Está um dia chuvoso e nublado lá fora, consigo ouvir os primeiros pingos de chuva no telhado, olhando pela janela do quarto posso ver o céu cinza, o vento que começa a soprar faz os meus dentes rangerem, são só sinais de que o inverno chegou a Seoul, apesar de estar morado a dois anos aqui ainda me surpreendo com o frio intenso que o inverno trás. Um frio que é sentido não só no corpo, mas na alma, ao lembrar a dor do meu coração sinto uma lágrima escorrer pelo meu rosto, através da janela vejo os primeiros flocos de neve aparecerem, a primeira neve é sempre mágica, é como se ela trouxesse consigo uma magia.

  De repente sou tirada de meus pensamentos com um barulho na porta, olho para trás e vejo que é apenas Choi Hyo Hwa, minha colega de quarto que chega de alguma balada, pelo seu estado percebo que bebeu bastante, seu cabelo negro está todo bagunçado e vejo apenas um pé calçado, ela cambaleando consegue chegar na cama, com certeza se seus pais a vissem assim diria que a má influência sou eu, uma estrangeira do Ocidente que está tirando sua filha do bom caminho. Até tenho vontade de dar uma bronca nela, mas resolvo ficar na minha, afinal Hyo é a melhor aluna da turma de Finanças Coorporativas, estuda de dia e de noite a fim de agradar os seus pais, carrega nos ombros a responsabilidade de ser a única herdeira de uma família dona de uma multinacional e ainda ser mulher, se eu fosse ela talvez vivesse bêbada.

   Me recordo de quando cheguei aqui, uma estrangeira cheia de expectativas que sonhava em conhecer os oppas, comer comida oriental a vontade, fazer amigos e ficar rica, por que não, mas a vida não é tão simples, realmente a adaptação foi muito difícil, assim que cheguei no aeroporto fui levada para a Universidade e rapidamente foi explicado como seria o cronograma de aulas, aonde seria o alojamento e como funcionava os horários, inicialmente era apenas eu no meu quarto, com alguns dias depois Hyo chegou, lembro-me que seus pais ao descobrirem que eu era estrangeira tentaram muda-la de quarto, mas não haviam mais vagas, rapidamente ficamos amigas e assim somos até hoje.

­― Será que você pode fechar a janela, não quero congelar ―fala Hyo, é quando me dou conta que estou com muito frio, vou até a janela e a fecho.

―Desculpe senhorita, mas você sabe que horas são e que dia é hoje? Tenho certeza que seus pais chegam aqui em 20 minutos. ― Ao escutar isso Hyo pula da cama e corre para o banheiro para se arrumar, hoje é nosso dia de folga e podemos ir visitar nossos pais.

 ―Você pode vim se quiser – fala Hyo.

― Com certeza isso não vai acontecer, você sabe que eu passo esse dia aqui.

 ―Eliza já está mais do que na hora de você se abrir ao mundo, conhecer novas pessoas, sair um pouco desse campus, você ficar aqui trancada não vai fazer as coisas mudarem ou o tempo voltar atrás. Eu tenho certeza que o Jin não gostaria de te ver assim.

    Ao ouvir esse nome uma onda de emoções me invade e como tantas outras vezes começo a chorar, resolvo sair do quarto e dar uma volta no campus, não quero estragar o dia de Hyo com lembranças tristes, paro em frente a um bosque com muitas arvores, adentro dentro e resolvo me deitar na grama, fecho os meus olhos e um filme começa a passar na minha mente.

    São 24 de dezembro de 2013, tudo está pronto para o Natal, os alunos se preparam para irem para casa visitar suas famílias, todo o campus está decorado, nas rádios tocam músicas natalinas, tudo está com um espirito festivo e eu como sempre é nessas datas desde que cheguei aqui resolvi ficar por aqui mesmo, aliás não tenho opção, pois Hyo vai para a casa dos pais, apesar de ter insistido que eu fosse com ela, eu preferi não criar problemas. Quando vejo que tudo está mais calmo, resolvo dar uma volta lá fora, saiu com meu casaco pois está muito frio, coloco meus fones e começo a caminhar, é meu primeiro inverno aqui, acho tudo muito lindo, muitos diriam que tudo se torna mais frio e quieto, mas sempre gostei desse silêncio, de repente meu silencio é quebrado, sinto algo me derrubando no chão e caindo por cima de mim, tudo acontece muito rápido, quando abro meus olhos escuto alguém falando algo.

―Você está bem? Me perdoe, a bicicleta ficou sem freio não consegui desviar.  ― Eu ainda sentada no chão olho para cima e vejo um rapaz alto, de cabelos pretos e olhos bem puxados, um pouco magro e de pele clara, mas não tão clara, vejo que ele está com sua mão estendida para mim, e eu estendo a minha a fim de me levantar do chão.

 ―Você está bem mesmo? Está machucada em algum lugar? Sinto muito, me perdoe.

 ― Está tudo bem. ― Coloco minha mão no rosto e vejo que tenho um corte na testa, acredito que ele viu de imediato também, pois me colocou na garupa da sua bicicleta e saiu pedalando em direção a enfermaria – devo dizer que fiquei preocupada já que ele falou anteriormente que a bicicleta estava sem freio, porém nada mais de anormal aconteceu.

              ―O que está fazendo? ― Pergunto a ele.

―Você precisa fazer um curativo nesse seu machucado.

―Não é nada demais, eu estou bem.

―Chegamos, vamos ver se tem alguém ainda por aqui. ― Por sorte realmente a enfermeira ainda não havia ido embora e fez o curativo em minha testa.

 ―Vocês jovens deveriam ser mais cuidadosos, por isso a taxa de mortalidade nessa idade é alta ― diz ela.

― A culpa foi minha, tinha uma ladeira e o freio da bicicleta não funcionou, me desculpe.

― Já terminei meu serviço, ela está bem, e agora me deixe ir para minha casa, que preciso chegar antes que a ceia esteja terminada. ― E assim saiu a enfermeira do consultório e nos deixou lá. Me levantei da maca e comecei a caminhar em direção a saída, percebi que ele vinha logo atrás e começamos a caminhar juntos pelo campus.

 ― Muito obrigada pela ajuda ― começo a falar.

  ―Eu é que tenho que pedir desculpas pelo que aconteceu, normalmente sou assim desastrado.

   ― Está tudo bem, acho que meu dia estava muito monótono, ser atingida por uma baike trouxe alguma emoção.

 ― Esqueci de me apresentar, me chamo Kim Hae Jin.

― Sou Eliza. ― Percebi que o meu nome o trouxe um pouco de confusão, pois ele ficou pensativo.

― Sou estrangeira, estou aqui por que consegui uma bolsa de estudos em Finanças Coorporativas.

 ― Claro que interessante por isso você está em pleno natal aqui sozinha eu presumo.

― Vamos dizer que sim, mas não consigo achar explicação para você estar aqui hoje, pela sua aparência você parece ser um coreano.

― Você está certa, é tão óbvio assim que eu seja um? Achei que poderia ir ao exterior e ninguém descobriria. ― Nesse momento dei uma batidinha de leve no seu ombro, e me arrependi em seguida, aqui na Coréia existe o que chamamos de hierarquia, dependendo da idade e da intimidade que você tem com outra pessoa, você não pode sair por aí batendo nos outros.

― Me desculpe. ― Falo para ele.

― Não precisa ter essa formalidade comigo, afinal de contas lhe atropelei. ― Me senti um pouco mais relaxada após isso, eu normalmente vivia com medo de falar com outras pessoas, e não ser a forma correta passei um mês para aprender como deveria me referir a cada pessoa, se ela fosse mais nova ou mais velha, se era de status maior ou menor, se era homem ou mulher, isso é bem estressante.

― Meus pais estão fora do país, já faz um tempo que não os vejo, já estou acostumado a ficar só nessas datas, é um pouco complicado falar sobre isso. ― Fala ele.

― Oh entendo, fico feliz ao menos não estou só aqui. ― Depois desse dia passamos a nos ver todos os dias, íamos ao bosque e ficávamos lendo livros ou ouvindo músicas, falando sobre os filmes e doramas, depois da Hyo ele era a única pessoa em que me sentia à vontade em conversar, falávamos sobre tudo, e devo dizer que foi o melhor inverno da minha vida.

Sou trazida a realidade com um barulho de gritos, abro os meus olhos e estou aqui deitada na grama verde, olho ao redor e percebo que existe uma grande agitação de pessoas, me levanto e vou conferir o que está acontecendo, quando vou me aproximando do prédio principal noto que há várias pessoas ao redor e câmeras de filmagem, ai lembro que tinha ouvido falar que seria gravado cenas de um dorama na Universidade, um integrante de um grupo de kpop estaria no elenco, então entendi o motivo de toda aquela agitação, eu não era muito ligada nessas coisas mas me aproximei para ver de mais perto quem seria, afinal de contas minhas amigas brasileiras iam morrer se soubessem que vi um k-idol de perto.

 Ao olhar vi que era um rapaz de cabelos castanhos claros, sua pele muito pálida e sua expressão séria, percebi que estava tentando ensaiar seu texto, mas com toda aquela agitação parecia um pouco incomodado, ao olhar pra ele percebi algo familiar, sua expressão era pensativa e calma, não sei por que me trouxe uma paz, olhei ao redor e algumas pessoas gritavam seu nome, logo percebi que se chamava Suho, já tinha ouvido esse nome em algum lugar, foi então que veio um estalo a minha mente, claro como n percebi antes, ele era um dos integrantes do EXO um boy grupo bem popular, de imediato peguei meu celular para tirar uma foto, não poderia sair dali sem nenhum registro, quando pego o celular vejo que está descarregado e xingo a mim mesma, ninguém nunca iria acreditar que o vi de perto agora.