo, imbecil! — Gaara aponta um dedo na cara do loiro assim que adentra o ambiente e desliga a TV com brusquidão alguns minutos depois.

— E você vai precisar contratar alguém para limpar o seu banheiro. Já fiz muito por você — retruca o loiro com um tom carregado de cinismo.

Apesar de trocado e devidamente seco, nosso amigo ruivo treme dos pés à cabeça. Sua aparência não é das melhores. Qualquer idiota é capaz de perceber que ele bebeu. E muito. Que provavelmente ainda está bêbado, na verdade.

Não posso evitar gargalhar com meu irmão.

— Vocês dois não valem nada — comenta ao assumir um lugar a poltrona no canto sob a janela. — Deve ser o sobrenome.

Cruzo um rápido olhar com meu irmão caçula e então me debruço sobre o encosto da poltrona em que Gaara se encontra, encarando-o de cima com o cenho franzido.

Naruto conservara o sobrenome da família biológica em homenagem a sua mãe, Kushina Uzumaki.

Seu pai, cujo nome e o paradeiro meu irmão só descobriu depois ter completado 18 anos, abandonou sua mãe ao saber que a garota (com 19 anos na época) estava grávida. Sua mãe, empregada doméstica de minha casa até então, morreu de complicações no parto.

— Nós dois estamos aqui cuidando de você — argumento com certo ar de indignação.

Naruto me julga em silêncio com uma rápida olhada de soslaio.

— Seja mais agradecido! — Naruto o repreende com falsa mágoa. — E vê se para de beber, Ok? Se você morrer de cirrose durante essa viagem, quando voltar para casa, Ino me mata! — Passa um dedo pelo pescoço na horizontal como se desenhasse uma linha imaginária. Em seu rosto há uma expressão sofrida, quase apavorada.

Reviro os olhos para a cena. O idiota deveria ser ator.

— O que foi todo esse showzinho, afinal? — Pergunto ao ruivo. — Não acha muito cedo? Só fazem 16 horas que elas viajaram, Gaara.

— Dê um desconto a ele — intromete-se Naruto. — O amor nos deixa idiota as vezes — suspira com ar afeminado as mãos juntas em frente ao rosto, olhos piscando em um claro deboche.

— Se essa é a minha desculpa, qual é a sua? Ao que me consta, você é sempre idiota!

Encaro meu irmão com a superioridade, de quem diz: “Tá vendo aí, ó? Bem feito!”

— Hunf! — Faz pouco caso. — Ser idiota é o meu charme!

— Aham, sei... — Debocha o ruivo.

— A Hinata gosta! — Argumenta incomodado.

Solto uma risada baixa, quase maldosa. Alguém que desmaia quando o namorado a abraça em público não deveria servir de parâmetro. Para nada no ramo sentimental, vale ressaltar

— Está aí uma coisa que eu nunca vou conseguir entender: como foi que alguém como a herdeira dos Hyuuga se apaixonou por você?

— Inveja? — Provoca divertido.

— Não — Gaara dá de ombros. — Eu só não consigo entender o que ela vê em você — admiti. — Não faz sentido!

— Você só diz isso porque nunca transou comigo — pisca com ar sedutor.

Gaara fecha os olhos e nega com a cabeça algumas vezes, completamente enojado.

— Você fala demais, Naruto! — Reclamo ao caminhar até ele e chutá-lo para fora do sofá.

O loiro me encara indignado.

— Põe na lista do: “eu vou contar para a mamãe!” — Debocho.

Às minhas costas, Gaara solta uma gargalhada baixa.

— E você, Uchiha? Como vão as coisas com a Sakura-chan?

— Bem. — Digo simples.

— Só isso? — Devolve com certo desânimo.

Reviro os olhos e arqueio uma sobrancelha em sua direção.

Alguém tem de avisar a esse escultor esquisito que rodinha de fofoca é passatempo para mulher.

— Nós vamos nos casar! Isso já diz muita coisa.

— Ino prometeu me dar uma resposta quando voltar de viagem — comenta cabisbaixo.

Ah, isso explica bastante coisa!

O encaro com ar solidário. Sakura também demorara um certo tempo para me responder quando lhe fiz o pedido.

— A Hina-chan aceitou o meu pedido sem pensar duas vezes — meu irmão se gaba.

Dou um cascudo em Naruto, agora sentado ao meu lado e lhe lanço um olhar mortal. Ele parece entender o recado e encolhe os ombros.

Ok, talvez eu esteja passando tempo demais com a Sakura. Se não me policiar vou estar por aí reagindo a assaltos alheios muito em breve.

Naruto sorri constrangido para o ruivo que assenti depois de revirar de olhos e acenar qualquer coisa para acalmar a figura culpada do jovem Uzumaki.

— Soube que o pai dela é contra o casamento de vocês — comenta o ruivo.

— Claro! O velho odeia o Naruto! — Me intrometo. — Apesar do sobrenome — brinco.

Meu irmão e eu somos os grandes herdeiros de uma das maiores empresas de tecnologia em ascensão do país. Para alguém ambicioso como Hiashi Hyuuga, isso deveria significar alguma coisa. Fora o salário generoso de meu querido irmãozinho, um jovem atleta, muito promissor.

— Tsc, ele odeia todo mundo! — Naruto faz pouco caso.

Me vejo obrigado a concordar.

Hiashi Hyuuga, apesar de tudo, nunca foi exatamente um exemplo de simpatia e eu, com toda a certeza, estou em condições de opinar sobre algo assim, já que meio mundo tem o hábito cansativo e desrespeitoso de me rotular como frio e arrogante.

— Agradar pais é difícil — suaviza Gaara na tentativa de fazer com que meu irmãozinho se sinta melhor.

Perda de tempo. Suspeito que não faça muita diferença para meu irmão, ser ou não, aceito por um velho soberbo e ranzinza. Naruto é dotado de uma alegria muito particular. Desnecessária e grande demais para se deixar abalar por algo tão pequeno.

— Eu não acho – retruco em tom implicante.

— Claro! O pai da Sakura-chan te adora! — Resmungam os dois em uníssono.

— E por que não adoraria? Eu sou o genro que ele pediu à Kami!

Naruto me encara com tédio.

— Tradução: ele sabe puxar o saco dele — gesticula o desenho de uma fita no ar, como quem faz um anúncio.

Gaara ri de nós.

— Até hoje tenho a sensação de que o pai da Ino não aceita muito bem o nosso relacionamento — comenta com indiferença.

— Não é como se pudéssemos culpá-lo — murmura Naruto para si mesmo.

Arqueamos uma sobrancelha em sua direção e ele encolhe os ombros, momentaneamente tenso ao dar-se conta de que pensou alto demais.

 — Hm... Digamos que você seja esquisito — dá de ombros com certo desconforto, os olhos presos em qualquer outro lugar que escapem do julgamento de um certo No Sobaku.

O ruivo lança um dos chinelos que está calçando no jovem Uzumaki e por pouco não o acerta.

— Eu prefiro o termo excêntrico — aponta para si com ar afeminado.

Naruto lhe dá a língua como se o provocasse. De surpresa, o chuto para fora do sofá outra vez e pisco para o artista de modo cúmplice. Gargalhamos os três juntos.

— Como acha que vão ser esses 30 dias sem elas? — Gaara me pergunta assim que normalizamos nossas respirações.    

— Torturantes, com certeza — dou de ombros. — E você? Acha que vai ficar bem? — Pergunto em tom de desafio, torcendo para que a resposta seja positiva. Apesar de não estar me importando tanto assim.

Ele encolhe os ombros e faz bico.

Estalo os lábios e nego com a cabeça. Se apaixonar é algo simplesmente humilhante. Não existem argumentos quanto a isso.

— Ainda bem que a Hinata vai voltar mais cedo — comenta Naruto ao reparar o ar cabisbaixo que toma conta do recinto.

Ele desistiu de ser jogado no chão e simplesmente tem as pernas cruzadas sobre o tapete no centro do cômodo.

— Bom para você! — Retruca o ruivo com um misto de ironia e inveja.

— Ainda não disse como a convenceu — afirmo.

— Chantagem emocional — diz o óbvio.

— Você não presta — Gaara acusa em descrença.

— Eu sei! — Sorri. — E graças a isso ela vai me ver jogar na final, semana que vem.

Lhe lanço um sorriso de canto e encaro o chão com ar derrotado.

Eu e meu irmão jogamos futebol em um dos melhores times do país como atacantes e estamos em uma excelente fase de nossas carreiras. Daqui uma semana vamos disputar o último jogo da temporada e, então, teremos nossas tão aguardadas férias em família.

 

Em algum momento, Gaara suspira e um silêncio se instaura na sala como uma bigorna. Cada um dos três sentindo a falta de sua garota a sua maneira.

— Ei, gente, ânimo! — O Uzumaki berra, de repente. — Ficar assim não ajuda!

— Diz o cara que passou duas horas chorando abraçado a uma almofada de coração logo que chegou aqui — implica o artista.

Encaro meu irmão com asco. Naruto pode carregar o peso de pertencer a minha família, mas nunca deixará de ser patético.

— Eu estava com saudades, tá legal?

— Ah, jura? — O ruivo o encara com deboche

— Calado! Você tomou um porre por não saber lidar com suas emoções. Não tem moral! — Naruto berra ofendido — E em minha defesa, eu ainda não tinha conseguido convencê-la a voltar antes. É muito difícil ficar longe da sua noiva grávida às vésperas do casamento!

Gaara parece engasgar com o ar ao redor e eu arregalo tanto os meus olhos que penso tê-los deixado cair no tapete abaixo de mim.

Naruto entra em choque ao perceber o que acaba de nos contar e logo põe as mãos sobre a boca, almejando poder fazer as palavras voltarem para dentro dela.

— Por que não contou antes? — Pergunto confuso.

— Falei demais — retruca agoniado.

— Hinata está mesmo grávida? — Gaara pergunta de um jeito esquisito.

— Tsc, estraguei a surpresa — coloca uma mão atrás da cabeça com um sorriso nos lábios; o susto e a culpa por ter falado demais rapidamente esquecidos. — Ela vai me matar!

— Você engravidou a herdeira dos Hyuuga antes do casamento — murmuro ainda aéreo com a notícia. — Neji vai te matar! — O encaro de soslaio.

Se o irmão de Hinata não o matar, mamãe com toda a certeza gostará de fazê-lo. Ela sempre enfatiza que nenhum de nós deve engravidar uma garota — quem quer que seja — sem que estejamos casados com ela.

— Não vai não — desdenha. — A gravidez ainda está muito no início e o casamento é daqui pouco mais de um mês!

— Você não perde tempo mesmo, não é? — Gaara implica.

— Naruto lhe lança um pequeno beijo no ar e pisca em sua direção, lisonjeado.

Reviro os olhos.

— As meninas já sabem? — Pergunto imaginando se este seria outro segredo recente entre mim e Sakura.

— Não — negou com a cabeça. — Hinata quer esperar até depois do casamento.

Assinto com a cabeça e me permito um sorriso de canto.

— Parabéns, dobe!

— Eu vou ser papai! — Berra com um sorriso de orelha a orelha. — Ah, é ótimo finalmente poder contar — comenta aliviado.

Rio pelo nariz e nego com a cabeça. Estou surpreso que ele tenha concordado em manter segredo.

Um silêncio se instaura enquanto a notícia parece ser absorvida. Encaro Naruto o tempo todo, ainda meio desconcertado com a verdade dos fatos.

Pegando a todos de surpresa, Gaara lança o outro chinelo que ainda usava, na direção de Naruto, que mais do que assustado, dessa vez não tem tempo de desviar.

— Idiota! — Grita alarmado.

Arqueio uma sobrancelha em sua direção e o encaro com curiosidade, o cenho franzido.

— Por que fez isso? — Meu irmão massageia o lugar atingido.

— Porque você acabou de destruir a minha vida!

— Jura? — Retruca em um deboche ressentido. — Não me lembro de ter te pedido para criar a criança! — Berra.

— Não, sua mula! — Levanta e caminha alguns passos de um lado a outro pela extensão do tapete. — Até parece que você não sabe como a Ino é. Quando souber que a Hinata está grávida, vai inventar de querer ser mãe também! — Puxa os próprios cabelos em um gesto nervoso.

Cogito rir dele e seu desespero, mas seu comportamento torna-se logo preocupante. Gaara costuma ser um rapaz controlado em toda a sua pompa de falso artista importante. O mais lógico no momento é culpar o álcool, mas o verdadeiro fato é: Ino Yamanaka definitivamente sabe como enlouquecer um homem.

Apreensivo, tenho de me repreender por desejar que a loira bonita não aceite o tal pedido de casamento. Com um pouco de otimismo e ela longe, talvez conseguiremos evitar que Gaara fique esquizofrênico em um futuro próximo.

— Relaxe. Alguma hora isso vai ter que acontecer — dou de ombros.

— Diga isso daqui um mês, quando a Sakura vier com o mesmo papo! — Retruca irritado.

É minha vez de suar frio e arregalar os olhos.

— Narutooo! — Torço o nariz e prolongo seu nome com um misto de ódio e pânico.

Meu irmãozinho franze o cenho e olha de mim para Gaara com descrença por um instante mínimo antes de cair na gargalhada. Ele ri tanto que precisa dobrar o corpo e secar as lágrimas que se acumulam no canto de seus olhos azuis.

Seu divertimento é contagiante. Só que não.

— Vocês deviam ver as caras de vocês! — Comenta ao tentar recuperar o fôlego sem muito sucesso. — Estão exagerando, não acham? As meninas estão consolidando carreira, não vão querer parar tudo agora, só para serem mães — argumenta. — Bom, a Ino talvez — pondera em provocação, sendo fuzilado com os olhos por Gaara. — Mas me admira você achar que a Saura-chan jogaria tudo pro alto assim.

Pondero suas palavras por um segundo e concordo aliviado.

— Comigo e a Hina foi um acidente. Não era para ter acontecido agora — fica sério. — Mas já que aconteceu, vou curtir cada segundo! — Anuncia com um de seus melhores sorrisos.

Reviro os olhos, descanso uma mão em seu ombro e lhe encaro contente.

Meu irmão caçula parece o mais velho, afinal. Casamento. Filhos. Sem que eu me desse conta, Naruto estava passando a minha frente esse tempo todo. Não que eu esteja reclamando, é claro. Veja bem, por mais que eu tenha a certeza de ter encontrado a mulher da minha vida, também sei que ainda preciso crescer muito. Não é o meu momento.  

— Parabéns, papai! — Torno a lhe parabenizar enquanto lhe dedico alguns tapinhas amigáveis e um sorriso de frente que quase não me permito esboçar.

O idiota sempre foi o meu melhor amigo. Estou mais do que feliz por ele.

— Obrigada, teme! — Naruto me dirigi um sorriso agradecido, uma das mãos a segurar a que tenho pressionada em seu ombro. — Bom! — Exclama ao se pôr de pé num movimento rápido. — Eu vou nessa!

— Mas já? — Gaara pergunta aflito. — Ainda não estou pronto para ficar aqui sozinho.

— Relaxe, o Sasuke vai ficar de babá — garante.

— Vou, é? — Me pronuncio com deboche. — São quase três da manhã!

— Olha só, eu tenho que encontrar a mamãe daqui a algumas horas e arrumar a minha casa para a reunião do cerimonial — ergue as mãos no ar. — Se eu quiser estar vivo para ver o nascimento do meu filho, meu terno precisa estar ajustado, meus votos muito bem escritos e meu apartamento impecável para a volta da Hinata!

— Hinata volta em uma semana — desmereço seu argumento. — Você tem tempo.

— E dinheiro para uma empregada — acrescenta Gaara.

— Teme, colabora! — Me lança um olhar assassino.

Rio por dentro.

— Tá certo, eu cuido do palito de fósforos — Concordo com ambos os braços erguidos em clara rendição.

— Prefiro lagartixa ruiva – deposita uma mão sobre o queixo como quem pensa a respeito.

— Eu ainda estou aqui, beleza? — Gaara chama a atenção.

— Cale a boca! — Mandamos juntos.

O ruivo revira os olhos e cruza os braços jogando-se para trás em sua poltrona, frustrado.

Rimos de seu comportamento. Ele ainda está meio bêbado.

Levo Naruto até a porta, pensando no que farei para distrair Gaara por tempo o suficiente para que ele durma logo e eu não tenha de voltar aqui no dia seguinte. Consigo entender a parte da saudade, a ansiedade pela resposta ao pedido de casamento, mas o restante de seu comportamento é mais do que ridículo e desespero.

Faço o caminho de volta, cato qualquer coisa para beber na geladeira, escoro-me ao batente da sala e encaro meu amigo ruivo que parece a beira das lágrimas.

Adquiro um tique estranho quase de imediato e tenho de contar até dez. O idiota com certeza ainda está bêbado. Cogito desmaia-lo só para vê-lo dormir mais rápido, mas me obrigo a desconsiderar a ideia, a voz de Sakura, me pedindo para cuidar dele, ecoando em minha cabeça.

Respirando fundo, controlo o impulso de gritar e lhe sacudir pelos ombros, e apenas reviro os olhos antes de negar com a cabeça.

— E então, Sofrência, à que filme depressivo quer assistir primeiro?


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