Infinite escrita por Skye Miller


Capítulo 19
Sky.




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Meu quarto. 6:45 PM. Segunda-Feira. Estou atrasada para a escola, mas definitivamente não ligo. Alguma coisa aconteceu comigo quando abri os olhos. Ainda não decidi se é algo bom ou ruim. É mais como um pressentimento. Um presságio ou coisa do tipo.

Fui acordada pelo meu celular tocando “Pumped Up Kids” ao máximo. Era Aaron, avisando que iríamos realizar algum item da lista mais tarde. Confesso que acho essa música com uma letra tão triste para ser o toque de Aaron, mas sempre foi uma de suas músicas favoritas, ao menos, era antes de ele começar a escutar rap ou seja lá o que for toda aquela mistura de frases que ele escuta.

Conversamos por três minutos até que eu me desse conta de que havia perdido o horário de acordar e despedir-me com um rápido “Te vejo depois” antes de desligar e jogar-me na cama. Então um sentimento estranho surgiu. Essa coisa que ainda estou sentindo e não sei definir exatamente o que é. Mas estou com expectativa, expectativa de que alguma coisa aconteça.

As horas passam, agora são exatamente sete horas. Minha mãe pergunta se não irei a escola, naquele tom preocupado e ao mesmo tempo rígido. Não respondo, pois não sei a resposta e fico enrolando para me vestir. Ás sete e quinze eu troco de roupa e dou um pequeno sorriso em direção ao espelho. Sempre gostei de fazer isso, sorrir para mim mesma e tudo parecer ficar Ok depois disso.

É um caminho longo até a escola, pois perdi o ônibus e como pão com geléia enquanto ando. Quando atravesso os portões da Walter preciso esperar até o segundo horário para entrar na sala de aula. Enquanto isso revejo os itens da lista de Juliet que já cumpri. Aos poucos, acho que estou entendendo qual é a finalidade da lista. Parece uma maneira de me habituar á ausência dela. Mas como ela sabia que não iria mais fazer parte da minha vida? Fecho os olhos, tentando não pensar muito nisso e quando decido abri-los o segundo sinal toca e os alunos passam por mim para a troca de classe.

Minha aula agora é biologia e eu preciso andar três pavilhões para chegar até lá, passando pelos banheiros, sala de carpintaria e de teatro. Meus olhos se fixam na porta da sala de carpintaria e sem nem mesmo perceber meus pés estão guiando-me até lá. Não deveria haver ninguém aqui, pois a sala só funciona no contra turno, então fico um pouco surpresa por encontrar Maxwell limpando o que suponho ser sua mesa e colocando algumas ferramentas desconhecidas sobre ela.

Estou quase saindo da sala quando ele se vira e me vê parada aqui. Se fosse em outra ocasião, eu teria sorrido, cumprimentado-o  ou perguntado se ele havia visto Anne e sairia andando logo em seguida. Mas eu não faço isso, não tenho coragem, não depois da cena que fiz no sábado a noite. Então eu continuo ali, com a mão sobre a fechadura da porta e sem saber exatamente o que fazer.

— Olá, Vivi.

Ele sorri aquele sorriso de “Além de popular eu sou o capitão do time de futebol” que só ele sabe dar e se encosta-se à mesa. Estou tão desconfortável que acabo nem mesmo cumprimentando de volta. Uma parte de mim diz que eu deveria dar meia volta e ir direto para a sala enquanto a outra me impulsiona a pedir desculpas. Mas eu sou tão orgulhosa que fico remoendo o fato de que ele também me deve desculpas pelo que disse.

— E aí Max. – O apelido soa tosco ao sair dos meus lábios, de maneira tal que Maxwell revira os olhos e cruza os braços. Seu queixo dá uma inclinada para frente, como se me pressionasse a continuar falando. – Não sabia que você fazia aula de marcenaria... Bem, quer dizer, na verdade, eu sei sim, Anne vive reclamando que você só fala em fazer mesas e cadeiras e... Ah, esquece. O que você está fazendo aqui?

— O que você está fazendo aqui?

Engulo em seco, resistindo à vontade de sair correndo.

— Eu não sei, eu... A porta estava aberta e eu acabei ficando curiosa e... – Fecho os olhos. Só entrei aqui para estar perto de Sky, pois sinto falta dela. Preciso contar á ela o que aconteceu no final de semana, preciso contar sobre os estranhos sentimentos que estou sentindo por Aaron. Preciso finalmente vê-la e mostrá-la quem eu sou, eu melhor dizendo, a versão marionete de mim mesma que tenta ser perfeita como Juliet. – Uma amiga faz também, achei que iria encontrá-la aqui.

— E você tem amigas além de Anne e Mayune?

— Anne e Mayune são minhas amigas? – Deixo escapar e quando Maxwell levanta as sobrancelhas surpreso vejo que não tem volta, mas eu tento consertar o meu erro mesmo assim. – Quero dizer, claro que elas são. E você também, você também é meu amigo.

— Sou?

Só consigo pensar no item 1° - Aprenda a perdoar quando digo:

— Sim, acho que sim.

Mas não, eu não perdoei Maxwell, apesar de dizer isso. Ele respira fundo e guarda todas as ferramentas dentro de uma caixa, pega seu boné dos Yankes e caminha em minha direção.

— Certo, amiga, acho que estamos atrasados para a aula. Biologia, certo?

Eu assinto, pois fazemos essa aula juntos. É estranho andar ao lado de Maxwell sozinha, pois todas as outras vezes Anne estava entre nós, tagarelando enquanto Maxwell se preocupava mais em estar trocando mensagens no celular ou cumprimentando as pessoas ao redor, sem dar tamanha atenção. Mas há uma grande diferença agora: Maxwell está me contando sobre a aula e sobre a sua vontade em continuar fazendo isso ao sair do ensino médio, apesar de pensar muito sobre as possíveis bolsas de estudo que irá ganhar por meio do esporte. Fala sobre o time feminino e o quão feliz estar com as nossas vitórias.

Quando entramos na sala recebemos a noticia de que o professor está doente e que a substituta ainda não chegou, então Maxwell e eu continuamos conversando. Isso mesmo, conversando, como duas pessoas normais. Como dois amigos. Sem que eu revire os olhos para ele toda vez que percebo que ele não dá á mínima para Anne. Sem que eu sinta um pouco de ódio dele por iludir Anne. Sem que uma parte de mim ainda queira continuar jogando bebidas em seu rosto pelas palavras grosseiras que trocamos no sábado a noite.

É então que percebo que Maxwell, apesar de tudo, é uma pessoa legal. Essa compreensão faz com que eu peça desculpas por chamá-lo otário.

Maxwell sorri e diz:

— Não, Vivi, eu sou um otário. Eu sou um bosta. Eu sou um fodido. Eu sou tudo o que você já pensou e pensa sobre mim. – Eu abro a boca para rebater, mas ele já está me contrariando novamente: - Sério. Ou acha que eu não percebo seus olhares de morte todas as vezes que não correspondo ás coisas que Anne me cobra? Ela merece algo melhor, eu sei que sim. E também sinto muito por tudo o que eu disse. É só que... Ás vezes você é toda cheia de si e em outras é meio que tão vaga e... Ah, deixa para lá.         

Antes que eu possa pedi-lo para continuar a substituta aparece e já nos manda abrir nossos livros. Maxwell senta á três cadeiras da minha esquerda, de maneira que eu só consiga ver o seu perfil, mas o faço mesmo assim, encaro-o tão diretamente que ele olha para mim e dá um sorrisinho sem graça. Faço o mesmo. Mas não quero sorrir, não estou sentindo a mínima vontade de fazer isso depois do que escutei.

É isso o que sou? Uma pessoa vaga, ou, melhor dizendo, vazia? É por isso que passo tanto tempo tentando ser Juliet, para que eu possa suprir essa minha necessidade de ter alguma coisa dentro de mim mesma? Sempre admirei Juliet por transbordar, será que não seria admiração, mas inveja, por saber que eu nunca seria capaz de fazer isso? Será que é por isso que Aaron é tão distante e frio, por saber que eu não passo de uma casca oca e vazia?

Essas questões ficam me atormentando por horas, até que eu decido jogá-las para o meu subconsciente, para que eu possa esquecê-las. Não. Só estou tentando ser Juliet para nunca esquecê-la, para ser uma pessoa melhor. Maxwell mesmo disse que ás vezes sou cheia de si, mas o que seria esse “si”? Quem sou eu, afinal de contas?

Preciso falar com Sky. Preciso contar á ela tudo o que estou sentindo e o que tenho pensado ultimamente. Mas as horas passam devagar, as trocas de horários fazem com que eu nunca nem mesmo chegue perto da sala do zelador e toda vez que entro em uma sala me pergunto se alguma das meninas que estão sentadas ali é Sky.

Em determinado momento, Anne e eu nos esbarramos. Ela fala sobre o próximo jogo dos meninos e repte três vezes que eu precisa tomar muito cuidado com sua perna machucada na hora de fazer piruetas. Sinto vontade de dizer á ela que ela é uma péssima amiga, que nunca me escuta, que só olha para o próprio umbigo. Mas então uma coisa estranha acontece. Aquela sensação estranha volta, e com ela surge o seguinte questionamento: “E que tipo de amiga eu sou?”

Estou me questionando sobre muitas coisas, talvez esse seja o tal pressentimento da coisa toda, e não sei se isso está me fazendo muito bem. Nunca gostei de questionar a mim mesma, pois, ao questionar-me, minhas indagações ficavam tão profundas que era preciso horas e horas contando e recontando números para que eu pudesse me recompor.

Mas, definitivamente, talvez eu não seja uma boa amiga, afinal. Quantas vezes eu não me escondi em meu próprio mundo esperando que as pessoas notassem que havia alguma coisa de errado comigo ao invés de simplesmente desabafar? Quantas vezes eu não fiquei dizendo a mim mesma o quão fútil Anne e Mayune eram por falarem tanto de garotos e hormônios sendo que talvez, só talvez, eu pudesse tentar participar da conversa, tentar entender que garotos e hormônios são comuns na vida de toda adolescente? Talvez, só talvez, eu devesse falar mais sobre o que estou sentindo.

Então eu digo á Anne. Eu a corto no meio do seu discurso de líder de torcida muito preocupada com sua coreografia para dizer que tem alguma coisa acontecendo comigo. Que tenho me sentido vazia. Que visto as roupas de Juliet para tentar ser como ela, que idolatrá-la faz com que eu me sinta muitíssimo bem e ao mesmo tempo terrivelmente péssima. Digo que estou tão tão tão cansada de ir para a escola todos os dias. Que sinto tanta tanta tanta saudade da minha irmã. Que eu não entendo a mim mesma. Que eu não sei quem eu sou.

Anne está com um olhar que não consigo decifrar exatamente o que significa. Ela balança a cabeça, por isso sei que está me ouvindo. Mas então ela começa a perguntar coisas, sobre quando comecei a sentir isso, desde quando sou assim, o que exatamente eu sinto, pois ela ainda não entendeu o fio da questão. Então eu digo que não sei o que eu sinto. E aí Anne ri, mas quando percebe meu olhar para automaticamente.

— Olha Vivi, isso é apenas uma fase. Vai passar. Você só precisa sair mais, só isso. Conhecer novas pessoas. Ter encontros, talvez? – Sinto vontade de vomitar. Meu estomago se contorce e se aperta e parece que vou morrer a qualquer instante. – Você só fica presa dentro de casa, é claro que isso não está lhe fazendo nada bem. É só uma “bad” rápida. Isso é normal, amiga. Mas todas as vezes que quiser falar qualquer coisa, eu estou aqui. Gosto dessa coisa toda de psicologia, sabe? Da mente e tudo, você será tipo meu primeiro teste para ver se consigo ser uma boa conselheira!  Mas tipo, me conta, você usa algum medicamento? Você tem surtos psicóticos? – Minha cabeça gira e gira e gira e todos os rostos que passam por mim se confundem e eu só escuto a voz de Anne ao fundo, distante, mas sei que ela está ao meu lado, fazendo perguntas absurdas e sacudindo os braços. – Ai meu Deus, Vivi, aquele incidente com a Amanda Monkey foi um surto? Um tipo de ataque? Você se consultou em um psiquiatra depois daquilo? Talvez seja muito sério, coisa de medicação e tudo. Vai que você tem esquizofrenia ou...

Eu estou chorando. Eu estou desmoronando e Anne não percebe pois continua a falar e falar e falar. Eu me afasto, a visão turva por conta das lágrimas e corro em direção ao banheiro. Fico em frente ao espelho, vendo a máscara de cílios que passei apressadamente antes de sair de casa manchar o meu rosto inteiro. Minhas mechas azuis estão tão desbotadas que se confundem com o loiro e me deixam com uma aparência ainda mais triste. Estou além de triste. Estou dentro de uma bolha que acredito não conseguir sair.

Existe uma coisa engraçada com confiança. Quero dizer, a gente sempre acha que conhece as pessoas, não é mesmo? Que temos plena noção de quem elas são, do que elas são capazes. Mas não é nada disso. Estamos em constante mudança, e as pessoas ao nosso redor parecem mudar de tal maneira que você não consegue acompanhar. Mas você continua com elas. Você continua a acreditar nelas. Á confiar nelas, apesar de tudo. E então uma coisa grave acontece na sua vida e você está tão atolado de coisas para falar que acaba despejando na primeira pessoa que vê, em uma pessoa que você ingenuinamente acredita que pode ser leal. E você quebra a cara, pois não é nada daquilo que você esperava.

Anne me chamou de teste. Ela me escutou e pareceu tão preocupada que eu cheguei a ficar aliviada por haver alguém além de Sky para conversar, mas então ela começou a me avaliar, examinar, como se eu fosse algum tipo de experimento. Por que diabos eu tomaria comprimidos se até quando fiz terapia após a separação dos meus pais não tive que ser sujeita á isso? Por que eu teria um surto, um ataque, se tudo o que fiz foi defender minha irmã de uma vadizinha qualquer que não sabe de nada? Como eu poderia ser esquizofrênica se não tenho nenhuma característica dessa doença?

Essas perguntas fazem com que eu chore ainda mais. O banheiro não está vazio, eu sei que tem alguém dentro de uma das cabines, que parece estar em um conflito se saí ou não. Por fim, eu para de chorar e fazer ruídos estranhos. Enquanto respiro fundo e tento consertar o estrago que ficou em meu rosto, a terceira porta da cabine abre. É Ramona. Ao perceber quem eu sou, seus olhos se arregalam um pouco e ela abre a boca, como se fosse dizer algo, mas acaba apenas me encarando. Espero que pergunte se estou bem. Espero que pergunte o que aconteceu. Ou, talvez, faça algum comentário grosseiro ou sarcástico. Mas, ao invés disso, ela se coloca ao meu lado e tira uma caixa de lenços umedecidos da bolsa e me entrega. Fico encarando-a, por que diabos ela teria isso na bolsa?

Diante da minha hesitação, Ramona puxa um dos lenços e passa sobre minha bochecha, muito concentrada em seu trabalho. Inspiro e expiro lentamente, tentando não chorar novamente por uma completa desconhecida estar me ajudando. Pela segunda vez, aliás. Ainda não lhe agradeci por ter ajudado Aaron a me levar para casa, mas Ramona não parece ser muito sociável. Quando ela termina de limpar o meu rosto, dá um sorriso mínimo e uma palmadinha em meu ombro. Então fica ali, parada, me encarando, as sobrancelhas arqueadas. Quase sorrio quando ela inclina o queixo para frente, da mesma maneira que Maxwell fez mais cedo, incentivando-me a falar.

— Odeio todo mundo nessa escola.

Ramona assente e caminha até a saída. Então, subitamente, se vira e sorri.

— Você não é a única.

Quando ela desaparece, tudo o que fica é sua caixa de lenços umedecidos em minhas mãos e uma sensação estranha de alivio. Essa foi, definitivamente, a primeira vez que falei alguma coisa com Ramona. Nunca disse um “Oi” nem nada, apenas gruídos no treino quando ela acertava a bola em cheio no meu rosto na tentativa de fazer um gol a distancia. Uma vez, no nosso primeiro jogo, ela gritou qual era o meu problema, e sua voz estava tão histérica que sempre tive a impressão de que era esse o tom dela. Mas, não, muito pelo contrário, a voz de Ramona é harmoniosa e suave. E tenho a estranha sensação de que a conheço muito bem.

Quando finalmente saio do banheiro e finjo para mim mesma que já estou estável e que superei tudo o que Anne disse vou para a última aula antes do almoço. É a única aula que tenho com Mayune e ela parece estar meio aérea. Nós damos uma rápida troca de olhares antes da aula começar. Mais mensagens de Aaron chega, avisando-me que vai me pegar depois do almoço e há tantos emojins que eu acabo nem respondendo. Então ele manda ainda mais emojins, dos mais variados tipo. Quando pergunto o que diabos ele quer dizer com isso, ele não responde por pelo menos cinco minutos antes de mandar um simples “Nada.” Mando o famoso “olhos revirando” e o dedo médio, ele apenas devolve a mesma mensagem.

É estranho trocar mensagens com Aaron. É estranho estar com Aaron. É estranho ter Aaron de volta na minha vida. Ou seja, tudo o que envolve Aaron, é estranho para mim. É difícil. É desconfortável. É intrigante. E ao mesmo tempo é tão bom, tão maravilhoso, tão diferente. Faz com que eu esqueça que Juliet está morta, faz com que eu esqueça de estar sempre na linha.

...

Refeitório. 11:45. Segunda-Feira. É aqui que percebo tudo. É nesse exato instante que um véu cai sobre meus olhos e eu me pergunto como eu estive cega por tanto tempo, como não pude perceber isso antes e fazer as conexões necessárias para chegar até aqui. Acabo de descobrir quem é Sky, e, de sobra, quem é o garoto que ela gosta e ainda não sei se essa situação toda é boa ou ruim.

Estou sentada onde estou habituada: Ao lado de Mayune, de frente para Anne e Maxwell. A diferença, desta vez, é que estamos de lados opostos a mesa. E, é por conta disso, que tudo se encaixa na minha cabeça.

A coisa toda começou quando Ramona passou pela porta do refeitório e sentou-se no lugar de sempre. Eu a estive observando durante todo o trajeto, com a intenção de acenar ou dar um sorriso de agradecimento pelo que fizestes por mim dentro do banheiro. No entanto, ela passou por nós sem olhar uma vez sequer na nossa direção. Exceto, no entanto, quando ao sentar-se, Maxwell disfarçadamente virou a cabeça e ficou olhando para ela.

Minha memória tentou lembrar o que normalmente ocorria quando Ramona entrava no refeitório. Por eu estar de costas à entrada, só notava a sua presença quando ela já estava sentada. Mas, Maxwell, por estar de frente a ela, sempre a via entrar. E, quando tento lembrar da sua expressão, diversos sorrisos, piscada de olho e pequenos acenos me vem a mente. Maxwell e Ramona trocam cumprimentos entre si. Ramona faz aula de marcenaria. Ramona usa roupas características suas e raramente é vista andando com alguém. Mas, acima de tudo, Ramona tem a voz mais suave que já vi além da de Sky.

Sky.

Sky gosta de um garoto que tem namorada e usa boné dos Yankes. Sky faz aula de mercenária. Sky não tem amigos. Sky. Sky. Sky.

Fico sem saber o que fazer. Fico desconcertada, chocada, estática, uma série de sensações. E, no fundo de tudo isso, sinto-me feliz e realizada. Feliz por Ramona ser Sky, pois Ramona é uma ótima pessoa e realizada por descobrir finalmente quem é minha melhor amiga fora daquela sala do zelador.

Espero até que ela saia do refeitório para segui-la. Não me despeço de ninguém, apenas vou calmamente atrás dela, tentando acompanhá-la sem assustá-la. Ela fica parada no estacionamento, com os fones de ouvido caídos pelo pescoço.

— Obrigada. – Digo ao ficar ao seu lado. Ela não se assusta, pelo contrário, é como se esperasse que eu fosse até ela. – Não só por hoje, por sábado também.

Seus ombros se encolhem e ela demonstra indiferença, como se isso não fosse nada demais.

— Seja uma ótima goleira no próximo jogo e estamos quites.

Eu sorrio, primeiro timidamente e depois de maneira descontrolada. Ela faz o mesmo, só que de maneira mais hesitante. Meu Deus, como não pude perceber que Ramona é Sky?

— Pode deixar. – Minhas mãos tremem um pouco. – Olha, se você quer manter sua paixão pelo Maxwell escondida, tem que parar de encará-lo tanto no refeitório. Por mais que a Anne fale tanto sobre si mesma, ela pode acabar percebendo e as coisas ficarem feias pra você.

Seu sorriso se desfaz. Ela me olha confusa e depois a surpresa fica estampada em seu rosto. Eu fico sem saber o que falar ou fazer, então apenas continuo encarando-a.

— Não sei do que está falando. – Seus olhos movem-se para qualquer coisa que não seja o meu rosto. – Quem é Maxwell?

Eu sorrio e delicadamente ponho a mão em seu ombro, queria tanto que ela confiasse em mim, em mim Vivi, igual ela confia em mim, Sea. Mas isso é difícil.

— Claro que sabe bobinha. Você mesma me contou. Na sala do zelador.

— Mas o que você... –  Ela se cala por um instante. Sua garganta treme um pouco enquanto ela engole em seco. – Sea?

— Oi Sky.

— Como você.... O que... Você sempre soube?

Então explico a ela que hoje acordei com a sensação de que algo assim poderia acontecer. E que, acima de tudo, já estava a muito tempo querendo encontrá-la, mas que, por uma simples analise de comportamento percebi. E, quando menos percebo, Ramona está falando sobre também ter me procurado. Nós nos encaramos, como se fossemos completas estranhas. Por fim, ela sorri e diz:

— Estou feliz por você ser você.

Isso me enche de uma alegria tão grande que não cabe dentro do peito. Eu a abraço e quando ela repete novamente isso, sinto vontade de chorar. Ela gosta de mim, de mim como Vivi da mesma forma que gosta de Sea.

Nós conversamos sobre tudo o que nosso tempo permite. Conversamos sobre nós. Sobre as coincidências que nos cercam e em como fomos bobas de não termos percebido nada antes. Estou tão feliz de Ramona ser Sky. Parecemos duas loucas paradas no estacionamento, mas há apenas nós duas aqui.

Uma vez, eu jurei que Sky havia sido a única coisa de real que havia acontecido durante meu dia. E isso não é mentira. Agora que sei que Sky é Ramona, percebo que ela é uma das únicas coisas reais que tenho de fato na minha vida.

Ela faz, assim como Aaron, que eu goste de mim mesma como Vivi. Mesmo que por poucos minutos.

E isso já é o suficiente.


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Notas finais do capítulo

espero não ter decepcionado vcs, mas eu sempre imaginei que elas descobririam dessa forma, desculpa aí quem queria que fosse algo mais glorioso
a questão é que momentos gloriosos ainda virão
bjjs



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