Love and Flowers escrita por LelahBallu


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Hey!!
1 - Então, eu sei que maioria aqui é fã mais de long, mas honestamente eu tenho passado um tempo evitando as minhas. Uma em especial vem me deixando decepcionada com a resposta, ou posso dizer falta de resposta a ela. Então eu estava um pouco chateada e não muito animada a escrever, até que voltei para minhas ones, que amo escrever também, então eu estou postando hoje umas das que escrevi recentemente.
2 - Quero dedicar a one para a Luna Lovegood, minha beta a quem devo muitas outras. Esta one é sua Luna.
3 - Essas ones serão postadas separadamente, mas seguem o estilo das que estão em Give Me Love, são inspiradas por uma música, ou frase contida na música, ou situação e geralmente não serão muito longas.
4 - Espero que gostem!!



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Felicity Smoak

Abri meus olhos enquanto absorvia o som familiar dos pássaros cantando fora da minha janela, respirei fundo sabendo que não era justo eu me irritar com os sons alegres que os inocentes animais emitiam e estendi minha mão alcançando o despertador apenas míseros segundos antes que ele tocasse. O dom de acordar instantes antes do despertador era algo que eu nunca iria compreender. Chegava a ser um pouco perturbador.

Afastando as cobertas corri minhas mãos por meus cabelos e os amarrei com a liga que sempre mantinha em meu pulso. Todo o meu corpo agindo com calma, até mesmo podendo chamar de um certo grau de preguiça. Com um suspiro cansado forcei-me a encarar o calendário que ficava em cima da minha penteadeira apenas metros a frente da minha cama. Era surpreendente que eu estivesse tão cansada apesar de ter tido horas de sono sem acordar nenhuma vez após ter deitado em minha cama, fechado os olhos e praticamente ter dormido de imediato. Não havia sido uma noite tranquila, mas havia sido interrupta. Ainda mantendo meus olhos no bendito calendário e caindo em conta que eu não poderia mais adiar o inevitável, eu me apressei em sair da cama, fui até a janela do meu quarto e a abri, os pássaros se afastaram de imediato o que eu considerei uma benção, eu não era a maldita branca de neve, eu não ia cantar uma música para eles, assoviar ou algo do tipo. Talvez eu os tivesse traumatizado depois da última vez que os confrontei.

Olhando para baixo ignorando a escada de incêndio e atravessando a rua que não estava ainda movimentada pela manhã, meus olhos caíram na pequena loja de flores que havia sido inaugurada há duas semanas, eu encarava mais especificamente o alto e bem constituído homem vestido em uma camisa de flanela, a estampa em xadrez vermelho e preto, o jeans escuro e sapatos sujos de lama fazendo contraste com o que o que geralmente era usado pelos nova-iorquinos. Sobretudo preto, sapatos sempre brilhantes e também pretos, gravatas, vestidos elegantes, esse parecia ser o uniforme daqueles que viviam nessa grande metrópole. Mas o homem parecia ser um amante das coisas simples, eu não poderia vê-lo agora direito, mas seus olhos azuis sempre faziam jogo com um sorriso simpático e boas maneiras, nunca parecia estar com pressa, eu nunca tinha o visto vestir roupas mais elegantes, sempre a usual camisa de flanela. E era sempre muito pontual.

Eu não era íntima dele, eu sequer o conhecia. As únicas coisas que eu sabia sobre ele era que além de atraente, ele era o dono da loja, chegava sempre cedo, por que apesar de ter alguns funcionários, ele sempre era responsável por abrir sua loja de fachada acolhedora. Ele chegava em sua van, e tal como agora ele descarregava suas flores. Para ser sincera e deixar claro aqui: Eu nunca havia entrado na loja, sempre passava por frente, mas nunca entrei. Eu o via através da vitrine de vidro e via seu sorriso cortês quando conversava com uma cliente. Sua total atenção nela. Eu sequer sabia qual era seu nome. Ele havia chamado minha atenção, por que ele parecia ser algo fora de um script, ele não combinava com o cenário ao redor, sua loja não estava entre um café, ou uma padaria ou loja de artesanatos, não havia nada caseiro o cercando, sua loja estava entre prédios cheios de tijolos aparentes, como o meu, e um bar desprezível que eu rezava que fechasse todas as noites, que alguém denunciasse o dono por venda de drogas ilegais ou algo do tipo, eu nem sabia se o dono vendia drogas, mas seria uma boa razão para que o maldito bar fechasse.  Eu seria presa se eu inventasse essa razão?

Respirei fundo percebendo que mais uma vez eu estava adiando o dia que mal havia começado e desviando a atenção do bonito florista eu voltei a fechar minha janela, perdendo o momento em que ele ergueu a cabeça e olhou a direção da mesma, eu me virei e caminhando até meu banheiro me tranquei ali para um longo banho.

Vestindo minhas calças jeans apertadas e blusa branca, eu calcei minhas botas, colocando minhas lentes e guardando meus óculos e minha bolsa para qualquer contra tempo, eu coloquei meu relógio de pulso e o encarei.

Graças a minha lerdeza eu chegaria atrasada no teatro. Eu não tinha tempo para preparar um café da manhã que se preze e tudo por que eu havia ficado perdida em pensamentos enquanto encarava o atraente florista.

Algumas mulheres perdoariam essa minha falha.

Agora seria um bom momento para haver um café ao lado daquela sua loja. Soltando um palavrão eu peguei meu casaco que estava pendurado atrás da porta, e fechei meu apartamento ainda resmungando. Entrando no elevador eu agradeci o fato de pelo menos ter perdido a Srª Lewis descendo com seus dois netos, pequenos demônios era o que havia saído da barriga de sua filha.

 Minha mãe sempre me repreendia quando eu falava desse jeito sobre os dois pestinhas, mas se havia uma Smoak que tinha alguma afinidade com crianças, especialmente estas crianças, não era eu.

Algumas mulheres também me perdoariam após conhecer tais monstros.

Não minha mãe é claro.

Saindo do prédio e com o pensamento em Donna Smoak e voltando para que dia era hoje, eu voltei a encarar a loja de flores, não faria mal comprar algumas flores para a mulher, ela merecia.

Ignorando mais uma vez o fato de que eu chegaria atrasada eu caminhei para a loja, observando pelo vidro e notando que não havia ninguém a vista, eu considerei deixar para lá, podia ser cedo demais. Mas acabei deixando a ideia de lado e envolvi minha mão na maçaneta rústica. Ao empurrar a porta, me surpreendi com o tinido delicado e até mesmo um pouco irritante provocado pelo sino. Era uma típica loja de flores, mas que parecia está no século errado, na rua errada, talvez em frente ao prédio errado. Era encantadora, mas ao mesmo tempo me deixava um pouco confusa.

— Ainda não abrimos. – Escutei a voz grossa soar através das paredes, eu sabia que se tratava do homem a quem eu encarava através da minha janela todos os dias desde que a loja havia inaugurado, mas ainda me surpreendi com a forma que reagi a ela. Ele devia estar em alguma sala que o corredor depois do balcão insinuava. Olhei ao redor buscando-o, havia alguns caixotes de madeira com os mais variados tipos de flores, ele provavelmente organizaria tudo ainda.

— Oh desculpe. – Murmurei, a vontade de dar meia volta, retornando. Eu não deveria ter entrado.

— Está tudo bem. – Murmurou, sua voz se aproximando, ergui meus olhos pegando o momento em que seus olhos reagiram com surpresa ao me encarar. Ele vinha do corredor, um sorriso em seus lábios, mas parou de imediato quando chegou ao balcão e me encarou. Sua mão descansando sobre o mesmo. – Você. – Murmurou simplesmente.

Certo, isso eu não esperava.

— Eu?  - Murmurei confusa.

— Humm... Do que você precisa? – Murmurou sem jeito. Levantou a parte dobradiça do balcão e o atravessou voltando a descê-la. – Ainda é cedo, ainda estou arrumando alguns arranjos, e meus funcionários ainda não chegaram, por isso eu disse que ainda não abrimos, mas eu posso fazer algo para você? – Perguntou parecendo até mesmo um pouco ansioso. – Em que posso ajuda-la?

— Está tudo bem. – Murmurei envergonhada. – Você não precisa parar o que está fazendo por mim. – Meneei a mão em um gesto atrapalhando indicando que deixasse para lá. – Eu só vou...

— Eu não me importo. – Murmurou me interrompendo. Pisquei surpresa com a velocidade com que disse. – É sempre bom ter novas clientes, seria um prazer, eu sou Oliver. – Murmurou estendendo sua mão. – Oliver Queen.

— Felicity Smoak. – Murmurei deixando minha mão ser envolvida pelo calor da sua. O contato de nossas peles me distraindo momentaneamente. – Eu moro...

— Do outro lado da rua. – Sorriu. – Eu sei.

— Ok. – Murmurei hesitante.

— Desculpe, eu não queria assusta-la, eu só vi você saindo de lá, algumas vezes. – Deu de ombros.

— Tudo bem. – Sorri. Afinal enquanto ele tinha me visto algumas vezes entrando no meu prédio, eu o observava todas as manhãs. Eu era a assustadora aqui, não ele. – Hum, Oliver?

— Sim? – Perguntou soando distraído. Seus olhos me fazendo cativa, a intensidade neles me absorvendo, fazendo-me esquecer por alguns instantes que dia era hoje e por que eu havia entrado em sua loja em primeiro lugar.

— Minha mão. – Murmurei por fim. Observei-o ficar sem graça, soltar minha mão e levar a sua ao pescoço, aquilo mais do que o seu físico, e seu rosto bonito, me atraiu. Deixou-me encantada na verdade.

— Desculpe.  – Murmurou extremamente envergonhado. – Então, Felicity, do que você precisa? – Perguntou abrangendo a sua loja com um gesto ao estender seu braço. – O que posso fazer por você? Você quer uma planta para decoração? Flores?

— Eu preciso de um arranjo.  – Falei dando de ombros.

— Presente? – Perguntou franzindo o cenho. Seria ridículo demais se uma garota comprasse flores para si mesma, certo?

— Sim. – Assenti. – Para minha mãe. – Completei.

— Aniversário? – Perguntou caminhando de volta para o balcão. Ele estava em seu território agora, agia com mais confiança. Assenti vagamente em resposta, esquecendo-me que ele ainda estava de costas. Ele se virou com um olhar interrogativo e voltei a assentir. Agora eu era o quê? Muda? – Ela tem alguma preferência ou é do tipo que gosta de ser surpreendida? – Murmurou já se concentrando em seu dever.

— Definitivamente o último. – Murmurei pegando uma rosa e cheirando. Estava fresca e eu tinha certeza seria vendida antes que isso mudasse, ele tinha muitos clientes, maioria mulheres, e eu podia apostar que não era apenas por arranjos decorativos, o homem era muito atraente, eu tinha certeza que estava acostumado à atenção feminina.

— Então posso ficar livre para escolher? – Perguntou parecendo ficar a vontade com isso.  Parecendo até mesmo contente. Assenti concordando.

— Mas se eu tiver o atrapalhando...

— Não está. – Interrompeu-me mais uma vez, eu ficaria irritada se não fosse por aquele sorriso que acompanhava a frase. Maldito sorriso, maldito homem bonito com ar campestre. – Eu tenho algo lá nos fundos que vai ser perfeito, se importa se ficar a sós enquanto preparo?

— Claro que não. – Murmurei o dispensando com um sorriso. Com a forma que eu estava agindo, alguns momentos para ficar sozinha seria ótimo.

— Fique a vontade. – Murmurou após assentir, atravessou o balcão mais uma vez e seguiu pelo estreito corredor. Observei suas costas enquanto se afastava, peguei meu celular e enviei uma mensagem para Helena, avisei que chegaria atrasada para o ensaio. A culpei por ter marcado algo tão cedo e expliquei que tinha que visitar minha mãe antes. Ela respondeu quase de imediato, disse que estava tudo bem, que apenas ela tinha chegado e que daqui em diante não voltaria marcar ensaios tão cedo. Ficamos trocando mensagens até a volta de Oliver, parte por que eu deixei escapar que havia descoberto o nome do florista bonitão, como ela gostava de chama-lo, apesar de tê-lo visto apenas uma vez.

Quando Oliver retornou, seus passos me fez erguer a cabeça e ignorar o celular quase que de imediato.

— Tulipas? – Murmurei erguendo uma sobrancelha. – Não é algo muito surpreendente.

— Não. – Assentiu. – Ao menos que seja dessa cor. – Brincou.

— Tem razão. – Murmurei com um sorriso, as pessoas sempre se preocupavam em dar flores vermelhas, ou brancas, sempre era sobre paixão ou pureza, e se queriam algo mais alegre escolhiam girassóis, ou margaridas.

Tulipas laranjas.

Foi o que escolheu.

Quase me emocionei com sua escolha.

— Espero que ela goste. – Murmurou me passando o arranjo bem ornamentado e cheio.

— Eu também. – Assenti encarando as flores, perdendo-me momentaneamente em pensamentos. Balancei a cabeça os dispensando e o encarei. – Quanto lhe devo?

— É um presente de aniversário. – Deu de ombros. – Eu não vou cobrar.

— Eu não posso aceitar isso. – Neguei com firmeza. – Seu negócio gira basicamente em presente de aniversários. – O lembrei. – Você vai falir se não cobrar as flores que vão ser dadas como presente de aniversário.

— Oh não. – Meneou a cabeça com um sorriso brincalhão. – O que me sustenta de verdade são as de pedido de desculpas. – Piscou. Ri diante do seu humor. – E é claro, o dia dos namorados.

— O que seria de vocês sem homens traindo para sustentar o comércio? – Perguntei fixando-me na primeira opção.

— Exato!

— De qualquer forma, eu não me sentiria bem com isso. – Falei mais séria.

— Esqueça. Nem estamos abertos, não é oficialmente uma venda. – O encarei incerta, não era justo. Não parecia certo. E eu não queria dever nada a ninguém. – Vá. – Murmurou provavelmente evitando mais protestos. - Dê parabéns a sua mãe por mim. – Pediu.

            Soltando uma respiração profunda, eu cedi.

Assenti concordado.

            - Obrigada. – Murmurei por fim, ele apenas me deu outro de seus sorrisos. Ainda relutante eu acenei em despedida e saí com as flores em um braço. Caminhei por alguns quarteirões antes de descer para pegar o metrô. Ganhei alguns olhares curiosos, uma garota carregando flores sempre ganharia esses olhares, eu presumo. Quando finalmente chegamos em minha parada e deixei o cheiro de cigarro para trás, eu senti meu peito apertar um pouco, eu estava quase lá.

            Passei pelos portões cumprimentando Sr. Douglas com um aceno e andei por entre as lápides deixando a melancolia me consumir. Minhas botas afundavam na grama molhada, os nomes de desconhecidos sendo gravados vagamente em minha mente. Eu já os havia decorado, alguns na verdade.

            Sim, hoje é o aniversário da minha mãe.

            O aniversário de sua morte.

            Quatro anos. Hoje faziam quatro anos  que ela havia morrido, um acidente de trânsito, um bêbado perdeu o controle do seu carro e então invadido a calçada em que nós duas estávamos, eu havia acabado de contar a ela que eu havia ganhado o papel que sempre havia desejado, que a companhia sairia dali um mês e que eu estava dentro, ela bateu palmas daquele jeito espalhafatoso dela, sorriu e estava prestes a me abraçar quando o carro a atropelou, ali, bem na minha frente eu vi minha mãe morrer.

            Eu não acho que algum dia eu conseguiria esquecer tal visão.

            Hoje não era um dia comemorativo, não era um dia para se dar parabéns. Era um dia para lamento, mas após o vexame do primeiro ano, depois de ter chorando tanto, de ter lamentado, Helena conversou comigo, me fez perceber como era minha mãe, como ela era alegre, e como ela odiaria me ver sentada no chão em frente a sua lápide e chorando copiosamente. Helena nesse dia trouxe uma garrafa de vodca, três copos, e após colocar um cheio em cima da sua lápide, se ocupou dos outros, bebemos em meio a risadas, por que lembramos de cada vez que minha mãe me fez passar vergonha, e de como ela fazia ela mesma passar vergonha, sorrimos lembrando de seus momentos mais ternos, e finalmente nos permitimos algum choro, por que sua morte sempre seria algo terrível que levou alguém que não merecia isto.

            Helena me fez prometer que os próximos anos seriam assim, eu poderia chorar, lamentar, mas nunca seria apenas isso. Ela disse:

“Donna merece risadas, merece ser lembrada da mãe atrapalhada e amorosa que foi, inclusive um pouco piranha, aquela mulher sabia como atrair os homens. Ela não merece ser lembrada por que algum bêbado não soube pisar em um freio.”

Desde então, eu acordava, olhava o calendário e embora registrasse que dia era hoje, não me permitia pensar no significado disso até entrar no cemitério, não deixava me dominar por melancolia até passar por entre as lápides, e só quando eu parava em frente à lápide dela é que eu me permitia pensar que ela não estava mais aqui.

— Hey. – Murmurei ajoelhando-me e colocando as flores no centro de sua lápide. – Cheguei um pouco mais cedo dessa vez, não se preocupe, eu não estou a usando para fugir de algo ou me prendendo em uma bolha de depressão. Hoje começa os ensaios da minha nova peça. Teremos alguns intervalos, mas será um dia intenso. Eu não poderia vir depois. Helena vai dirigir, e ela é uma péssima diretora, todo mundo reclama e diz que prefere quando ela era apenas uma atriz. – Ri. – Eu acho que os outros atores estão se rebelando, mandei mensagem para ela avisando que iria me atrasar, e ela disse que ninguém havia chegado ainda, você imagina alguém obedecendo aquela maluca? Eu não sei por que obedeço, ou talvez eu não obedeça, ou não estaria atrasada. – Dei de ombros. – Eu trouxe flores hoje, eu sei que você gostaria mais da vodca, mas você é minha mãe, você precisa ser um exemplo, ok?- Respirei fundo ainda encarando o nome gravado, a data de nascimento e de sua morte. – Tulipas laranjas. – Murmurei por fim. – Eu sei, papai lhe deu tulipas laranjas em seu primeiro encontro, eu não planejei isso. – Sorri lembrando-me dos olhos azuis e o sorriso bonito. – Oliver, um floricultor bonito e charmoso as escolheu, você provavelmente daria em cima dele e me envergonharia. Desde que papai morreu você ficou um pouco vadia e Oliver, bem, ele com certeza chamaria sua atenção. Talvez você tentasse me empurrar para ele, o que me envergonharia também. – Engoli em seco. - Mas honestamente, eu não ligaria, por que eu sinto sua falta. – Murmurei em um fio de voz. – Eu te amo mãe, eu espero que ao menos você esteja dando um pouco de trabalho aí em cima, faça-os se arrepender de tê-la levado sim? E se você estiver com o papai, não se esqueça de dizer que eu o perdoei, eu perdoo você dois, eu estive com raiva por um tempo, mas eu sei que não poderia depender de vocês para sempre, eu só gostaria de ter tido um pouco mais de tempo. Mas o que tivemos foi algo que muitos invejariam. Então, até o ano que vem. Quem sabe o que lhe trarei na próxima vez? – Sorri enxugando uma lágrima que teimosamente desceu por minha bochecha, erguendo-me e tomando uma respiração profunda eu a deixei para trás. Se eu ficasse mais tempo eu quebraria minha promessa a Helena, uma promessa que eu havia feito a minha mãe também.

Então parti, e tentei seguir meu dia como qualquer outro, fui para o ensaio, ganhei um abraço de Helena que prometeu que passaria mais tarde, mesmo que fosse a noite e levaria aquele copo de vodca para minha mãe. Durante os ensaios, Helena perdeu a paciência inúmeras vezes com todos que estavam, atores, figurantes e figurinista, ela manteve o pulso firme, o que fez com que ganhasse respeito dos mesmos. Ela também brincou nos intervalos, deixando claro que ela sempre seria uma amiga quando isso acabasse. Quando anoiteceu ela sugeriu que comêssemos e bebêssemos algo no bistrô perto, mas neguei, se eu bebesse era capaz que em algum momento eu acabasse chorando. Ela pareceu entender, e então com um último abraço ela se despediu, falando que então tinha passar em um lugar, eu sabia onde era, mas apenas sorri.

Resolvi ir caminhando, já que meu prédio não ficava tão longe assim, e eu estava no espírito de caminhar. Parei no caminho para levar algo para comer em casa e carregando as sacolas, com meu sorvete favorito em uma delas eu apressei meu passo. Pensei em Oliver, a esta hora sua floricultura devia estar fechada, ele devia estar em seu apartamento, onde quer que ele seja, com uma namorada talvez, ou não. Ele parecia ser o tipo família, modos simples, eu sabia que não era casado, por que assim como observei seu rosto, eu mantive meus olhares em sua mão esquerda, ocasionalmente. Isso não significa que ele não tinha alguém. E um homem tão bonito, devia ter alguém. Eu poderia perguntar, mas duvidava que depois de hoje eu voltaria a entrar em sua loja, provavelmente eu me limitaria a ficar o observando através da minha janela. Ele era uma boa visão, principalmente em dias como este.

Afastando tais pensamentos de minha mente eu encarei meu prédio logo mais a frente e vacilei um passo ao perceber o próprio Oliver sentado nos degraus dele. Fiquei confusa, talvez ele estivesse esperando alguém, talvez houvesse uma razão específica por ele estar ali, essa razão não tinha que ser eu, certo?

Mas ele se ergueu quando me viu se aproximar, seus olhos fixaram-se nos meus e aquele sorriso encantador estava ali dirigido para mim.

— Oi. – Murmurei ainda confusa, parando em sua frente.

— Oi. – Ele devolveu ainda sorrindo.

— Perdido? – Brinquei. Ele meneou a cabeça em negativa.

— Esperando por você. - Confessou. Que ele dissesse isso me surpreendeu mais do que o fato de ele estar me esperando, a confusão voltando, por quê ele estava me esperando, ele devia ser cortês com todas suas clientes, não é que ele estivesse interessado especialmente em mim, a não ser...

— Ahh. – Soltei chegando a uma conclusão. – Você veio cobrar as flores... – Murmurei passando uma sacola para a outra mão e passando a tentar a abrir a bolsa.

— O quê? – Murmurou incrédulo.

— ... Eu falei que não era bom para os negócios e...

— Felicity. – Interrompeu-me. Sua mão cobrindo a minha e parando-a. – Eu não estou cobrando nada.

— Não?

— Não. – Assentiu. – Eu queria convida-la para jantar. – Murmurou por fim, seus olhos desceram até as sacolas. – Mas acho que você dirá não.

— Jantar? – Repeti me sentindo uma boba.

— Sim. – Assentiu. – Se você não puder hoje, podemos marcar para outro dia, isso se sua resposta for sim, é claro.

— Eu... – Comecei, então parei. Olhei para as sacolas em minhas mãos. Eu estava surpresa, não previa um interesse dele para mim, e agora eu estava cansada, física e emocionalmente, eu não deveria estar muito atraente e ele ainda queria sair comigo, ele era lindo e parecia ter passado o dia todo descansando, eu era a atriz, mas ele parecia um modelo. Eu não previ isso, e agora tinha um sorvete descongelando e comida chinesa esfriando. – Eu...

— Eu não quero que se sinta pressionada. – Falou rapidamente. – Podemos nos encontrar outro dia, é só que eu a vejo todos os dias. Eu... Você me fascina. – O encarei ainda mais surpresa. – Eu a vejo em sua janela, a vi gritar com os pássaros outro dia, vi chutar a bola das duas crianças irritantes para o carro passar por cima...

— Ok, você me viu nos meus piores dias. – Murmurei envergonhada.

— Mas vi nos melhores também. – Sorriu. – Vi carregar as sacolas para a avó dos monstrinhos, vi entregando café da manhã para o morador de rua, e a vi sorrir nesse dia. Você me fascina, e eu pensei em chama-la para um encontro.

— Você mal me conhece. – Retruquei.

— E não é para isso que serve os encontros? – Perguntou confiante. – Diga sim. – Pediu.

— Você pode se arrepender. – O alertei.

— Eu ficarei bem. – Assentiu.

— Está bem. – Assenti concordando. – Mas tem que ser agora. – Ergui as sacolas exibindo para ele. – Vamos subir e encomendar um pouco mais, por que acho que você é do tipo de homem que não contenta com pouco, e eu encomendei pouco. Precisa ser agora, por que eu provavelmente me arrependerei e desmarcarei com você se deixarmos para depois. – Confessei. E eu não estava mentindo. – Você quer subir comigo?

— Parece perfeito para mim. – Sorriu.

— Não fique presunçoso. – Alertei.

— Eu tenho algo para você. – Murmurou subindo as escadas e abaixando-se para pegar algo atrás da grossa coluna da entrada. Ele trouxe um arranjo de flores.

— Tulipas. – Murmurei meneando a cabeça.

— Tulipas vermelhas. – Assentiu me entregando. No mesmo ato ele tomou minhas sacolas para si.

— O que aconteceria se eu fosse alérgica a flores? – Murmurei erguendo uma sobrancelha.

— Você nunca teria entrado em minha loja. – Murmurou dando de ombros.

Verdade.

— E se eu demorasse a aparecer, chegasse no outro dia? – Perguntei insistente. 

— Daria a alguma senhora que tivesse pena de mim. – Sorriu.

— Tenho a impressão que sim. – Sorri também. – Subimos?

— Depois de você. – Murmurou gesticulando exageradamente. Sufoquei uma risada por conta do gesto afetado. Não falamos muito quando entramos no elevador, quando ele entrou no meu apartamento ele elogiou a decoração, encomendamos mais comida e ele perguntou o que eu fazia, depois disso a conversa veio fácil, quando eu coloquei sorvete em cada taça ele estava sentado no sofá, seu olhar concentrado no programa de TV.

— Espero que seja do tipo que gosta de sorvete. – Falei o entregando a sobremesa.  Ele me deu um sorriso de garoto.

— Definitivamente. – Contente sentei ao seu lado, ciente demais de sua proximidade. Fiquei o encarando, concentrada em seu perfil, eu podia imaginar o que minha mãe estaria me aconselhando agora, “Pule em cima dele garota”, ela provavelmente estava certa, eu deveria fazer isso. Ele sentiu meu olhar em si e me encarou, seus olhos mais uma vez me atraindo como imã, seu sorriso se esgueirando, sua mão se ergueu e alcançou meu rosto, seu polegar movendo-se delicadamente.

— Obrigada. – Murmurei ciente de que até então não havia feito isso. – Pelas flores.

— Não foi nada. – Murmurou seu rosto parecendo mais próximo. – Eu sou dono de uma floricultura, esse é meu meio de conquistar as garotas. – Brincou. Eu deveria ficar zangada com seu comentário, mas por alguma razão me divertiu, talvez por que eu não acreditei nisso, ele conversou comigo sobre seu trabalho, e a forma como ele falou, me mostrou que ele era apaixonado pelas flores, pelo o que cada uma podia significar, por sua natureza, cada aspecto. Ele era um apaixonado pela botânica, e principalmente pelas flores. Não era apenas um meio de chegar as garotas, então eu não me zanguei, eu não acreditei e eu ri do que disse. Assenti divertida.

— Verdade, mas isso vai quebrar seu negócio. – Falei ainda o fitando.

— Não se preocupe. – Murmurou ainda mais próximo. – Eu sempre tenho os traidores para sustentar meu negócio.

 - Como eu pude me esquecer disso? – Meneei a cabeça com um sorriso. Ele não falou mais nada, a distância havia sido vencida, e não cabia mais nenhum comentário ali, tudo que cabia ali era um beijo. Um beijo terno que me surpreendeu por sua delicadeza, o calor de sua boca absorveu a minha, seus lábios se moveram sobre os meus com a mesma confiança com ele fazia tudo, mas ainda tinha aquele grau de timidez que ele deixou escapar apenas uma vez, quando demorou a soltar minha mão. Sua mão rapidamente envolveu minha nuca, e seu beijo logo se aprofundou. Era nosso primeiro encontro, nosso primeiro beijo, e parecia perfeito, mesmo em um dia como esse parecia perfeito. Mesmo após o fim dele eu mantive meus olhos fechados por alguns segundos, ainda o sentia perto, seus lábios ainda estavam ali a míseros centímetros dos meus, eu podia sentir. Quando finalmente abri meus olhos, encontrei os dele me observando tão intensos, tão magnéticos. Ele parecia tão aturdido quanto eu, tão surpreso com essas faíscas quanto eu.

— Ainda é muito cedo para eu pedir por um segundo encontro? – Murmurou fazendo com que perdesse um pouco aquela tensão, um sorriso escapando. – Não?

— Acho que um segundo encontro nos cairia bem. – Assenti. – De preferência algo fora de casa e que eu pudesse me arrumar antes.

— Você está linda! – Protestou.

— E você é um galanteador. – Retruquei.

— Eu sou. – Concordou. – As mães me adoram.

— Eu não duvido. – Murmurei perdendo aquela alegria por alguns segundos. – Acho que está na hora de você ir. – Murmurei olhando para o relógio. – Você sabe, para que possamos ter um segundo encontro.

— Você está certa. – Falou se erguendo do sofá e estendendo-me uma mão. – Acompanhe-me até a porta. Assim eu posso ganhar um beijo de despedida.

— Confiante, heim? – Falei o acompanhando apesar de tudo.

— Eu preciso ser. – Falou. – Demorei duas semanas para convida-la. – O encarei maravilhada com o que disse, por que dava a impressão que ele tinha me visto tão logo abriu sua loja e desejou me conhecer de imediato. – Boa noite Felicity. – Murmurou sem se dar conta do meu estado contemplativo. – Felicity?

— Hum? – Murmurei distraída. Ele apenas sorriu e inclinou-se, seu braço abraçando minha cintura e apertando-me contra si, seus lábios tomando os meus em um novo e intenso beijo, tão bom quanto o outro, talvez melhor, por que agora eu correspondia com mais entusiasmo, e envolvia mais do que lábios apenas, envolvia línguas e mãos. E quando ele me soltou eu quase desejei que voltássemos para dentro, mas a razão sobressaiu meu corpo inconsequente, ele tinha uma loja aqui em frente, era melhor eu conhece-lo melhor antes de fazer qualquer coisa que pudesse trazer constrangimento depois.

— Até mais. – Murmurou me soltando.

— Até. – Murmurei ainda mexida com o beijo.

— Espero que sua mãe tenha gostado das flores. – Falou antes de beijar meu rosto, ele sorriu.

— Ela amou. – Murmurei por fim.

— Você devia procurar os significados das flores. – Sugeriu. Ele se virou e logo  entrou no elevador. Não me deu oportunidade de resposta. Fechei a porta e fui até meu quarto. Abri a janela recebendo o vento frio e olhei para baixo, ele atravessou a rua e então se virou, seus olhos encaram os meus, e eu podia ver seu sorriso contente, ele acenou, uma mão dentro do seu casaco, e eu ergui uma mão também em aceno. Sorri com a imagem boba que devíamos estar provocando para quem quer que passasse. Ele foi embora, mas eu me mantive ali, observando-o desaparecer.

Peguei meu tablet e sentei em minha cama, meus dedos deslizando, até que logo eu estava procurando o significado de tulipas, não as laranjas, mas as vermelhas. E então contrariando toda a expectativa que eu tinha para o final do dia, eu sorri.

Agora eu estava mais do que ansiosa por todos os encontros que ainda estavam por vir, por que eu sabia que não ficaríamos apenas no segundo.

Teríamos muito mais do que isso.

E Oliver também sabia disso.

E foi o que ele queria dizer quando pediu para o que eu procurasse o significado.

Deitando eu fechei meus olhos, um sorriso em meus lábios eu percebi mais uma vez que esse dia apesar de tudo, contrariando o que eu imaginava...

Esse dia foi perfeito.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado, e fico no aguardo do Feedback, como sempre. Até a próxima!
Xoxo, LelahBallu