A pianist's melancholy escrita por U can call me A


Capítulo 1
First and last melancholy


Notas iniciais do capítulo

Olá, aqui estou eu com mais uma história de partir o coração. Ou não.
Tem uma historinha sobre essa história: Lá estava eu, tarde da noite, considerando a ideia de dormir, quando de repente me lembrei de uma oneshot lá do início do ano que eu havia escrito numa folha de caderno, inspirada num mangá (que também é oneshot) chamado "Akuma ni itsukushimi no te wo", ou "The hands the demon adored", um pouco depois que eu li, e me empolguei com a ideia de postá-la. Porém não demorou muito pra eu lembrar que eu tinha arrancado a folha do meu caderno pra mostrar pra uma pessoa, e desde então nunca mais vi a folha. Obviamente, lá fui revirar meu quarto tarde noite, mas achar que é bom... Felizmente, eu encontrei meu primeiro rascunho da história (que só tinha tipo, dois ou três parágrafos) e decidi reescrever. Um pouco depois disso, eu tive a brilhante ideia de ligar a história com minha outra oneshot "Misofonia", e acho que gostei do resultado.



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Enquanto suas mãos moviam-se quase que automaticamente sobre as teclas, criando sons que preenchiam aquela sala espaçosa, ela não sentia realmente como se estivesse presente ou ao menos pensando na música naquele momento. 

Era o quarto ensaio do dia, até onde ela se lembrava. Na verdade, ela já havia perdido a conta de quantas vezes havia tido que reiniciar a música, e já era "o quarto ensaio do dia" a pelo menos uma hora. Ela não admitiria passar disso, mas insistia em se distrair com seus pensamentos cada vez mais desagradáveis, e sem perceber começou a tocar uma melodia diferente da que estava ensaiando, uma que havia composto no tempo que estava apaixonada e ainda pensava em se declarar. Naquele momento, com sua mente tensa e seus dedos hesitantes pela tristeza, a melodia soava diferente da que ela uma vez imaginou. Bem, não uma vez, considerando que Ihna havia passado uma boa quantidade de tempo para compôr. Se ela inconscientemente havia começado a tocar essa música, então o sofrimento já estava tomando controle de seus movimentos. 

— Ugh... - Ela parou de tocar para secar as lágrimas com uma das mãos, a outra ainda no piano como se não quisesse cortar o laço que tinha com a música, mas não haviam lágrimas, apenas o sentimento sufocante de amar alguém que vai se casar. 

Era tão cruel a convidarem pro casamento, e ainda mais com tanta empolgação como se ela fosse uma amiga querida... De fato ela era, mas provavelmente apenas porque o casal não sabia dos sentimentos de longa data que a moça carregava. Além disso, haviam pedido que ela tocasse no casamento. Ihna queria recusar, talvez com todas as forças que tinha, mas quando aquela pessoa pediu tão carinhosamente, elogiando seu talento como pianista, por um instante as hesitações dela derreteram. Por um instante, não pareceu ruim aceitar. Talvez, talvez não fosse tão ruim assim... No fundo ela nunca deixou de pensar que aquele carinho era vazio, mas...! 

"Veja só o que você faz comigo..." Ela pensou, miseravelmente, por mais que soubesse que a pessoa que tanto amava não veria seu sofrimento. Não, aqueles olhos não iam na direção dela, tampouco se enchiam de amor. Não eram pra ela. 

 E mesmo que tanta felicidade fosse por causa de outra pessoa, talvez ela pudesse ser parte do motivo, ainda que apenas um pouco. Ela queria ver seu amor sorrir num dia extremamente feliz, com uma bela música de fundo da qual Ihna pudesse se orgulhar, e ela queria poder sorrir e dizer "estou feliz por você". 

Mas ela não estava! Ela estava de coração partido, sem esperanças, quase certa de que nunca teria um amor correspondido! Ela estava sendo sufocada por sentimentos ruins e solidão numa sala espaçosa que sem música se tornava vazia vazia, sem ninguém pra ouvi-la tocar além dela mesma! E a pessoa que ela mais queria que ouvisse naquele instante... Aquela pessoa estava tão distante... Tão fora de alcance... 

Clap clap clap... Ela deu um pulo de onde estava sentada e bruscamente mexeu a cabeça, procurando pela fonte do som de palmas, mas vendo nada, achou que era coisa de sua cabeça. Ela realmente devia estar sedenta por um pouco de motivação se havia chegado ao ponto de imaginar alguém batendo palmas, huh. Ou pelo menos era isso que estava pensando até sentir alguém lhe cutucar o ombro. Ihna se assustou um pouco, e virou quase que imediatamente. 

Uma moça em um vestido florido com bolsos e casaco amarelo lhe sorriu quando seus olhos se encontraram. Belos fios loiro mel escapavam da touca que ela estava usando para cobrir grande parte da cabeça, e a garota praticamente parecia um raio de sol. Um raio de sol na primavera, com um brilho gentil e iluminando jardins para que todos admirassem as flores desabrochando. Ihna conseguiria pensar numa música inspirada naquela garota, se tivesse ânimo. 

As duas passaram alguns segundos daquele jeito, até a intrusa tirar um lápis e caderno do bolso. 

"Sua música é linda, eu amei! Acredito que ficaria ainda mais bonita se você não parecesse tão triste..." A moça escreveu, mostrando para Ihna e ao ver que esta havia terminado de ler começou a lhe afagar os cabelos, com o mesmo sorriso de antes. Gentil, carinhoso, preocupado... Ihna delicadamente tirou a mão dela dali, por mais que ela precisasse de um pouco de atenção naquele momento. 

— É uma música triste. E eu estou triste. - Respondeu Ihna, curiosa pelo motivo da garota estar escrevendo em vez de falando, mas ao mesmo tempo se sentindo invadida. Era complicado perguntar alguma coisa quando continuar aquela conversa a deixava desconfortável. No entanto, a loira percebeu o olhar dela para o caderno e seu rosto pareceu entristecer, embora mesmo assim ela tenha voltado a mover o lápis na folha. Enquanto ela fazia isso, Ihna não conseguia evitar reparar em cada movimento dela e nas expressões que fazia ao escrever. 

"Você quer saber sobre o caderno?" Ela mostrou a pergunta e Ihna assentiu, o que fez a garota continuar rabiscando. A continuação demorou para vir, e a pianista teve um bom tempo para refletir sobre sua dúvidas naquele momento. 

"Bem, a minha audição não é mais como antes de certos ferimentos, e nunca vai ser. Já faz muitos meses, e  embora esteja aprendendo leitura labial e linguagem de sinais... Eu ainda me sinto melhor me comunicando por escrita. E acho que já que estou lhe contando isso deveria me apresentar, então... Eu me chamo Soli. Ah, no entanto, não se preocupe, eu desenvolvi bastante leitura labial, então consigo entender você." Ela desviou o olhar enquanto deixava a outra ler, pressionando os lábios como se ainda tivesse mais a contar, mesmo que não fosse falar realmente, e esfregou nervosamente uma mão em um dos braços coberto pelo casaco, onde cicatrizes do mesmo dia que havia tentado destruir sua audição estavam escondidas. Ao terminar de ler, Ihna ficou em silêncio por alguns instantes, e então se levantou, dando um abraço na outra. Soli demorou um pouco para reagir e abraçar de volta, mas logo aquele contato, que havia começado como um simples gesto de empatia, se tornou profundo e significativo para as duas. 

A sala não estava mais vazia. Mesmo que não houvesse mais música, havia alguém. Havia humanidade, havia tristeza. E isto, este específico momento, era o incrível encontro de duas almas feridas. Afinal, não é só o amor que machuca, pode ser a falta dele também. 

Mesmo que sua conversa tenha sido tão curta, não havia muito o que explicar, ambas simplesmente e claramente precisavam de um abraço, e Ihna sentia que Soli concordava com isso. Além disso, mesmo que Ihna quisesse sussurrar explicações para a outra, esta não havia acabado de dizer que não podia ouvir? Aliás, por falar nisso, como ela podia dizer que uma música era linda sem ouvir? Pensando em perguntar isso, Ihna desfez o abraço e deu um passo para trás. 

— Ei, Soli... Eu pronunciei certo? Não sei, mas... Como você pode dizer que minha música é linda se você não... - Sua fala saiu hesitante, como se estivesse pisando em ovos, ou até mesmo vidro, afinal aquele parecia ser um assunto delicado. No entanto, a loira sorriu e pegou o caderno de volta. 

"Um bom ouvinte escuta com o coração", ela escreveu e riu da expressão de Ihna. Ela parecia exasperada, mas ao soltar um suspiro este soou mais como um riso contido. "De fato, eu preferiria não estar viva comparado a não poder escutar música, algo tão querido para mim, mas eu... Pedi por isso e estou em paz agora. Se eu me arrependo de uma coisa, é apenas não poder ouvir sua música e voz com algo além do meu", havia o desenho de um coração muito mal feito no meio, "mas saiba que ele estará sempre aberto para lhe apoiar, o que quer que esteja lhe fazendo tão triste. Por isso, continue tocando! Não deixe os sentimentos ruins tomarem conta de você, como aconteceu comigo..." 

O tempo de espera para Soli terminar seu texto pareceu longo e Ihna acabou brechando sobre o ombro dela, que se apressou e lhe passou o caderno. Soli ficou um pouco ansiosa quanto à reação que Ihna teria, se suas palavras teriam efeito, e um monte de outras coisas, mas todas suas preocupações desapareceram quando a pianista lhe respondeu com um sorriso. Era frágil, como se qualquer descuido pudesse desmancha-lo. Ela também parecia cansada demais para mantê-lo por muito tempo. 

— Obrigada, Soli, você apareceu justo quando eu precisava, e isso com certeza vai ser algo importante pra mim pra sempre. - Ela disse, e delicadamente pegou o lápis para escrever algo no caderno. Soli havia sentido seu peito se aquecer com aquele sorriso, e tal sensação não foi embora enquanto ela observava e admirava cada detalhe da pianista quietamente enquanto esperava. Ela tentou brechar também num pequeno ato de impaciência, mas não foi permitida ver. 

E no entanto, seu coração pareceu derreter quando Ihna finalmente mostrou o que havia feito. Ela havia escrito parte da melodia que havia tocado, um pedaço da música que ela achava particularmente belo, junto com algo que deveria ser um autógrafo mas saiu torto. Talvez Soli não soubesse ler partitura, mas era muito mais o gesto que valia naquele momento, e de fato foi algo que valeu mais do que palavras. Os olhos de Soli começaram a lacrimejar, contrariando sua boca que mantinha um sorriso, por mais que um tanto contorcido por ela estar tentando conter o choro, e ela segurou o caderno contra o peito. Ihna chegou a pensar que ela estava tentando fundir a música com seu coração, por mais bobo que fosse pensar isso. 

De fato, ela não pode evitar envolver a outra em seus braços mais uma vez, e dar um beijo no topo da cabeça dela quando esta começou a chorar. Parecia até o que faria pra cuidar de si mesma chorando, se pudesse se multiplicar. Soli a apertou de volta e se acomodou na curva de seu pescoço, até o choro parar e ela estar mais calma. Durante esse tempo, Ihna desajeitadamente afagou seus cabelos cor de mel enquanto questionava suas próprias ações. 

Como por exemplo, dar aquela música, mesmo que só um pedaço, pra outra pessoa além da que a havia inspirado. Aquilo a incomodava um pouco, mas quando ela decidiu tomar tal ação, pareceu certo. Mesmo que fosse uma música carregada de sentimentos por outra pessoa, agora era algo especial para Soli também, e Ihna sentiu um pouco de admiração pela garota que havia conseguido até acrescentar significadoa a algo que já parecia carregado o bastante. 

Soli não queria desfazer o abraço, se sentia realmente confortável daquela forma, mas o fez para poder escrever algo no caderno. Ihna tentou não se incomodar em estar molhada de lágrimas, mas não era algo que acontecia todo dia, e ela não se sentia acostumada. 

"Eu quero te ver de novo", Soli escreveu. 

Aquilo deixou Ihna surpresa, e logo seu rosto começou a se acomodar em um sorriso cansado e triste, por aquilo a lembrar de quando conheceu a pessoa que ocupava seu coração. 

— Você é uma pessoa muito legal e boa de conversar, sabia? Haha... Eu quero te ver de novo. Digo, eu gostaria muito... Tanto te ver tocando quanto gostaria de te encontrar mais vezes. Ah, eu conheço uma cafeteria ótima, você aceita marcar algo lá? 

— Eu também quero. Você pode facilmente me encontrar aqui, é algo como meu habitat natural. - Ela respondeu, lançando um rápido olhar para o piano, e se virou pra Soli. - Eu não digo isso com frequência, mas... Venha me ver tocar de novo, eu gostei da sua companhia. 

Ihna não perguntou o que Soli estava fazendo na área de música daquela escola de artes se não podia ouvir, mas se tivesse perguntado talvez descobrisse que lá também havia aulas de linguagem de sinais, e numa tentativa de escapar a realidade a garota tinha ido passear por ali. Em vez disso, logo ela descobriu que Soli tinha uma irmã preocupada a procurando. 

*** 

A tarde estava chegando ao fim, e o céu já começava a assumir belas variações de cores. O sol ainda iluminava a entrada da igreja, cuidadosamente decorada para aquele dia, na qual duas pessoas que se amam seriam unidas. Ou pelo menos fora isso que uma mãe por ali dissera ao explicar para sua criança curiosa o que era casamento. Ihna sem querer ouviu a conversa enquanto entrava, botas de salto logo fazendo barulho no piso antigo da igreja. 

Se fosse ela quando pequena, então certamente teria questionado "Então por que só um homem e uma mulher se casam?" De fato, ela tinha a vaga memória de realmente ter perguntado algo assim em algum momento de sua infância. 

E também tinha a vaga memória de alguém respondendo "Porque é o certo." Obviamente ela também questionou porquê aquilo era o certo, mas foi considerada apenas uma criança perguntando bobagens. 

Não que ela concordasse, mas como estava cercada de pessoas pensando "Porque é o certo", Ihna se esforçou pra dar o seu melhor sorriso ao conversar com as outras pessoas que estavam ali, falando de como aquele casamento era maravilhoso. "Porque é o certo", ela se proibiu de chorar e esvaziou sua mente para tocar perfeitamente, sem adicionar nenhuma música não planejada, enquanto a noiva entrava na igreja. "Porque é o certo", ela sorriu de volta quando o casal no altar sorriu pra ela. 

Mas ela não aguentou agir "certo" por muito tempo, e reuniu toda sua coragem para ao final da cerimônia, tocar a música que era tão especial para ela. Todos ficaram admirados, embora parecessem pensar que aquela música já estava planejada, exceto um certo casal que havia se conhecido e apaixonado graças à uma das muitas apresentações daquela pianista. Apesar de não saberem todo o significado por trás daquela música, eles reconheceram como uma das criações dela e expressaram seus agradecimentos sorrindo antes de saírem da igreja, recebendo parabenizações de vários convidados no caminho, alguns jogando pétalas de flores em vez de arroz. Ihna sabia que havia cavado a própria cova tocando aquela música e se sentindo abalada logo depois mas... Ela simplesmente tinha que fazer isso. Como se estivesse colocando em prática a forma de pensamento "Se esse é o fim, melhor acabar com capricho". 

E aquele foi o ponto final perfeito. O problema era que, mesmo depois daquele fim, a história continuava, por mais que ela não fizesse ideia de como seguir em frente. Sem nem considerar a ideia de ir pra festa, ela, sem saber pra onde ir e certa de que se fosse pra casa iria se sentir solitária demais, foi parar na sala com piano que havia denominado seu habitat natural. A escola estava aberta por ter aulas no período da noite, e ela dava aulas de piano lá, então ninguém questionava realmente o que ela fazia ali, mesmo que com um vestido de festa. Além disso, ela havia escolhido uma roupa que também podia ser considerada casual, levando em conta que ela pudesse acabar fugindo do casamento em algum momento, por não suportar mais ficar lá. 

A sala estava escura. Não que ela esperasse que não estivesse, e a escuridão era boa para ver as estrelas, mas aquela noite supostamente não era de lua cheia? Ela abriu as cortinas, e pôde dar uma boa olhada no céu noturno. Uma nuvem estava cobrindo a Lua, o que explicava aquela escuridão inesperada, mas ainda não parecia uma ameaça de chuva. Ihna apenas ficou ali, distraidamente olhando pela janela. As luzes da cidade eram incômodas, mas se alguém olhasse com cuidado, talvez conseguisse ver beleza nelas. A forma como contavam crônicas de uma cidade grande e agitada para os que tinham paciência de observá-las tinha o seu próprio encanto, por mais que não fosse surpresa bons observadores vendo coisas onde os outros não vêem. 

— Você gosta de observar as estrelas? - Ela se lembrou daquela pessoa perguntar uma vez. - Porque eu gosto, e muito. Por exemplo, veja, aquela é a constelação de escorpião! 

Ao lembrar dessa memória, Ihna procurou no céu tal constelação. 

— Onde? - Ela perguntou de volta, e aquela pessoa apontou pro céu entusiasticamente. 

— Consegue ver algo parecido com um jota no céu? 

— Consigo... - Ela respondeu. 

— Consigo. - Ela repetiu em voz alta. 

— Então você está vendo a constelação de escorpião! É fácil, não é? 

— Fácil, huh... As coisas agora não parecem fáceis pra mim. - Ela murmurou, com um sorriso nostálgico, sem dar importância para a lágrima deslizando seu rosto. Ela percebeu canhões de luz de algum lugar iluminando o céu, como que deixando claro para quem pudesse ver que uma grande comemoração estava acontecendo, e franziu as sobrancelhas, o sorriso desaparecido.

Se alguém entrasse na sala, certamente estranharia ela falando sozinha no escuro, mas colocar tudo pra fora num dos lugares em que mais se sentia confortável era ótimo pra ela, e por isso Ihna não tentou parar. 

Hum... Não sei. Você vai ter que me ensinar a encontrar muitas outras constelações para que eu possa dizer se é fácil ou não. - A Ihna daquela memória dissera, corando um pouco ao ver um sorriso tão bonito no rosto de sua companhia. 

— Com todo prazer, afinal eu fico muito feliz em poder ensinar algo pra uma pessoa tão inteligente e talentosa como você. Ihna, você é tão brilhante quanto uma estrela. 

— Eu... Eu não quero ser uma estrela... As estrelas ficam tão longe de você... Eu não quero apenas ser apontada e admirada de longe... - Ela começou a soluçar, enquanto mais e mais lágrimas caiam. - Mas agora já é tarde demais pra dizer isso, não é? 

Naquele dia, ela praticamente havia aceitado se tornar uma estrela no exato momento em que começou a tocar no casamento. Ou talvez ela fosse uma estrela há muito tempo. Não, de todas as opções, ela de repente se sentiu estúpida por não perceber antes: sua pessoa amada que era a estrela da história desde o começo. Aparentemente perto, criando esperanças no coração de sonhadores, mas distante e intocável. Como alguém havia conseguido alcançar tal estrela? 

A resposta já não importava mais. 

*** 

Ihna voltou com sua rotina de sempre com dificuldade, mas Soli a visitando frequentemente foi se tornando algo comum e parte do seu dia a dia. Sem nem perceber ela começou a ansiar por essa pequena alegria. Apesar de se sentir abalada com cada convite do casal recém casado para visitá-los, ela estava conseguindo seguir com sua vida. Adiando resolver muitos de seus problemas e incerta sobre seus objetivos, mas estava conseguindo. 

Naquele dia em especial, ela estava tentando aprender uma música de um filme que gostava muito, mas sua cabeça estava distraída se perguntando se e quando Soli apareceria naquele dia. Lá fora, os passarinhos de uma árvore perto da janela também pareciam estar particularmente inquietos, como se quisessem contribuir para sua desconcentração. O Sol estava iluminando a sala, mas Ihna estava considerando fechar as cortinas. 

Ela suspirou e tentou começar a tocar novamente, mas dessa vez o som de alguém correndo no corredor a fez desviar os olhos da partitura, para segundos depois ver uma jovem de touca enfiar a cabeça por uma brecha ao abrir a porta. Ela estava empolgada para fazer uma surpresa naquele dia. 

— Ihna! - Ela chamou, entrando na sala com um sorriso, para logo abraçar a outra. 

Desde seu incidente, a mera ideia de falar a desagradava muito. Falar e não ouvir sua voz como antes, nem ter o mesmo controle por seu tom, trazia muitos sentimentos ruins à tona, por mais que ela dissesse que já havia superado e que havia decidido por aquilo em primeiro lugar, então Soli tentava o possível para usar meios alternativos de se comunicar, e havia se esforçado muito no que podia. Até agora, leitura labial e escrita estavam dando certo. 

Mas desde que conheceu Ihna, ela percebeu que a pianista parecia sempre triste. Às vezes mais, às vezes menos, mas sempre com um olhar melancólico. Por isso, cada vez que se encontravam, Soli tentava algo para animá-la. Ela tinha a sensação de que se não fizesse alguma coisa, Ihna acabaria caindo numa tristeza profunda e tomando alguma decisão extrema como ela mesma havia feito no passado. Seus métodos pareciam estar dando certo, visto que pouco a pouco Ihna estava passando a sorrir mais, e isso deixava Soli feliz. 

E então ela decidiu tornar aquele dia, que parecia apenas um dia comum do calendário, em algo especial pras duas, chamando Ihna pelo nome usando sua voz pela primeira vez. Por quê? Bem, ela tinha a impressão de que isso faria a outra feliz, consequentemente dando a ela mesma um pouco de alegria também. Além disso, pra ela não era necessário uma data no ano marcada para fazer coisas especiais pelos outros, ainda mais os que considerava importantes. 

Apesar de que vez ou outra ela se perguntava "Se eu conseguisse ouvir Ihna, a consideraria tão importante como agora?". Mas tentava não pensar nisso, porque a resposta estava debaixo de seu nariz: Ela provavelmente nem teria conhecido a moça. 

Ela sentiu Ihna finalmente retribuir o abraço, meio sem jeito, mas como o esperado do plano, feliz. De visita em visita, Soli foi contando mais sobre si mesma, então a pianista já sabia o suficiente pare entender o quão significativo era o que ela havia acabado de fazer. 

— Obrigada... - Ela murmurou contra a barriga da outra, já que uma estava sentada e outra em pé. Soli obviamente não ouviu, mas sentiu a vibração da voz de Ihna em sua barriga e aquilo fazia um pouco de cócegas. Ela conteve um riso. 

Mais uma vez, ela estava agradecendo Soli por ser o raio de Sol que ela precisava em sua vida, lhe transmitindo uma sensação de calor confortável, muito diferente de estrelas distantes. Recuperando seu ânimo, em algum outro dia ela criaria uma música inspirada nessa sensação com um nome tão perfeitamente conveniente que nem parecia coincidência: Soli. Certamente, seria uma música de aquecer o coração. 

Ihna realmente esperava que o motivo de sua felicidade não fosse se tornar novamente o de sua tristeza.


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Notas finais do capítulo

Música que inspirou a ideia da que Ihna compôs: https://www.youtube.com/watch?v=bvMmnBUe9iQ
Admito que não pesquisei tanto sobre perda auditiva quanto pesquisei sobre misofonia, então peço perdão se algo parecer irrealista.
Coincidentemente, eu encontrei um mangá muito interessante chamado "Hidamari ga Kikoeru" durante o tempo que escrevia essa oneshot. É uma história emocionante, em que um dos personagens principais tem perda auditiva, e por isso talvez eu tenha me baseado em algumas coisas. E oh, é um shounen-ai muito bem trabalhado!



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