A Ruína da Magia - Crescent Valley escrita por Leo


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo


Bom, se você está chegando por aqui agora, não deve nem imaginar, mas esta obra foi postada neste site há mais de um ano e meio sob o nome de "Crescent Valley".

Mas eu precisei de um tempo para averiguar o que eu queria fazer com essa história. Um dia, percebi duas coisas: a primeira, que o propósito da história não estava me satisfazendo. Na verdade, ela não tinha um propósito plenamente decidido. Ela era simplesmente "por diversão" e, de repente, isso já não era mais suficiente para mim. Eu queria contar alguma coisa relevante. Eu queria fazer uma diferença na vida daqueles que estavam lendo.

A segunda coisa que percebi foi que, se realmente eu fosse considerar uma publicação a sério, o livro precisava de sérias reformas. Sendo assim, eu o deletei porque precisava ter certeza de que gostaria de continuar com a história. E, por todo esse tempo, a minha decisão definitiva foi que não.

Entretanto, algo mudou nos últimos tempos, e eu comecei a reparar o potencial que a história continha, inclusive em poder ser um canal de divulgação das minhas visões de mundo e daquilo que eu acredito. Ela poderia ser reformulada para conter não só algo divertido, mas também um propósito. Não só momentos interessantes que prendessem quem lesse, mas uma mensagem forte por trás sobre os valores que acredito que o mundo mais precisa hoje. Valores como honestidade, amor, lealdade e, acima de tudo, redenção. Então creio que este projeto acabou se tornando um livro espiritual também. E, pelo menos para mim, foi a melhor escolha que eu já poderia ter tomado. É o que me define hoje.

Satisfeito com o rumo que a história pode tomar agora, realmente ciente de que ela tem algo a dizer, eu quero comunicar que "O Espectro da Morte" vai continuar, sob o novo nome de "A Ruína da Magia". Sei que alguns esperaram muito tempo para que esta notícia um dia fosse anunciada, e olhem, este dia realmente aconteceu! Se você nunca ouviu falar da história, seja bem-vindo! Se já é um leitor antigo (um "Kanal" rs), seja bem-vindo de volta!

Mas preciso também explicar como esse retorno vai funcionar.

Por causa do meu horário com a faculdade, que é bastante apertado, eu vou precisar reescrever o que é necessário extremamente devagar. O que significa que os capítulos provavelmente serão postados bem aos poucos.

Mas eu decidi deixar vocês com algo sobre a história de uma vez, porque sei o quanto aqueles que já a conheciam gostavam dela e queriam que ela continuasse. Pois bem, espero que eu possa surpreender vocês com o que esta versão 2.0 reserva. E espero que façam a escolha de me acompanhar novamente. Desta vez, a ideia é encerrar toda a saga. E você começa agora, junto comigo, uma jornada à vila de Crescent Valley. Aperte os cintos!



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                O silêncio da noite envolveu em um abraço gélido os moradores da pequena Crescent Valley. Um a um, os humildes casebres fecharam suas janelas, isolando-se do vento cortante que sussurrava pelas frestas da madeira envelhecida. Quando o relógio da igreja monumental erguida no centro da vila decretou meia-noite através do lamurioso sino centenário, todo o vilarejo já havia adormecido. Exceto por uma casinha rústica de dois andares no limite do povoado, onde uma estranha luz azul brilhava, intermitente.  

                O foco da estranha luminosidade era um pequeno menino, estendido no chão frio. Não podia ter mais de doze anos, encolhido em um casaco três vezes maior que o seu tamanho. Ele abria e fechava as mãozinhas, entoando uma única frase, que mais parecia uma canção estrangeira.

Helligkeit... Helligkeit... Helligkeit... 

                Ao som de sua voz, o estranho brilho aparecia, como se emanasse dele mesmo. As faíscas cianóticas projetavam sombras nas paredes; amigos imaginários na percepção do garotinho.  Apenas os seus sussurros ecoavam no breu da noite, empolgados com a façanha que realizava.  

                De repente, a porta frágil do quarto escuro se abriu e braços fortes o agarraram pela cintura.  

                O garoto esperneou, chutando o adversário com vigor, mas a pessoa que o segurava era bem mais forte. Pensou em gritar por seus pais e estava mesmo prestes a fazê-lo quando o invasor cochichou em seu ouvido:

— Sossegue, Ronan!  

                A criança parou de se debater, reconhecendo aquele que o apertava contra a parede. Era apenas seu irmão mais velho, Kyle, tentando assustá-lo como sempre. Naquela noite, no entanto, nem mesmo as brincadeiras de mau gosto de Kyle podiam diminuir sua empolgação.   Ele tinha conseguido. Finalmente tinha conseguido!

— Kyle — abriu o sorriso mais largo que conseguiu — Eu acabei de fazer o meu primeiro! 

                Kyle protestou com a cabeça. 

— Não temos tempo. — ele pegou a mão do garoto — Precisamos sair daqui imediatamente.               Ronan foi puxado para os corredores, sentindo o aperto suado do irmão o levar com facilidade.

— O que foi? — reclamou, tentando se soltar — Cadê o pai e a mãe? 

                Um estouro ensurdecedor agitou o primeiro andar; as janelas se quebraram, passos fortes penetraram a casa e um grito esganiçado de dor se fez ouvir na cozinha logo abaixo deles.

— Mãe! — Ronan exclamou.

                Kyle tapou sua boca, puxando-o com força pelo corredor. O irmãozinho choramingava com a boca coberta, lutando para encerrar a corrida. 

                Os dois pararam próximos à janela no final do corredor; Kyle se ajoelhou ao seu lado.

— Ronan, eles nos descobriram. Sabem o que nós somos.  

                O garoto empalideceu. 

— Nós precisamos fugir.  

                Ele agarrou o irmão, colocando-o para fora da janela. 

— É muito alto! 

— Confie em mim. 

                Kyle o largou.  

                Por dois segundos, Ronan foi um saco de batatas mergulhando a quatro metros de altura direto para o chão até sentir como se duas mãos invisíveis, frias feito o vento noturno, freassem a velocidade da sua queda. Ele aterrissou de pé, são e salvo, nos fundos da casa.  

                As galinhas do quintal fugiram assustadas, cedendo passagem ao menino tão amedrontado quanto elas.  

                Ele olhou para o alto, onde Kyle se preparava para pular.  

                Então alguém surgiu atrás de seu irmão, agarrando-o brutalmente na altura do peito.  — Ronan, corra! Corra! 

                O filho mais novo da família de camponeses obedeceu, chorando copiosamente enquanto os gritos de Kyle torturavam seus ouvidos. 

— Peguem o garoto! Lá embaixo! — vozes comandaram, e um tropel de pernas começou a se aproximar rapidamente do fugitivo. 

                Ronan ofegava. Sua fuga o levou o mais distante que já tinha ido do vilarejo. Seguia pelas margens do enorme lago que demarcava o vale, tão próximo que podia ver o seu reflexo acompanhando a corrida desenfreada. Percorreu toda a distância do espelho d’água até a orla ser subitamente bloqueada por um conjunto denso de árvores que cresciam muito juntas.   Mesmo se não tivesse visto as centenas de avisos comunicando sobre a proibição de entrada na clareira do bosque, ele saberia que não devia prosseguir. Aquela era a regra mais antiga do vilarejo, conhecida por moradores de todas as idades. 

                Mas Ronan não tinha opção àquela noite. Ou entrava na mata proibida, ou se deixava levar por aqueles que haviam acabado de subjugar sua família. Ele atravessou por baixo da cerca de arame, que alcançava a copa de algumas das árvores. O casaco de seu pai acabou preso na cerca, e o garoto se viu obrigado a deixá-lo para trás.  

                Àquela altura, o pânico já tinha lhe subido à cabeça. Não sabia o que devia temer mais: seus perseguidores ou a brenha que tinha acabado de cruzar. 

                Assim que pisou na clareira do bosque, o som da natureza silenciou por completo. Os grilos pararam de cantar, o farfalhar das folhas das árvores sendo arrastados pelo vento desapareceu e até mesmo o brado dos caçadores se extinguiu. O único barulho eram seus arquejos pesados. Caminhou por entre os troncos grossos, buscando o outro lado da cerca. Se conseguisse atingir a extremidade oposta ao povoado, poderia fugir para algum lugar diferente; pedir ajuda. Ele nunca havia deixado o Vale antes, mas certamente devia ter alguma coisa além daquelas montanhas nebulosas que via ao longe.  

                Ele estava confiante de que conseguiria. Ainda tinha chances de resgatar sua família e fazer tudo ficar bem outra vez. Seus pais tinham lhe contado histórias. Não eram os únicos que se escondiam. Existiam outros como eles lá fora, apenas esperando para serem encontrados.    Algo roçou sobre seus pés, e ele gritou antes que pudesse se conter. Sem nem ver o que era, começou a correr de novo em linha reta, desviando dos galhos que serviam como obstáculos. Não tardou para que tropeçasse em um emaranhado de objetos cinzentos, que se quebraram sob seu peso. Caído sobre as estranhas formas porosas, um cheiro desagradável fez suas narinas arderem, oriundo do pó grudento que se prendera na roupa que usava.  

                Ele se limpou o melhor que pôde, segurando-se nos galhos para se levantar. Olhou com mais atenção para o que tinha-no derrubado. E, ali, bem aos seus  pés, o que restava de uma caveira sinistra jazia parcialmente coberta pela terra úmida. A consistência opaca contrastando com a escuridão da noite. 

                Ronan quis chorar outra vez, mas então gemidos diferentes dos seus surgiram do meio da floresta.  

Tanto tempo... 

                Seu coração palpitava a mil por hora, sensível contra o peito magro. 

Finalmente. 

                Como em um pesadelo, uma aura luminosa clareou o entorno do cadáver, quase cegando o menino que tentava se esconder. O brilho vermelho se transformava em pleno ar, tornando-se cada vez menor. Ronan pensou que talvez desaparecesse e o deixasse em paz, porém, sem aviso, a projeção deixou de encolher.  O espectro não era formado por nada além de olhos. Dois rubis flamejantes, muito redondos, flutuando sobre o esqueleto destruído. Por algum tempo, não fizeram absolutamente nada além de encará-lo fixamente. Quando as palavras foram pronunciadas, pareciam ecoar na cabeça do menino. 

Venha aqui...

— N-não... Por favor... — Ronan murmurou para o olhar vermelho.

Não tenha medo... Estive esperando por muito tempo que alguém como você aparecesse.

— Alguém... como eu? — Ronan repetiu, trêmulo.

Sim. Eu sei o que você é... O que sua família é. 

                O garoto prendeu o fôlego. Seria possível que aquela fosse a ajuda que gostaria de encontrar? Que já a tivesse alcançado tão rápido?

— Você pode nos ajudar? — perguntou timidamente — Estão me perseguindo. 

Claro que posso... Mas primeiro você precisa fazer um favor para mim.

— Qualquer coisa! Só... por favor... ajude a minha família.

                Os olhos brilharam com mais força, avivando o rosto de Ronan no escuro.

Aproxime-se, criança...  

                Ele assim o fez, cheio de desconfiança. 

Mais um pouco...  

                Ronan deu outro passo hesitante, chegando assustadoramente perto do crânio que o fazia querer fugir.

Agora olhe para mim. — disse-lhe a assombração. 

                Ele encarou aqueles olhos vermelhos sobrenaturais, vendo a si mesmo refletido nas retinas medonhas.   

                O esqueleto aos seus pés começou a rachar sozinho, reduzindo-se às cinzas.

Continue olhando para mim. 

                A poeira fez seus olhos arderem, e o cheiro fétido lhe causou náuseas novamente. Até que os olhos piscaram, e isso fez com que sumissem de vez.   

                Ronan se virou, mas não identificou nada. Não havia mais nenhum sinal da aberração. — Olá...?   

                Do chão brotaram mãos, que seguraram os tornozelos do menino, lutando para se pôr de pé. Ronan gritou enquanto seus joelhos cediam e a repentina criatura se levantava. 

                Uma vez erguido da ossada rançosa, que misteriosamente sumira, o ser espalmou as roupas sujas de poeira, encarando a pequena vítima em estado de choque.

— Não esperava por essa, não é? — murmurou. Desta vez com lábios de verdade, que realmente se moviam. Lábios familiares. Os lábios de Ronan.

— Obrigado por me ajudar... Ou deveria agradecer a mim mesmo? 

                A voz gélida tinha o seu timbre. O clone riu com prazer, e a gargalhada reverberou por toda a floresta, fazendo o chão ao redor de Ronan sacudir. Ele soltou um grito de terror e abandonou sua cópia sinistra, lançando-se floresta adentro. 

                O som da própria risada o perseguia. Maligna e mortal. E, então, com um sobressalto de pânico, o inocente garoto soube que tinha acabado de destruir para sempre não só as esperanças de sua família, como também a sobrevivência de qualquer um como ela.


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