Redemption escrita por Marimachan, Ginko13, Fujisaki D Nina


Capítulo 12
XII - Tense Meetings


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura! ;)



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Sentada na sala de estar, com os joelhos dobrados, costas eretas, cabeça levemente abaixada e mãos delicadamente juntas no colo, Dango parecia uma figura de paz e serenidade para quem olhasse de longe.

Tipo, beeeem de longe.

Longe o bastante para não notar os ombros tensos, os olhos arregalados, os lábios que quase sangravam de tanto que ela os mordia ou então o suor frio que não parava de lhe escorrer pelo rosto.

Como, perguntava-se, aquele passou de um dia normal para o primeiro encontro com o homem a quem devia sua existência nesse mundo? Até hoje mais cedo, antes do café, quando Otae, Kagura, Shinpachi e Shouyou lhe explicaram e comunicaram sobre a vinda de Gintoki, ela era apenas a órfã cuja mãe abandonou, o pai não sabia da existência e que era criada por seu professor que sempre fora. Como diabos agora ela estava prestes a se encontrar não apenas com seu pai biológico, mas também com a esposa e os quatro filhos desse?!

Ela estava apavorada, e os auto-questionamentos não ajudavam: Por que ele queria conhecê-la? Ao que parecia, ele já tinha uma família muito boa sem ela, conhecê-la ou não, não faria diferença na vida dele.

Como será que ele era? Seria do jeitinho que todos lhe falavam?

Como a trataria?

O que pensaria dela?

Ela deveria ter penteado melhor o cabelo, ARGH!

O leve toque em seu ombro foi tão repentino que a fez pular no lugar, mas tanto o susto quanto parte de seu nervosismo desapareceram quando ela viu que era Shouyou ali; o sorriso e a mão nas costas servindo-lhe bem como um suporte para aquilo tudo.

― Eles chegaram. ― Com o aviso do professor, ela engoliu em seco. ― Vamos?

Dango apenas assentiu, não confiando em sua voz para falar algo sem gaguejar, antes de levantar-se e seguir com o sensei para a entrada da casa, onde Shinpachi, Otae, Kondou, Kagura, Souichiro e mesmo Hijikata e Sougo já estavam; todos fitando a família de dois adultos, três crianças e um bebê que parava a meio caminho entre o portão e a casa, acompanhados de Rose.

― Sejam bem-vindos ao dojo dos Shimura ― Shinpachi e Otae cumprimentaram, fazendo uma leve reverência, gesto que foi imitado pelos outros e depois pela família.

Gintoki passou os olhos rapidamente pelos antigos conhecidos, parando-os apenas ao se deparar com Shouyou, fitando seu antigo sensei. Esse, por sua vez, sorriu ao ponto de fechar os olhos, dando um passo para o lado e fazendo Gintoki enfim notar a figura baixa de cabelos brancos, que estava meio escondida atrás do homem até então.

Ele pretendia observar atentamente a menina aparentemente acanhada naquele momento, mas não teve essa chance, pois sem qualquer aviso uma figura gigante e peluda surgiu bloqueando sua visão. Ele não teve tempo de se preparar para o que sabia que estava por vir, e quando percebeu, já encontrava-se dentro de uma boca gigante e dentuda. Pelo que parecia, Sadaharu estava bem, e não havia perdido aquela mania.

Gintoki ouviu Mayah gritá-lo, bem como Rose e Sayuri, num tom que parecia misturar desespero e admiração. Pelo o que ele conhecia de seus filhos, provavelmente Satoshi e Mayume, ao contrário dos outros, estariam muito mais aparvalhados pelo tamanho do cachorro do que pelo fato dele parecer estar sendo devorado.

Pressentindo que o pavor das mulheres e de sua filha mais velha pudessem tomar proporções maiores, ele finalmente afastou a cabeçorra do cão, passando a tentar tirar a baba que escorria por seus cabelos. Pegando um lenço no bolso interno do kimono, tentou enxugar o restante de saliva canina, enquanto via o filho mais velho e a mais nova com os olhos brilhando, permitindo-o prever o que viria em seguida.

― Tão grande~ ― a pequenina finalmente expôs sua admiração, já começando a correr atrás do cão que rodeava Gintoki pulando e balançando o rabo.

― Caramba, o que vocês dão pra esse cachorro?! ― Satoshi dirigiu-se aos habitantes locais, os quais observavam a cena (alguns com pequenos sorrisinhos discretos).

― Provavelmente os 5 Kg de ração diários que eu era obrigado a comprar ― o prateado comentou meio resmungando, mas não demorou a fazer as duas criaturas pararem de correr que nem peões. ― Hai, hai. Já chega ― pediu calmamente, embora claramente fosse uma ordem. ― Parece que você não mudou muita coisa, não é?. ― Levantou as mãos para acariciar a cabeça peluda, fazendo-a inclinar-se e contorce-se um tanto quanto dengosa (e essa fora a deixa para Mayume agarrar-se na pata canina, esfregando-se no pelo macio).

― Tão fofo~

― Sinto muito por ele tê-las assustado ― Shouyou pediu, assim que o grupo de pessoas mais o cão se aproximaram da varanda aonde todos aguardavam (Mayume rindo-se, completamente agarrada a pata e assim sendo carregada pelo animal). ― Acho que Sadaharu-kun não conseguiu se conter ao rever Gintoki. ― Sorriu novamente.

― Sadaharu ― Kagura chamou. ― Entra.

E então, após Gintoki arrancar a pequena fada dele, o inugami obedeceu, indo deitar-se num canto da sala de estar, não deixando de ficar atento à seu antigo dono, contudo. Somente depois do samurai conseguir convencer a filha a dar atenção ao animal apenas mais tarde foi que ele finalmente passou a observar mais atentamente o motivo pelo qual estava ali.

Aquela era realmente a garotinha que esbarrara com ele noite passada.

Aquela era sua filha.

Dango chegou a sentir o olhar de Gintoki (e de mais alguns) sobre si, mas antes que conseguisse fita-lo também, todos começaram a entrar na casa e não teve mais coragem de erguer o olhar até que estivessem todos na sala.

Quando o fez, deu de cara com as três crianças que, até então, sequer havia reparado direito. O único garoto tinha a atenção dos olhos âmbar voltados para ela e uma sobrancelha arqueou-se quando ele notou seu olhar; os olhos da garota com cabelo chocolate viajavam por toda a casa, sem um ponto certo, mas quando passavam por ela, Dango sentia que o faziam correndo; e a pequenininha tinha os olhos castanhos-claros refletindo toda a empolgação que seu rostinho já mostrava.

Percorreu os três mais uma vez antes de, hesitante, girar o olhar para outro dos visitantes: a bela mulher que carregava o bebê em seu colo. O singelo, porém doce sorriso que ela lhe oferecia, deixou Dango ao mesmo tempo envergonhada e desconsertada. Como aquela mulher conseguia sorrir assim para a filha de seu marido fora do casamento?

Sem vontade de mais uma dúvida para lidar agora, Dango moveu o olhar mais uma vez, mas quase se arrependeu disso no mesmo instante, ao encontrar-se com os olhos vermelhos de Gintoki. O mais velho analisava-a dos pés à cabeça, parecendo tentar lê-la como a um livro.

Por mais que estivesse, Dango não deixou o medo domina-la e sustentou o olhar do mais velho. Se fossem defeitos que ele estava procurando, covardia não seria um que ele iria achar. Por um longo segundo eles ficaram assim, até que algo entrou parcialmente em sua frente, cortando seu contato com o albino.

— Então. — Era Souichiro que agora encarava Gintoki de cima à baixo, com os braços cruzados e uma sombra arisca que raramente se via em seus olhos. — É você que é o cara, heim?

Gintoki não fez mais do que arquear uma sobrancelha para aquele garoto que, de todos naquela sala, era a única pessoa que ele não conhecia e que não fazia ideia de porque o encarava daquele modo.

— E você quem é?

— Okita Souichiro — declarou estufando o peito.

O permanentado, porém, ignorou completamente sua pose, girando a cabeça na direção de Sougo.

— Quem é a desventurada que teve um filho com você?

Cada um dos moradores de Edo teve uma reação, alguns ficaram preocupados pela reação de Gintoki quando soubesse, outros quiseram rir por esse mesmo fato e uns poucos ficaram bravos por causa do comentário do espadachim, mas ninguém falou nada. Exceto por Sougo, que com um sorriso sacana, apenas comentou:

— Você não vai querer saber, Danna.

— Oe, oe — Souichiro exclamou para chamar a atenção de Gintoki. — Podemos voltar ao assunto? Fala logo. — Esticou o pescoço na direção do mais velho, estreitando os olhos azuis. — O que você veio fazer aqui?

— Souichiro! — O tom forte e bravo de Kagura fez o garoto pular, perdendo toda a sua pose e virando-se meio encolhido para o olhar severo da mãe. — Já chega. Senta e fecha a boca

— Mas mãe...

— Senta logo. — Souichiro pôde perceber a ameaça na voz da mãe e isso acabou sendo o suficiente para decidir obedecer.

Mas não lhe impediu de lançar um último olhar a Gintoki e de manter uma encarada severa sobre ele enquanto voltava para junto de Dango.

Todavia, igual à última vez, o garoto não era o foco da atenção de Gintoki, embora ele olhasse de Souichiro para Kagura, sem parar. Mas isso se devia ao fato das palavras do menino não pararem de se repetir em sua mente.

“Mas mãe”.

Aquele garoto de dez anos chamara Kagura de mãe.

O filho de Okita Sougo chamara Kagura de mãe!

— Você teve um filho com dezessete anos? – O questionamento de Gintoki nem de longe foi escandaloso como ele se sentia de verdade, mas não ia abandonar os dez anos de autocontrole que perdia apenas com sua esposa em menos de dez minutos com aquele pessoal.

Por isso mesmo não se atreveu a olhar para Sougo — se aquele sádico pervertido entrasse em sua mira agora, Gintoki não responderia por si. Porém, a falta de uma resposta barulhenta de sua parte surpreendeu aos moradores de Kabukichou. Eles haviam presenciado o quanto Gintoki estava diferente de como eles conheciam na noite anterior, mas para não dar um ataque nem sabendo que a que um dia fora sua filha de criação se tornou mãe em tão jovem idade, era mudança demais na opinião deles.

Mesmo surpresa como os outros, a expressão de Kagura logo se fechou, pois não importava como falado, era nítido que ele havia repreendido sua atitude. E se o samurai achava que ainda tinha algum direito de fazê-lo, ele estava muito enganado.

— E você o que tem a ver com isso? Você sumiu da minha vida por vontade própria, — Apontou um dedo na direção do filho. — bem antes de ele entrar.

Não era a intenção, mas Kagura acabou soltando um pouco da mágoa que ainda sentia naquela frase. Uma mágoa que Shinpachi e mesmo Otae não puderam deixar de compartilhar. O clima começava a pesar, todos podiam sentir, mas o silêncio só foi quebrado quando Shouyou notou Souichiro mirando Dango antes de voltar-se para Gintoki. O Okita era capaz de tudo para proteger sua amiga, disso ele sabia bem, mas também sabia que o comentário que viria quando ele abriu a boca não melhoraria a situação. E, percebendo que Gintoki também tinha uma resposta na ponta da língua para ser dada, e que, dada a expressão dele, essa também não ajudaria a melhorar as coisas, ele preferiu interromper antes.

 — Hai, hai. — A voz suave do professor ecoou, começando a cortar o clima tão tenso que se instaurou. — Acho que essa conversa pode ser deixada para depois ― afirmou tranquilamente, direcionando seu olhar de Gintoki para Kagura e vice-versa, embora deixasse implícito que não deixaria espaço para contrariá-lo.

Ambos assentiram de leve, relaxando suas posturas, e Souichiro pareceu sentir que o professor se referia a ele também, pois fechou a boca. Vendo todos mais calmos, Shouyou sorriu fechando os olhos, para reabri-los em direção à sua discípula.

— Dango — chamou, fazendo a albina mira-lo. — Por que não se apresenta?

O pedido a deixou nervosa, era perceptível em seu cenho franzido, mas mesmo assim ela assentiu, engatinhando de joelhos até ficar de frente para a família Sakata. Os seis pares de olhos sobre ela não impedindo-a de falar.

— Muito prazer. Eu sou Sa- — Interrompeu-se, engolindo em seco. Pelo jeito, tinha algo que estava nervosa demais para dizer: seu sobrenome. — Eu sou Dango.

Sorrindo docemente, Mayah foi a primeira a se ajoelhar e aproximar-se da pequena, após entregar Soujirou à Rose. A morena curvou-se levemente antes de responder com a voz melódica.

— Olá, Dango. — Olhou-a ternamente. — Meu nome é Mayah — apresentou-se sem utilizar seu sobrenome de propósito, na tentativa de deixá-la mais a vontade. — E acho que você já sabe, — Levantou a mão para pegar na do marido, que com o gesto também ajoelhou-se. — Mas esse é Gintoki. E esses, — Em um gesto simples com a mão, pediu que as crianças e Rose se aproximassem. — São nossa governanta, Rose, e nossos filhos: Satoshi e Sayuri, Mayume e Soujirou. — Por último apontou para o pequeno no colo da senhora, para depois virar-se de volta para a albina. — Estamos muito felizes de te conhecer.

Dango não pôde evitar ficar surpresa e um tanto envergonhada pelas palavras da morena, mas outra coisa que não pôde conter foi o calor e a calma que se instauraram em seu peito, fazendo-a sorrir de leve com as bochechas rubras.

Vendo a cena, Gintoki suspirou internamente. Mais uma vez, agradecia a qual tenha sido a divindade que fizera de Mayah sua esposa; apenas ela para conseguir fazer uma criança ficar confortável naquela situação. Antes que ele ou mesmo Dango pudessem dizer algo, entretanto, a doce vozinha de Mayume soou.

— Ne, ne, Dango-nee-san! – a pequena voltara a sorrir cheia de empolgação para a albina maior. – Você tem mais irmãos? – junto com a animação, expectativa agora transbordava de seu olhar, vinda da ideia de ganhar não apenas uma, mas mais irmãos.

— Eh? – Dango levou uns segundos para processar a pergunta, precisando primeiro processar que a pequena falava com ela de fato. – N-não, sou só eu.

― Dango ― Gintoki finalmente se pronunciou antes que outra pessoa falasse no lugar dele mais uma vez, chamando a atenção da primogênita, que agora voltava a se encolher um pouco mais. ― Eu realmente sinto muito pelas coisas terem sido desse jeito. ― Olhou-a, tentando criar um contato direto com os olhos castanhos claros, e a menor não negou esse contato; continuou em silêncio, porém. ― Não vou dizer que sou tão vítima dessa situação quanto você, porque acredito que isso está longe de ser verdade ― continuou, escolhendo bem as palavras que usava. ― Mas eu realmente não sabia sobre você. Se eu soubesse, muito provavelmente as coisas seriam muito diferentes. E também não irei te pedir perdão por toda a ausência na sua vida até aqui, porque eu sentir muito por isso não irá mudar muita coisa. Mas quero te pedir que, por favor, me deixe mudar isso a partir de agora.

Ao fim da fala, Dango permaneceu quieta por mais alguns segundos, mas logo pronunciou-se, engolindo em seco antes de abrir a boca.

― Como? ― questionou ainda o encarando.

― Estando o mais presente possível na sua vida a partir de hoje ― Gintoki respondeu, tentando ser o menos impositivo possível. ― O que eu de fato quero é que você venha comigo para Aokigahara, para que eu possa ser pra você o pai que eu não fui até hoje. Mas o que eu quero não importa muito ― desdenhou a própria fala com um gesto rápido com a mão. ― Você é quem irá decidir isso ― concluiu.

― Mas nós queríamos te fazer uma proposta antes de você tomar sua decisão ― Mayah fora quem completara o marido, utilizando o mesmo tom que usara para conversar com ela antes. ― Nós queríamos convidar você, e quem mais quiser, ― Olhou para os outros presentes na sala. ― para ir conosco para Aokigahara. Então você passa o mês de férias lá em casa, conhece toda a família, que não é pequena ― acrescentou sorrindo levemente divertida. ―, e também nos conhece melhor. ― Apontou para si mesma, o marido e os filhos. ― E então poderá decidir o que for melhor pra você, no seu tempo.

― E mesmo que decida ficar aqui depois, não tem problema ― Gintoki deu continuidade. ― Ainda assim faremos o possível para estarmos o mais presente possível com você, e tudo o que precisar saberá aonde pedir e encontrar.

Dango ficou seriamente tentada a se beliscar ali mesmo. Não conseguia acreditar nas palavras que ouvira e mesmo os olhares sinceros do casal pareciam miragens ao seu ver. Até ontem não tinha pai, até dez minutos atrás estava simplesmente conhecendo-o, e agora... Estava sendo chamada para morar com ele e sua família?

Não, chamada não, convidada. Tanto Gintoki como Mayah haviam deixado claro que a decisão era sua. Mas ainda assim, era estranho demais para ela estar sendo convidada a outra residência por um homem que mal conhecia. Ela sequer conseguia atribuir o que Shouyou e os outros haviam lhe contado ao homem que tinha à sua frente.

— O-oe, espera aí! – A garota foi puxada de seus pensamentos quando uma exclamação ecoou ao seu lado. Souichiro, um tanto em pânico, levantara-se de supetão e agora encarava os visitantes. – Vocês estão falando sério? Querem que ela vá morar com vocês lá?? Tipo, lá longe no horizonte?!

— Souichiro! – E ele teria continuado seu questionário exagerado se Kagura não o interrompesse. Ela foi até o filho e pegando-o pela orelha, carregou-o até a porta. – Já chega. Eu te disse para ficar sentado, não disse? Agora vai ficar aí fora até acabarmos aqui!

— Mas...! – Não teve tempo de retrucar antes que a mãe fechasse a porta em sua cara.

Batendo as mãos como se limpasse a poeira delas, Kagura soltou o ar.

— Francamente... – Olhou de canto para Sougo. – Esse comportamento só pode ter vindo de você.

Sougo, como sempre, não deixara o comentário sem resposta, mas Gintoki sequer a ouvira, ou as de Kagura que se seguiram. Estava ocupado demais encarando a ruiva que não via há quase onze anos e que mudara ainda mais do que depois dos dois anos após a Guerra. A pirralha escandalosa e de boca suja com quem vivera agora agia como a própria Mayah quando se enfezava, colocando limites nos filhos.

Parece que não havia sido apenas ele que mudara tão drasticamente. Isso de certa forma o orgulhava, já que mesmo sendo o tutor imprestável que era naquela época, ela parecia ainda ter conseguido se tornar uma boa mãe. Lembrar-se do fato de que Kagura havia tido um filho aos 17 anos, porém ― e com aquele miserável ― o fazia esquecer-se completamente desse orgulho e querer matar lentamente o policial desgraçado que havia tirado a inocência de sua pirralha gulosa ― mesmo que ele soubesse que essa não existia exatamente.

Sentindo algumas veias pulsarem em sua testa, Gintoki encarava Sougo, que continuava a discutir com a ruiva, extremamente tentado a desembainhar sua espada e fazer o serviço ali mesmo. Como aprendera na última década, contudo, o prateado fechou os olhos, respirando fundo, mantendo seu auto-controle, e assim que terminou de expirar, abriu-os novamente, passando a encarar Dango, que continuava em silêncio, de cabeça baixa, pensativa sobre o assunto.

― Não se preocupe com isso agora ― chamou a atenção da pequena para si, falando de forma tranquila, contrariando totalmente o ambiente, que agora se encontrava em caos, com o pessoal tentando separar Kagura e o Okita, os quais entraram numa briga ferrenha. Dango levantou seu olhar para encarar o mais velho, que possuía um sorriso simples nos lábios. ― Você ainda tem alguns dias para pensar se aceita ou não nossa oferta.

― Alguns dias... ― ela repetiu, guardando a informação para analisa-la mais tarde, quando sua mente estivesse mais tranquila. ― Está bem ― concordou assentindo.

Àquele ponto, o silêncio começava a voltar ao cômodo, já que aparentemente Shouyou finalmente dera fim à confusão que os outros dois haviam arranjado. Abandonando Kagura e Sougo no canto da sala, o professor aproximou-se dos Sakata.

― Dango ― chamou gentil. ― Poderia agora nos dar licença, por favor? ― pediu à pequena, que após olhar uma última vez para Gintoki e Mayah ― os quais sorriram concordando ―, levantou-se, saindo do cômodo pela porta de trás.

Mayah pediu que seus filhos fizessem o mesmo e os três caminharam em direção ao jardim frontal da propriedade, deixando ali apenas os adultos presentes e Soujirou, que permaneceu no colo de Rose.

Assim que a porta se fechou atrás de si, Dango já pôde ouvir os adultos falando de novo. Eles não falavam baixo e a porta era suficientemente fina para que ela conseguisse ouvir a conversa se quisesse, mas aí é que estava: ela não queria. O ar saíra de seus pulmões parecendo mil vezes mais leve agora que estava na varanda, mas ainda não era o suficiente. Ela precisava se acalmar, precisava pensar, afastar aquela tensão.

E só tinha um lugar onde ela poderia fazer isso.

Não era certo, Dango sabia, treinar com suas roupas comuns e sem máscara, mas ela não tinha paciência para os devidos preparos no momento, de modo que apenas prendeu sua franja para trás com uma presilha antes de pisar na área do dojo. Pegando uma espada de treino, ela se dirigiu para uma das pontas do tatame e entrou em posição de luta, tendo como adversário nada além do ar à sua frente.

— Ei. – Seu primeiro passo quase saiu em falso quando uma voz a distraiu. A porta do dojô que dava para a varanda continuava aberta, e no batente dela agora estava Souichiro. 

Naquela hora, se Kagura não o tivesse feito, ela mesma teria feito o Okita parar com o escândalo, mas logo que a ruiva o expulsou da sala, os pensamentos da albina se voltaram para a proposta de Gintoki e nada além. Entretanto, vendo o amigo ali e lembrando-se do modo como ele reagira à tal proposta, Dango começou a armar suas defesas, pronta para usar a arma de madeira em suas mãos se Souichiro insistisse em trazer mais uma confusão para sua cabeça agora.

No entanto:

— Ia começar sem mim? – Foi tudo o que ele disse, indo até onde estavam as espadas de treino e pegando uma também.

Diferente de Dango, ele estava com a roupa própria para treinos (acabava usando elas quando todas as outras ficavam sujas), mas isso não fez diferença alguma no momento em que os orbes azuis se encontraram com os castanhos no tatame, ambos em posição de luta. Uma leve sombra de agradecimento passou pelo sorriso de Dango antes de esse se tornar nada mais que desafiador e então, ela atacar.

Os primeiros golpes foram precisos e com força total, embora não por isso Souichiro deixasse de bloqueá-los e ataca-la muitíssimo bem também. Porém, lá para o nono ou décimo movimento, Dango sentia-se já muito mais leve; pronta para analisar todos os acontecimentos que aconteceram desde que acordaram naquela manhã.

Primeiro de tudo: Gintoki. Dizer que ele não era o que ela esperava seria pouco. Os cabelos eram prateados como os seus e ele tinha o permanente natural, mas o que eram aquelas roupas? Pareciam feitas sob medida e da melhor qualidade; um vagabundo nunca poderia pagar por uma coisa dessas, nem o mais embromista de todos. E Aquela postura tão séria? Eles não estavam num momento de vida ou morte onde o protagonista precisava parecer foda nem nada do tipo. Não importa o quanto procurasse, ela não encontrava qualquer traço do vagabundo bêbado, escandaloso e indecente que sempre ouvira que seu pai era.

— Ponto! – Souichiro riu ao conseguir encostar a ponta de sua espada na costela da garota, marcando sua primeira vitória.

Sem dizer nada, Dango e ele apenas retornaram para as posições iniciais, enquanto a albina também retornava para seus pensamentos.

E quanto à família... Mayah fora tão gentil com ela. Dango ainda não entendia o porquê, embora agradecesse. E aquela menininha, Mayume, se bem lembrava, havia a chamado de nee-san. Não era a primeira vez que isso acontecia, várias crianças mais novas a chamavam assim, mas para Mayume, chamá-la assim tinha outro significado, porque ela realmente era sua irmã mais velha.

O pensamento de ter não apenas uma, mas quatro irmãos mais novos, mesmo que só por parte de pai, fazia seu estômago roncar esquisito.

— Ponto! – Souichiro declarou mais uma vez, seu último golpe acertando agora no peito da amiga.

Retornando as posições, começaram a luta; de volta aos pensamentos.

E agora ela estava sendo convidada a ir para a casa deles, podendo decidir se ficaria ou não para morar lá. Em outro distrito, em outro feudo, longe de tudo e todos que conhecia e com pessoas que acabara de ver pela primeira vez na vida!

Tudo bem, tudo bem, vamos fechar um pouco a torneirinha de drama. Ela ainda tinha um tempo para decidir se ela queria sequer ir para... Aokigahara?, com eles. Ela não precisava ir se não quisesse, ela não precisaria ficar se não quisesse. Sua vida mudar drasticamente ou não estava apenas em suas mãos.

O pensamento a fez relaxar instantaneamente. É... estava tudo bem. Estava tudo na mais perfeita or-

Tunk!

O golpe fortinho em sua cabeça pareceu acorda-la. O que a atingira fora nada mais que a espada de Souichiro, que ainda segurando-a, mirava a albina com um olhar meio estranho.

— Oe, oe. – Tunk, tunk. Os golpes se repetiram na cabeça. – Tem alguém em casa~? Algum espírito vingativo que liga de eu ter acabado de ganhar três rodadas~?

Os cutucões continuaram, em sua testa, em sua bochecha direita, tudo com Dango ainda meio em transe. Até Souichiro colocar um pouco de força demais no último cutucão em seu estômago.

Ele quase não teve tempo para capitar a raiva no olhar de Dango e apenas graças a seus reflexos rápidos ele pôde defender o golpe da albina com sua espada. Mesmo assim, sua defesa foi fraca e Souichiro precisou dar um passo para trás para não cair por conta do impacto. Dango foi feroz, não apenas nesse último golpe, mas nos próximos que lhe desferiu. A cada passo que a albina avançava, rosnando pra cima do amigo, era um passo que Souichiro voltava, até que Dango bateu em sua espada com força suficiente para fazer seu pé escorregar no tatame. O Okita caiu com as costas no chão enquanto a Sakata continuou a lhe apontar a arma de treino; sua respiração ofegante não a fez perder o olhar firme na direção do outro.

Um riso baixo de Souichiro começou a ecoar pelo dojo, baixo a princípio, mas já tendo se tornado uma gargalhada quando ele sentou-se no tatame, um braço apoiado no joelho ao erguer a cabeça para Dango, lhe mostrando um travesso, porém sincero, sorriso.

— Essa é a Dango que eu conheço.

A albina baixou sua espada com um longo suspiro, para então sentar-se ao lado do amigo enquanto soltava sua franja presa.

— Você é um idiota.

Souichiro simplesmente deu de ombros, o que fez um silêncio se instalar sobre eles.

Durante um dia de treino normal, eles agora estariam indo atrás das fatias de melancia na geladeira, as quais comeriam tranquilamente na varanda, aproveitando o clima do dia e jogando conversa fora. Mas o simples fato do Okita guardar silêncio já deixava claro o quanto as surpresas daquele dia estavam afetando não somente à Dango, mas a todos naquela casa (e talvez até no distrito, quando o resto de seus conhecidos ficasse sabendo de Gintoki).

O que aconteceria agora? Em seus dez anos de vida, Dango nunca tivera tanto medo do futuro.

— Aí. – Ela se virou quando Souichiro a chamou. O menino, no entanto, olhava exatamente para o outro lado, escondendo seu rosto dela. – Você não... não vai mesmo embora com eles vai? Digo... pra morar lá.

— Claro que não. – A resposta saiu automática, antes mesmo que Dango pudesse pensa-la. Não se arrependeu dela, entretanto, dando um sorriso brincalhão antes de completar. — Eu não posso te deixar. Você ficaria perdidinho sem mim pra te ajudar nos deveres.

— Se for só por isso então pode ir embora. – Do mesmo jeito que com Dango, o retruque saiu antes de Souichiro pensa-lo bem e por um instante seu sangue gelou.

Souichiro sequer podia lembrar-se de uma parte de sua vida sem Sakata Dango nela, porque de fato isso nunca acontecera. Ele nascera seis meses após a menina ser deixada à porta do dojo e desde então os dois sempre estiveram juntos, fosse aprontando, treinando, estudando, brincando ou brigando. Dango era sua melhor amiga e o mero pensamento de que o pai dela (para ele, o cara que a negligenciou durante dez anos) de repente apareceria dessa forma e a levaria para longe era algo que lhe enchia de insegurança.

Para sua sorte, Dango apenas riu de seu comentário; uma risada baixa e tranquila que também lhe trouxe um sorriso. O garoto não podia nem pensar em perder momentos como aquele.

As risadas cessaram, no entanto, quando três sombras se projetaram da porta que dava para a varanda. Dango e Souichiro viram ali os três filhos de Gintoki, vindos do quintal, mirando na direção deles.


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