Manual de um lobo solitário escrita por DreaMaker


Capítulo 3
A bela miragem


Notas iniciais do capítulo

Quanto tempo hein? Provas, testes, trabalhos...



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Depois de quase morrermos e sermos comidos por um urso gigante babão, e sermos salvos por uma loba da alcateia inimiga, ainda ouvimos um sermão da minha mãe- e irmã de Artie- por termos perdido o jantar e demorado a chegar em casa.

Francamente, era difícil entende-la.

— OK, mãe. Não foi o fim do mundo, tá legal? – sentei-me em um canto da caverna escura, popularmente conhecido como o cafofo fedorento de nossa família.- Só perdemos o jantar. Acontece, não é Artie?

— Exatamente. Pelo menos maninha, você não engorda.- Artie sugeriu, quase rindo, se não fosse pela cara que minha mãe havia feito, que meio que significou “Repita isso de novo e vai virar tapete aqui em casa”.

— Foi um erro confiar em você Artie. Pelo visto, você nunca vai crescer. – Minha mãe disse, delicada como sempre com os outros lobos.- Você é uma má influência para o Macky.

Tio Artie repetiu as palavras de minha mãe, soando baixo, como uma brincadeira, para que ela não ouvisse.

Revirei os olhos. Ele não se cansava disso e ela não se cansava de brigar com ele.

Deitei, perto da parede de pedras, em um canto fresco, a poucos metros de distância da luz fraca do sol, que estava quase se pondo no horizonte, atrás das árvores de coníferas da nossa floresta.

— E o que seus irmãos vão comer agora?!?- Mamãe estrilou, furiosa.

— Grama.- Tio Artie sugeriu, coçando a orelha com uma das patas traseiras. Não me admira que ele poderia ter pego pulgas, já que vivia se esfregando em poças de lamas por aí. – Saborosa, Orgânica e econômica. A melhor comida que a natureza poderia oferecer. E quem precisa de caçar afinal? Gastamos nossa vida com isso. Alguns de nós até já morreram nessa atividade imprestável...

— Até parece que eu vou dar grama para os meus filhos!

— Você faz tempestade em copo d’água Angelina... Só estou falando que...- Tio Artie argumentou, mas foi interrompido quando uma sombra de um lobo apareceu na caverna.

— Cheguei. – Era meu velho, que adentrara a caverna, com um coelho entre os dentes. Agora a mamãe pararia de reclamar, finalmente, nem tudo estava perdido.

Suspirei aliviado.

Apenas minha mente não se calava com uma pergunta que acabara de surgir: Qual era a verdadeira história da rixa entre os lobos brancos e negros? Por que isso simplesmente não acabava de uma vez? Afinal, já se passara muito tempo e ninguém mais se importava com aquela velha história...

E por isso mesmo cometi um grande erro. Decidi, durante o jantar, perguntar de forma mais discreta o possível o que impedia essa trégua:

— Pai.- chamei-o. Seu focinho virou-se para mim, indiferente, enquanto mastigava um pedaço do coelho.- Eu estava pensando, quem garante que a história da briga dos lobos brancos e negros é verdadeira?

Mais um mastigado.

— As lendas que contamos aos filhotes, ora.... Que pergunta Macky!

— Ok, mas... E se não fosse bem essa a história? - Comecei tentando soar o mais cuidadoso com nossas crenças, que era como achar uma agulha no palheiro na minha família.

— O que você quer dizer com isso? – Ele virou seus olhos dourados para mim, em um certo tom intrigado.

— Eu sei lá...- Pude ver que Artie, de modo quieto me observava em olhar que praticamente dizia “ Eu sei por que você está fazendo essas perguntas. ” – Talvez, isso tudo seja uma grande bobagem. Quem sabe alguém não inventou essa baboseira e...

— BOBAGEM?!?- Minha mãe arregalou os olhos, como uma coruja prestes a afugentar sua pequena presa. Senti algo pesado, como se eu estivesse soado bem ameaçador. – Que história é essa Macky?!?

— Eu só estou dizendo que.... Seria uma boa opção acabar com essa briga toda, não acham? – Desviei o olhar em uma fração de segundo para meus irmãos que haviam terminado de comer e agora um estava devorando a orelha do outro. Sei que não era uma boa ideia perguntar esse tipo de coisa, mas... No fundo, eu realmente esperava que eles pudessem me entender.

— Macky, chega.- Meu pai pediu, e absorvi que isso era um aviso pré-discussão na caverna.

— Por que vocês ficam tão incomodados com isso? O que há demais eu só estou tentando entender um pouco da nossa história. Quem disse que todos os lobos negros são bons ou sei lá, todos os lobos brancos são ruins? - Continuei, nervoso.

— Macky, chega! – Meu pai havia saltado de onde estava e praticamente estava cara a cara comigo. Senti seu hálito quente e fedido arrepiarem meus pelos. Seu focinho estava escancarado, revelando dentes brancos e afiados. Imaginei, que se eu dissesse apenas um pio, eu seria engolido por eles. E morrer mordido pelo próprio pai não era a minha melhor opção de morte.

— Ross! – Minha mãe estrilou, também nervosa, mas nem tanto quanto ele. – Saia de cima do jantar! E Macky, depois eu e você conversamos. Vá passear um pouco! Refresque a cabeça ou qualquer coisa do tipo.

Bufei, desviando o olhar dos olhos ameaçadores de meu pai. Não gostaria de enfrenta-lo apesar de saber que se isso contasse, eu ganharia a luta. Meu pai pôde ter sido um bom lutador, mas, devido a idade, seus ossos já se apresentavam fracos e frágeis. Além disso, em uma das brigas, ele havia machucado sua pata esquerda traseira, fazendo com que ele se tornasse manco.

Porém, ás vezes, eu sentia vontade de dizer tudo, o que sentia e queria. Mas, como tudo nessa vida, ensinaram-me que para tudo existe um limite, inclusive para a sua própria liberdade.

Sem aguentar aquela situação, esquivei-me pedindo licença e sai pela porta da caverna. O que eu menos queria era segurar aquele peso em meus ombros.

Talvez minha mãe tivesse razão, um pouco de ar me faria bem. Corri desenfreadamente até o rio mais próximo. Com certeza, cercado pelo ruído relaxante das águas correntes, eu me sentiria bem melhor.

Cheguei ao campo descoberto que antecedia ao rio. Quase não havia árvores, apenas um capim meio morto que balançava a leve brisa do clima. O sol estava lentamente se pondo atrás das árvores altas e pontudas, e o céu estava praticamente claro, como se as nuvens tivessem se dissipado.

Caminhei alguns metros e logo cheguei a margem. Como eu havia pensado, aquilo tudo me fez bem. Observei meu reflexo através das águas esverdeadas, tentando procurar e aprender um pouco mais sobre mim. Mas, eu não enxergava nada além de um focinho e orelhas completamente negras.

Será que seria tudo mais simples se fôssemos todos de uma cor só?

Mas, afinal... O que havia me incomodado tanto?!? Aquele incidente mexera tanto comigo a ponto de me fazer questionar coisas que eu ao menos nem importava?!? A mente lupina era algo estranho mesmo.

De repente, vi um vulto branco do outro lado da margem. Um pouco além, do outro lado das águas, pude ver um lobo branco. Àquela distância eu não saberia dizer se o mesmo se identificava como fêmea ou macho. Mas, se tem algo que aprendi com Artie, fora que as fêmeas com certeza eram mais delicadas e baixas que os machos da nossa espécie.

E ao julgar pelo porte daquele animal, acreditei se tratar de uma fêmea. Ou ao menos, era o que eu queria acreditar.

Observei-a enquanto ela bebia a água. Ela ergueu-se delicadamente, como uma garça que pega seu alimento nas águas. Continuei encarando aquela espécie que tanto me intrigava. Ela se manteve imóvel.

Pensei que talvez, poderia se tratar de Andine. Sustive o olhar e nesse momento, decidi tomar uma decisão.


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