Bacchikoi escrita por Lunnarea


Capítulo 4
3º Capítulo — Petricor


Notas iniciais do capítulo

É... e mais outro glossário para este capítulo, cada vez tem mais palavras, mas aqui está:

1 - Primeiro Andar: No Japão é bem comum a contagem dos andares incluir o térreo como o primeiro andar.

2 - Kotatsu: É como se fosse uma mesa, onde tem um cobertor grosso posto sob o tampo para evitar que o calor, gerado por um aquecedor acoplado no móvel, escape.

3 - Misoshiru: É o prato básico da culinária japonesa, uma sopa feita de soja fermentada, que é comida tanto no café da manhã, no almoço e no jantar.

4 - Itadakimasu: Uma expressão japonesa usada em amplas situações mas, basicamente, é um agradecimento a tudo e todos que proporcionaram aquilo para a pessoa.

5 - Ohashi: O talher japonês, os famosos palitinhos.

6 - Getabako: São armários típicos para se guardar calçados, que normalmente ficam no genkan, na entrada, das casas, escolas e afins.

7 - Pitcher: É o arremessador no baseball.

8 - Softball: Uma modalidade similar ao baseball que foi feito para ser jogado em campos fechados e, majoritariamente, é um esporte praticado por mulheres.

9 - Doujinshi: São publicações independentes, normalmente de mangás, que são comercializadas, ou trocadas, em grandes eventos na maioria das vezes.



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A primeira coisa que pôde sentir ao acordar foi o som dos pássaros cantando, aos poucos notou a maciez da cama na qual estava deitado, ainda um tanto desnorteado. Espreguiçou-se lentamente após se sentar sobre o lençol, enquanto um calafrio subia pela sua espinha conforme esticava-a. Levou as mãos até as cortinas, abrindo-as e deixando que a fraca luz do sol adentrasse pela fresta que ia crescendo, cerrou os olhos por conta do incômodo que ia amenizando-se pouco a pouco.

Parou por alguns instantes sentado na borda do colchão, piscou três ou quatro vezes antes de conseguir organizar sua mente e depois de um longo bocejo tratou logo de arrumar-se para a aula. A primeira coisa a se fazer, como já de costume para ele, era tomar seu café da manhã, antes mesmo de tirar sua roupa de dormir.

Saiu do quarto quando pôs seus calçados, conforme descia os degraus escuros o som da televisão ia se tornando cada vez mais nítido, e assim tomando como certo seu palpite sobre aquela voz pertencer ao repórter que transmitia a notícia logo no jornal da manhã. Notou também, desde antes de abrir a porta do quarto, o cheiro da manteiga derretendo sobre a frigideira suspenso no ar, e somado ao som do salmão fritando sobre a panela, que despertou logo de imediato a fome no rapaz.

Antes mesmo de descer os degraus por completo e finalmente ver os alimentos sobre o fogo, notou a simpática figura que estava em frente ao fogão, que havia se distraído com a distinta cacofonia do preparo da comida junto ao som da reportagem cotidiana. Ela pôde perceber a presença do rapaz antes que ele chegasse ao primeiro andar (1), olhou em direção à passagem que dava para a escada enquanto esperava-o passar por ali.

Ao terminar de descer ela estava ali, olhando na direção de Ren, enquanto exibia um sorriso gracioso e discreto antes de voltar sua atenção para a panela de novo. Sorriu de volta para ela e foi se sentar em uma das almofadas da mesa baixa que estava centralizada, enquanto esperava ela terminar de fazer o café da manhã. Não bastou ele olhar em direção ao kotatsu (2) para notar a figura com quem ele passou toda a tarde, somado com parte da noite de terça assistindo à televisão.

Corou-se ao lembrar do que havia acontecido, mas preferiu abster-se disso e, antes que pudesse pensar em dizer algo, foi visto pelo garoto que sorriu rapidamente, não como o riso de sua mãe, mas tinha um tom alegre e não era nada discreto. Para evitar que Seiichi reparasse a vermelhidão em seu rosto ele se apressou e se sentou na mesa, desviando o olhar em direção à janela que tomava grande parte de uma das paredes do cômodo enquanto fingia apreciar a vista que mostrava um pequeno e verdejante quintal que contracenava com a paisagem urbana que tomava parte do cenário. Perdeu-se aí, passou a admirar a bela cena de fato.

— Garotos? — A mulher surgiu do corredor, trazendo as peças de cerâmicas sobre uma bandeja. — Aqui está o café da manhã. — Dispôs na frente de ambos as peças da louça clara, primeiro a tigela de arroz e depois o misoshiru (3) que era servido na vasilha de porcelana.

Antes de se sentar ela ainda voltou para a cozinha e buscou lá os pratos retangulares onde o peixe foi posto, e estes dividiam espaço com os dois copos de chá e mais um outro de leite. Não demorou muito para que tudo estivesse em seu devido lugar, desde os talheres até os recipientes colocados simetricamente à mesa, um ritual que ela seguia todas as manhãs com exímia precisão.

— Itadakimasu. (4) — O agradecimento dos três soou, quase que em uníssono, e puseram-se a comer.

Comiam vagarosamente e em silêncio, enquanto alternavam entre a bebida quente e o arroz, pois a sopa foi a primeira coisa a ser consumida, e pouco a pouco os grãos brancos iam sumindo e dando lugar ao fundo da tigela. Ren foi o primeiro a terminar a refeição matinal e, depois de agradecer uma outra vez, retirou-se para o seu quarto para terminar de se arrumar.

Não demorou muito para que Seiichi e a mulher terminassem de comer também, mas não se levantaram de imediato, pois um tanto de preguiça atingiu ambos depois de se alimentar. Relutante, ela teve que se levantar, afinal, se demorasse um pouco mais ela atrasaria seu cronograma, algo que não queria de fato, pois nutria uma inegável paixão pelo seu emprego, amor este que era responsável por fazê-la perder a noção do tempo e voltar tarde para casa quase todos os dias.

Ao notar que ela iria se levantar, o garoto que havia deitado sobre o tapete que cobria o piso daquela parte do cômodo aprontou-se também, e sem dizer nada prontificou-se a ajudá-la a levar a louça de volta. Levantou-se e pegou algumas das peças que estavam sobre a mesa, enquanto ela punha as restantes sobre a bandeja.

— Momo, deixe que eu levo isso para você — disse o rapaz, enquanto aprontou-se para levar o conjunto de porcelana à pia.

Em passos curtos e silenciosos ele cruzou o ambiente, sem a mínima preocupação com o tempo que passava ligeiro, fez questão de chegar cedo o suficiente para criar uma folga consideravelmente grande para cobrir qualquer imprevisto. Olhou o relógio assim que passou pelo arco da porta da cozinha, sobrava pouco mais de vinte minutos para que saíssem, outros quinze para que terminassem o percurso e, de acordo com seus cálculos, ainda sobravam mais dez antes deles se atrasarem. A mulher acompanhou-o até o cômodo, e trazia consigo o restante da louça que não coube na bandeja.

Deixaram sobre o tampo do balcão as cerâmicas e os talheres sujos, e a mulher logo se prontificou a para lavá-los, sequer hesitou quando seus dedos pálidos encostaram na água gélida que escorreu da torneira aberta. Não demorou muito para que a pilha de tigelas fosse reduzida a zero, os ohashi (5) e os pratos que antes eram lugar da porção de peixe foram limpos logo em seguida. Quando terminou de lavar a última peça da louça ela tateou as portas do armário em busca do pano seco que sempre deixava pendurado numa das alças, mas, estranhamente, ele não estava no lugar em que colocava-o de costume.

Desviou o olhar para procurá-lo, o que não tardou muito em fazer, pois o baixo ruído da louça sendo guardada chamou-lhe a atenção, o rapaz solícito já havia secado, e também acomodado todas as cerâmicas dentro da prateleira, pondo cada uma no seu devido lugar. Arqueou os lábios quando notou que foi percebido, e sem dizer coisa alguma, deixou o pano nas mãos de Momo. Bastou mais alguns poucos instantes para que Ren descesse as escadas outra vez, trazendo consigo sua bolsa e desta vez trajando o seu uniforme escolar, que combinava o tom cinzento do suéter e a malha escura do paletó verde, finalmente estava pronto para ir.

— Vamos indo? — Seiichi sugeriu logo que avistou o companheiro.

Um sinal sucinto com a cabeça foi o suficiente como resposta e, após conferir o horário rapidamente, seguiu até a porta da residência que levava diretamente até o agradável exterior. Logo abriu-a e por ali passou, chegando na calçada cimentada, mas que de alguma forma era alegre. Talvez os raios solares dançantes foram pouco a pouco contagiando o cenário urbano da cidade, atingindo não só a grama que se intercalava com o concreto, mas todas aquelas casas que emolduravam a paisagem.

Atravessaram o pequeno portão que ali havia e a mulher seguiu na direção oposta dos dois, depois de se despedirem ligeiramente, enquanto acenava ao andar. Não demorou muito para que retomassem o caminho até a escola, quando pisaram na primeira faixa da rua, que estava destacada em meio ao piche do asfalto, Ren olhou para trás por cima do ombro. Havia notado algo se movendo por detrás deles mas, como esperava, não havia nada ali, decerto apenas se confundiu. Apressou o passo para compensar a distância entre ele e o amigo.

Diversas vezes tentou se distrair disso, pois mais parecia uma paranoia do que algo real, mas o cenário cotidiano que se mostrava vívido e radiante não foi eficiente em atrair sua atenção, mesmo os comentários repletos de nostalgia que Seiichi fazia ao entrarem em cada uma das poucas ruas que faziam parte do trajeto não lhe eram suficientes. Não percebeu quando o amigo notou sua apreensão, no entanto, ainda que não lembrasse de muitas coisas daquele percurso que antes tomavam todos os dias, ele não se importou de ficar à frente, preocupou-se em desviar do caminho diversas vezes, duvidou de que tomou a direção certa algumas outras, mas por mais incrível que parecesse eles já podiam ver a escola no fim da longa avenida em que estavam.

Não muito antes de cruzarem com a primeira cafeteria o rapaz parou quase que instantaneamente para olhar a vitrine, encarou os doces um a um, dos bolos aos sorvetes, de fato aquelas peças cativaram seu olhar por certo tempo, elas cumpriram o seu propósito. Podia-se ler em seu rosto que ele queria entrar ali, e pelo que bem conhecia o amigo, ele ficaria pensando nos doces o resto do dia.

Mas, contrariando essa suposição, o rapaz não ficou muito tempo apreciando os doces e apertou o passo para acompanhar Ren, que nem mesmo parou para esperá-lo, conseguiu vencer todo o apelo que aquela vitrine bonita tinha.

— Você não quer mesmo entrar lá? — perguntou enquanto esperavam os carros pararem de passar.

— Eu prometi para a Momo que você não se atrasaria hoje.

— E você se importa com o que promete para os outros? — Não conseguiu evitar dizer, escapou-lhe imprudentemente o comentário num tom baixo pouco antes de torcer os lábios.

O semáforo não tardou em abrir, e o clássico e agradável som que acompanhava o sinal verde soou, chamando a atenção de todos para a travessia, inclusive a de Seiichi, que não conseguiu ouvir o que lhe fora dito pois a cacofonia que surgiu quando a multidão que se acumulou tratou de se mover impediu que distinguisse ao certo a voz baixa de Ren dentre os inúmeros ruídos dali.

Não tinha certeza de que ele o ouviu e preferiu ignorar o que lhe foi dito, mas também não sabia se sua voz se perdeu dentre todos aqueles barulhos, mas ainda preferia acreditar nisto. O amigo indicou o sinal aberto e perguntou se iriam atravessar, não demorou muito para que assentisse e atravessassem até o outro lado da rua pela faixa tracejada em silêncio, pois não se atreveu falar mais alguma coisa desde o ocorrido.

Reparou que quase todas as pessoas vestiam o mesmo uniforme que o seu, com diferenças ínfimas que não tinham qualquer importância, e seguiam rumo ao mesmo lugar. Como acostumou-se ao ver todos aqueles alunos, ele soube também que chegaria dentro do horário desta vez, pois não era muito provável que todas aquelas pessoas se atrasassem duma só vez.

Quando se aproximaram o suficiente para que pudessem ver as portas vítreas da escola ambos suspiraram em uníssono, como se isso já estivesse sendo combinado há tempos. Ainda não conseguiu olhar para o amigo, mas não precisou de nada além da onomatopeia que escapou de Seiichi depois que percebeu a coincidência para saber que ele olhava em sua direção. O desconforto que sentia em permanecer em silêncio, de ter as palavras roubadas como se tivesse desaprendido a falar não era tão grande quanto o esforço que fazia para manter os olhos fixos no chão, tentar distrair-se com os diversos tons da calçada, mas isso não estava sendo mais efetivo o bastante. Não sabia quando começou a preferir estar isolado naquele ambiente desagradável que o colégio se tornou do que ao lado dele, que havia sido seu companheiro por muito tempo e, por mais que tentasse negar isso, aquele pensamento egoísta não parecia querer esvair de sua mente.

Já havia se exaurido daquilo, não conseguia mais manter-se ali. Apertou ainda mais a alça da bolsa contra seus dedos quando atravessaram o arco metálico que ornava a entrada e viram o pátio do colégio, onde os primeiranistas se amontoavam ao redor das mesas em que cada um dos clubes recrutava mais membros, "não falta muito" pensou.

Por mais que fosse difícil transitar naquele estreito corredor que havia entre os aglomerados de pessoas ele seguiu sem muita dificuldade, pois era evitado pelos estudantes que panfletavam e convidavam os novatos, e não se atentou para qualquer coisa além de chegar até os clássicos getabako (6) que haviam depois das portas.

Adentrou depressa dentro da instituição, e como se estivesse entrando numa outra dimensão, era incrivelmente quieto comparado a toda a cacofonia que havia do lado de fora do prédio. Era corriqueiro que o silêncio significasse algo ruim sempre que ele chegava na escola, mas desta vez ele possuía apenas uma conotação neutra, pois também não indicava nada de bom, e a cada segundo a mais que durava evidenciava ainda mais a ausência de Seiichi, que ainda não havia entrado no recinto.

Virou-se e olhou o lado de fora, mas ele também não estava no espaço que havia entre a multidão e as janelas, o que, como num sabor agridoce, dissipou toda aquela tensão que veio acumulando e que se mesclava com o fio de preocupação que o sumiço do amigo havia lhe causado.

Esperou tempo o suficiente para se cansar, o que não levou mais do que três ou quatro minutos, e assim pôde ter certeza de que ele trocou-o por algo mais interessante, "não importa" foi a última coisa que ele pensou antes de sair dali. Substituiu seus tênis pelos calçados que haviam no pequeno armário e nem sequer hesitou, ou mesmo aguardou alguns instantes a mais, em seguir só até a sala de aula do mesmo modo em que fez durante todo esse tempo.

Ren não teria encontraria com ele ali se não fosse a insistência do amigo durante o dia todo, por mais que ainda não fosse o mesmo campo que ambos jogavam juntos, ainda evitava andar até aquela parte da escola. Não conseguiu deixar de observar o lugar, cerrou os punhos conforme olhava o gramado que cobria parte do diamante, e não pôde continuar a olhar quando o monte surgiu em meio a sua vista.

Só um relance foi o suficiente para que ele pudesse imaginar um arremesso sendo feito por um pitcher (7), não hesitou por um só instante, por mais que algo dentro dele quisesse acompanhar aquele lance, e desviou o olhar subitamente. Mas já havia visto o suficiente para que aquelas memórias acolhedoras, que vinham contra a sua vontade, fizessem com que ele quisesse sentir a sensação de arremessar uma bola outra vez, que, se dependesse de seus desejos, já teriam sido esquecidas há muito.

Torceu os lábios enquanto tentava reprimi-las. Inútil, pois mesmo assim as lembranças continuaram surgindo. Só notou que fitava o concreto no chão quando percebeu que alguém se aproximava pelo caminhar ritmado, virou o rosto o suficiente para que pudesse ver quem dali vinha. Era aquela garota da loja de doces que, durante a maior parte do dia, não era a mais entusiasmada das pessoas, se fosse posta em um gráfico crescente ela estaria, decerto, entre os primeiros. Mas este não era um desses casos, usava o uniforme branco do time de baseball e exibia um olhar que já havia confortado ele por diversos dias.

Acenou para ele logo quando o viu, enquanto inclinava a cabeça levemente para o lado e deixou que um sorriso tomasse forma em sua expressão. Não demorou muito para que alcançasse o garoto e, como já de costume, encarou-o bem de perto, o que só foi possível após ela abaixar-se o suficiente para compensar a diferença de tamanho entre os dois. Fitou as suas retinas escuras por alguns instantes, como se pudesse lê-las e desviou o olhar somente quando foi ajustar o boné que usava naquele momento. Olho no olho, indagou:

— Hey! — Exibiu os dentes brancos num sorriso novamente. — Você sabe que, quando estiver pronto, pode voltar para o time, não é?

Deixou que um longo suspiro escapasse por entre seus lábios, enquanto desviou o olhar para qualquer lugar onde deixasse de ver a garota. Mesmo após isso ele ainda não conseguiu dar uma resposta para ela, por mais que tentasse se esforçar, por consideração, afinal, sempre que podia, ela vinha perguntar isso a ele. Não era necessário, de fato, pois apenas o semblante que surgia no rosto de Ren após ouvir a questão todas essas vezes, mesmo que por uma fração de segundos, era suficiente para que ela tornasse a indagar isso no futuro. Rapidamente, dentre um riso divertido e outro, desgrenhou os fios negros que compunham o cabelo do rapaz e logo endireitou a postura.

Mas nenhum dos dois havia percebido quando uma outra pessoa havia surgido ali, ambos estavam tão imersos um no outro que qualquer ação que houvesse acontecido nos arredores teria passado despercebida pelos dois. Quase que ela terminou por colidir com quem estava ali, mas este conseguiu, por sorte, desviar do movimento imprudente que a garota fez ao se afastar. A possibilidade de ser visto naquela situação por um estranho fez com que calafrios subissem a espinha, mas logo aliviaram-se ao ver a face familiar de Seiichi.

— É... Eu não estou atrapalhando nada? — disse ao afagar a nuca com uma das mãos. Esperou por uma resposta enquanto as pontas frias de seus dedos percorriam a pele quente do pescoço. — Acho que ainda gosta deste sabor — Aproximou a caixinha que mesclava o branco e tons rosados, onde os dois grandes desenhos de morangos evidenciavam o sabor da bebida que, desde aquela época, continuava sendo a preferida do amigo. — Eu devia de ter trazido algo quente? — indagou, Ren levou a mão ao encontro da sua e segurou gentilmente a embalagem que estava gelada por causa do clima.

— Não precisa se preocupar, assim está bom. — Destacou da embalagem o plástico que envolvia o canudo. — Obrigado.

As vozes e risos que ecoavam do campo raptaram a atenção da garota que olhava em direção aos rapazes que trajavam o uniforme, a porta da pequena sala que havia depois do gramado estava aberta, e de lá alguns outros membros do clube saíam tão animados quanto os outros. Logo o treino começaria. Aproximou-se do desnível que havia ali com cuidado, afinal, por mais que não estivesse a uma grande altura, uma queda dali poderia render-lhe, no mínimo, um tanto de dor.

Vê-los correndo enchia-a de entusiasmo como poucas coisas conseguiam, ainda mais no frio que fazia no início da primavera. Todos já haviam saído da sala, e os que antes estavam dispersos já se reagruparam não muito distante da entrada da quadra enquanto aguardavam-na ali, não demoraram muito para notá-la lá, olhando na direção deles.

— Watari, 'cê gosta de baseball? — Seiichi perguntou, fazendo com que ela olhasse para os dois novamente.

Como se ela e Ren pudessem partilhar seus pensamentos, eles se entreolharam e um outro sorriso alargou-se na face da garota enquanto ele cobriu a boca na tentativa malsucedida de abafar o riso curto que havia escapado. Não muito descompassada ela também riu, mesmo que não tenha se preocupado em ser discreta com isso, e por mais que aos olhos do garoto parecesse zombaria dos dois ele não estava muito mais que confuso, ou ao menos isso que mostrava em seu rosto.

— Eu é... — tentou dizer algo, mas tornou a rir outra vez.

— Gostar não é bem a palavra, — continuou no lugar de Hoshino — eu diria que ela é fissurada por isso. — Se assegurou de aproximar-se o suficiente da orelha do rapaz. — Ela importunou os professores até eles deixarem ela fazer parte do clube — sussurrou.

— Ela faz parte do clube de baseball? — Não conseguiu se conter, mesmo que o amigo tivesse acabado de contar isso a ele.

— É... — disse depois de sua sessão de risos, e da eventual sessão de arfadas que veio a seguir. — Por mais improvável que pareça, eu sou a capitã do time.

— Mas... — Hesitou por um instante, desviou o olhar e coçou a cabeça pouco antes de olhá-la de cima a baixo como se estivesse a analisando. — Você é uma garota e... — A garota cruzou os braços e isso fez com que ele risse baixo para que pudesse quebrar a tensão que existia, ao menos em sua mente. — Garotas não jogam baseball... ao menos não jogavam até agora.

— Foi o que me restou afinal, não temos um clube de softball (8). — Deu de ombros. — Eu não reclamo mais disso já que agora eu posso ver aquele bando de garotos bem de perto.— Riu. — Ao vivo é bem melhor do que ler em qualquer doujinshi (9). — Ela olhou uma última vez para o campo.

Antes mesmo dele dizer qualquer coisa ela se foi para o treinamento mas, se dependesse somente dela, certamente gastaria alguns minutos a mais com a conversa, talvez até uma hora ou mais outra, sentia-se assim bem no fundo, de certo, só que não pôde adiar por mais um segundo sequer o agradável bate-papo que estavam tendo. Contudo, não esperava que o rapaz a seguisse até lá, e consequentemente arrastasse Ren consigo.

Bastou pisar no campo para que a cumprimentassem, como se estivessem coordenados, não soou muito ordeiro, e haviam alguns alunos descompassados, tinham também aqueles que estavam mais animados que os outros, e que acabavam por sobrepor seus colegas sem querer, mas nada que pudesse incomodá-la e só parou quando chegou na frente dos jogadores, expirou lentamente um tanto de ar enquanto encarava cada um dos jogadores que estavam ali.

A porta da sala, que ficava debaixo de uma pequena cobertura, se abriu de novo, emitindo um som agudo que chamou a atenção da capitã assim como de todos aqueles garotos que estavam na sua frente, desviaram o olhar para o lugar de onde partiu o barulho incômodo enquanto aguardavam, num misto de apreensão e entusiasmo, que o velho treinador saísse dali.


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