O Mundo que Você não Vê escrita por Carolambola


Capítulo 5
5




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Estávamos em guerra? 

Levei um segundo para superar o choque que a notícia trouxera. Olhei para o lado para fazer um comentário, mas Joseph tinha desaparecido. No lugar dele, vi Lilith correndo em minha direção.

— Amanda, venha comigo.

A segui obedientemente pelos corredores até chegarmos a uma porta que eu nunca tinha visto antes. Era grande e imponente, ornamentada com inúmeras pedrinhas vermelhas. Rubis.

— Marinette vai tirar suas medidas e lhe fazer uma roupa de batalha - Lilith me explicava, visivelmente nervosa - espero que tenham alguma coisa que não queime.

Ela abriu a porta e revelou um ninho de pessoas correndo, apressadas. Aparentemente, pequenas fadinhas costureiras tiravam as medidas e costuravam as roupas das vampiras ali presentes. Avistei Áurea a Amélie em um canto. Elas acenaram para mim, também preocupadas. Apreensão era a expressão no rosto de todos no momento, e provavelmente estava na minha cara também.

Fui posicionada em frente a um espelho de corpo todo, com a moldura dourada trabalhada e também incrustada de rubis. Um pequeno grupo de fadinhas me cercou e tirou minhas medidas. Expliquei a elas que tipo de roupa precisaria ser, resistente à água e ao fogo, ao que elas assentiram e, minutos depois, voltaram com uma roupa, que me entregaram.

O traje era, apesar de tudo, bonito. Era preto e justo, feito de um material grosso e visivelmente resistente, com algumas aplicações de couro. O vesti, esperando uma roupa pesada, mas era incrivelmente leve. As fadinhas retornaram, concordaram com a cabeça e me entregaram um par de botas até os joelhos, feitas do mesmo material, e luvas. Uma delas deu um passo a frente para me dizer que as luvas permitiriam que eu usasse meus poderem sem prejuízo, pois eram feitas de alguma coisa da casa delas.

Agradeci por tudo e saí da sala, procurando alguém que pudesse me dar uma luz. Joseph, Lilith e Arthur provavelmente estavam a mil, então estavam fora de cogitação. Também não estava com paciência para as irmãs, que também deviam estar se preocupando com aquilo tudo.

Resolvi sentar no banco de pedra no jardim. Já estava escurecendo mesmo. Como suspeitei, o lugar estava completamente vazio. Levei um livro, deitei na guarda do banco e li, sozinha e em silêncio, por horas. Este era o bom de ser vampira: eu não dormia, ou sentia fome, nem mesmo ia ao banheiro. Por isso, fiquei muito tempo deitada no banco, sem mexer um músculo que não fosse necessário para virar a página.

Era mais ou menos uma e meia da manhã quando senti minhas pernas sendo levantadas e depois baixadas novamente, no colo de alguém. Subi os olhos do livro, olhando para a pessoa.

Sentado ali, Joseph sorria para mim. Aqueles sorrisos falsos, de quem está preocupado, mas não quer preocupar os outros. Me preocupar, no caso. 

Sorri de volta para ele, me sentando direito.

— O que aconteceu? - me virei e coloquei a cabeça em seu colo. Ele começou a fazer carinho nos meus cabelos.

— Harriet está se aproximando das fadas. Quando amanhecer nós iremos para lá. Me desculpe, Mandy, não consegui tirar você dessa.

— E eu não ficaria de fora, mesmo se tivesse conseguido!- Ri para ele, tentando relaxar o clima. Ele revirou os olhos e riu para mim, mas ainda estava tenso. 

— Eu sei que não. Mas não custava tentar...

— Tudo bem. Vamos quebrar a cara dessa gente!- Ele concordou e sorriu. Achei que tinha conseguido relaxar a cabeça dele, mas seu rosto assumiu uma expressão séria instantes depois.

— Mandy - Ele começou, com a sua cara de palestrante. - Quando chegarmos lá, vai ser perigoso. Eu sei que você tem grandes habilidades e que se revelou uma ótima lutadora, mas prometa que vai ser cuidadosa.

— Sim, Joseph.

— E prometa que não vai ficar perto de mim, falar comigo ou sequer olhar para mim durante a batalha.

— Como assim? Por que eu não?

— Por que me querem morto - explicou. Mas isso eu já sabia. Porque eu não poderia sequer olhar para ele ainda era o mistério. - E eu me importo com você. Se perceberem isso, ao invés de me pegarem, vão tentar pegar você. Daí eu vou tentar salvar você, e aí vão me pegar. No final, acabamos os dois mortos.

— Se é assim. Agora você me prometa que vai ser cuidadoso. - concordei com ele, porque ele tinha razão.

— Prometo. - falou, alegremente.

— E que não vai tentar me salvar se não tiver como.

— Mandy, eu vou tentar te salvar até as últimas das consequências. - Fiquei comovida com a declaração, mas não era disso que eu precisava.

— E eu agradeço, mas preciso saber que você não vai se ferir por causa de um cadáver. Prometa, por favor.

— Prometo.

— Então, Joseph... - finalmente pensei em como distrair a nós dois, com uma coisa que eu vinha querendo fazer havia dias. - Você disse que amanhã vai ser perigoso...- falei, praticamente sussurando.

— Sim... - Ele respondeu no mesmo tom, confuso.

— Então, eu queria aproveitar para fazer uma coisa que eu quero faz tempo...

— Qualquer coisa...

Puxei a gola da camisa dele para baixo e levantei a cabeça, até que finalmente o beijei. Fui levantando até estar na mesma posição de mais cedo, com as pernas ao redor de sua cintura. Fizemos o negócio das árvores mais uma vez, sem parar. Chegamos na clareira, e novamente ele tirou minha blusa e eu tirei sua camisa, mas agora nós poderíamos ir além. E fomos. 

Nunca tinha feito ao ar livre antes. Só tinha feito uma vez, aliás, com o canalha do Josh, e foi péssimo. Joseph era um cavalheiro muito bom de (falta de) cama. Quando terminou, estávamos abraçados no chão da floresta. Eu ficava desconfortável de ficar nua na frente dos outros, então rapidamente nos vestimos. De mãos dadas, corremos de volta para o banco. Sentamos ali, e Joseph olhou para o céu, para onde o sol começava a dar sinais de vida.

— Tenho que ir, querida. Partiremos em meia hora. Vá se aprontar. Te encontro na porta em vinte minutos.

Dizendo isso, ele desapareceu para dentro da mansão. 

Mais uma vez sozinha, recolhi o livro que ainda estava ali e subi para os meus aposentos. No caminho, Lilith me mandou colocar o traje e recolher o que eu levaria, nada grande ou pesado. Cheguei ao quarto e resolvi tomar banho, estava toda suja de terra. Dentro da banheira, lembrava da noite passada. 

Quando saí, vesti minha "fantasia", arrumei o colar de coração, coloquei algumas fotos no bolso interno do traje, junto com meu celular. Me despedi do quarto, torcendo para conseguir voltar para lá.

Encontrei Joseph na porta no horário marcado. Ele passou o braço pela minha cintura e murmurou que "era hora do café". Não sabendo o que ele queria dizer, o deixei me guiar até o salão de baile, onde foram posicionadas inúmeras mesas. Sentamos lado a lado, junto com todos os outros vampiros. Joseph se levantou.

— Irmãos e irmãs - começou ele, em voz alta. Todos pararam de falar e se viraram para ele, prestando a maior das atenções. - Hoje e pelos próximos dias estaremos enfrentando grande perigo. Lembrem-se: eles são a ameaça; não é o melhor jeito de resolver conflitos, é sabido, mas não tenham pena. Os que A seguem já estão irreversivelmente corrompidos. Sejam cautelosos e sagazes. Para que fiquemos fortes, hoje teremos nosso café especial. Nossas garçonetes serviram as bolsas mais frescas e de melhor qualidade da região. Bebam à vontade e quantas quiserem; na saída receberão para a viagem. Por favor, não mordam as garçonetes. Aproveitem!

Uma salva de palmas; as garçonetes começaram a passar com carrinhos lotados de bolsas de sangue, dos quais cada vampiro retirava uma. Elas não paravam de surgir com carrinhos cada vez mais cheios, me levando a pensar que os vampiros roubaram todo o sangue disponível no país.

Uns quinze minutos depois, todos estavam mais que satisfeitos. Sabia que sentiam-se muito poderosos. Eu não estava sentindo tanto o efeito, porque tinha bebido bastante daquele cara, mas ainda era uma sensação gostosa.

Levantamos e nos encaminhamos para a saída. Fui grudada em Joseph, que segurava minha mão. Estávamos atrás de todos. Quando eu passei, uma moça me entregou uma bolsinha fina, que grudava na roupa e era impermeável. Olhei dentro e vi que tinha cinco bolsas de sangue, bem comprimidas, ali. Agradeci com a cabeça. Ela entregou duas à Joseph. Ele agradeceu e lhe deu algumas instruções, ao que ela assentiu. O restante do grupo ainda caminhava, alguns metros na nossa frente. Logo que nos juntamos, todos começamos a correr. 

Corremos o dia todo. Um vampiro pode chegar a 200km/h, e um mais velho é capaz de correr ainda mais rápido. Os mais antigos, como Lilith e Verena, no entanto, estavam educadamente acompanhando os outros, mais lentos.

Até que chagamos a um porto e entramos em um navio imenso, que de alguma forma ia mais rápido que a corrida dos vampiros. Em questão de horas, estávamos no porto das fadas, em um lugar perto da Nova Zelândia. 

Eu olhei para o tal reino das fadas, deslumbrada com a beleza. Me lembrava muito de Valfenda, de O Senhor dos Anéis. Mas não era branco e dourado e ficava em uma montanha. Era cheio de árvores e tudo parecia brilhar, além de ser decorado com bilhões de pedrinhas preciosas. Pequenas fadas voavam por ali, apressadas. O grupo de vampiros subiu para os aposentos designados por Madame Agnes. Sabe-se lá porquê, ela me deixou no quarto de Joseph. Vi o sorriso malicioso no rosto dele, misturado com o nervosismo.

Fomos para o quarto, que era grande e decorado com cristais e ouro, cheio de espelhos e com uma cama gigante posicionada bem no meio. Larguei a bolsa com as bolsas de sangue e me joguei na cama, apenas para constatar que ela era deliciosamente fofa. Joseph se arrastou e deitou do meu lado, e ficamos os dois ali, de barriga para cima, não propriamente descansando ou dormindo, pois não tínhamos sono. 

Ainda estávamos deitados em silêncio quando alguém bateu na porta, e eu gritei "pode entrar". Uma fadinha com cara de criança nos avisou que tinha "comida" lá embaixo. Ela chegou a fazer aspas com os dedos no ar! Quando ela fechou a porta, com cara de nojo, eu e Joseph caímos na gargalhada. Descemos, bebemos de algumas bolsas e subimos de volta. Continuamos deitados na cama, nos beijando. Não fizemos nada mais. E conversamos. Ficamos nessa até umas sete da manhã, quando voltamos para o refeitório, que tinha mais da "comida". Então o "pessoal da batalha" foi instruído a descer para a planíce, onde ficaríamos esperando o inimigo. Antes de sair, Joseph me puxou para um canto e me deu um beijo demorado na boca e um na testa. Me abraçou e se juntou a Lilith, Verena, Hadrian, Arthur, Petrus, Velentin, Aaron e as irmãs. Eles ficariam na parte de trás, protegidos pela Guarda. Era assim. A Liga lutava tanto quando a Guarda, mas a batalha obrigatoriamente começava naquela posição. Me disseram, ou melhor, Lilith me disse, para ficar na ponta direita. Então foi para lá que eu fui, mais isolada dos outros. 

Percebi como o nosso exército era grande, ainda mais com a presença das fadas. Naquele momento, pensei que nada poderia nos vencer. 

Até que eu vi o exército de Harriet. Era mais ou menos o dobro do nosso.  E nele estavam incluídos lobisomens, animais enormes e peludos, vampiros, fadas e até humanos. Eu podia sentir o cheiro de seu sangue. Mas o que me deixou confusa foi o tamanho das fadas. As que eu vira até então eram mais ou menos do tamanho da minha mão, exceto Madame Agnes. 

Olhei novamente para o nosso exército. No lugar das criaturinhas minúsculas de antes, eu vi mulheres e homens vestidos para lutar, todos de um tamanho normal, alguns mais altos que eu. 

Engoli em seco. Foi só ali que a ficha caiu. Eu estava em uma guerra, onde eu teria que matar gente. Mas não era matar que me incomodava. Era o medo de morrer. Ou de Joseph, Arthur, Lilith, Amélie ou qualquer um do meu "time" não sobreviver.

Ouvi a voz de Joseph, tentando negociar. O inimigo apenas provocou em resposta. Foi assim que eu conheci Harriet, uma menina, isso mesmo, uma menina de uns dezoito anos, baixinha, de cabelos louros encaracolados e pele branca como a neve. Ela falou algo que eu não entendi e, com um gesto dos seus bracinhos finos, todos do seu lado começaram a correr. Visto isso, o meu lado começou a correr. Corri junto, obviamente, fazendo força para não olhar para Joseph. Então algo me fez parar. Um lobisomem me derrubou e estava por cima de mim. Ele não podia me morder de jeito nenhum. Agarrei sua boca gigante, agradecendo por estar de luvas, e a abri até sentir sua mandíbula se deslocar. Quando consegui, ele recuou de dor, me dando tempo para pular e "montar" nele, como em um cavalo. Ele tentava me tirar dali, mas eu me segurava. Cansada daquilo, puxei um pedaço firme de madeira do meu campo de visão e o enfiei com toda a minha força no pescoço do bicho, o sentindo atravessar. O lobo caiu sem vida embaixo de mim. Um pouco desconcentrada, virei de volta para a batalha, recuperando o foco. Continuei correndo, decapitando um vampiro de surpresa no caminho, e ateando fogo no corpo.

Percebi que estava totalmente perdida ali, sem saber o que fazer em uma guerra. Acho que estava meio que esperando que alguém me atacasse, mas nada acontecia. Olhei para os lados. Muitos corpos já jaziam no chão. Suspirei. Enquanto olhava ao redor, bati o olho em Joseph. Me assegurei que ele estava bem e desviei o olhar rápido. Bem a tempo de ver uma fada verde voando para cima de mim. Sorri um sorriso falso para ela e, controlando o vento, a derrubei. Ela caiu, e eu esperei que ela se levantasse antes de enfiar a mesma madeira do lobisomem na barriga dela. Ela se ajoelhou na minha frente, mas ainda podia me matar com aquela madeira. Com um movimento rápido, quebrei seu pescoço. Era a terceira vida que eu tirava, mas quem estava contando? 

Continuei correndo, sempre para frente. Estava bem na linha de frente agora, e quase no meio. Realmente tinha achado que minhas habilidades seriam mais úteis na batalha. Pensando nisso, puxei a madeira, agora ainda mais  ensanguentada, e a quebrei em duas. Enfiei no peito de dois vampiros que corriam juntos, ao mesmo tempo. Deve ter ficado um efeito legal. Matei mais duas fadas até olhar para a minha posição inicial. Foi aí que eu vi.

Dois lobisomens gigantes e com pelos claros estavam em cima de Áurea. Amélie estava muito ocupada. Mas eu não. Corri e pulei sobre um dos lobos, dando tempo de Áurea escapar. Ela estava coberta de mordidas, mas se curaria pela própria habilidade. Ainda assim, não podia ficar perto dos lobos naquele momento.

— Corra!- mandei. Ela obedeceu e sumiu.

O que eu não tinha percebido era que, sem ela e com todos bem na frente, eu estaria sozinha com dois lobos, ambos muito maiores do que o que eu matara. E mais fortes também. O primeiro me derrubou de costas para o chão. Não tinha muito o que eu fazer. Achei que arrancariam minha cabeça; um deles realmente chegou perto. Ele estava a milímetros do meu pescoço quando Joseph interviu e o jogou para longe. 

— Sai daqui, agora! - Joseph gritou. Foi o que eu fiz, me afastei rapidamente, crente de que ele terminaria com os dois lobos em dois tempos. Tinha corrido uns quinhentos metros quando olhei para trás, apenas vendo se ele estava me seguindo.

Foi apavorante perceber que não, ele não estava atrás de mim, mas sim na mesma posição na qual eu estava antes. Corri o mais rápido que pude. Sem saber o que fazer, montei mais uma vez em um dos lobos, procurando desesperadamente um pedaço de madeira. Até que ouvi Joseph gritar de dor. Não vi o que o fez gritar naquele momento, mas foi o suficiente para me deixar desesperada. Mais do que enojada e com a maior força que conseguia produzir, enfiei a mão dentro do lobisomem. Catei seu coração, e, quando o encontrei, agarrei e puxei para fora com tudo, e espremendo entre os dedos. A criatura caiu morta aos meus pés. Joguei o coração no chão, coberto de neve, e subi no outro, arrancando o coração do mesmo jeito. Joseph estava deitado no chão.

— Ei, Joseph, olha pra mim. O que foi? Olha pra mim! Por favor, Joseph, olha pra mim. — Não seria exagero dizer que eu estava implorando.

— Mandy...

— Ei, o que houve?

— Meu braço.

Virei seu braço e quase comecei a chorar quando vi a mordida ali. Era imensa e sangrava muito. Aquilo queria dizer que ele tinha mais ou menos trinta e seis horas de vida, a não ser que ele bebesse sangue de lobisomem ou... ou talvez uma das irmãs o pudesse ajudar... Gritei por Áurea, que apareceu, já totalmente recuperada. Ela se ajoelhou e murmurou no meu ouvido que talvez demorasse um pouco. Suspirei e assenti. Joseph já soava incoerente em inglês, então os dois começaram a falar em alemão, me impossibilitando de entender qualquer coisa. Fiquei ali, como uma preocupada vigia. Observava a luta acontecendo na minha frente, percebendo que não fazia ideia de que horas eram. 

A batalha tinha sido empurrada mais para frente, então no raio de cinco quilômetros a nossa volta estava tudo vazio, salvo os corpos que jaziam no chão. Eu olhava para todos os lados e para o céu, com medo dos ataques aéreos das fadas. Assim que terminou, depois de uns vinte minutos, Áurea me disse para segurá-lo ali por mais uns cinco minutos, e desapareceu em seguida.

— Você foi muito bem. Jamais esperaria que fosse arrancar os corações de dois lobisomens. Obrigado.

— Obrigada e de nada. 

— Mas, você prometeu que não me olharia.

— Você que prometeu que não me salvaria se eu fosse um caso perdido. Eu nunca prometi que não te ajudaria em caso de necessidade...

— Talvez eu não tenha julgado como um caso perdido...

— Talvez não. Mas veio igual. E obrigada por isso.

Ele levantou e me deu um beijinho rápido. Daí saiu correndo, me deixando sozinha na neve.

Corri na mesma direção. O esforço estava me deixando com sede. Achei um dos humanos inimigos e enterrei os dentes em seu pescoço, tirando a cabeça logo depois. Minha boca parecia queimar como fogo. O humano tinha tomado um remédio contra vampiros, pílulas que Harriet inventara para impedir que seus soldados servissem de petisco. Tinha me esquecido disso, talvez pela adrenalina. Pior para o humano, pois o remédio também impedia a transformação. Girei seu pescoço e o homem caiu. 

Olhei ao redor. Vi Lilith e Joseph, cada um cuidando de um lobo; Verena e Hadrian, juntos, com um vampiro. Todos estavam bem. Arthur e Amélie cuidavam de fadas. Harriet estava parada, observando tudo. Eu a fiquei encarando, até que ela me notou. E começou a flutuar na minha direção.

Ao notar a aproximação veloz da fada, Joseph correu e parou na minha frente. Quanto mais ela se aproximava, mais caminhávamos para trás. A batalha se movia cada vez mais rápido agora que praticamente todos os humanos tinham sido derrotados. Logo, só nós três estávamos para trás. Ganhamos mais distância ainda da batalha, até que paramos para ver o que diabos Harriet queria, ou o porquê de ela estar enrolando tanto para nos matar.

— Amanda, querida, ouvi muito sobre você... - ela tinha uma voz doce e fina, agradável. - Suas habilidades são incomparáveis, e tirei a prova disso hoje. Então, meu bem... não estaria interessada a se juntar a nós? Conosco, você teria todas as regalias que pudesse imaginar. Seria tratada como rainha. E Joseph, você sempre será muito bem-vindo, meu amor, sabe disso...

— Cale a boca Harriet. Mandy, não dê ouvidos a essa fada!

— Oh, Joseph, assim você me ofende, querido! Então... Mandy? O que você acha, querida? Junte-se a nós, prometo que você vai amar. 

— Não.- Respondi, firmemente. 

— Ah, não, é? Vamos ver se assim você muda de ideia.

Então eu comecei a sentir muita dor. Era como se minhas costas tivessem sido destruídas. Meu pescoço ardia e parecia sangrar, mas não sangrava. Eu caí no chão, sem conseguir mexer um músculo, sem qualquer controle sobre meu corpo, gritando de agonia. Foi aí que eu percebi: era o estado que eu estava quando caí daquele precipício, segundos antes de morrer. Estava na floresta novamente, mas via Harriet sorrindo para mim e Joseph com a expressão agoniada e culpada. Tentei parar de gritar e sorrir, só para fazê-lo mudar de expressão, mas só consigo gritar mais. 

— Pare com isso, Harriet; deixe-na em paz, ela não tem nada a ver com isso. 

— Oh, Joseph... vejo que arrumou uma namoradinha. Isso torna as coisas mais divertidas, querido. Vejamos.

Então a dor sumiu. Levantei, e era como se nada tivesse acontecido. Abracei Joseph, esquecendo completamente de Harriet.

— Olha só, os dois pombinhos. Bem, vamos começar. Leia isso, Joseph.

Ela fechou os olhos e se concentrou em algo. Joseph me soltou. Ela abriu os olhos e sorriu maliciosamente, fitando Joseph.

Ele pôs as mãos na cabeça, como se doesse muito. Mas não era dor. Ela o estava obrigando a ler sua mente, e os pensamentos não pareciam bons.

— Pare, Harriet. Não há... necessidade... disso. Pare!

— Tá bom.

Então ele se recuperou, ficando ereto novamente.

— Então, agora vocês dois virão comigo?

— Não. - respondemos juntos. 

— Vocês estão tirando a graça da brincadeira, amores. Se vocês colaborassem, não haveria a necessidade de eu fazer isso.

"Isso o quê?" me perguntei. Tudo o que ela já tinha feito? Talvez. Ou ela ainda tinha algum truque na manga?

Obtive minha resposta quando Joseph caiu do meu lado. Achei que ela o tivesse matado, mas ele tremia muito. Estava congelando, assim como quando se tornou vampiro. Pior que isso, vi que seus lábios e as pontas dos seus dedos estavam ficando roxas. Ela o mataria de frio. Sem saber o que fazer, fiz uma bola de fogo e atirei nela. Harriet gritou e desapareceu. Eu a matara? Sem me preocupar com isso, me ajoelhei ao lado de Joseph, que ainda tremia, um pouco menos, e já voltava à cor normal. Minhas mãos estavam quentes. Segurei as dele, geladas, e as pressionei por alguns instantes, até ele ficar parado e branco como sempre.

— Você a matou?

— Não sei. Ela deve ter ficado um pouco queimada, no mínimo.

— O que você fez?

— Joguei fogo nela.

— Ela ainda deve estar viva, mas fugiu mesmo. Já podemos voltar. Acabou por hoje.

Ajudei ele a levantar e partimos para o palácio. As fadas que não lutavam e Áurea nos esperavam. O restante do grupo voltou em seguida.


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Notas finais do capítulo

Super capítulo hoje, então comentem!



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