Pedaços Transformados escrita por Kurohime Yuki
grande batalha
MALIA, 9 ANOS.
Sem o seu cabelo, Malia não se sentia uma heroína. Ou talvez ela fosse. Uma heroína que perdeu todas as batalhas, e que agora estava na mais importante delas, a decisiva, e sabia que perderia, que não tinha como evitar.
Nem todas as batalhas eram vencidas, percebeu ela. Nem sempre o bem vence o mal e os heróis são os vencedores. Aquela era uma delas. Infelizmente aquela era uma delas e ela não era uma espectadora infeliz, mas uma protagonista infeliz de sua própria desventura em série.
Malia suspirou, sentindo-se triste e talvez um pouco feliz, porque... iria acabar. Finalmente tudo iria acabar. Nada de remédios e tratamentos, dores e enjoos; nada daquela tristeza que a colocava para baixo, mas também seria nada de sua família, de seu irmão e de seus amigos. Nada de nada.
Ela iria morrer, ela iria morrer e tudo iria acabar. E isso era bom. E isso era ruim. E isso era o que iria acontecer.
—Está tudo bem, Julie – disse Malia, embora nem mesmo acreditasse no que dizia, mas ela precisava dizer aquilo.
Malia precisava dizer que estava bem mesmo que não estivesse, porque Julie era sua amiga e precisava daquelas palavras - mesmo que não fosse verdade, mesmo que todos soubessem disso, Malia precisava dizer e dizer e dizer, porque precisava que Julie estivesse bem mesmo que ela não estivesse, mesmo que ela estivesse morrendo.
Mesmo que ela estivesse quase morta.
—Está tudo bem, Julie – repetiu, pegando a mão de sua amiga e apertando o mais forte que conseguia, embora não fosse tão forte assim. – Você pode chorar e rir, você pode dizer que está triste e feliz. Eu estou triste e feliz.
A única coisa realmente ruim, que Malia não tinha nem que pensar no lado positivo, era que as pessoas que a amava iria sofrer e ela... Ela não sabia o que fazer.
Malia sentia como se estivesse decepcionando-as, deixando-as para trás sem nem pensar nelas, como se estivesse sendo egoísta e pensando apenas em si mesma - e isso a fazia se sentir mal. E um pouco aliviada por saber que isso não iria durar muito. E um pouco perdedora, como se desistisse.
Ela estava desistindo?
Ela estava escolhendo o caminho mais fácil?
Existia isso de escolher quando não tinha escolha?
—Você sabe o que eu digo, Julie – disse Malia, sorrindo suavemente para sua melhor amiga e vendo-a retribuir, sentindo suas próprias lágrimas assim como via as dela. – Somos todos...
E então seu fôlego faltou.
Respirar era difícil – muito, muito difícil. Respirar não era colocar o ar para dentro e depois para fora; respirar era mais difícil do que parecia, do que algum dia já foi.
Malia inclinou-se para trás, alongando seu corpo como tinha aprendido e tentou respirar, tentando não entrar em pânico porque não conseguia, tentando não seguir seu instinto e se curvar sobre si mesma, porque sabia que a dificuldade só iria piorar se fizesse isso.
Está tudo bem, Malia, pensou ela. Está tudo bem, daqui a pouco... daqui a pouco estará melhor ainda.
—Pequenas borboletas – completou Julie quando ela não pode.
Elas eram pequenas borboletas. Todos eram pequenas borboletas. E borboletas foram feitas para voar e não estar presas, borboletas um dia foram lagartas e no outro voadores e agora ela seria uma borboleta - e seria livre.
Malia seria uma borboleta - ela tinha aceitado isso. E teria que deixar as pessoas que amava, mas... As pessoas que a amava não precisava deixá-la, porque ela sempre estaria com elas mesmo que não estivesse estivesse com elas.
Malia Hood seria uma borboleta e iria apenas se transformar quando seu casulo ainda era pequeno.
Só não agora, nesse momento - mas logo.
E ela precisava que seus últimos dias valessem a pena, que fizessem a diferença, que ajudasse seu irmão a encontrar um pote de ouro.
(Alguém precisava.)
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