30 dias sem ela escrita por Luah


Capítulo 1
E a tortura ainda nem começou de verdade




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CAPÍTULO 1

E A TORTURA AINDA NEM COMEÇOU DE VERDADE

 

— Tem certeza de que precisa mesmo ir? — Pergunto outra vez e posso senti-la revirar seus grandes olhos verdes do outro lado da linha. — Pense bem, ainda dá tempo de voltar atrás e escolher ficar comigo!

— Tenho certeza, Sasuke-kun!

Bufo, mais do que revoltado. Odeio mais do que tudo no mundo, ter de ficar sem ela não importa o tempo, ou o motivo.

— Own! Não precisa se emburrar — implica.

É minha vez de revirar os olhos. Nunca fui muito fã de piadas ou brincadeiras.

— Tsc — estalo a língua nos lábios com aspereza —, irritante!

Ela gargalha brevemente e um sorriso de canto brota em meus lábios de imediato. O som de sua gargalhada sempre fora o mais agradável entre todos os outros. Se fechar os olhos sou capaz de senti-la perto, em toda a sua graça de cabelos e bochechas rosadas.

— São só 30 dias, Sasuke-kun. Vai passar super-rápido! — Tenta me animar após alguns instantes de silêncio.

Minha respiração parece ficar presa em minha garganta, meus olhos se arregalam e meus lábios se entreabrem em busca de uma reação que transpareça minha surpresa bem o suficiente.

— 30 dias, Sakura? — Tenho a voz perigosamente controlada. — Não eram só dez? — Silêncio. — Sakura?

— Ops — retruca, com um misto de receio, culpa e preocupação, no mesmo instante em que juro poder vê-la socar a própria testa em uma auto recriminação.

— Sakura! — A repreendo.

Não consigo acreditar que ela se atreveu a mentir para mim. Irritante, irritante, irritante!

— Hã... — gagueja. — Talvez eu tenha mentido sobre o prazo da viagem — sussurra culpada, a voz trêmula. Palavras a atropelarem umas às outras.

Uma veia salta em minha testa e tenho de me controlar para não berrar com ela. Simplesmente odeio quando minha adorável namorada de cabelos cor de rosa esconde coisas de mim. É totalmente inaceitável!

Conto até dez mentalmente e corro a língua nos lábios em uma expressão furiosa; as sobrancelhas unidas.

— Mas, amor, eu — desligo o telefone e cogito atirá-lo contra a parede, mas apenas o aperto até os nós dos dedos ficarem brancos.

Me obrigo a respirar fundo. Não posso correr o risco de dizer alguma coisa — qualquer coisa — que me cause algum tipo de arrependimento no futuro. Sakura Haruno sempre teve uma tênue tendência para o drama, além de ser uma menina irritantemente sensível, e eu, bom, eu sempre fui muito afiado com as palavras. Já perdi a conta das vezes em que terminamos por uma ou duas frases impensadas que saíram de minha boca.

Não demora muito para que o meu celular comece a tocar em um lembrete cansativo de que nossa conversa ainda não acabou.

Contenho um bocejo e me permito um pigarro seguido de um suspiro arrastado antes de atender.

— E lá vamos nós... — Murmuro entediado.

— Escute aqui, seu... seu... — berra do outro lado, logo que atendo a chamada, fazendo-me afastar um pouco o telefone da orelha e franzir o cenho em desconforto. — Argh! Se me deixar falando sozinha outra vez, eu juro que salto desse avião só para dar na sua cara, Uchiha! — Ameaça em um descontrole histérico.

— Tentador — retruco irônico.

Pega de surpresa, ela se acalma no mesmo instante e suspira, assumindo um silêncio quase cauteloso. Também não me atrevo a dizer nada. Ter o som de sua respiração em meus ouvidos é reconfortante tendo em vista a distância física entre nós que só faz aumentar.

— Sinto muito por ter mentido — começa baixinho. — Só quis evitar uma briga — tenta ponderar de forma manhosa; quase fofa, eu admito.

Me obrigo a continuar em silêncio. Não há o que retrucar quanto a isso. Sakura conhece meu humor melhor que ninguém. Talvez se ela tivesse me contado mais cedo, eu a teria infernizado completamente nos últimos dias. Mas não justifica. Nada justifica a mentira!

— Sasuke? — Chama incerta quando permaneço calado.

— Você querer evitar que brigássemos é exatamente o que está nos fazendo brigar agora — é tudo o que me permito dizer, irredutível e orgulhoso.

— Esse congresso é muito importante para a minha carreira! — Exclama em exasperação, como se fosse eu o errado. Bufo audivelmente e mordo a língua para conter palavras duras. Ela parece recuar por um instante, sua respiração forte a ecoar em meus ouvidos. — Eu achei que entenderia — admite triste. — Que ficaria feliz por mim... — Apela em busca de uma compreensão descaradamente imposta.

Uno as sobrancelhas e sinto meu rosto se enrugar aos poucos a medida em que cogito me sentir culpado por estar bravo com ela. Em seguida nego com a cabeça em um esforço silencioso para me manter neutro. Ela está errada!

— Eu estou feliz por você, sempre fico — dou de ombros ainda num tom distante.

— Mas?

— Mas no momento estou irritado por todo o resto! — Deixo que a raiva se mostre em minhas palavras.

— Amor... — Travo meu maxilar e fecho os olhos. — Essa viagem é realmente importante... — Volta a dizer em um tom suplicante, quase choroso.

Nego com a cabeça e volto a abrir os olhos enquanto suspiro baixinho.

— Eu sei — retruco sem emoção, ansioso para não precisar ouvi-la apelar muito mais.

— Não parece! — Reclama chateada.

— O que quer que eu faça, Haruno? — Desafio, autoritário.

— Quero que tente se alegrar de verdade por mim; parecer mais compreensivo! — Pede agoniada. — É o meu futuro!

— Iupi! — Ergo os braços em comemoração e festejo da maneira mais falsa que encontro.

— Você pode fazer melhor que isso, Uchiha!

— Tsc, um mês é muito tempo, Irritante! — Reclamo ainda inconformado.

— Não, não é! Vai ver como vai passar super-rápido! — Tenta me enrolar.

Reviro os olhos e sinto o corpo ligeiramente tenso ao pensar em todas coisas que não sei fazer.

— Vai demorar uma eternidade. Isso, se eu sobreviver tanto tempo com você longe! — Garanto frustrado. — Não sei cozinhar, lembra?! — Chuto o rodapé em protesto, praguejando baixo quando quase arrebento meu dedão.

Ela ri brevemente do outro lado da linha e posso visualizá-la revirando os olhos enquanto o corpo se contrai em diversão.

— Tenho certeza de que você dá conta! —Faz pouco caso.

Bufo baixinho. Não costumo ser dramático, mas gostaria que ela se sentisse culpada por ter mentido e principalmente por ter concordado em me abandonar por exatos 30 dias sabendo de minha absurda falta de aptidão doméstica.

Vergonhosamente meu apelo não surte o efeito desejado.

— Não devia ter mentido — comento de repente, a manha esquecida, a voz rouca e fria.

— Eu sei — retruca em um tom que transborda culpa.

Recosto-me à parede e cruzo os braços com o telefone ainda equilibrado a orelha.

— Tem certeza de que precisa assistir ao congresso inteiro? 30 dias, é um tempo longo demais.

— Pare com isso, por favor! Esse comportamento não ajuda!

— O que não ajuda é você se mandar por um mês inteiro, futura ex-Haruno — implico rancoroso. Em seguida sorrio ao imaginar seu rosto ficar iluminado com minha referência ao nosso noivado recente.

— Acho que vou precisar repensar esse pedido de casamento — pondera com uma seriedade que me congela os nervos. — Meu futuro marido é muito mandão. E carente! — Acrescenta divertida.

Solto o ar que prendera sem sentir e reviro os olhos com um sorriso de canto subitamente aliviado.

— Não se atreva! — Dou corda a brincadeira. — O anel no seu dedo custou muito caro para eu ser dispensado justo agora!

— Ei! — Berra indignada.

Gargalhamos juntos e meu coração parece aquecido quando foco minha atenção no som de sua genuína alegria. Desejo tomá-la em meus braços mais que tudo.

— Você ainda nem chegou lá e eu já sinto a sua falta! — Confesso assim que nossas respirações se regularizam. Em seguida me xingo por isso. Escravo de meu próprio orgulho, odeio demonstrar o quanto ela me tem nas mãos, mesmo que sutilmente.

— A distância faz o amor aumentar!

— Hunf, o idiota que disse isso, com certeza morreu sozinho!

Sua risada ecoa em meus ouvidos outra vez.

— Ah, vamos, vai ser bom não me ter por perto o tempo todo. Você vive dizendo que precisa de espaço e que eu te deixo maluco — abro a boca para argumentar, mas ela não dá tempo. — Sou irritante, lembra?

Aprecio a ironia de ter minhas palavras viradas contra mim por um instante mínimo, o maxilar rígido.

— É claro que lembro. — Concordo a contragosto — Mas... Sem você aqui eu fico sem sexo! — Provoco malicioso.

— Seu pervertido! — Murmura envergonhada. A surpresa em seu tom me anima conforme imagino o tom de vermelho lhe colorindo as bochechas.  

— Hm... — Continuo provocando; o sorriso de canto em meus lábios alargando-se mais e mais.

— Não me venha com essa de “Hm” — me repreende com autoridade, a vergonha subitamente esquecida. — Sasuke Uchiha, eu acho muito bom que o senhor use as mãos enquanto eu estiver fora, porque se eu souber que alguma vadia encostou em você, eu

— Relaxe — lhe corto com um revirar os olhos —, você é a única capaz de me satisfazer, rosada — a tranquilizo com ar sedutor e um suspiro um tanto entediado.

Seu ciúme sempre fora algo engraçado e reconfortante para o meu ego desde que nossa suposta briga acabasse na minha cama. Agora, sob a perspectiva da distância, soa apenas como uma insegurança cansativa, ainda que compreensível.

— Hunf, sei... — Retruca em desconfiança. — Acho bom mesmo! — Acrescenta em uma ameaça velada.

Reviro os olhos com mais vontade dessa vez e posso escutá-la resmungar qualquer coisa. Por um segundo, tudo o que faço é escutar o som pesado de sua respiração.

— Eu te amo — digo baixinho, satisfeito por ouvi-la suspirar em resposta.

— Eu também te amo — retruca derretida.

Encaro o chão aos meus pés com ar pensativo. Não digo isso a ela com muita frequência. Reconheço o meu erro.

— Espero que esses 30 dias passem logo — murmuro quase conformado.

— Então, estamos bem? — Minha rosada parece aliviada de repente.

— Tsc, estamos longe! — Arregalo um pouco os olhos e encaro meus pés com as sobrancelhas unidas e uma expressão desanimada.

— Por pouco tempo!

— Por um mês inteiro. Vou ficar aqui sozinho, um mês inteiro!

— Não vai não. Naruto e Gaara vão estar com você — tenta me animar, como um adulto que conta uma grande novidade a uma criança pequena.

Uma careta se forma em meu rosto no mesmo instante.

O idiota do meu irmão caçula, Naruto, passou os últimos dois dias berrando aos quatro ventos que cortaria os pulsos se Hinata insistisse em trocá-lo por um congresso idiota. Ele até ameaçou algemá-la ao pé da cama para que não conseguisse pegar o avião a tempo. Depressivo e desesperado. As vezes agradeço à Kami por meu irmãozinho ser adotado.

Já Gaara passou a noite na casa da mãe em protesto e apareceu no início da manhã apenas para se recusar a ir até o aeroporto com a namorada. Depois se trancou no apartamento abraçado a uma garrafa de vodca. Desde então, ninguém sabe dele. Fones de ouvido, uma playlist ruim e álcool. Péssima combinação!

— Animador — debocho. — Principalmente se levarmos em consideração que Naruto não come, nem bebe nada desde que a Hyuuga foi embora (um pouco mais de ignoráveis quatro horas) e não para de dizer que nunca mais será feliz — murmuro sentindo-me envergonhado por meu irmão caçula.

Tendo uma idade mental inferior — em pelo menos uns cinco anos — a da namorada, Naruto sempre soou patético em seu comportamento. O típico idiota apaixonado. Não que ela aparente uma postura muito diferente, mas ainda assim...

— Esse tipo de comportamento é a cara dele — retruca divertida. — E o Gaara, como está?

Enrugo um pouco o rosto, incerto sobre minha resposta.

— Bem... — Pondero um pouco esquivo. — Se ignorarmos algumas coisas — meneio a cabeça.

— Como assim? — Devolve confusa. — Que coisas?

— Ah... — Luto para fugir do assunto. — Nada demais...

— Sasuke-kun!

— Eu não sei como ele está! — Admito com as sobrancelhas unidas. — O idiota fez um discurso sobre se matar, se trancou em casa com uma garrafa de vodca e uma playlist de músicas tristes. Não atende o telefone. Naruto ficou de ir vê-lo.

— O quê? — Tenho de afastar o telefone da orelha para não ficar surdo com o grito que vem da Yamanaka. — Como assim se matar? Deixaram-no se trancar em casa com uma garrafa de vodca? O Gaara não bebe! Ai meu Deus! Alguém pare este avião! Meu ruivinho está deprimido e precisa de mim!

Reviro os olhos para o fim de seu discurso e finjo um bocejo. Ino sempre foi a mais melodramática de todo o grupo. Definitivamente o projeto da Barbie sabe como fazer uma boa cena carregada de histeria.

— Cale esta boca e sente aí, Ino-porca! — Posso ouvir minha namorada repreendê-la ao retornar ao controle de nossa chamada.

A loira parece retrucar algo e mais alguns sons indistintos me chegam em cortes. As duas travam uma breve conversa que já não me é possível ouvir.

— Garanta que o Naruto vá mesmo vê-lo, tá legal? Nós sabemos que ele não vai se matar, mas não custa nada ficar de olho — Sakura pede assim que deixa Ino de lado. — Ele não está costumado a beber e pode acabar desidratando ou entrando em coma — anuncia com sua seriedade médica, ao mesmo tempo sexy e preocupada.

— Vou cuidar dele! — Digo simples.

— Promete? — Devolve incerta.

Reviro os olhos um pouco descrente e incerto quanto a achar graça ou me sentir ofendido.

— Prometo! — Dou de ombros.

— Ótimo! — Sua voz soa um pouco mais descontraída e ela parece responder alguém a quem não identifico até notar a reverência com que minha namorada parece tratar a pessoa em questão. Tsunade.

Estalo a língua nos lábios e empino o nariz encaixando os fatos em minha cabeça. Odeio a maldita Tsunade.

— Hã... Eu vou precisar desligar, moreno! — Anuncia frustrando minha oportunidade de alfinetar a velha senhora, ou mesmo confirmar o porquê de estarem juntas. — Se cuide e cuide dos meninos, tá bem?! Eu te amo! — Corre com as palavras e desliga sem que eu tenha e chance de lhe responder.   

Bufo ao encarar a tela de meu celular onde agora se lê “chamada encerrada”. Serão longos trinta dias, afinal.

Sakura viajou com as amigas para um congresso de medicina em Londres por incentivo de sua orientadora, a bruxa velha, Tsunade. Analisando bem os fatos tenho quase certeza de que foi a broaca quem a incentivou a mentir. — Tsc, se ela ao menos parasse de dizer que essa viagem é superimportante para a consolidação de sua carreira e blá, blá, blá. Sei que é egoísmo, mas não gosto de não a ter por perto. Nunca gostei. Culpa dela eu estar tão mal-acostumado.

Guardo o telefone no bolso e sorrio mexendo levemente os ombros. Se tivesse sabido antes que essa viagem duraria tanto tempo, talvez a tivesse algemado ao pé da cama exatamente como meu irmão ameaçou fazer com a namorada.

Tropeço em um sapato seu ao caminhar até a sala de estar e sorrio de canto ao olhar à volta. Desde que a irritante baixinha dos cabelos cor de rosa viera morar comigo o ambiente tornara-se inteiramente diferente. Da disposição dos móveis às novas cores em todas as paredes. Sakura Haruno literalmente bagunçava o meu mundo em mais sentidos do que eu seria capaz de descrever.

 

(...)

Quase meia noite.

Espreguiço-me em minha poltrona, entediado com o filme a minha frente e arqueio uma sobrancelha ao enxergar “Naruto” no visor de meu celular, assim que o retiro do bolso.

— Acho melhor vir para cá, teme! — Anuncia logo que atendo.

— O que ele fez? — Pergunto com ar entediado, após soltar um suspiro.

Apesar de não estar no meu melhor humor, me sinto muito confortável em meu lugar em frente à TV, na sala de estar, para ansiar resolver problemas alheios.

— Bebeu a garrafa inteira.

Cogito revirar os olhos e simplesmente desligar o telefone, mas então me recordo de que prometi a uma certa rosada, cuidar de um idiota ruivo. Maldito seja o amor.

— Eu já chego aí — aviso em um tom arrastado.

Mais uma vez não posso evitar pensar que os próximos trinta dias serão bem mais do que só insuportavelmente longos.

Rodo o apartamento a procura de minhas chaves com a maior má vontade que consigo reunir e, após descer de escada até a garagem de meu prédio desejando que meu telefone toque outra vez com o anúncio de que minha presença já não é mais necessária, me dirijo ao encontro de meu irmão e do ruivo bêbado.

 


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