Beside You escrita por Louise K


Capítulo 5
Cold, Cold Feeling


Notas iniciais do capítulo

Eu não tenho nem justificativas plausíveis para ter ficado 1 ano e 10 meses sem atualizar essa fic. Tudo o que me resta é sentir vergonha de mim mesma e pedir mil perdões para aqueles que acompanharam essa obra. Eu realmente sinto muito, galerinha.
Gostaria de agradecer quem comentou a fic mesmo vendo que ela estava inativa há tanto tempo. Vocês foram meu combustível.
Blindspot está chegando ao fim. Por que não dar um fim decente para Beside You também?
Se bem me recordo, eu havia comentado alguns capítulos atrás que essa fanfic teria um total de 5 capítulos. Mas como sou uma escritora com vergonha da inatividade, resolvi adicionar mais um capítulo que será postado em breve (EU >>JURO


Antes de tudo: eu juro que a Tasha é minha personagem favorita e que eu a amo muito.
Preparem vossos coraçõezinhos, perdoem qualquer erro e boa leitura ♥



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Localização desconhecida | Domingo, 11:52 AM

Luzes, luzes e mais luzes. Foi como os olhos de Tasha foram recepcionados assim que a mesma retomou sua consciência. Ela sentia suas pálpebras pesadas, como se tivesse passado por uma noite terrível e mal dormida. Mas Tasha não se lembrava de chegar em sua casa, muito menos na própria cama. Quando esse pensamento percorreu sua mente, a mesma se esforçou para abrir seus olhos novamente. Após alguns segundos de adaptação, a latina conseguiu focar e ter dimensão de onde estava. Aquele lugar estava longe de ser sua casa. E onde estava deitada tampouco chegava perto de ser sua cama. Tratava-se de um duro, frio e desconfortável chão. Quando tentou levantar-se para descobrir onde estava, foi impedida pela total imobilização de suas mãos e pernas. Nesse momento a agente descobriu que não só tinha seus movimentos restritos, como também tinha sua boca coberta por uma fita. Que inferno, ela pensou.

 

— Finalmente! — uma voz masculina a assustou. — Pensei que teria que te forçar a acordar.

 

Tasha não respondeu e nem poderia se quisesse. Seguiu a figura enigmática com seus olhos. 

 

— Já sei o que você deve estar se perguntando. "Quem sou eu?". — ele disse andando em voltas ao redor de Tasha, que permanecia no chão. O homem disse com um tom de falsa animosidade e delicadeza em sua voz que fazia Tasha querer distribuir no mínimo meia dúzia de socos naquele rosto.  — A resposta é: ninguém importante. Não temos tempo para apresentações. Agora, vamos. Tem uma pessoa que quer te ver. — O tom delicado que o homem tentava transmitir foi totalmente desconstruído pela forma que ele a agarrou do chão com uma das mãos e a arrastou porta afora em direção a um estreito e escuro corredor. 

 

Tasha sentia diferentes tipos de dores por seu corpo e ela tinha o pressentimento de que aquilo estava prestes a piorar. Após ser arrastada por alguns metros, ela foi jogada em outra sala. A atual parecia ser tão clara quanto a anterior. Seus olhos pareciam estar queimando. Ou seria essa uma consequência das bebidas de horas atrás? O pensamento de não poder aproveitar a própria ressaca em paz passou pela mente da latina e fez com que ela sentisse mais raiva ainda.

 

— Olha quem acordou. — o homem anunciou com o mesmo tom de voz utilizado momentos atrás.

 

— Natasha Zapata! Quanto tempo, minha querida. — uma voz diferente anunciou enquanto de um canto escuro na sala. Se a situação não fosse tão delicada, Tasha teria soltado uma risada do quão ridículo aquilo havia sido. Parecia que havia sido tirada de dos filmes de comédia que costumava assistir em suas noites em claro. Mas ela não podia se dar o privilégio de rir. Principalmente quando ela reconhecia aquela voz. —  É assim que você faz? Resolve sua vida e finge que esqueceu de mim? 

Esse era o trato, Tasha queria ter dito em voz alta, mas foi impossibilitada pela fita em sua boca.

O homem que naquele momento se encontrava parado na sua frente fingindo uma expressão chateada já estava morto para Tasha há tempos. Pelo menos figurativamente. Tratava-se de Octávio Bloltorf, conhecido como ‘Tilt’ por qualquer um que já houvesse frequentado pelo menos uma casa de jogos clandestinos da cidade de Nova York. Zapata havia enterrado o seu passado de jogos e apostas, então aquele homem definitivamente tratava-se de um fantasma.

 

  Tasha havia entrado no mundo dos jogos de uma maneira repentina. A morte de seu amigo e parceiro Andy anos atrás a afetou de maneiras avassaladoras. Perdê-lo desencadeou diversos vícios e costumes nada positivos para ela. Zapata nunca foi boa em lidar com seus sentimentos, então naquela situação não poderia ter sido diferente. Perder Andy pode ser considerado o gatilho para uma série de acontecimentos de sua vida. Tasha entrou em um estágio profundo de depressão. Na época, ainda como detetive do Departamento de Polícia de NY, ela parecia não se preocupar com o próprio estado de saúde mental, mesmo que soubesse que o mesmo piorava a cada dia que se passava. Durante meses, Tasha permitiu que seu quadro se agravasse, já que conseguia manter as aparências em seu espaço trabalho — ao menos na maioria das vezes. Após um ano, Tasha parecia ter se recuperado, mas a situação não durou muito tempo, já que estava prestes a transferir sua tristeza para uma área que já estava presente em seu histórico familiar: ela começou a beber. Por sorte, seus deslizes com o álcool nunca chegaram a afetar seu trabalho. A latina fazia o possível para que tudo o que acontecesse em sua vida pessoal ficasse fora se sua vida profissional. E ela surpreendentemente conseguia. Noites e noites frequentando bares em variados pontos da cidade fez com que Tasha conhecesse pessoas diferentes, de todos os tipos. Ela claro, nunca se apresentava a estranhos com seu verdadeiro nome. Criava nomes e, muitas das vezes, criava até personagens. Tasha até ousava dizer que era divertido. Diferentes homens e mulheres passaram por sua vida durante aquele momento de sua vida. Muitos até foram esquecidos por ela. 

No entanto, o rosto de Tilt era algo bem difícil de ser esquecido. Octávio Bloltorf era um dos maiores organizadores dos jogos clandestinos da cidade. Ele e Tasha foram apresentados em um dos muitos bares percorridos pela latina. Em uma noite, após algumas bebidas, ela foi convencida a participar de um dos jogos que estava acontecendo em uma área mais reservada do estabelecimento. Para sua própria surpresa, em sua primeira mão, Tasha conseguiu completar um full house e vencer outro jogador que também possuía um full house, mas não possuía o maior trio da mesa. Tasha lucrou cerca de 200 dólares naquela noite. Ela não sabia, mas sua sorte seria a causa de sua ruína. 

Depois de sua primeira vitória, Zapata não conseguiu se conter. A princípio tentou estabelecer regras consigo mesma. Seu erro foi acreditar que conseguiria jogar apenas nos finais de semana. O que deveria ser apenas um, tornou-se rotina em praticamente todos os dias da semana. Não demorou muito tempo para que ela perdesse o controle da situação. Sua sorte de principiante começou a obliterar-se após os primeiros meses de jogatina. Em questão de dias, Tasha viu seu dinheiro ir embora por conta de suas apostas. Quando deu conta do que estava acontecendo, já era tarde. Estava com dívidas acumuladas e precisando negociar com o homem responsável por coordenar os jogos na cidade, Octávio Bloltorf.

Tilt, como ficou conhecido por sua personalidade inquieta e perturbada tanto no jogo como, e principalmente, na vida real, não era o homem que Tasha acreditava que era. Quando foram apresentados, Tilt demonstrou ser um homem gentil. Ou pelo menos fingia ser. Sua capacidade de dissimular sua personalidade com seu falso tom de voz amigável era uma coisa que irritava Tasha até os dias de hoje. A latina conseguiu conversar com ele sobre suas dívidas e ele mostrou-se uma pessoa muito compreensível, dando um prazo para que ela quitasse suas dívidas. Entretanto, Zapata não possuía dívidas somente nos jogos. O aluguel de seu apartamento, suas dívidas pessoais e muitos outros problemas estavam acumulados. Isso resultou no rompimento de seu trato com Tilt. As consequências não poderiam ser piores. Tasha teve de conhecer pessoal e fisicamente um lado do homem que acreditava ser um homem aprazível. Sem dar um segundo aviso, Tilt enviou seus capangas para fazer com que ela não se esquecesse que era melhor ter dívidas com o diabo do que com ele. 

As dores distribuídas por seu corpo naquele momento não se igualavam com o que Tasha sentiu após os longos minutos sendo eletrocutada pelos capangas de Octávio. Os homens que trabalhavam para o ‘empresário’ tinham como marca registrada as suas habilidades de torturar e ferir pessoas sem deixar marcas visíveis. As marcas poderiam não ser vistas, mas eram bem sentidas. E isso Tasha podia garantir.  Depois da breve e dolorosa tortura, ela não teve outra opção a não ser quitar sua dívida. Não podia correr o risco de que alguém descobrisse seu histórico, logo não poderia se dar ao luxo de fazer uma denúncia ou até mesmo contar para alguém. 

 

— Sei que você deve estar se sentindo fraca agora, mas sinto lhe informar que a culpa é toda sua. Você que decidiu levar isso para o lado difícil e bater nos meus meninos quando eles foram buscar você. Infelizmente tivemos que te dar uma coisinha para dormir. — ele disse com um sorriso cínico. — Mas não se preocupe, querida. Daqui a pouco melhora. Enquanto isso, deixa eu te explicar o que você está fazendo aqui. — ele fez uma pausa para sentar-se em uma cadeira que foi oferecida por um de seus capangas. — Os seus amiguinhos, os federais, estão na minha cola já tem um tempo e tenho quase certeza de que eles estão bem perto de chegar até mim. Eu não sou estúpido, é claro. Então eu resolvi fazer uma festinha de despedida com os meus jogadores favoritos.  — o homem de meia-idade fez uma pausa e aguardou a reação de Tasha, que permaneceu apática. 

 

— Acho que ela não está muito feliz, Tilt. — um dos três homens presentes na sala comentou, enquanto a encarava. 

 

— Não é possível. Ela adora um joguinho. — Tilt exclamou. — Vamos ver o que ela tem a dizer. Seth, tira essa fita da boca dela por favor. — ele ordenou e o homem que havia comentado sobre sua infelicidade se aproximou de Tasha para retirar a fita de sua boca. — Espero que você já tenha percebido que não adianta gritar, estamos muito distantes de qualquer aglomeração. 

O homem tirou a fita de Tasha de maneira rápida e indolor e ela agradeceu mentalmente por isso. Embora estranhasse tal atitude vindo de um dos empregados de Octávio.

 

— Você é burro ou o quê? — Tasha não perdeu tempo. — Em algum momento vão notar meu desaparecimento e vão te encontrar antes mesmo que você consiga pensar em pegar seu avião. 

 

— Essa era a Tasha que eu queria! — ele exclamou após dar uma risada. — Eu sempre disse que adorava a sua sinceridade. Não disse, querida? Mas eu não quero saber dos seus palpites como agente do FBI. Essa Tasha é chata. Eu quero a Tasha jogadora. Quero saber o que você achou da minha proposta.

 

Tasha manteve-se em silêncio, o encarando. A sua mente estava turbulenta. Ela sabia que era a mistura do álcool e de seja lá qual foi a substância que aplicaram nela fazendo efeito em seu organismo. A agente tentava calcular suas maneiras de sair dali. Os homens de Tilt não tinham costume de andar armados, ele mesmo fazia questão de dizer isso. Mas isso não era garantia alguma de que os três ali não estivesse carregando pelo menos uma pistola. Ela precisava estudar mais o ambiente e as possibilidades, mas sua mente não estava cooperando.

 

— Tilt, — Tasha resolveu usar seu apelido para fingir que estava indo na onda dele. — Eu não posso participar da sua festinha porque depois que quitei minha dívida, eu parei de jogar. — ela explicou com uma falsa tranquilidade.

 

Foi nesse momento que o homem diante dela fez jus ao seu apelido. No universo do poker um jogador em tilt é aquele que está um estado mental no qual ele não é mais capaz de tomar decisões racionais, agindo assim emocionalmente ou, no caso de Octávio, agressivo. Ele tinha a fama de ser um péssimo perdedor. Tasha nunca tivera a oportunidade de ver esse lado dele de perto, e estava prestes a presenciar no pior momento possível. Tilt se levantou da cadeira onde sentava abruptamente e chutou a mesma em direção à parede mais próxima, abandonando completamente sua postura gentil e carismática. Tasha não era profissional na área da saúde mental, mas tinha certeza que Octávio era um ótimo candidato a ser diagnosticado com algum transtorno de humor.

 

— Eu não ligo se você parou ou não. — vociferou. — Eu só quero que você participe da minha festa. — Tilt fez questão de se agachar para ficar na mesma altura que ela, que ainda estava jogada no chão, e dizer essas palavras com o rosto colado ao de Tasha. Ela, ainda que estivesse assustada com essa nova reação, não demonstrou. — Parabéns, Tasha. Você conseguiu me irritar. Levem ela daqui. Ela precisa repensar suas atitudes. — ele disse e foi mais um momento em que Tasha teria soltado uma risada se não fosse um momento preocupante. Pensar um pouco, ele está falando com uma criança?, Tasha pensou.

 

Mais uma vez ela não teve tempo de resposta. Em poucos momentos estava sendo arrastada corredor afora pelo mesmo homem que havia levado-a até Tilt. Dessa vez Tasha foi arrastada por uma distância mais longa. Ela estava se sentindo tão fraca que não conseguia reagir, apenas permitiu ser levada. Tasha podia não conseguir se soltar agora, mas ela fez o possível para observar o local ao máximo. Pelos extensos corredores e largas portas automáticas, ela tinha quase certeza de que se tratava de uma fábrica ou de um hospital abandonado. Após passarem por diversas portas e extensões de corredores, o homem alto, forte e tatuado a largou no chão como se ela fosse um saco de lixo. Tasha o observou pegar um chaveiro em seu bolso e começar a destrancar uma porta diferente das outras por onde passaram, essa se parecia com a porta de um contêiner. A agente olhou a sua volta e percebeu que estavam em um corredor repleto deles, todos iguais. Um corredor completo de caixas enormes. Hospital abandonado logo foi eliminado das suposições de Tasha sobre o que era aquele lugar.

Assim que o capanga de Tilt abriu a porta, um frio hostil escapou pela mesma. Foi então que ela percebeu do que se tratava. Era um freezer e já havia uma pessoa lá dentro. Era uma mulher, sentada no canto e abraçada com suas próprias penas, certamente tentando manter-se aquecida. Tasha não teve tempo de checar se ela estava viva ou não. Quando percebeu, estava sendo levantada por uma das mãos do brutamontes que a carregava. Mesmo depois de analisar todas as possibilidades e chegar à conclusão óbvia de que estava em desvantagem, Tasha resolveu agir.

 De forma impulsiva, a agente aproveitou que o homem havia colocado-a de pé e utilizou a única parte do seu corpo que não estava imobilizada para acertá-lo em cheio. Ela não pensou duas vezes antes de bater com a própria cabeça na dele com o máximo de força que conseguia. O capanga definitivamente não esperava por aquilo e ficou levemente desnorteado. Porém, não tão desnorteado quanto Tasha gostaria. Mesmo com o nariz sangrando, ele foi em direção a ela com certa agressividade. A latina não teve tempo de reação, pois ainda estava com suas pernas e braços presos. Em questão de segundos estava sendo lançada dentro do freezer. Quando seu corpo colidiu com o chão congelado, Tasha observou que a mulher estava viva e assistia com uma feição assustada todo o ocorrido. Foi tudo o que Tasha conseguiu observar antes que o brutamontes se aproximasse dela. A agente tinha certeza de que estava prestes a ser espancada. Mas acabou sendo pior. Ela não viu de onde ele tirou aquilo, mas quando percebeu, o capanga estava empunhando um cassetete elétrico. Tasha estava prestes a ser eletrocutada pela segunda vez em um período curto de tempo, dessa vez de forma ainda mais violenta. O impacto do choque sobre seu corpo foi tanto, que dessa vez ela definitivamente não precisaria de qualquer substância para ficar inconsciente. Sentiu seu corpo colapsar e seus olhos se fecharam imediatamente antes de ser largada ali, ao lado de uma desconhecida naquele freezer.

••• 

SIOC | Segunda-feira 3:35 PM

 

Patterson não acreditava no que estava acontecendo. Não podia ser real. Aparentemente um namorado assassinado e um namorado terrorista não eram sofrimentos suficientes para o Universo ou qualquer outra força que controlava os acontecimentos. Não bastava estar se recuperando do trauma de ter sido baleada pelo homem que confiava, não bastava ter que lidar com a dúvida do paradeiro do mesmo.

É claro que o Que ou Quem controla e supostamente deve escolher os acontecimentos de forma aleatória, resolveu não cumprir seu papel de forma correta. Patterson tinha todos os motivos do mundo para acreditar que os acontecimentos de sua vida estavam sendo escolhidos a dedo. É como se a vida fosse um jogo de RPG e quem estava controlando sua personagem fosse uma pessoa muito sádica e que não se sentia satisfeito ao ver a campanha do jogo tomava rumos que pudessem trazer felicidades para ela.

Chegava ser injusto. Por que logo quando ela se permitiu abrir para alguém que realmente a conhecia e podia confiar, algo tão terrível teria que acontecer? Justamente depois de uma das melhores noites da sua vida, a noite em que ela realizou uma das vontades que estavam tomando conta de seus pensamentos desde que ela e Tasha começaram a passar mais tempo juntas. A noite em que ela decidiu permitir-se aflorar sentia por sua amiga; a noite que considerou abandonar seus próprios pensamentos inseguros que a faziam acreditar ser muito cedo para tentar algo. 

A noite em que ela e Tasha se beijaram. A mesma noite em que sentiu coisas nunca sentidas, – coisas essas da qual ela ainda nem tivera tempo de assimilar, devido à velocidade dos acontecimentos – resolvem sequestrar a mesma. Patterson nunca sentiu a necessidade de despejar sobre alguém ou algo a culpa sobre os acontecimentos em sua vida, ou na vida de outras pessoas. Ela sempre acreditou que tudo era por acaso, totalmente aleatórias. Mas ela não reclamaria se pudesse ficar cara a cara com o responsável por todas essas desgraças e questionar o que ela havia feito para merecer tais coisas.

Momentos depois de receber a ligação de Kurt informando o que ela mais temia, Patterson não pensou duas vezes antes de correr para seu laboratório e fazer o que estava ao seu alcance para descobrir o que tinha acontecido com Tasha. Agora ela estava ali, esperando o banco de dados analisar as câmeras que capturaram o rosto de Tasha depois que ela saiu do metrô. Como tudo ocorreu quando estava chovendo e já passavam das 2h da manhã, não foi difícil encontrar imagens dela em ruas próximas à estação de metrô que havia saltado. Que ela havia saltado minutos depois de se despedir da melhor maneira possível de sua amiga...

 

 — Ali! 300 metros depois da estação de metrô. — a voz de Rich tirou a loira de seus pensamentos. Seus olhos voltaram a focar nos televisores do laboratório, que agora transmitiam o momento exato da captura de Tasha. As imagens mostraram que a latina foi totalmente surpreendida por dois homens encapuzados que saíram de um carro estacionado em uma rua 

 

 — Eles já estavam esperando por ela. O porta malas já estava aberto. Foi tudo premeditado. — Reade disse, sem tirar os olhos dos televisores. — Seja lá quem foi, sabia que essa era a rota de costume dela e que ela estaria fora de casa naquela hora.

 

— Impressionante. Se me lembro bem, a Tasha não estava tão sóbria e mesmo assim conseguiu acertar os dois caras. Alguém precisa me ensinar a fazer isso. — Rich disse se referindo aos dois socos que Tasha deu nos seus raptores antes de ser imobilizada pelo que parecia um taser e ser jogada no porta-malas do carro. A fala do ex-criminoso fez com que todos ali presentes direcionassem olhares de reprovação para o mesmo, que se recolheu com um sorriso sem graça.

 

Após revirar os olhos para seu colega de trabalho, Patterson deu um passo à frente, desviando seus olhares das telas e indo até seu computador. Ela pausou a imagem e ampliou a mesma, na tentativa de conseguir mais detalhes. 

 

— Não temos muitas imagens. — ela anunciou com frustração evidente em sua voz, sem tirar seus olhos de seu computador e sem parar de movimentar seus dedos rapidamente sobre o mesmo. — Vejam. — a loira disse para os agentes presentes ali no laboratório. — As câmeras só conseguiram gravar o trajeto do ponto onde eles a pegaram até o início da Ponte George Washington. O carro não chegou do outro lado da ponte.

 

— Isso é impossível, não tem nenhum retorno na ponte. — Rich comentou, tão intrigado quanto a amiga.

 

— Não tem nenhuma outra imagem do carro? — Jane perguntou em seguida.

 

Patterson seguiu avançando as imagens e parou abruptamente no vídeo que mostrava o mesmo carro sendo rebocado por um guincho, 30 minutos depois que entrou na Ponte.

 

— Isso não está fazendo sentido... — Patterson murmurou mais uma vez.

 

 — Eu vou pedir para ligarem para essa empresa que levou o carro e ver se consigo informações. — Weller disse já saindo da sala.

 

Patterson continuou analisando as imagens. Jane, Reade e Rich presentes ali na sala observavam a loira ir e voltar com as imagens das câmeras. Tinha algo de diferente na cientista. Ela já tinha trabalhado sob pressão, incontáveis vezes antes. Os seus colegas de trabalho já estiveram em perigo antes e ela soube lidar com isso. Mas a tensão que Patterson emanava não deixou de ser percebida por Rich, ele só não conseguia entender o motivo. Ainda.

 

— Tem algo muito errado aqui. — ela murmurava para si mesma, pensativa. A loira colocou as duas imagens em comparação: de um lado o último registro do carro na ponte e em outro o veículo sendo rebocado.

 

— Pattycake, pensa comigo. — o hacker disse chamando a atenção dela. — Presta atenção nos outros carros e nos horários. Aquele SUV cinza. Ele foi capturado pela câmera 2 às 02:44:54 e o próximo registro está na câmera 3 às 02:45:07. Existem 12 segundos dessa ponte que não são gravados e provav--

 

— Um ponto cego! — ela exclamou interrompendo-o. — Isso faz todo sentido. A única explicação para esse carro ter entrado na Ponte e ter ficado lá sem que as câmeras mostrassem é que eles ficaram parados em um ponto cego. — Patterson completou a linha de raciocínio de Rich. 

 

No mesmo instante Kurt retornou à sala. 

 

— A empresa disse que quem ligou para o reboque não foi o dono do carro, mas sim um policial rodoviário que encontrou ele abandonado atrapalhando o fluxo na Ponte. Falaram que não tinha ninguém lá quando chegaram e que até hoje ninguém foi buscar o carro. — Weller explicou.

 

— Ok, isso faz sentido. Eles trocaram de carro onde as câmeras não têm acesso. Então eles entraram na Ponte com um carro, pararam em um lugar onde não existe alcance das câmeras e abandonaram esse. — Patterson comentou enquanto voltava a mexer no controle das câmeras. 

 

— Jane e Kurt, eu preciso que vocês vão até esse carro e vejam se acham alguma coisa útil. — Reade ordenou. — Patterson e Rich, continuem trabalhando nos vídeos e me informem sobre qualquer detalhe. Eu vou continuar tentando ligar para o celular dela, caso alguém resolva atender. Pode ser que tenhamos sorte com o rastreador. — ele disse saiu da sala.

 

— Nos mantenham informados também. — Kurt pediu antes de se encaminhar fora do laboratório, seguido por Jane. 

 

— Ok Patts, agora você e eu. — Rich comentou com seu tom de voz que Patterson tanto detestava: o que anunciava que ele estava prestes a falar algo constrangedor ou irritante. A loira ainda nem tinha escutado o que seu amigo tinha a dizer, mas revirou os olhos por antecedência, sem tirar sua atenção dos computadores. — Você está estranha... e não saber o que é, está sendo intrigante. Se não fosse a situação atual eu diria até que é divertido. — continuou falando. — Eu sei que você e a agente Cara Fechada são amigas, mas por que você foi a primeira a suspeitar sobre o desaparecimento dela? — ele questionou, mas não obteve resposta. Então prosseguiu. — Como você sabia que ela tinha desaparecido exatamente depois que saiu da estação de metrô? E mais: como sabia que ela não tinha chegado em casa?

 

— Porque eu estava com ela no metrô e pedi para ela me mandar mensagem quando chegasse em casa. Ela não me mandou e eu fiquei preocupada. — a loira não precisou mentir, mas sabia que Rich não se contentaria com essa resposta.

 

— Eu sou seu amigo, estava na mesma festa que você e, ainda assim, você não mostrou esse tipo de preocupação comigo. — o hacker respondeu levando uma mão ao peito, fingindo estar ofendido. 

 

Patterson resolveu não responder. Apenas desviou seus olhos das telas por alguns segundos, encarou Rich e lhe lançou um olhar de reprovação antes de retomar sua atenção para as dezenas de registros de movimentação de carros da ponte mais movimentada da cidade.

•••  

Localização desconhecida | Domingo, 5:19 PM

A primeira coisa da qual Tasha ficou ciente ao despertar, foi do frio absurdo que a envolvia. Tudo era frio, o ar, o chão no qual ela estava deitada, absolutamente tudo. Até mesmo as roupas que supostamente tinham o propósito de aquece-la, estavam falhando. O fato de que elas estavam úmidas devido à chuva que pegara no caminho de casa com Patterson tornava tudo ainda pior. 

A segunda coisa que tomou consciência foi de como seu corpo parecia estar ainda mais dolorido. Se antes de ter sido jogada e arrastada chão afora de formas nada delicadas ela já estava com dores, agora era como se elas tivessem triplicado. Ser eletrocutada duas vezes e dopada por uma substância desconhecida também era um fator que contava muito.

Cuidadosamente Tasha levantou-se do álgido chão. Sua cabeça ainda doía muito e quando ela levou as mãos até o rosto percebeu que alguém havia removido as fitas que antes inibiam seus movimentos. Ela olhou para suas pernas e também notou que estava livre das mesmas. Antes que sua mente pudesse criar alguma teoria, ela percebeu a presença de uma pessoa observando-a ao erguer a cabeça. Era a mulher que já ocupava o freezer antes dela ser jogada ali. Tasha se distanciou, mantendo a defensiva.

— Por um momento pensei que você estivesse morta. — a mulher foi a primeira a se pronunciar. — Mas eu vi que você ainda estava respirando, então eu apenas fiz os procedimentos corretos.

 

— Obrigada. — Tasha respondeu e parou para analisar a mulher. Ela possuía cabelos curtos, ondulados e em tons ruivos. Sua pele era branca, mas naquele momento estava vermelha, principalmente na região da bochecha e do nariz, devido ao frio. Ela estava totalmente encolhida no canto do repartimento e não apresentava ameaça alguma. — Você está aqui há muito tempo? 

 

— Não sei o número exato de horas, mas sei que cheguei aqui um pouco antes de te trazerem. — a mulher respondeu e Tasha pode perceber o tremor em seu queixo. — Camille Hall — apresentou-se e estendeu uma de suas mãos para Tasha, que agora estava parada à sua frente.

 

— Natasha Zapata. Também respondo por Tasha. — retribuiu o gesto. Ela não pode deixar de reparar que as mãos de Camille estavam mais aquecidas do que as dela.

 

 —  Eu diria que é um prazer te conhecer, mas eu estaria mentindo. — a ruiva respondeu e arrancou um leve sorriso da agente. 

 

— Eu não poderia concordar mais. — murmurou e sentou-se no chão, abraçada ao próprio corpo. A cada minuto que passava parecia que fazia mais frio.

 

Tasha passou a mão por seus bolsos. Não se surpreendeu quando não encontrou seu celular e outros pertences.

— Eles também pegaram seu celular? — a agente perguntou. 

— Sim. — Tasha soltou um xingamento baixo com a resposta de Camille. — Mas eles me deixaram com isso aqui. — a ruiva levantou a manga de seu casaco, mostrando um smartwatch em volta de seu pulso. Imediatamente Tasha se recordou de Patterson dizendo que deveria dar um desses para a latina já que ela vivia perdendo o celular dentro da própria casa. Ela precisou afastar os pensamentos.

— Isso é bom. Você já tentou fazer alguma ligação? — perguntou esperançosa.

— Sim. Mas aqui não tem sinal. Eu já tentei. — a resposta da ruiva foi como um balde de água fria em qualquer esperança que a latina pudesse ter construído. — E para piorar, ele está com a bateria baixa.

— De volta à estaca zero. — ela disse sem esconder a frustração em sua voz. — Bem, deixe ele desligado. Pode ser que precisemos dele em algum momento. Mas só vamos usar em caso de emergência.

Camille concordou e as duas permaneceram em silêncio por mais alguns minutos.

— O que traz você até aqui?

 

— Ao freezer? Eu acho que desagradei o Tilt. — Tasha respondeu.

 

— Eu me referi a esse lugar aqui. Mas se serve de consolação, eu também contrariei aquele maluco e fui arrastada até aqui. — ela explicou após um suspiro.

 

— Dívidas? 

 

— Não necessariamente. Eu parei de frequentar os jogos dele faz alguns meses, mas hoje ele me arrastou para cá dizendo que quer fazer um jogo com os “favoritos” — ela sinalizou as aspas com as mãos — e quando eu disse que não iria participar, ele surtou.

 

— Foi a mesma coisa comigo. — Tasha comentou enquanto se levantava e ia até à porta do contêiner. — Você sabe se tem mais alguém aqui além de nós? 

 

— Eu não faço ideia, mas tenho quase certeza de que ele não faria uma partida de poker só com três pessoas. — a ruiva disse.

 

— Eu contei pelo menos uns três capangas e uns 4 contêineres iguais a esse antes de entrar aqui. Não vi nenhuma saída, só um monte de corredores e várias portas. Acho que estamos em uma fábrica, frigorifico ou algo do tipo. — a agente falou rápido enquanto analisava a única saída delas dali: a porta. — Merda. Nenhuma tranca interna, só dá para abrir por fora. 

 

— Você é detetive ou algo do tipo? — Camille perguntou após a breve análise de Tasha.

 

— FBI. — respondeu secamente. 

 

— Agente do FBI e envolvida com o Tilt?

 

Tasha virou-se para a ruiva e arqueou as sobrancelhas para a mesma.

 

— E você por acaso é…?

 

— Advogada. — ela respondeu com um tom de voz baixo e arrancou uma risada de sua companheira de freezer. 

 

— Acho que ninguém tem o direito de julgar ninguém aqui. — Tasha ponderou em um tom brincalhão, enquanto retornava ao seu lugar no gélido chão.

 

— É, eu acho que você está certa. 

••• 

SIOC

O laboratório e os computadores que Patterson usava para trabalhar sempre foram um dos maiores motivos que a faziam amar tanto sua profissão. Eles sempre atenderam as suas demandas e a deixavam satisfeita. Pelo menos até então. Sua ansiedade e tensão eram palpáveis a cada vez que a cientista batia seus dedos sobre a superfície de seu computador principal ou murmurava algo sempre que precisava esperar por um processamento de dados. 

— Se você continuar com esses dedinhos nervosos, vai acabar fazendo um furo na mesa. — Rich comentou enquanto trabalhava em outro computador.

 

Patterson parou imediatamente o que estava fazendo. Ela se sentia tão nervosa que seus movimentos estavam automáticos. 

 

— Me desculpe, estou um pouco ansiosa. E esse sistema precário do banco de imagens de NY não está me ajudando em nada. — a loira reclamou antes de passar a mão pelo rosto em sinal de frustração. 

 

Rich fez uma pausa no que estava fazendo para se aproximar dela. 

 

— Ei, nós vamos achar ela. Não vai ser um sistema fuleiro de gravações que vai nos parar. Eu nem consigo pensar na última vez que isso foi motivo. — ele disse a observando.

 

Patterson soltou um suspiro frustrado. 

 

— Eu sei, mas eu não consigo parar de pensar que já fazem mais de 36 horas desde que ela foi pega. Isso é muito tempo, Rich. — havia um tom de desespero e preocupação em sua voz. — Sabe-se lá o que fizeram com ela. Não sabemos se ela está bem ou se está machucada. Nós nem sabemos se ela está vi--

 

 — Patterson, não ouse completar essa frase. A Tasha não é qualquer pessoa. Ela é a mulher que deu socos perfeitos naqueles homens mesmo estando bêbada. Eu aposto que a essa altura ela já deve ter quebrado o nariz de alguém. — ele disse encarando-a nos olhos e com as mãos em seus ombros. — Vamos lá, ânimo. Nada de bad vibes aqui nesse laboratório. Nós sempre conseguimos achar nossos amiguinhos quando eles se metem em encrenca. Hoje não vai ser diferente.

 

A cientista encarou o chão por alguns segundos em completo silêncio. Depois ergueu os olhos, com um sorriso discreto em seu rosto. 

 

— Você lembrou o nome dela.

 

— Às vezes acontece. — ele brincou. Antes que pudesse fazer alguma outra piada, os dois foram interrompidos pelo barulho vindo do computador de Patterson. 

 

A agente logo retornou sua atenção para a máquina.

 

— Consegui fazer as comparações dos carros que saíram da ponte nos 10 minutos seguintes ao momento que o carro que eles estavam parou no ponto cego. São três opções, um carro esportivo, uma van e um caminhão de transporte. — ela explicou enquanto apertava alguns comandos em seu computador. — Considerando o tempo de entrada, o carro com a velocidade suficiente para percorrer os 12 segundos da passagem no ponto sego até a saída da ponte, o vencedor é... — a cientista fez uma pausa, esperando a análise dos três carros. A resposta apareceu em poucos segundos na tela — a van!

 

— Ótimo trabalho, Patts. Eu disse que você conseguiria. — Rich disse animado. — Ok, agora vamos ver até onde as imagens desse carro nos leva. — ele falava enquanto digitava rapidamente.  — Nós vamos encontrar a agente Rabugenta.

••• 

Localização desconhecida | Domingo, 8:46 PM

Tasha estava começando a perder noção do tempo. Ela já não sabia se faziam 2, 5 ou 10 horas desde que ela havia sido raptada e tinha menos noção ainda de quanto tempo fazia desde que fora jogada naquele freezer. A única coisa que sabia é que o frio naquele lugar estava insuportável. Sentia-se tentada a pedir para que Camille ligasse o smartwach para checar se algum meio de conexão havia aparecido milagrosamente, mas sabia que deveria deixar o aparelho para um momento importante.

A fome que a agente sentia também denunciava que já estava naquele lugar há algum tempo. Sua última refeição havia sido uma fatia do bolo de Reade e alguns petiscos no bar. Mas Tasha não conseguia se concentrar nisso. O frio excruciante fazia com que qualquer outro sentimento fosse ofuscado. Embora ela e Camille sentissem que às vezes a temperatura no lugar oscilava, como se alguém estivesse mexendo no termostato, não deixava de ser totalmente desagradável. Apesar de ter deixado de sentir o próprio rosto horas atrás, sua dor de cabeça não a abandonava.

A única opção de distração que as duas possuíam ali era a companhia uma da outra. Para sua sorte — ou não — Camille era bem falante e tocava em um tópico novo a cada momento. No tempo que ficaram ali já haviam conversado sobre família, profissão e diversos outros assuntos aleatórios. A companheira de “cela” de Tasha já havia falado sobre seu noivo que estava na Suécia viajando a negócios e que provavelmente nem havia dado falta dela. Falou de seus dois cachorros, Bob e Cosmo e que esses sim provavelmente estavam com saudades dela, mas que sua empregada provavelmente tomaria conta deles. Comentou também a respeito de estar muito perto de realizar seu maior sonho, que era se tornar juíza. Dentre muitos outros assuntos que ajudavam Tasha a manter-se distraída, mesmo que fossem irrelevantes.

Diversas vezes a mente de Tasha divagava. Ela tinha quase certeza de que a enxaqueca que estava sentia tinha algo haver com o turbilhão de pensamentos que cruzavam sua mente. A latina não conseguia parar de pensar em tudo o que havia levado-a até aquele lugar. Tasha não parava de pensar no fato de que ela havia se colocado naquela situação. Não havia outra pessoa em quem ela pudesse despejar essa culpa, pois era inteiramente sua. Se ela não houvesse começado a beber, ela não estaria ali agora. Se não tivesse permitido-se viciar em jogos, certamente não estaria ali. Nada tirava de sua cabeça de que era tudo sua culpa.

 Embora seus pensamentos não parassem de martiriza-se, outra parte deles se direcionavam para as lembranças de acontecimentos recentes. Tasha até abriu um sorriso discreto quando os acontecimentos da noite passada cruzaram sua mente. A noite divertida que teve com seus amigos, a bebedeira saudável e ela… Desde que chegara ali Tasha não conseguia parar de pensar no último momento que compartilhara com Patterson. Ser sequestrada momentos após um dos acontecimentos mais felizes dos últimos meses parecia até pegadinha. 

A verdade era que Tasha já ansiava por um momento como aquele há tempos. Ela não se lembrava do momento específico que percebeu que estava apaixonada por sua amiga. Patterson era uma mulher brilhante, definitivamente uma das mulheres mais inteligentes que Tasha conhecia. Mas esses eram apenas alguns dos detalhes que faziam a latina sentir seu rosto se aquecer, mesmo estando dentro de um freezer. Quando Patterson retribuiu seu beijo na noite passada, Tasha sentiu-se como uma adolescente. Há tempos ela aguardava aquele momento, mas tinha medo de como sua amiga iria reagir. Ela nem conseguia se recordar da última vez que alguém foi capaz de fazê-la se sentir daquela forma. Tudo o que a agente sabia naquele momento é que mal podia espera para sair dali e encontrar a loira. Tasha podia não ter dois cachorros e um noivo aguardando por ela, mas tinha a certeza de que queria ver Patterson mais uma vez. 

Tasha nunca foi o tipo de pessoa que se abria com qualquer um, principalmente quando se tratava de desconhecidos. Então falava pouco sobre si mesma e deixava que sua companheira falasse mais. Isso não parecia ser um problema, já que ela conseguia falar por horas a fio sobre qualquer assunto. O máximo que Tasha conseguiu conversar com Camille, foi sobre seu histórico com Tilt e a casa de jogos. Ela ficou feliz por tocar nesse assunto, pois sua colega de freezer possuía informações que a agente desconhecia e que explicavam o motivo delas estarem ali. 

— Uns seis meses atrás o Octávio veio atrás de mim, pedindo para eu trabalhar em um caso para ele. Aparentemente o nome dele tinha sido citado em uma investigação da DEA. Felizmente eu consegui recusar o caso, porque não sou da área criminalística. Mas fiquei sabendo que essa investigação que começou com a Narcóticos levou a uma operação ainda maior e o Tilt perdeu tudo o que tinha. — a ruiva explicou — Eu cheguei a ouvir um boato de que ele tinha ficado louco, tinha incendiado as próprias casas de jogos e estava foragido desde então. Isso não me surpreendeu, ele sempre foi louco. O apelido já diz muito sobre ele. 

 

— Sim, e esse surto que ele teve provavelmente é o motivo de estarmos aqui. Ele está completamente alterado. —  Tasha comentou enquanto caminhava em círculos pelo estreito espaço do contêiner. 

 

O silêncio pairou sobre elas por um momento.

 

— Você acha que vão nos encontrar antes que qualquer coisa aconteça? 

 

— Tenho certeza. — Tasha respondeu mesmo não sendo 100% sincera em suas palavras. Ela não tinha certeza, mas acreditava naqueles que trabalhavam com ela. — Minha equipe é boa e esses capangas do Tilt são descuidados. Nós vamos ficar bem, só precisamos sobreviver a esse frio.

••• 

SIOC

— Como estão as coisas? — Reade questionou assim que entrou no laboratório de Patterson. Seu tom era de preocupação. 

 

— Estamos quase. — Rich disse, movendo sua atenção dos computadores para ele. — Alguma notícia do Kurt e da Jane?

 

— Sim, eles ligaram agora e estão voltando. Eles encontraram o celular dela no carro, despedaçado. Encontraram um par de sapatos também. Definitivamente era aquele carro. Mas ele não tinha placa, então obviamente não tem como dizer a quem o carro pertence. A perícia pode demorar um tempo. Estamos no escuro de novo.

 

— Não totalmente. — Patterson, que até então estava silenciosa mexendo em seu computador, se pronunciou. — Temos novidades. Conseguimos identificar o outro carro, o que eles usaram para sair da ponte com a Tasha. Era uma van. O circuito de imagens mostra que o carro saiu do estado e foi para Nova Jersey. —  a loira explicou enquanto mostrava as imagens do carro nas telas do computador. —  Mas acontece que, o carro saiu da estrada principal e foi para uma estrada onde não tem câmeras. 

 

Reade soltou um suspiro frustrado.

 

—  Calma, vai piorar. —  Rich comentou enquanto observava as explicações da loira.

 

—  Pois é. — Patterson prosseguiu. —  Segundo as imagens de satélite e outros registros, essa estrada é privatizada por diversas empresas. Só nessa extensão existem pelo menos sete fábricas de produtos agrícolas. 

 

— Não tem como você conseguir nenhuma das imagens dessa estrada ou das empresas? 

 

—  Não. Acredite, eu tentei. Mas aparentemente essas empresas tem um sistema de imagens que é compartilhado apenas entre eles. E nós não podemos ir até lá sem informações concretas. Essas fábricas são enormes. Demorariam dias até vasculharmos tudo. — ela não conseguia fingir a frustração em sua voz 

 

 — Vamos continuar trabalhando com o que temos. Busque pelos nomes dos proprietários de cada fábrica. Alguma coisa vai aparecer. — Reade disse e se retirou da sala.

•••

 

Localização desconhecida | Segunda-Feira 12h34

O corpo de Tasha já não estava aguentando a exaustão a qual estava sendo exposto. De todas as torturas que ela já havia sido submetida enquanto agente, ficar presa em um freezer definitivamente ocupava uma posição alta em sua lista de “5 Piores Momentos da Carreira”. Ela sabia disso porque teve tempo para repensar todos os momentos e criar a lista enquanto estava ali. 

Espancamento e afogamento foram experiências que a latina tivera o desprazer de vivenciar, mas isso não minimizava a sensação de sentir tanto frio a ponto de ter a impressão de que milhares de agulhas penetravam sua pele. As roupas que ela estava usando pareciam não ter utilidade alguma. Quando escolhera vestir uma calça, uma blusa e sua jaqueta de couro favorita para a confraternização com seus amigos, Tasha não poderia imaginar que se arrependeria profundamente da escolha. Estar descalça tornava tudo ainda pior. Ela nem conseguia lembrar em qual momento perdera seu scarpin de saltos baixos. Lembrava-se de ter tirado os mesmos em solidariedade a Patterson, momentos antes delas correrem descalças e de mãos dadas pelas ruas de NY sob a forte chuva — a lembrança levava um suave sorriso ao seu rosto. Aqueles foram momentos antes de ter sido sequestrada também. Pensando melhor, Tasha tinha quase certeza que perdera seus sapatos em algum momento entre o instante que fora surpreendida na rua e levada àquele lugar.

Tasha desviou seus olhos e devaneios de seus pés e olhou para sua companheira que agora estava encolhida ao seu lado, Camille. As duas resolveram ficar o mais próximo possível para compartilhar calor — o que, na opinião da morena, não ajudou muito.  O frio parecia não atrapalhar os sonhos da ruiva. Tasha invejava-a. Ficar sozinha com os próprios pensamentos definitivamente não estava sendo divertido.

 Não ter noção de sua localização também enlouquecia a agente. Ela não fazia ideia de que parte da cidade estava. Na verdade, nem mesmo possuía certeza se ainda estava em NY. A única certeza que tinha era de que se tratava de uma fábrica abandonada. Tasha não tivera tempo de estudar o espaço, mas podia afirmar com certeza que aquela era uma fábrica de alimentos. A julgar pelo estado do local que estava quando acordou e por onde percorreu, teorizava de que a fábrica não estava abandonada há muito tempo. Estava em bom estado, como se houvesse sido esvaziada recentemente.

Qualquer pensamento entediado que Tasha estava prestes a ter foi interrompido por um barulho vindo do lado externo do contêiner. A agente logo cuidou de acordar Camille e as duas se puseram de pé. Alguém estava mexendo na porta. 

— Fica atrás de mim. — Tasha disse e a ruiva seguiu a ordem.

— O que você acha que eles querem? — Camille sussurrou.

— Acho que chegou a hora do jogo. Vamos agir normalmente. Se eu fizer alguma coisa estranha, vai na onda. — a latina respondeu no mesmo tom. — Não faça nada estúpido. 

Camille estava pronta pare responder, mas foi interrompida quando a porta do freezer se abriu. Tasha se posicionou de maneira defensiva, mesmo estando em total desvantagem. Tilt fora buscá-las pessoalmente junto de mais dois capangas. 

— Eu fiquei sabendo que você deu trabalho para meu garoto. Ele não gostou nem um pouco do que você fez com o nariz dele. — ele comentou, escondido entre seus capangas. 

Tasha desviou seu olhar para o capanga do nariz quebrado. Ela havia feito um bom trabalho. 

— Ele mereceu. — ela respondeu de forma ríspida.

Tilt soltou uma risada irônica.

— Bem, eu espero que você tenha gostado da estadia em seu aposento refrescante e do leve choque que recebeu de bônus. — ele falou e não deu tempo de resposta para Tasha. — Eu vim buscar vocês para o grande momento. Por favor, meninas, se comportem. Os outros convidados estão esperando por vocês.  Deem esse prazer ao velho que vos fala e me deixem ver suas estratégias de jogo pela última vez. Podemos? 

Nenhuma das duas respondeu. Tilt fez um leve sinal e os dois capangas foram até Tasha e Camille para imobilizá-las com fitas novamente. É claro que o capanga que foi até Tasha era o mesmo que havia tido seu nariz deformado por ela momentos atrás. Ela podia dizer que ele não gostara nem um pouco, já que ele pegou seu pulso de uma forma muito mais agressiva do que ela observara o outro capanga fazer com Camille. 

De forma mais delicada — comparando-se às vezes em que Tasha foi arrastada de um lugar para o outro mais de uma vez — as duas foram levadas até o local do “grande momento”. Como estava andando e não sendo arrastada chão afora, a agente teve uma oportunidade melhor de observar o espaço onde estava. Julgando pelos aparatos ainda espalhados pelo local, Tasha consegui chegar à conclusão de que se tratava de um frigorífico e não uma fábrica como havia teorizado. E definitivamente havia sido fechada recentemente, pois ainda haviam máquinas e cartazes espalhados por todo o ambiente.

Elas foram levadas à um lugar espaçoso, que parecia um galpão. As paredes e o chão eram brancos, assim como todos os outros cômodos daquele lugar. Mas algo tornava aquele lugar diferente do que provavelmente era alguns meses ou dias atrás. Uma mesa redonda montada para o jogo, um minibar e algumas lâmpadas de neon destoavam o ambiente. Tilt realmente estava falando sério sobre essa despedida. Ele também falava sério quando se referia aos convidados que estavam esperando. Haviam outras pessoas esperando por elas. Três homens e uma mulher de idades diferenciadas. Entretanto, todos estavam na mesma situação que eles. Suas mãos estavam atadas, seus rostos estavam avermelhados e alguns possuíam feridas causadas pelo frio. Tasha tinha certeza de que seu rosto possuía pelo menos uma também.

 Os olhos atentos de Tasha não paravam de percorrer o ambiente. Havia apenas uma saída, que era a mesma que haviam utilizado para entrar. Havia um homem bem-vestido perto da mesa, preparando as cartas; era o dealer. Cuidando do bar, outro homem. Esse aparentava ser mais novo do que o dealer. Tasha também não deixou de analisar os seguranças, claro. Além daqueles três que estavam levando-as até a mesa, haviam outros quatro. Esses estavam armados. Tilt claramente havia mudado seu modus operandi. 

— Senhoras e senhores, sejam bem-vindos a minha despedida de cidadão americano. — o homem de meia-idade, que agora vestia um terno horroroso, exclamou. Tasha revirou seus olhos. — Fiquem à vontade. Bem, talvez não tão à vontade, já que não vou poder tirar as fitas em seus pulsos. — Tilt soltou uma risada e seus capangas fizeram o mesmo. — Espero que vocês entendam que é para o meu bem. Nós temos algumas pessoas nada pacíficas entre nós, — com essa fala, Tilt lançou um olhar para Tasha, que instantaneamente arqueou uma de suas sobrancelhas para ele. — mas vocês estão aqui por seu potencial de estratégia com as cartas e eu acredito que podem usar um pouco desse intelecto para perceberem quando estão ou não em desvantagem. — ele piscou para ela antes de gritar: — Que os jogos comecem!

Dito isso, seus capangas levaram os ‘jogadores’ para tomar assento à mesa redonda de tamanho médio. Tasha sentou-se ao lado de Camille e de um homem que possivelmente era o mais jovem ali. Ele possuía no máximo 25 anos. A agente não pôde deixar de questionar mentalmente a razão que o levou até aquele lugar. À sua frente, sentava uma mulher mais madura, porém não muito. Ela tinha cabelos cacheados e presos em um rabo de cavalo. À sua direita estava um homem negro de cabelos e barba grisalhos, vestindo uma blusa social; e à sua esquerda sentava outro homem, com um estilo mais informal, de cabelos lisos e vestindo uma regata. Tasha tinha certeza de que o freezer não tinha sido uma experiência fácil para ele. Todos pareciam estar extremamente exaustos. Ela precisava fazer algo para tirá-los daquele lugar.

— Como eu não tive tempo de enviar um convite formal para vocês, tenho certeza que ninguém trouxe dinheiro. Então eu mesmo vou emprestar uma quantia pequena de dinheiro para cada um e nós vamos jogar três partidas. — ele explicou e fez uma pausa dramática — E agora vem a melhor parte: eu e meus meninos estaremos apostando em vocês. Quem perder, volta para o freezer. Quem ganhar também volta para o freezer, mas talvez as coisas sejam mais fáceis. 

 

Absolutamente ninguém presente na mesa esboçou uma reação positiva. A maioria dos 'jogadores' agravaram seus olhares preocupados. Tasha virou-se para Camille, que demonstrava desespero em seus olhos, e sinalizou discretamente para que ela se acalmasse. A latina não sabia o que fazer, mas sabia que precisava encontrar um momento para intervir.

 

— Qual foi, Tilt? — o homem mais novo se pronunciou de forma indignada e calma ao mesmo tempo. Todos os olhos se voltaram a ele. — Você disse que seria só um jogo e agora você está dizendo que nós nem vamos sair daqui? Eu não te devo mais nada. 

 

— E é aí que você se engana, meu pupilo.  Eu nunca disse que seria só um jogo. — Tilt explicou enquanto se aproximava dele o rosto do mesmo. — Eu disse que seria meu jogo de despedida. Isso significa a despedida de todos vocês. — o homem sussurrou e em seguida soltou uma de suas risadas que faziam o sangue de Tasha ferver.

  A fala de Tilt provocou pânico na mesa. Todos começaram a falar ao mesmo tempo. A mulher sentada à sua frente falava sobre os filhos que estavam sozinhos em casa e o homem ao seu lado reclamava que não tinha tempo para isso. Um dos outros homens gritava que ninguém ali tinha culpa por ele estar maluco e se sentir sozinho. Corajoso, Tasha pensou. Ela permanecia observando. Tilt também havia entrado na discussão. Ele estava surpreendentemente calmo e rindo dos comentários, ao contrário dos outros jogadores. A agente ficou surpresa que Camille resolvera não falar nada e também permanecia em silêncio. Aquele era o momento perfeito. 

— O seu smartwatch. Confere se agora tem sinal. — a agente sussurrou para a ruiva discretamente. O caos ainda acontecia ao redor delas e Tasha estava surpresa de que os capangas de Tilt ainda não haviam interferido ou dado um tiro para o alto. 

Discretamente Camille levou seus braços para baixo da mesa. Tasha permanecia com a cabeça erguida, fingindo observar o que acontecia ao redor. Ninguém parecia perceber o que estava acontecendo. Os capangas eram realmente muito estúpidos. A agente sentiu um leve toque da perna de Camille contra as suas. Quando inclinou seus olhos, viu uma das mãos da ruiva fazendo um sinal positivo. Ela olhou para o relógio. Havia bateria e sinal. Finalmente uma notícia boa. Tasha aproximou seu corpo de Camille discretamente. As mãos da ruiva estavam atadas, o que tornava impossível que ela digitasse algo na tela minúscula de seu relógio. Com muito cuidado a latina levou suas mãos, também atadas, até o relógio e começou a digitar o primeiro número que veio a sua mente: o do celular de Reade. Após digitar e apertar o botão de chamada desajeitadamente, Tasha trocou um olhar rápido com Camille e voltou a sua posição inicial de observadora. Ela sentia-se como uma aluna de ensino fundamental colando pela primeira vez e fazendo de tudo para não ser pega pelo olhar da professora.

Após alguns segundos, a agente voltou seu olhar para o relógio e viu que a ligação não havia sido completada. Ninguém havia atendido. A latina não desistiu, discou novamente. Dessa vez a ligação não demorou muito para ser atendida. Mas agora era tarde. Quando Tasha e Camille ergueram seus olhos, perceberam um par de olhos sobre elas. Era um dos seguranças de Tilt, o do nariz quebrado. Ele rapidamente foi em direção às duas e Tasha teve que pensar rápido. 

— Fala com eles. Fica atrás de mim. —  ela disse para a ruiva, enquanto se levantava da cadeira que estava sentada. Tudo aconteceu em questão de segundos. Os que antes discutiam, pararam e agora prestavam atenção no que acontecia. Quando o brutamontes se aproximou das duas, com a intenção de ir até Camille, Tasha pôs-se a frente dele e tentou repetir o golpe em seu rosto, mas ele foi mais espero e desviou. Na mesma sequência, a agente ergueu sua perna direita para acertá-lo com um chute. O golpe foi em cheio e foi o momento perfeito para que ela conseguisse uma coisa importante: a arma que o capanga carregava desleixadamente em sua cintura. Ela não pensou duas vezes antes de atirar no homem do nariz quebrado e apontar a arma para Tilt em seguida. A ação dela fez com que todos os outros capangas que estavam prestes a ir em sua direção ficarem parados.

— Se vocês se mexerem, eu atiro nele. — ela gritou para os capangas que a cercavam. Tilt ainda estava sob sua mira. 

Tasha rapidamente desviou seu olhar para buscar por Camille. Encontrou-a debaixo da mesa, sussurrando algo para o relógio. Aparentemente estava conseguindo falar com Reade. Entretanto, deixar de prestar atenção ao seu redor foi seu maior erro. Mesmo tendo Tilt e os seus capangas sobre sua visão, a agente descuidou-se e ficou de costas para o barman. Quando percebeu, o homem estava saltando em sua direção. Em seguida, os dois atingiram o chão. Tasha não soltou a arma e a usou para golpear a cabeça do homem que agora estava por cima dela. Por estar com as mãos imobilizadas, o golpe não fora tão forte quanto seria em situações normais. Antes que pudesse pensar em mais alguma coisa, estava sendo atingida por um forte soco em seu rosto. Tasha ficara levemente desnorteada e largou a arma. Isso foi suficiente para que o barman e mais um capanga pudessem a imobilizar.  

— Uau, você não está para brincadeira mesmo. — ela ouviu Tilt dizer enquanto outro capanga ia até à mesa e puxava Camille debaixo da mesma de forma violenta. Ele logo tratou de arrancar o relógio de seu pulso, jogá-lo no chão e o quebrar em vários pedaços.

— A vadia ligou para alguém, chefe. — o capanga informou enquanto pressionava Camille contra o chão de forma violenta. 

Nesse momento Tasha foi obrigada a parar para analisar a situação. Havia uma arma apontada para a sua cabeça, outra para a cabeça de Camille e pelo menos três outros capangas apontavam suas armas para aqueles que estavam na mesa, completamente aterrorizados. Tasha sabia que era capaz de se soltar do capanga que a imobilizava e conseguiria chegar a tempo no homem que apontava a arma para Camille. Mas ela não poderia garantir que a ruiva ou qualquer outra pessoa ali não seria ferida, então resolveu ficar quieta. Sua prioridade era sair com todos os vivos daquele lugar.

— Natasha, Natasha, Natasha... Quando penso que não, você ainda consegue me surpreender. Eu acho que te subestimei. — Tilt dizia enquanto se aproximava da morena. — Você estragou a minha festa! — ele gritou no rosto dela e fez com que Tasha sentisse seu sangue ferver novamente. Por questão de segundos ela esqueceu totalmente sua análise de segundos atrás de que deveria manter a calma. Quando percebeu, havia cuspido no rosto de Tilt. O capanga que bloqueava seus movimentos, agora pressionava seu braço em volta do pescoço da agente com mais força. Tilt limpou o próprio rosto e voltou a se aproximar de Tasha. Dessa vez, ele agarrou o rosto dela com uma de suas mãos e sussurrou contra a face dela: — Eu sabia que você ia aprontar alguma coisa, só não esperava que seria tão rápido. Pensei que você seria mais inteligente e escolheria poupar sua vida.  Agora você vai encarar as consequências dessa sua atitude. 

Nesse momento, um dos capangas se aproximou de Tilt e sussurrou algo em seu ouvido. Pela leitura labial, era como se ele estivesse apressando seu patrão. Eles estavam preocupados com a ligação. O capanga terminou sua fala, se afastou de seu patrão e saiu do galpão. Algo estava acontecendo. Tilt, que havia soltado o rosto de Tasha, ficou paralisado por alguns segundos. Ela conseguiu identificar com facilidade que ele estava prestes a surtar. 

Em questão de segundos Tilt foi até a bancada do bar próximo a ele e começou a jogar os objetos que estavam sobre a mesma no chão. O barulho das garrafas e dos copos se despedaçando ocupou o galpão. Ele estava completamente tomado pelo ódio. Nesse momento, Tasha temeu pela vida daqueles reféns que estavam totalmente a mercê de um homem desestabilizado. Ela fechou seus olhos e respirou fundo. Quando os abriu, Tilt havia terminado seu acesso de raiva e estava próximo ao seu rosto novamente.

— Você tem sorte que eu não suporto sangue. Eu poderia matar vocês nesse exato momento com as minhas próprias mãos. — ele esbravejou. — Mas isso não significa que você não vai morrer hoje. Eu vou antecipar minha despedida desse país e todos vocês vão voltar para o freezer. — seu tom de voz mudou em segundos. Era como se ele fosse um robô e alguém estivesse o controlando. Ele fez o anúncio como se estivesse apresentando uma ideia fantástica. — Vocês serão deixados para serem esquecidos aí. Enquanto eu vou curtir minha aposentadoria bem longe do frio. 

Tasha já não sabia como reagir. Aquela era uma situação pior do que lidar com bombas prestes a explodir. Tilt era totalmente instável. Qualquer reação de Tasha poderia desencadear consequências nada amigáveis. Ela manteve-se quieta. 

— Levem eles. Deixa essa aqui comigo. — Tilt anunciou e Tasha observou os capangas levarem todos os reféns em direção ao mesmo lugar de onde os contêineres estavam. Camille também foi carregada. A agente seguiu a ruiva com o olhar até ela desaparecer porta afora. Antes de ser levada, Camille acenou discretamente com a cabeça para Tasha. Significava que ela conseguira conversar com alguém durante os breves segundos de ligação. Tasha estava mais aliviada. Ao menos na medida do possível. Havia um brutamontes a enforcando, uma arma apontada para sua cabeça, sua vida e a de inocentes dependia de um lunático… mas ela estava tranquila. Acreditava em sua equipe.   

Quando todos os reféns foram levados para fora do galpão, restaram apenas Tasha, Tilt e mais dois capangas. Um era o mesmo que ainda permanecia a imobilizando, o outro mantinha-se distante e observava tudo.

— Espero que você não seja burra suficiente a ponto de cogitar fazer alguma coisa de novo. Eu realmente tinha o mínimo de consideração por você, Natasha. — ele sussurrou, novamente próximo ao rosto da agente. Após alguns segundos observando os olhos da mesma, ele se afastou e fez um sinal para seu capanga. — Dá uma lição nela, Kirk.

Bastaram cinco palavras de ordem do lunático para que questão de segundos o capanga que estava apenas observando viesse para cima de Tasha. Ele começou a distribuir socos por todo seu corpo. Seu abdômen e rosto eram os principais alvos. A agente gritava de dor enquanto ouvia a risada de Tilt e do homem que a segurava para que ela não revidasse. Após mais alguns socos, Tasha começou a sentir o forte gosto ferruginoso surgir em sua boca. O sangue escorria por seu rosto e sua boca enquanto o capanga desferia socos durante o período que pareceu uma eternidade.

Zapata não ouviu, mas um assovio baixo de Tilt foi o suficiente para que o homem interrompesse sua sequência de socos. O outro homem, que antes a segurava, a largou segundos depois. Tasha estava completamente sem forças. Ela era incapaz de aguentar o peso de seu próprio corpo. Suas pernas falharam e ela logo desmoronou sobre o chão. Sua visão estava turva e um zunido alto tomava conta de seu ouvido direito. Ela cuspiu uma quantidade considerável de sangue no chão e seu corpo estava completamente tomado pela dor.

Octávio se agachou calmamente próximo a Tasha, enquanto ela ainda tentava recuperar seu fôlego e seus sentidos.

— Espero que isso tenha sido suficiente e que você tenha aprendido sua lição. — o homem falou calmamente, carregando aquele sorriso cínico de sempre. — Meninos, levem ela.

Mais uma vez a ordem de Tilt foi cumprida de forma imediata por seus capangas. Os dois se aproximaram da latina, que ainda estava caída no chão, e a agarraram pelos braços. Tasha já estava esgotada. Não possuía forças para permanecer em pé. Deixou-se ser carregada de forma nada gentil fábrica adentro mais uma vez. Tilt os seguia. Assoviava de forma alegre e irritante. Nem a audição possivelmente danificada de Tasha fora capaz de impedi-la de ouvir o som vindo do homem e muito menos de inibir o sentimento total de ódio que a consumia. 

Como esperado, eles retornaram até a ala de contêineres. Os outros capangas estavam fechando uma das portas quando eles chegaram no enorme corredor. Não havia sinal dos reféns, muito menos de Camille.

Enquanto os dois homens seguravam Tasha, outro abriu a porta do freezer. Dessa vez ele estava vazio. Mais uma vez durante aquele dia, Tasha foi arremessada no chão. Quando seu corpo entrou em contato com a gélida superfície do contêiner, a agente soltou um gemido de dor. 

— Aproveite seus aposentos, Natasha. — Tilt disse enquanto observava o sofrimento da agente da porta do freezer, junto aos seus capangas. — É aqui que você vai viver sua última hora de vida. Você está vendo isso aqui? — Tasha levou seu olhar repleto de ódio para ele. O homem de meia-idade segurava um controle em sua mão. — Esse termostato aqui é o que vai decidir se você vai e seus amiguinhos que estão aqui perto vão morrer de forma rápida ou devagar. E o melhor: eu vou escolher isso enquanto embarco rumo à minha aposentadoria. Eu amo o poder da tecnologia! — ele bradou. — Espero que você curta seus últimos momentos e tenha algum tempo para se arrepender por ter estragado meu jogo e minha despedida. 

Durante um momento de raiva, Tasha concentrou suas forças e se levantou do chão. Ela tentou correr até Tilt. Queria esganá-lo com suas próprias mãos. Entretanto, observou a porta se fechar antes mesmo que pudesse chegar até ela. Ela ouviu a risada de Tilt vindo do lado de fora do contêiner, junto do barulho das tranças da porta. Ali estava ela novamente, deixada para morrer.

•••

SIOC

         A cada minuto que se passava, Patterson ficava mais apreensiva. Enquanto encarava as dezenas de arquivos dos donos das fábricas junto a Rich, ela já não era mais capaz de controlar sua ansiedade. Há tempos um caso não mexia com ela de forma tão intensa. Não era a primeira vez que alguém da equipe estava sob ameaça, tampouco a primeira vez que Tasha se encontrava em perigo. Mas algo nisso tudo conseguia ser diferente. Era a primeira vez que um deles havia sido sequestrado por questões que aparentemente não possuíam ligações com algum caso. Essa situação era diferente. E isso era o mais preocupante. Isso fazia com que Patterson se sentisse tão angustiada. Tasha, sua colega de trabalho, melhor amiga e... amiga estava desaparecida há dois dias e o máximo que a cientista possuía eram informações inconclusivas sobre a localização da mesma.

— A maioria dos registros dessas fábricas possuem irregularidades sanitárias e quase todas também mostram evidências claras de maus tratos aos animais. — Rich comentou ao seu lado enquanto analisava os arquivos. — Mas eu realmente não vejo como isso pode ter alguma relação com a Tasha.

— Estamos deixando alguma coisa passar. — Patterson reclamou antes de soltar um grunido de raiva. Nesse momento, foi como se ela tivesse chagado ao seu limite. A agente sentiu lágrimas se formarem nos seus olhos e levou suas mãos até seu rosto. Ela respirou fundo na intenção de se acalmar, porém, o efeito foi contrário. As lágrimas não paravam de rolar por seu rosto. 

         Rich observou tudo de longe, levemente desesperado e sem saber como reagir. Além dos dois, haviam outras três pessoas no laboratório. O hacker percebeu que a atenção de todos havia se voltado para a agente que chorava no canto da sala e ele logo se encarregou de expulsar silenciosamente todos dali. Ninguém questionou, abandonaram seus afazeres e saíram da sala imediatamente. Agora que estavam sozinhos, Rich se aproximou da loira.

— Ei, Pattycake. — o homem chamou baixo ao encostar sua mão desajeitadamente no ombro de sua amiga. Ela manteve seu olhar abaixado. — Eu entendo que você esteja estressada por conta disso. Confesso que estou tenso com tantos acontecimentos e tão poucas pistas úteis também. Mas nós não podemos parar agora. — ele disse e não conseguiu reação alguma da loira. — A agente Rabugenta está esperando por nós em algum lugar.

         O breve silêncio que se instalou entre eles, logo foi quebrado pela discreta risada de Patterson. Ainda havia uma lágrima escorrendo por seu rosto, mas o sorriso estava lá.

— De onde você tira tantos apelidos para ela? — a loira perguntou enquanto secava o próprio rosto delicadamente. — A Tasha ainda vai te matar quando descobrir eles.

— Você não conhece nem metade dos apelidos que eu já criei para ela. — Rich disse enquanto ia rapidamente até o outro canto do laboratório buscar um copo d’água para sua amiga. — Agente Cara Fechada, Rabugenta e Ranheta são só alguns. — ele disse após entregar o copo para a mesma. Ela sorriu novamente das palavras e o agradeceu pela água, antes de aceitá-lo. A reação dela o satisfez. Sua amiga poderia não estar extremamente feliz, mas estava melhor que estava alguns momentos atrás.

— Obrigada, Rich. — a loira agradeceu. — Você não tinha obrigação de fazer isso.

— Eu sei. — ele respondeu de sua maneira convencionalmente convencida, fazendo com que sua amiga revirasse os olhos e desse uma risada. — Por isso eu sei que quando tudo isso acabar você vai me contar tudo o que está acontecendo entre você e a Rabugenta. — Rich completou em um tom debochado.

         Patterson sentiu seu rosto ficar vermelho imediatamente e nem sabia como esconder sua reação. Entretanto, antes que pudesse pensar em alguma maneira de se desvencilhar daquele assunto, foi surpreendida pela entrada repentina de Reade em seu laboratório.

         O agente estava agitado e segurava seu celular.

— É ela. Rastreia isso. — ele disse ofegante e Patterson logo correu para seu computador, seguida de Rich. O hacker logo se apressou para conectar o celular de Reade a um dos computadores remotamente, para que pudessem ouvir a chamada com mais clareza.

Se vocês se mexerem, eu atiro nele.” uma voz feminina anunciou pelo telefone. A voz estava distante, mas era a de Tasha.

— É ela! — Patterson sussurrou de forma animada enquanto aguardava seu computador conectar com o sistema de rastreio de ligações. Por algum motivo o coração da loira estava acelerado. Ela moveu seus dedos rapidamente pelo computador, dando início a triangulação do sinal da chamada.

— Você ainda está me ouvindo? — Reade perguntou, quando um silêncio se instalou na ligação. — Quem mais está aí?

         O silêncio foi preenchido pelo som do que pareciam duas pessoas lutando. Um homem gritou e sons de socos foram escutados. Reade, Tasha e Rich se entreolharam preocupados ao ouvir mais dois gritos. O computador ainda triangulava a chamada.

Uau, você não está para brincadeira mesmo.” Foi a vez de uma voz masculina anunciar. Em seguida escutou-se o gemido de dor de uma mulher e o barulho de algo caindo. Como se o aparelho que realizava a chamada tivesse sido jogado no chão.  A partir desse momento tudo o que se ouviu foi silêncio.

— A chamada caiu. — Reade após checar seu celular. — Você conseguiu rastrear?

— Sim. — Patterson anunciou. — Naquela área das fábricas existem duas torres telefônicas. Uma fica na parte sul e outra na parte oposta. O tempo da chamada foi muito curto, não consegui uma localização precisa. Mas deu para calcular que a chamada foi feita de algum lugar na área norte. — ela explicava enquanto mexia rapidamente em seu computador. — Então se formos isolar essa área, — a loira fez uma pausa para esperar o processamento de seu computador. — sobram apenas quatro fábricas.

— Ei, eu consegui algo também. Consegui a gravação completa da ligação. — Rich anunciou enquanto digitava rapidamente do outro computador. Nesse momento Jane e Kurt adentraram o laboratório, antes que eles pudessem se pronunciar ou fazer algum questionamento, Rich reproduziu a chamada em alto volume. Todos ficaram em silêncio para prestar atenção.

Alô?” A voz de Reade iniciou a chamada.

Diversas vozes foram ouvidas ao fundo, nenhuma se parecia com a de Tasha.

“Todo mundo aqui tem uma vida, Tilt. Não é justo que você simplesmente queira acabar com tudo só porque está indo embora.” Uma voz masculina irreconhecível exclamou, seguida por muitas outras. Era uma discussão acalorada que se estendeu por alguns segundos.

“Fala com eles. Fica atrás de mim.” A voz de Tasha pôde ser ouvida e a discussão que acontecia sessou. Em seguida, o som do que se assemelhava a uma luta foi ouvida no fundo.

Tasha? É você?” Reade perguntou.

“Não é a Tasha, é a Camille. Não tenho tempo para explicar. Mas nós estamos em uma fábrica abandonada.” uma mulher explicou de forma apressada. “Aqui tem muitos freezers e os capangas do Tilt estão nos mantendo neles.” a voz feminina completou de forma rápida, atropelando as próprias palavras. “Ele vai fugir. Disse que vai sair do país, vocês---”

Se vocês se mexerem, eu atiro nele.” A voz de Tasha pôde ser ouvida no fundo.

“Você ainda está me ouvindo? Quem mais está aí?” Silêncio seguido pelo grito de uma mulher. Era a mulher que antes falava.

Uau, você não está para brincadeira mesmo.” a sentença vinda da voz masculina foi a última registrada antes de a ligação ser interrompida.

— O que aconteceu? — Jane perguntou confusa. — Isso foi agora?

— Sim. Nesse exato momento. Eu recebi uma ligação com o DDD de Nova Jersey no meu número pessoal e pensei que fosse trote. Mas é a Tasha, com certeza é a voz dela no fundo.  — Reade explicou.

— Eu consegui mais uma coisa. — Patterson, que não havia desviado seus olhos do computador, anunciou e atenção de todos se voltou a ela. — Das sete fábricas que ficam naquela região, três são frigoríficos e isso explica o freezer que essa Camille mencionou. E na parte oeste, que é de onde essa ligação veio, existe só um. Ele foi fechado um mês atrás e o proprietário é Oliver Bloltorf está morto. Mas Oliver tinha um irmão chamado Octávio, que também é dono de negócios. Ele é proprietário de dezenas de bares aqui e em Jersey. — a loira explicava rápido, sem se importar se eles estavam acompanhando sua linha de raciocínio ou não. — Mas no mesmo mês que o frigorífico fechou, o FBI de Jersey começou a investigar os irmãos Bloltorf sobre envolvimento com organização de jogos clandestinos e tráfico de drogas. 

— Esse Tilt que a mulher da ligação falou, só pode ser Octávio. No mundo dos jogos, ‘tilt’ significa uma pessoa com um emocional abalado. — Kurt acrescentou.

—  Gente, más notícias. — Rich anunciou do outro computador. — Os bens dos Bloltorf podem ter sido apreendidos, mas um dos helicópteros deles está com voo marcado para daqui a 5 minutos. O trajeto é de Jersey para o Aeroporto de NY. 

— Certo. —  Reade se pronunciou. — Eu e Patterson vamos com uma equipe para o frigorífico. Jane e Kurt, vocês vão com outra equipe para o aeroporto. Rich, você fica para nos dar apoio caso precisemos. — todos concordaram com a fala do diretor e logo se apressaram para seguir o que foi falado. 

•••

Frigorífico Bloltorf, Nova Jersey 

Assim que a porta do contêiner se fechou contra sua face, Tasha tentou abri-la de maneira desajeitada. Ela tentou chutar e jogar seu próprio corpo contra a dura e enorme peça de metal, mas algum tempo depois percebeu que só estava agravando seus machucados. A agente encostou suas costas contra a gelada porta e sentou-se no chão. Tasha já não conseguia conter as lágrimas que escaparam de seus olhos e iniciavam uma disputa de espaço com o sangue que também escorria por sua face. Suas esperanças estavam começando a se dissipar.

Tasha tinha certeza de que todos os policiais, detetives e outros de áreas semelhantes, já haviam imaginado a própria morte pelo menos uma vez. Ela não era diferente. Desde o início, quando ainda trabalhava como detetive no Departamento de Polícia de NY, a latina tinha certeza de que morreria por conta de uma bala. Sempre que pensava na morte, a imagem de uma emboscada vinha a sua mente. Era sempre algo relacionado a um tiroteio. Uma bala atravessando seus órgãos de forma desastrosa a ponto de fazê-la perder sangue até desfalecer. Essa era sua idealização de morte justa para a carreira que escolhera seguir. Ela já havia pensado em outras formas também. Envenenamento e até mesmo explosão já haviam passado por sua mente. Morte por congelamento, por outro lado, definitivamente não fazia parte de seus planos. 

A situação estava ficando insuportável ao ponto de que a agente já não conseguia ter pensamentos positivos. Ela já não sentia nada. Literalmente. Não sentia mais as partes de seu corpo, era como se estivesse sob efeito de um anestésico. Nem a dor do ferimento seu rosto era sentida. A única coisa que não deixava de ser percebida era o maldito frio. Alguns minutos se passaram desde que ela fora jogada ali e uma fina camada de gelo havia se formado sobre sua jaqueta. Quando Tasha percebera isso, entrou em um estado leve de desespero. Ela estava cada vez mais convencida de que morreria ali.

Saber que Camille havia conseguido falar com Reade era bom, mas não saber o que foi dito exatamente era torturador. Tasha não sabia se a advogada havia dado informações precisas para seu amigo. Tudo aconteceu muito rápido. Era muito provável que Camille não tivesse tido a oportunidade de passar dados úteis sobre a localização delas. Até porque as duas não sabiam onde estavam. 

Na situação que se encontrava, Zapata obrigava-se a afastar os pensamentos negativos que pairavam sua mente com frequência. Ela precisava fazer um esforço para acreditar que sairia bem e viva daquele lugar, assim como os outros. Mesmo que fosse difícil. A agente confiava em seus amigos e na sua equipe. Ela sabia que estavam juntos há muito tempo e já possuíam um histórico de casos muito mais complicados do que toda essa situação. Tasha acreditava em cada membro de sua equipe. Ela acreditava sua vida a eles. 

Havia uma pessoa em especial que não saía de sua mente e impedia que os pensamentos negativos se intensificassem. 

Em certo momento, Tasha começou a sentir-se mais fraca e quando fechou seus olhos, pôde enxergar Patterson. Ela sabia que isso era o impiedoso frio mexendo como sua mente. A agente tentou resistir, mas não conseguia deixar de imaginar sua melhor amiga ali ao seu lado. Não que esse fosse o seu desejo. Tasha definitivamente não desejava que Patterson estivesse ali, correndo o risco que a latina corria naquele momento. Mas ela não podia negar que, se aquele fosse seu último momento de vida, seria muito bom ter uma última oportunidade de ver a mulher que tanto admirava e não deixava seus pensamentos.

Julgando pela sensação térmica, eu diria que estamos muitos graus abaixo de zero aqui. — Tasha conseguiu projetar com clareza a fala da loira em sua mente quando fechou seus olhos. — E considerando a roupa que você está usando, eu diria que as chances de você aguentar é de pouco menos do que uma hora. Sem contar esse ferimento sangrando na sua testa. Eu sinto muito, Tash...

A latina tornou a abrir os olhos e se deparou com o vazio contêiner. Sua mente estava a torturando. As palavras imaginadas — formadas por seu próprio subconsciente, claro — poderiam ser imaginadas, mas não deixavam de ser reais. Ela já estava certa que não duraria muito. A agente olhou ao seu redor. O chão e as paredes de metal estavam cobertos por uma espessa crosta de gelo. A temperatura estava bem mais baixa do que esteve enquanto ficara presa durante as últimas horas. Ela realmente foi largada para morrer ali. 

Não muito tempo depois, Tasha começou a se sentir extremamente fraca. Já sentia-se incapaz de controlar o próprio corpo. Quando percebeu, estava deitada no gélido chão. Ela se sentia mais lenta. Os únicos movimentos de seu corpo eram o tremor de seu queixo e de suas mãos, além de sua respiração. A agente não precisava ter conhecimentos avançados em medicina para perceber que seu corpo não estava agindo corretamente. Ela começou a perceber a desaceleração de seus próprios batimentos e sua respiração ficar mais espaçada. Já não existiam forças para manter os próprios olhos abertos. Suas pálpebras se fecharam e abriram algumas vezes. Antes que se fechassem pela última vez, Tasha não pôde deixar de perceber a fina camada de gelo que haviam se formado em seus cílios. Antes de ficar inconsciente, Tasha não pode deixar de pensar no fato de ela mesma era culpada pelo que estava acontecendo. Sua impulsividade havia colocado sua vida e a de outros em perigo. Ela estava colhendo o que havia plantado. Tristeza e arrependimento foram seus últimos sentimentos antes que seus olhos se fechassem por tempo indeterminado.

 


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Notas finais do capítulo

Talvez você esteja querendo me xingar, talvez esteja triste... Que tal deixar um comentário sobre isso? :)



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