Alvo Fácil escrita por Ametista


Capítulo 1
O contrato




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Meu nome é Samantha Joy Puckett. Ou Sam, para Deus e o mundo. Tenho 23 anos e sou uma típica ariana, então é bem previsível que eu tenha pavio-curto e que apesar da carinha de anjo, eu traga um demônio no corpo. É brincadeira; sou uma garota como qualquer outra, na verdade. Sou irritante e irritadiça, gosto de carne – não importa o tipo, sendo carne já está ótimo –, Bolos Gordos e minha cor favorita é marrom, afinal, convenhamos, existe uma cor mais bonita do que a de um bom molho de churrasco?

O único detalhe da minha vida que não me classificaria exatamente como normal é o meu emprego. Entre no Google e procure pelo meu nome; provavelmente vai aparecer que eu tive um sucesso temporário no iCarly, em seguida trabalhei como babá em Los Angeles e por fim, fiz dinheiro com compra e vendas de ações. Isso é só a fachada. Desde que saí de Los Angeles e fiz faculdade por somente três dias – igualzinho ao Spencer, mas diferentemente dele, eu fui expulsa –, as oportunidades foram ficando escassas, tio Carmine me ofereceu um emprego e bom... descobri que sou boa nisso. Tornei-me uma assassina de aluguel.

Em minha defesa, posso dizer que realizei meu sonho de me tornar uma ninja invisível – agora sou mestre em artes marciais e meu codinome no submundo da máfia é Fantasma. Só não é uma vida glamorosa como eu costumava achar que seria. Na maior parte do tempo, estou enfiada em algum lugar poeirento procurando pelo melhor ângulo com um fuzil de precisão ou empilhando corpos com as tripas de fora. Já tentou tirar sangue de seda? Posso dizer que é uma droga.

Já estava cansada de toda aquela rotina quando meu telefone tocou na manhã de domingo. Gemi alto, pois tinha acabado de finalizar com um contrato especialmente sangrento e estava planejando tirar umas boas e longas semanas de férias. Fiquei tentada a não atender ao chamado, mas no que saí da cama e olhei o identificador, vi que não era Mei Ling – a secretária que me passa os contratos – e sim tio Frank.

Coloquei o celular na orelha com o cenho franzido:

— Aconteceu alguma coisa? – indaguei, um tanto preocupada.

— Olá, principessa. – Ele não pareceu surpreso por eu querer ir direto ao ponto. – Nós temos uma nova proposta. Exclusiva, é claro, para você.

Enfezei-me no ato.

— Tio Frank, quantas vezes eu tenho que dizer para não falar comigo sobre trabalho nessa porcaria de telefone?! É para isso que eu tenho uma maldita secretária!

— É um cliente especial.

— Não dou a mínima – cortei. – Ao contrário de vocês, eu não gosto de amadorismo.

— O cliente exigiu que eu a contatasse diretamente – explicou de modo pausado, tentando não perder a paciência. – Não posso nem passar as particularidades, porque eu não as conheço. O cliente quer que você o encontre pessoalmente para repassar tudo no maior sigilo.

Franzi os lábios. Um cliente que se arrisca dessa forma? Isso é incomum, pensei. Entretanto, eu já estava decidida – meu descanso viria em primeiro lugar.

— Não vai ser necessário, eu não quero o contrato. – Joguei-me na cama, puxando o edredom acima das pernas. – Acabei de voltar para casa. Estou exausta.

— É mesmo? – retrucou, irônico. – Não vai mexer os pauzinhos nem por 5 milhões?

Sentei-me com as costas duras, completamente estupefata.

— Como disse? Estão oferecendo 5 milhões por um contrato exclusivo?! – ri com incredulidade. – O cara quer a cabeça de quem, do presidente?!

— Shhhh, sua idiota! Fique nas metáforas, é para isso que elas existem! – ralhou aos sussurros. – Olhe, se quiser o trabalho, o cliente a estará esperando para um jantar amanhã, no hotel Plaza às oito da noite. Não se atrase.

— Espere. Está dizendo o famoso Plaza... de Nova York?

— É, acha que estou falando do Plaza das docas de Seattle? O homem é rico, Sammy.

— Tio Frank, eu moro em Boston.

Ouvi-o estalar a língua, como se isso fosse irrelevante.

— Basta dizer ao maitrê que procura pelo Sr. John Smith. Até logo. – E desligou.

Revirei os olhos para o nome falso ridículo – existiam milhares de “John Smith” por toda a América. Se o homem queria anonimato, por que diabos queria me encontrar?

Acabei sendo vencida pela curiosidade. Fiz uma reserva em um hotel em Nova York que não fosse o Plaza – eu detestava ficar no radar de qualquer pessoa – e comprei uma passagem de avião para aquela noite ainda. Mantive minhas armas todas no lugar, uma vez que ainda não sabia com que espécie de contrato eu iria lidar, isso sem mencionar os detectores de metais nos postos de embarque, mais um motivo para eu repudiar viagens no ar. Separei apenas um nunchaku — evolução adulta da minha adorada Meia de Manteiga – e meu gancho de cabelo japonês – consigo matar cinco homens com um desses em uma briga –, para o caso de imprevistos. Minha bagagem, como sempre, era muito básica e prática. Deixei para comprar o vestido que usaria no tal jantar quando chegasse à Nova York.

Às sete e quarenta da noite do dia seguinte eu já estava arrumada no que eu considero um traje de gala adequado; um vestido sereia longo azul-marinho inteiramente fechado e um casaco de cashmere cinza, os cabelos presos ao alto pelo gancho. Peguei um táxi que me levasse do Pierre no Upper East Side ao Plaza e cheguei cinco minutos adiantada. O maitrê se mostrou muito prestativo ao me guiar para a mesa reservada – que não era uma sala privativa, como imaginei –, ajudando-me até mesmo a tirar o casaco, o que foi muito engraçado, pois ele corou violentamente ao ver o quanto minhas curvas se destacavam dentro daquele vestido. Ele estava me fazendo um elogio eloquente quando um homem de smoking puxou a cadeira e se sentou diante de mim.

Analisei-o. Certamente aquele não era de fato o cliente – sei distinguir um homem rico de um capanga com um só olhar. O homem que se atrapalhava com as abotoaduras na minha frente devia ter em torno de trinta anos e era alto e musculoso, o cabelo cor de palha de milho. Eu podia apostar meu fígado que era russo – namorei um detestável russo por um ano, Nikolai, então sei bem do que estou falando.

— Sr. Smith – cumprimentei com um movimento do queixo. O maitrê se afastou.

— Srta. Puckett. – Ele deu um meio sorriso tímido, os punhos se contraindo, nervosos. – Está arrasadora esta noite, se me permite a ousadia.

Ergui a sobrancelha. O sotaque era discreto, mas era evidente que estava ali. Russo.

— Sei que estou. Faz parte do trabalho. – Uma parte sutil, embora importante. Quanto mais eu parecesse uma loira fútil para os olhares externos, melhor. Ninguém desconfia que alguém assim tem uma faca presa ao sapato.

Ele juntou as mãos sobre a mesa, a expressão séria.

— Falamos disso agora?

Revirei os olhos.

— Você é novo no ramo, não é? – Sorri, maliciosa. – Devia saber que manter as aparências faz parte das regras. Viemos jantar e vamos jantar.

— Como queira – aquiesceu e uma gota de suor lhe escorreu a têmpora. Estranho.

O jantar foi servido à francesa e comemos em silêncio, fazendo comentários genéricos vez ou outra acerca do clima de Nova York ou da decoração do hotel. Fiquei satisfeita de ter comido um sanduíche tamanho família antes de sair, pois comer em público agindo como uma dama refinada era um saco. Não me servi de uma só gota de álcool – prefiro fechar negócio sempre muito lúcida – e reparei que aquele homem também não. O crème brûlée tinha acabado de ser posto na mesa quando ele me deslizou um pacote pardo sem a menor cerimônia.

Limpei a boca no guardanapo e abri o pacote com naturalidade. Em vez de encontrar um dossiê resumido de meu próximo alvo, me deparei com apenas um celular e um convite para um baile na região do Vale do Silício, datado para a próxima sexta-feira. Devolvi o pacote bruscamente.

— Sr. Smith – comecei, pronunciando o nome com sarcasmo –, acho que o seu patrão não está familiarizado com o funcionamento dessas transações. Ele me passa o nome, eu estudo a melhor estratégia para executar o serviço da maneira mais imperceptível o possível e depois ele me paga o combinado. Não recebo ordens passo a passo de ninguém.

Ele se mostrou surpreso por eu ter percebido que ele não era o mandante e se apressou em disfarçar. Novatos.

— Ele quer contratá-la por que sabe que é a melhor. – Não me deixei dobrar pelo elogio. Conversa mole, eu farejo de longe. – Contudo, se ele é o empregador, ele é quem dita as ordens, não é certo?

— Errado – redargui, pouco tolerante. O modo como ele articulava me deu a entender que ele também não conhecia o tal empregador. O sigilo, ao que tudo indicava, estava sendo levado bem a cabo. – No momento, não estou precisando deste contrato. Aceitei encontra-lo aqui somente porque fiquei curiosa quanto às imposições que foram feitas e, bem, não estou mais. Se seu chefe quer um soldadinho de chumbo, estou convencida de que meu tio pode encontrar alguém mais adequado. – Levantei-me, vestindo meu casaco. – Passar bem.

— Srta. Puckett, só me deixe dizer que o empregador quer encontra-la na sexta-feira, durante esse baile, para lhe passar o arquivo com os dados. – Ele gesticulou para que eu me sentasse novamente. – Esse encontro é mais uma escala, entende?

Continuei de pé.

— Por que a demora? Se eu estivesse com o arquivo, na sexta-feira o trabalho já teria sido concluído.

— Estamos falando de um homem ocupado – argumentou. – E que preza por formalidades.

— O celular?

Ele deu de ombros.

— É para que saiba como identifica-lo. Basta estar nesse baile. – Os dedos tamborilaram no pacote. – E então? Como ficamos?

Não respondi. Apenas apanhei o pacote e guardei no bolso interno do casaco, caminhando em direção à saída.


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Notas finais do capítulo

Não sei o que dizer, então digam por mim ;)