Pedaços Transformados escrita por Kurohime Yuki


Capítulo 199
Distração


Notas iniciais do capítulo

E ai, quem foi fazer o enem? Eu fui, né? Que tanto texto era aquele? Ano passado não foi assim.



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distração

setembro, um dia depois

—Vocês não precisam sair – anunciou a enfermeira, olhando para os olhos que a encaravam e diziam que não, eles não iriam sair. Nem por um segundo, nem por um minuto; não por nada e com certeza não por ela.

Arly estava impressionada.

Três garotos e uma menina.

Um garoto dormindo na poltrona.

Um garoto sentando-se no chão com a cabeça encostada na cama, os olhos fixos no teto como se perguntasse "por que estou aqui?".

Um garoto na cama que parecia feliz, risonho e em casa.

E uma garota com ele.

Arly estreitou os olhos, algo dentro de si dizia que isso era pior do que um triângulo amoroso e ela não sabia dizer quem estava sendo disputado ali.

Ou se queria saber.

A garota a olhou como se ela fosse doida e estivesse ofendida, como se o simples fato de ter pensando por um segundo que pudesse retirá-la dali a ofendesse.

Arly se sentiria ofendida se um sentimento de amor alheio não estivesse desenvolvendo-se dentro de si, porque... Sim, sim e apenas sim. Seu sorriso que aprendeu depois de tantos anos de trabalho, o sorriso que não era feliz nem triste, mas que apenas mostrava os dentes, foi substituído por um verdadeiro, porque ali havia fé, havia amor e havia caridade.

Era difícil encontrar essas três coisas juntas ali, naquele local, principalmente com pessoas tão jovens.

O garoto sentado no chão era a prova. Uma delas. A mais visível. Ele tinha o rosto pálido, a mão tremia e apertava fortemente a mão de...

—Calum – olhou Arly o prontuário. – Certo?

—Sim – acenou o próprio.

—Preparado? – questionou ela, colocando a prancheta de lado e pegando as luvas e seu material.

Seringa, frascos, algodão, álcool, band-aid... tudo certo. E ela ainda odiava essa parte. Odiava como seus olhos queimavam e sua boca secava, como se fosse ela quem teria seu sangue retirado, que estava esperando uma sentença... E ela amava quando dava uma de liberdade, quando os ajudava a irem para casa, quando os faziam se sentir em casa – ao menos um pouco, ao menos para ficar mais fácil de lidar com tudo, ao menos para não se sentirem numa casa de horrores e esperassem todos tipos de monstros, ao menos para dá-los esperança.

—Vamos acabar logo com isso – murmurou Calum em retorno, sentando-se e esticando o braço a sua frente.

O garoto no chão desviou os olhos e apertou mais forte ainda a mão que segurava, a que estava livre.

O garoto na cama não reclamou.

O da poltrona ainda dormia.

A garota chutou o que estava no chão.

—Saia – ela disse, os dedos dos pés insistentes nos cabelos dele, cutucando-o.

—O-o q-que? – gaguejou ele, virando-se para encará-la hesitante, nem dando uma segunda olhada ao menino com quem estava de mãos dadas.

Arly revirou os olhos brincalhões para Calum , como se perguntasse “isso acontecesse sempre?” e ele retornou com um “dá para acreditar?”.

—Sa-ia – silabou a garota, irredutível. – Ou que você quer que eu soletre?

—Mas...

—Ela está certa, Luke – disse Calum.

—Abra e fecha a mão – pediu Arly, amarrando o elástico em torno do seu braço e procurando uma boa veia na dobra do seu cotovelo.

—Você pode esperar lá fora – continuou ele.

—Eu não vou te deixar sozinho – retrucou Luke, franzindo as sobrancelhas.

—Ele/eu não está/estou sozinho – disseram os dois da cama. Ele num murmúrio neutro e ela numa reclamação contrariada.

—Eu não vou te deixar sozinho com Julie – corrigiu-se Luke.

Oh, triângulo amoroso, pensou Arly, então era verdade.

—Ashton está ali – apontou Julie.

—Ashton – zombou Luke, virando-se para ela. “Ciúmes”, Arly movimentou a boca para Calum; Calum concordou solene. – Seu namorado Ashton – continuou ele, a zombaria nunca deixando os seus lábios. – Grande diferença.

Ou não. Talvez, lembrou-se Arly, fosse um daqueles relacionamentos modernos sem compromisso que via passando na televisão... Como era o nome mesmo? Poliamor? Pollyamor? Pollyamore? Alguma coisa de vários e amor.

—Saia – repetiu Julie.

Arly rasgou a embalagem da seringa...

—Não.

...encaixou a agulha...

—Luke – avisou Julie e até Arly estava impressionada pelo serviço de distração. - Não me faça te fazer dormir no escuro todos os dias da sua vida depois desse.

—Tente.

...Arly levantou-a, levantando as sobrancelhas com uma pergunta silenciosa, com a pergunta “preparado?” brilhando em seus olhos.

—Vá logo – murmurou Calum para ela.

Ela furou-o e puxou a ampola devagar, observando o sangue escuro preencher a seringa...

—Não me faça dizer a mamãe sobre o formulário de faculdades em branco.

—O que? – engasgou Ashton, sentando-se como deveria. – Já estão distribuindo? – perguntou. – Eu não recebi nem um!

—Eu estou com o seu, idiota – disse a namorada dele. – E não é como se você fosse precisar.

—Por que eu não iria?

—Por que você iria? – retrucou ela. – Eu estou guardando uma cópia para o meu irmão idiota, que jogou a dele fora.

Oh, eles eram irmãos, percebeu Arly, só um pouco surpresa. Como ela demorou tanto para perceber isso? Os cabelos eram iguais e os olhos também e havia uma confortabilidade de um para o outro que só sendo irmãos para existir – só sendo irmãos e se amando muito para deixar alguém empurrar os dedos dos pés em seu cabelo.

—Pronto. – Arly afastou-se. – O resultando vai estar pronto... – Ela olhou no relógio. Seis horas da manhã. – Daqui para as nove.

—Isso é muito amplo – murmurou Julie.

—Agora. – Ela sorriu. – O horário de visita não começou ainda, me acompanhem.

—Tchau, Julie – provocou Luke.

—Todos vocês – disse, escrevendo num adesivo nome e número do quarto antes de colar no frasco. – Não sei o que está acontecendo aqui, mas um garoto menor de idade não pode ficar com outro de menor.

—Quem vai ficar com...

—Eu vou – anunciou Liz, entrando no quarto. – Não se preocupe, eles vão sair - prometeu, esperando Arly passar para fechar a porta. - Agora... - Liz virou-se para eles, seus olhos queimando de raiva. -Quem gostaria de confessar o roubo do meu carro?


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