Lost escrita por Gabs


Capítulo 21
XXI


Notas iniciais do capítulo

eu terminei esse capítulo agorinha, mas como hoje faz exatmente um mês desde que eu atualizei decidi postar hoje mesmo!
espero que gostem!!



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Sua mãe.”

Você não tinha o direito de fazer isso comigo.”

É a minha vida!”



Abriu os olhos e o oceano era a única coisa que via, ainda deitada na areia da praia sentia-se zonza e deslocada, todas aquelas lembranças martelavam sua cabeça, todas voltando de uma vez só chocando-se contra ela.

Absorvia as informações como se sua mente fosse uma planta seca e suas memórias fossem água fresca, mas não queria, Deuses, como não queria. Achava melhor morrer de sede do que se lembrar do que tinha acontecido.

Mas não havia como fugir daquilo, era sua vida. E agora estava sozinha mais uma vez.

Embora estivesse aliviada por ter sido jogada naquele local, estar longe deles era tudo o que ela mais queria agora. 

Os amava, com todo o coração, como nunca havia amado alguém, mas o que eles haviam feito… A machucava mais do que achava ser possível. 

Era algo que ela passara a vida toda buscando, teria dado de tudo para saber aquilo antes e aquelas pessoas, tão próximas, tão queridas, guardavam a verdade a sete chaves bem debaixo do seu nariz. 

Ela sabia que Thomas só havia aberto o bico porque ele sabia que ela encontraria respostas em outro lugar, ele não queria contar, ele não iria contar caso ela não tivesse pressionado-o. E ela não se arrependia de tê-lo estrangulado, então achava que estavam quites. 

Levantou-se devagar e tirou o máximo de areia que conseguiu do corpo, ainda estava cansada e sentia tanta fome que achava que seria capaz até de comer areia para se saciar. 

Talvez aquilo que Morgana havia feito com ela, aquele tipo de teletransporte, portal ou seja lá o que fosse tivesse drenado sua energia. 

Entretanto ela precisava de roupas, urgentemente. 

Se recusava a vestir aquele vestido mais um minuto sequer, a mera lembrança do jantar com o pai de Thomas e tudo que se seguiu era capaz de fazê-la arder em chamas, aquele vestido lhe trazia todas aquelas memórias. 

As casas na beira da praia não tinham muros então pulou por cima de um deles sorrateiramente e, desculpando-se com os donos, roubou algumas peças de roupa do varal, as que julgava necessária, uma calça cargo verde musgo com vários bolsos - útil para carregar armas pequenas e ingredientes para poções e feitiços -, uma camisa cinza de gola redonda com mangas longas e uma jaqueta preta pesada que parecia a prova d'água, também um par de tênis escuros que eram um ou dois números maior que o seu e um par de meias grandes. 

Não tinha muitas opções que não se trocar ali mesmo no quintal, aproveitou que o sol havia nascido a poucas horas e rezou para que ninguém na casa olhasse pela janela. Decidiu deixar o vestido lá mesmo, achou que talvez eles pudessem apreciar a bela peça de roupa e talvez não ficassem tão chateados com seu furto. 

Todas as casas ali pareciam iguais e ainda não sabia onde estava, mas não podia permanecer ali, tinha certeza de que eles estariam a sua procura. Independente do que ela havia feito sabia que eles sempre queriam mantê-la por perto sob vigia, e Deuses, ela precisava de um tempo sozinha. 

Caminhou rapidamente por entre as casas e se deparou com uma rodovia e então, um posto de gasolina com conveniência. Não conseguia usar sua magia, era como se a fogueira selvagem dentro de si estivesse completamente adormecida, então não conseguia fazer os carros pararem para que passasse, decidiu então que faria com que eles parassem de uma forma ou de outra. 

Caminhou devagar para dentro da rodovia, ouvindo os carros buzinando enquanto ela invadia um espaço que não era seu e pouco a pouco, devagar e perigosamente atravessou de um lado ao outro. 

—Moça você precisa ter cuidado, nunca se sabe que tipo de gente doida pode estar atrás do volante, você não pode entrar assim no meio da rodovia! -alertava um funcionário, aparentemente muito preocupado com sua segurança enquanto dava uma bela encarada em seus seios, teve vontade de afundar seu crânio no asfalto. 

—Eu atravessei, não atravessei? -sorriu cínica e deu de ombros deixando-o para trás enquanto ele voltava a dizer algo sobre os perigos da estrada e ela não conseguia se importar menos. 

Uma conveniência suja e vazia de um posto de gasolina parecia um restaurante cinco estrelas devido ao tamanho da fome que a garota sentia, ela podia - e talvez devia — ter devorado o funcionário que ficara encarando-a com olhares maliciosos. 

—Quero três cachorros quentes com tudo o que você tiver. -disse apressada ao atendente. 

—Preciso ver o dinheiro antes, senhora. -ele respondeu e mal parecia ter ouvido seu pedido. 

Sentiu um calafrio na espinha ao lembrar que não tinha dinheiro, nem conta no banco. 

Ela com certeza devoraria aquele cara em cinco minutos se não comesse aquele cachorro quente logo, precisava pensar. 

—Tem algum caixa eletrônico por aqui? -resmungou mal humorada. 

—Do lado de fora, à esquerda. 

Correu até o lado de fora atrás do caixa, mas não conseguiu se segurar ao ouvir o mesmo funcionário de antes assobiar para ela enquanto encarava sua bunda, não, aquilo era inaceitável. 

—Está assobiando para o quê, hein seu idiota? -questionou com o queixo erguido olhando o homem nos olhos. -Você não estaria assobiando se fosse o seu rabo que eu estivesse encarando como um animal, estaria? 

Agarrou o bolso traseiro da calça do homem e puxou com toda a força, se esquecendo por um segundo que era mais forte que os humanos, e observou quando a calça dele se partiu no meio, deixando tudo o que ele mais gostava de observar à vista.

—Agora, se eu chegar ao caixa e pegar você me olhando de novo, vou fazer muito pior que isso. -sussurrou deixando-o ali ajoelhado no chão, tentando cobrir-se de qualquer forma. 

Observou enquanto o atendente dos cachorros quentes saia para ajudar o colega e deixou para lidar com eles depois. 

Encarou o caixa eletrônico como se ele fosse ensiná-la a usá-lo, mas nada veio, obviamente. Tocou o objeto e usou pouquíssima magia para acessá-lo e então dezenas de notas começaram a serem cuspidas para fora, uma com valor mais alto que a outra. 

Pegou todas que conseguiu e enfiou nos vários bolsos da calça voltando às pressas para dentro da conveniência. 

O garoto não estava lá, devia estar cuidando do colega desagradável, mas ela não conseguia esperar, então tratou de pular o balcão e servir-se de quantos cachorros quentes e quantos recheios ela conseguisse. 

Fazia algum tempo que ela não comia algo assim, industrializado, com tanto sódio, algo que não acrescentava nada em nutrientes, o que fez com que ela sentisse falta das refeições planejadas que comia em Santa Marcelina ou no castelo dos Collins. 

Mas preferia comer algo ruim e ser independente do que comer algo bom e sempre ser mantida em rédeas curtas. 

Agarrou um belo par de coturnos pretos antes que se esquecesse, aqueles tênis estavam saindo de seu pé com frequência demais para que fosse considerado confortável, mas as botas, aquelas sim davam conta do recado. 

Percebeu que precisava de uma mochila para carregar seu dinheiro então andou um pouco por dentro da loja e agarrou uma bolsa grande de viajante e colocou nos ombros, jogando várias garrafas de água e pacotes de salgadinhos e aperitivos dentro logo em seguida, e fez questão de deixar três notas de cem no balcão antes de sair. 

Já devia ser quase oito horas e o sol já começava a esquentar sob sua cabeça, ainda sem conhecimento algum sobre onde estava decidiu seguir em frente à beira da estrada, era confortável ter seu sangue circulando mais uma vez, o que Morgana havia feito havia deixado seu corpo estranhamente sensível e fraco caminhar ao som das ondas do mar era tudo o que ela precisava para se sentir disposta mais uma vez. 

Uma vila despontou no horizonte e com suas expectativas mais altas do que nunca, Katherine desatou a correr até os pequenos casebres de madeira aglomerados no meio do deserto ao redor.

Haviam poucas pessoa na rua, em sua maioria mulheres e todos vestiam roupas simples de cores entre marrom e cinza, nenhuma delas olhou em sua direção, todas ocupadas demais com seus próprios afazeres para se dar ao trabalho de encarar a forasteira.

Era uma mudança agradável de ares, lembrou-se de quão incomodada ficou no baile com todas aquelas pessoas rudes lhe encarando, como se fosse um animal num circo.

As explodiria se pudesse. 

Gostaria de ter tido conhecimento de seus poderes antes, assim poderia ter lidado com elas sozinha, sem a necessidade de ser cuidada por Thomas.

E agora era uma péssima hora para pensar nisso, não havia nada que pudesse fazer com relação ao que já havia acontecido.

Um pequeno estabelecimento lhe chamou a atenção, sua vitrine estava repleta de itens antigos e decorações deslumbrantes, luminárias decoradas com flores, jogos de chá delicados e o que mais lhe chamou a atenção, cinco facas de mármore claro, quase azul. Estavam presas num cinto preto com detalhes dourados e quase lhe imploravam para serem compradas.

Ela precisava de algo para se defender uma vez que sua magia não dava sinais de que voltaria tão cedo e felizmente era muito habilidosa com facas, aquelas iam da mais longa, com cerca de cinquenta centímetros, para uma adaga pequena por volta dos oito centímetros.

—Com licença, aquele conjunto de facas ali na frente está à venda? -o homem do caixa a encarou como se ela falasse outra língua então seu rosto de acendeu como se ela tivesse acabado de dizer que compraria a loja toda.

—As Lâminas de Selene? Sim, estão a venda, você gostaria de vê-las? -perguntou já se levantando da cadeira e atravessando a loja e retirando a peça do mostruário.

O chão rangia e reclamava a cada passo dado sobre o chão de madeira velha e fosca, aquele chão não era encerado, ou sequer limpo há anos.

Todas aquelas pessoas pareciam tão miseráveis e todas as casas pareciam tão velhas, como eles sequer viviam daquele jeito?

—Existe um rumor sobre essas lâminas, dizem que elas foram feitas por espíritos da água quando estes precisaram defender seu território na primeira e última vez que lutaram, lâminas mortais e belíssimas, estão na loja há décadas, meu avô tentou vendê-las, então meu pai depois dele e agora eu, é quase uma herança de família. -ele riu.

Provavelmente ninguém ali tinha dinheiro suficiente para sequer considerar comprar um artefato daqueles.

—Vou levar. -remexeu sua mochila e deu um punhado de notas para o homem.

—Senhorita, isso é muito mais do que o artefato vale. -informou deslumbrado com as notas que dançavam nas mãos de Katherine.

—Renove seu estabelecimento, compre roupas, comida. Melhore sua vida, faça o que quiser com o dinheiro, é seu. -colocou as notas amassadas nas mãos do senhor e observou enquanto os olhos castanhos dele se encheram de lágrimas.

Ele não era velho, devia estar nos seus trinta anos, mas seu olhar era tão vazio, expressões cansadas de esperar por um futuro tão deprimente, ela sabia que não era muito e que era algo tão fútil, dinheiro, mas esperava que pudesse melhorar algo, qualquer aspecto da vida dele.

Ela não tinha a mínima idéia de quanto valia aquela quantidade de notas amassadas que ela havia acabado de oferecer a ele, não sabia o que ele poderia fazer com aquele dinheiro, mas a julgar pelo choro e a quantidade de agradecimentos que ele estava dando a ela, achava que era o suficiente.

Saiu da loja ajustando o cinto em sua cintura e cobrindo-o com sua jaqueta, que estava amarrada em sua cintura, era por volta do meio dia e o sol queimava seu couro cabeludo, os homens saíam das fábricas para almoçar e estes sim desperdiçaram alguns segundos do dia para encará-la, tratou de sair da cidade o mais rápido possível.

Andava há horas, apenas areia e o sol quente em sua cabeça lhe faziam companhia, nada mais ao redor, era como se a pequena cidade existisse no meio do nada, secou o suor em sua testa com as costas da mão e avistou um contorno no horizonte, parecia um prédio, talvez fosse uma outra pequena cidade.

Já andava há tanto tempo que mal sabia que dia era ou onde estava, o deserto parecia não ter fim e ver aquele prédio ali, mesmo que abandonado, era como um oásis no meio daquele deserto, fez questão de andar mais rápido.

Ela não se lembrava de nenhuma vez em que tivesse entrado num prédio tão frio, era como entrar numa caverna abandonada, o cheiro era de umidade e bolor e através da fraca luz que entrava pelas claraboias não planejadas, que eram apenas buracos no teto causadas pela idade avançada e pela situação de abandono do prédio, era possível ver a poeira flutuando pelos cômodos, aqueles minúsculos grãos de poeira eram os únicos moradores daquele lugar. Uma leve melodia soava por entre as paredes, desfazendo aquele silêncio com delicadeza, como se aquele som devesse estar ali, como se pertencesse àquele lugar.

Tudo parecia uma cena de filme e curiosa como era, Katherine não conseguiu se segurar e antes que se desse conta já caminhava na direção do som, atravessava cômodo após cômodo e estranhou aquele lugar tão horrendo ser tão grande e então ao atravessar o que parecia ser a centésima porta, que estava mais inteira do que as anteriores, um grande salão se revelou a sua frente, quase tão deplorável quanto os anteriores, embora com o dobro de tamanho. Quase todas as quatro paredes daquele cômodo tinham mais de três portas, um papel de parede amarelo com manchas de bolor descascava em todas as paredes, algumas delas quase não tinham mais nenhum vestígio de que ali algum dia havia tido qualquer tipo de decoração que não fossem aquelas marcas de infiltrações e teias de aranhas. Um grande lustre de vidro estava caído no meio do salão, haviam cacos de vidro por todo o lugar como uma grande armadilha, alguns pedaços de vidro eram quase do tamanho de sua mão, o que levou ela a se perguntar o que poderia ter acontecido ali para que algo daquela magnitude e tão valioso acabasse daquela forma.

Mas o som estava ficando mais alto, ela precisava cruzar aquele mar de cristais se quisesse chegar ao outro lado e descobrir de onde vinha aquele som tão encantador. A melodia ficava rápida e então caótica e em segundos ficava lenta mais uma vez, suave e estável. Ela não entendia porque se sentia tão atraída por aquela melodia, já havia algum tempo que ela não se interessava por algo a ponto de fazer tanto esforço, era inexplicável, mas ela não conseguia ignorar.

Atravessar o chão que estava completamente coberto de vidro era muito mais difícil do que parecia e ela não queria fazer barulho para que a pessoa que estava tocando a melodia não soubesse que ela estava ali. Ela estava insegura quanto ao uso da magia ali, mas talvez se tirasse apenas os maiores pedaços de vidro das áreas onde planejava pisar, aquilo poderia dar certo.

Removendo um caco após o outro ela avançava devagar sentindo a ansiedade de chegar tão perto daquela porta crescer cada vez mais.

Então um som grave foi ouvido, parecia que uma nota havia sido tocada errado, e agora tão perto da porta ela conseguia ouvir tudo que acontecia com muito mais clareza.

—Droga! -uma exclamação irritada e algo pareceu ter sido chutado do outro lado, ela congelou onde estava.

Entrar não seria uma boa, bater também não faria sentido, ela queria entrar, mas nada parecia bom o suficiente, nada parecia seguro o suficiente.

—Venha logo para cá, você está me desconcentrando. -a voz do outro lado parecia incomodada, e masculina.

Apenas entrar seria estúpido demais, e se o homem do outro lado quisesse lhe fazer mal? Se fosse um inimigo? Ela não era tão burra como costumava ser.

Antes que pudesse tomar uma decisão o homem abriu a porta de madeira e parecia impaciente com sua demora, Katherine deu cerca de cinco passos para trás ao ser pega de surpresa e sentiu o líquido quente e a tensão em sua perna quando um pedaço grande de vidro rasgou seu tornozelo.

—Que merda! -exclamou ao colocar o pé no chão e se afastar do meio do salão, encostando-se na parede próxima ao que parecia ser a porta principal.

O sangue escorria por sua perna devagar, não doía muito, mas incomodava um pouco, o que já seria ruim o suficiente caso ela tivesse que atacá-lo ou fugir dele.

—Isso parece feio. -ouviu o outro comentar, ele continuava parado em frente a porta que dava para a sala onde ele tocava o piano anteriormente e seu semblante sério não revelava muita emoção, ele parecia levemente e estranhamente entediado.

Estar sozinha em um local remoto e abandonado com um homem que ela não conhecia já era ruim o suficiente, mas estar sozinha e em desvantagem por estar ferida conseguia ser pior ainda.

—Não vai dar uma olhada nisso? -ele se encostou no batente da porta com os braços cruzados, partículas minúsculas de poeira voaram quando ele encostou seu peso sob a porta.

—Quem é você? -perguntou segurando o tornozelo, sem ousar tirar os olhos dele nem uma vez, nem por um segundo.

—Você é a invasora, me diga você. -ele debochou, estranhamente muito confortável.

Tudo naquela situação deixava claro que não era seguro que ela dissesse seu nome para ele, mas o garoto havia deixado explícito de que ele não revelaria sua identidade primeiro.

—Eu… O que me garante que você vai me contar quem você é? -gaguejou levantando-se devagar no que seu tornozelo já parava de sangrar.

—Porque você é tão desconfiada? Traumas do passado, hum? -ele fez um movimento com o ombro e Katherine teve que se segurar para não revirar os olhos indicando que sim, era um trauma do passado. Mas ele não precisava saber daquilo.

O moreno parecia cada vez mais curioso sobre a garota sorrateira a sua frente e Katherine não entendia como ele podia estar com uma expressão tão suave, quase como se não se importasse nem um pouco com quem ela era e se ela podia fazer algo contra ele. Ela havia conhecido alguém que era tão confiante assim no passado.

Apenas a mera lembrança dourada era capaz de transformar seu humor em algo nublado e tempestuoso.

—Bom, você não é muito de falar, não é? Ou talvez as únicas palavras que você conheça sejam “você”, “quem” e “é”, de qualquer forma não vou julgar. -ele deu de ombros depois de tirar sarro de sua cara descaradamente insinuando que ela não sabia falar, então se desencostou do batente da porta e se curvou rapidamente. -Leviathan Thorne ao seu dispor, e você é…?

Pensou uma, duas, cinco, dez vezes antes de responder.

—Se você não me disser o seu nome eu vou aceitar isso como uma permissão silenciosa pra te chamar da forma que eu quiser, você tem cara de Sarah… ou Hannah… -ele ponderava andando de um lado para o outro em meio ao salão empoeirado, a forma com que ele falava como se eles já fossem próximos quase fez Katherine rir.

E já fazia algum tempo que a garota não ouvia o som da própria risada.

De alguma forma estranha aquele garoto, Leviathan Thorne, parecia confiável. Seu colar permanecia calmo como costumava estar nos últimos cinco meses e sua energia não indicava que ele pudesse ser uma ameaça, decidiu então que daria aquele garoto o dom da dúvida.

—Katherine Williams. 

Alguns segundos de silêncio no que Leviathan deixou um pequeno sorriso de canto crescer em seu lábio enquanto colocava as mãos na cintura.

—Bom, Katherine… -ele pigarreou parecendo orgulhoso por ter adquirido tal informação. -Isso faz de nós amigos, certo? Então me diga, veio até essa espelunca para me ouvir tocar, ou você gosta de lugares com ar de assombrados?

Era impossível que ele só estivesse falando aquelas coisas, que tipo de pessoa fala tantas coisas sem pensar? Era como se ele não tivesse nenhum filtro entre o que ele pensa e as coisas que realmente saem de sua cabeça.

—Eu estava andando pela região e fiquei curiosa ao ouvir a música. -murmurou sem dar muitas informações.

Ele assentiu com a cabeça e deu dois passos em sua direção o que fez com que a garota se afastasse mais ainda.

—Calma, eu só queria ver se o seu tornozelo tá bem. -ele levantou as mãos e se desculpou parecendo arrependido pela tentativa de aproximação, o que era bom porque ela não queria que ele ficasse perto dela, mesmo com o benefício da dúvida ele ainda era um homem perigoso em potencial.

—Acho que sim, na verdade está melhorando. -ambos olharam rapidamente pelo tornozelo agora coberto pelo jeans sujo de sangue e voltaram a se encarar mais uma vez, a atmosfera daquele lugar estava ficando estranha. -Não leve a mal, mas eu não te conheço.

—Sem problemas. -ele deu de ombros voltando ao seu lugar ao lado da porta e possuía um sorriso tímido nos lábios, não era como se ela o tivesse elogiado, aliás ela havia feito o contrário, mas ele agia como se ela tivesse dito algo agradável?

Ele era complicado demais de entender ou ela havia passado muito tempo sem interagir com alguém? Não fazia idéia, mas estar ali estava sendo intrigante.

—É só que é difícil ver alguém por aqui, e a minha música não é elogiada há algum tempo… -e definitivamente não tinha sido elogiada agora, não que ela não tivesse gostado, mas não se lembrava de ter dito em voz alta que havia gostado, e mesmo assim ele agia como se ela o tivesse elogiado. -E você, apesar de ameaçadora, parece decente. Quero dizer, sem ofensas, mas faz algum tempo que não vejo ninguém, quem dirá alguém decente, limpo, sabe falar, essas coisas…

Ele gesticulava muito e sorria aleatoriamente enquanto falava, como se algumas frases ou palavras lhe trouxessem lembranças, Katherine desejou poder ser um pouco como ele, mas todas as suas memórias estavam manchadas agora.

—Não que você fale muito, obviamente. -comentou ele rindo fraco e lhe dando as costas, voltando para a sala do piano.

Decidiu segui-lo e ao chegar na porta preparada para atacá-lo caso ele estivesse planejando algo, encontrou o garoto sentado num banco velho folheando páginas de um velho caderno sem capa cheio de rabiscos que talvez, de um certo ângulo, chegassem a ser uma partitura.

Ele folheava a partitura rapidamente e parecia procurar por algo específico, seu semblante parecia o de uma criança animada, ele mordia o lábio e suas sobrancelhas estavam cerradas, focado nas folhas de papel que passavam rapidamente em frente aos seus olhos cor de violeta.

Mesmo tendo passado algum tempo no mundo mágico nunca havia visto ninguém com uma cor assim nos olhos, ela e Thomas possuíam olhos azuis, mesmo que de tons diferentes, os de Thomas sendo muito mais claros, Max possuía os olhos verdes como duas pedras de Jade brilhantes e Morgana possuía o mais belo par de olhos dourados que ela já havia visto, mas nenhuma pessoa, nem mesmo em Santa Marcelina, possuía olhos violeta.

—Vou te mostrar a minha favorita como oferta de paz, e aí você me deixa ver seu tornozelo? Essas coisas são muito velhas, sabe. Muito velhas, você pode pegar uma infecção. -ele indicava seu tornozelo com o nariz enquanto posicionava os dedos acima das teclas.

A insistência dele era apreciável, ele não conseguia aceitar que ela não confiava nele.

E ainda não achava que contar a ele sobre seus poderes era a coisa apropriada a se fazer, ela queria ter essa vantagem. Então deixaria que ele pensasse que podia tomar conta dela, por enquanto.

—Vou ficar bem, e porque quer tanto ser meu amigo, de qualquer forma? Você não faz a menor idéia de quem eu sou.

—Mas não é assim que se torna amigo de alguém? Você tem que não a conhecer primeiro. -ele sorriu e se voltou para o piano mais uma vez, a garota não possuía palavras para contrariá-lo.

Ela não sabia quem ele era, e a única coisa que tinha certeza era de que ele vinha do mesmo universo do qual ela tentava fugir, mas se ele estava aqui e ela também, talvez os dois estivessem tentando fugir de coisas parecidas. 

Ele tinha que ser de lá, ele tinha conseguido ouvi-la chegando mesmo quando ela tinha certeza de que não estava fazendo absolutamente nenhum som e seres humanos não possuíam olhos daquela cor, ela queria saber quem ele era e como ele havia chego até ali.

A melodia começou suave e lenta, ele mal parecia tocar as teclas, a garota observava atentamente no que os dedos longos do moreno começaram a se mover cada vez mais rápido pelas teclas monocromáticas do velho piano a sua frente, seu rosto estava levemente inclinado e ele possuía um semblante calmo e estava completamente focado em cada nota, a música era animada e revigorante, ele sorria levemente enquanto tocava.

Aquela sala não tinha nada de especial, nada que revelasse nada sobre Leviathan, apenas o velho piano e o velho caderno de partituras, e mesmo assim ele parecia gostar muito de estar ali.

—O que achou? -ele a observava com olhos de cachorro pidão.

Ela nem sequer havia notado que ele já havia parado de tocar, mas havia gostado muito do que havia ouvido e não conseguiu evitar sorrir para ele.

—Gostei.

—Acho que esse é o máximo que eu vou receber de um elogio vindo de você. -ele riu.

—Não é isso! Eu… Faz muito tempo que não falo com alguém. -tentou consertar a situação, não queria que ele se sentisse pouco apreciado, sabia que não era sua obrigação gostar do que ele tinha tocado, mas ela realmente havia gostado e ela sabia como era horrível quando se expõe algo que você gosta para alguém e não recebe uma reação à altura.

—Ah é? Eu também, qual é a sua história? -ele se arrumou no banco e sentou-se virado para ela e a observava com atenção esperando ansiosamente pelo que ela diria.

—Não quero falar sobre isso. -evitou olhá-lo nos olhos, seu passado era algo que ela evitaria ao máximo enquanto pudesse.

—Já esperava essa reação, então tudo bem. Vou te contar um pouco da minha, se isso for te fazer ficar mais confortável. -ele sorria e sua parte que ainda era humana não conseguia evitar sentir simpatia por ele. -Não tem muita coisa, mas eu fugi de onde eu nasci por não concordar com o que meu rei dizia, o cara é realmente um boçal, você não acreditaria nas coisas que ele fazia ou as coisas que ele dizia, era completamente absurdo, então me rebelei e abandonei tudo que eu tinha lá, não era muita coisa, e vim para cá.

Ela percebeu que ele havia omitido muita coisa, como contar para ela que ele era um ser de outra espécie e onde ele havia nascido ou quem era seu rei, mas era justo uma vez que ela também escondia coisas dele.

Percebeu então que estava construindo algo ali que era muito parecido com o que tinha antes, mas não conseguia falar sobre seu passado, mal conseguia pensar sobre, ela esperava que Leviathan fosse tão compreensivo quanto parecia ser.

—Fugir e vir para um lugar que você não conhece é algo arriscado. -comentou.

—E você? Fugindo de alguém?

—Sim, mas eu saí de um lugar que conhecia para um que eu não conhecia e então de alguma forma voltei para onde eu conhecia. 

—Ugh, sua história parece bem complicada. -ele se levantou e fez uma expressão exagerada levantando a sobrancelha e arregalando os olhos, Katherine saiu da frente da porta e acompanhou-o com o olhar conforme ele seguia para a porta principal com o pequeno caderno debaixo do braço.

Só então reparou em suas roupas, ele usava um sobretudo preto que parecia super pesado sobre uma camisa social preta e uma calça lisa também preta, ela não via alguém com uma roupa tão monótona há algum tempo, quando estava no reino todas as pessoas vestiam cores claras e roupas feitas sob medida e no mundo humano todas as pessoas vestiam roupas tão diferentes, mas nenhuma da mesma forma que ele, ele parecia algum vocalista de alguma banda famosa emo.

—Tem algum lugar para ir? Algum compromisso? -questionou o garoto segurando a maçaneta empoeirada da porta.

—Não, porque?

—Acho que você precisa de mais amigos, sem ofensas. Eu posso te apresentar para algumas pessoas.

Esse garoto realmente não tinha nenhum filtro, era impossível que tivesse e mesmo assim falasse tanta coisa impensada.

Mas era muito engraçado.

—Como vou saber que você não está me levando para a minha morte certa?

—Sei que pareço um cara estranho que poderia muito bem ser um sociopata, especialmente nas condições nas quais nos conhecemos, mas eu não faria isso. Entretanto, como sei que não estou em posição de pedir que você confie em mim, você pode pegar uma dessas facas que carrega no cinto e colocar nas minhas costas se quiser.

Aquilo a tranquilizava, e ao mesmo tempo não.

Ele só diria algo assim com aquela confiança porque sabia que aquilo não faria tanto dano quanto deveria nele, uma vez que era um ser mágico.

Mas ele não sabia que ela era uma feiticeira, e se sabia agia como se não soubesse, ela tinha menos motivos para se preocupar do que ele.

—Ok, vou te seguir por aí, mas só porque não tenho nada melhor para fazer. -colocou a mão em cima do punho de uma de suas facas, uma que ela sabia que tinha sido recentemente afiada e tentou soar casual, ela não tinha tantas razões para ter medo.

Ele sorriu satisfeito e a luz do sol quase cegou ambos no que ele abriu a porta e saíram do velho prédio.

O cenário do lado de fora parecia algo saído de algum livro pós-apocalíptico, o local fora do velho prédio quase não possuía mais asfalto e estava quase que completamente coberto por areia, o sol estava quente sob suas cabeças e não havia uma nuvem no céu.

Não havia quase nenhum prédio que ainda estivesse inteiro por ali, o que levantou o questionamento, para onde ele a levaria?

—Meu carro está ali. -ele comentou apontando para a parte de trás do prédio onde estavam.

Ao virar em direção ao tal carro viu um grande letreiro velho de neon que dizia “Darcy’s Hotel” o que indicava que há algumas décadas aquele grande prédio já havia sido um luxuoso hotel, o que explicava o papel de parede, o tamanho dos cômodos e o lustre gigantesco.

—Eu não fazia ideia de que aqui havia sido um hotel. -comentou sem saber ao certo o que esperar da resposta do outro.

—Sim, devia ser algo grande e espetacular no seu auge, sempre me pergunto o que aconteceu, como quais foram os donos, porque e como o lugar acabou desse jeito… -o carro estava parado à sua frente, há dez passos de distância, e ela foi pega de surpresa. Um conversível vermelho sangue estava parado ali à espera dos dois, era belíssimo. Leviathan foi gentil o suficiente para abrir a porta para ela com um sorriso gentil no rosto, Katherine esperava que ele não tivesse notado que ela havia segurado o cabo de sua faca com mais força. -Ou quem tocou aquele piano antes de mim, sabe? Eu gostaria de saber.

Ele não se deu ao trabalho de abrir a própria porta para entrar, apenas pulando para dentro do carro e segurando o volante com firmeza antes de dar a partida.

Katherine notou que haviam marcas de pneu no chão, como se o mesmo caminho tivesse sido trilhado ali muitas vezes, sempre da mesma forma.

—Você vem muito aqui, huh? -perguntou indicando as marcas com o polegar.

—Sim, é o único lugar onde consigo tocar em paz.

O caminho que ela havia percorrido algumas horas atrás foi feito sem problemas em minutos nos quais o garoto apenas fazia alguns comentários sobre o tempo ou sobre a aparência da garota parada ao seu lado, era como se ele não aguentasse ficar dez minutos sem falar.

Entraram na cidade grande e ela já estava preparada para os olhares indesejados, uma vez que aquele carro possuía um ronco muito alto e sua cor era vibrante demais para apenas ser ignorada. Entretanto não foi a reação que recebeu, nenhuma das pessoas que passava pela calçada sequer olhava para o carro ou para ela ou Leviathan.

—Porque não olham para nós? É muito estranho. -indagou e viu o quanto o garoto pareceu animado por não ser quem havia puxado o assunto daquela vez.

—Bom, talvez esse não seja mais o tipo de coisa que impressiona as pessoas hoje em dia, eu não sei. -deu de ombros encostando o carro em frente a um prédio luxuoso, tudo ali impressionava a garota por sua natureza estranha e espontânea.

Mas a deixava minimamente confortável porque ela havia sentido muita falta desse tipo de coisa no tempo que viveu no reino com todas aquelas pessoas robóticas. Leviathan era muito animado e parecia estar dando o máximo de si tentando “conquistar” Katherine.

—Chegamos, é aqui. -desligou o carro e sorriu para ela, aquilo parecia surreal.

Ela nunca havia achado que teria a chance de entrar num hotel daqueles, e por mais que escondesse do garoto, estava muito animada.

—Leviathan, que tipo de pessoa você vai me apresentar? -questionou seguindo-o pelo lobby, as pessoas na recepção o cumprimentavam como se fossem amigos de longa data.

—As pessoas certas, só isso. E pode me chamar de Levi. -ele piscou para ela antes de apertar o botão do elevador, e o pior, para o último andar.

Qualquer um que já tivesse vivido no mundo humano antes saberia que apenas pessoas podres de ricas viveriam no último andar de um prédio como aquele.

Levi a observava com cuidado, sabia que caso ele fizesse algum movimento suspeito ela não hesitaria em esfaqueá-lo, o que seria horrível a esse ponto, porque ele acreditava que eles haviam feito um ótimo progresso.

A porta do elevador se abriu e Leviathan saiu primeiro, segurando a porta para que ela pudesse segui-lo.

Não havia nada naquele corredor extenso além de uma grande e larga porta vermelha com desenhos de losangos. Alguns vasos com plantas para decoração, mas nada revelava que tipo de coisa havia do outro lado da porta, o que fez com que ela se arrependesse de tê-lo seguido até ali, ter feito tudo aquilo parecia tão estúpido agora, ela estava numa situação perigosa e ela sabia que a culpa era toda sua.

—Não faça eu me arrepender de ter vindo até aqui, isso está muito suspeito. -sacou a faca e observou quando Leviathan ergueu os braços em rendição.

—O quê? Só porque não tem uma placa de boas-vindas significa algo suspeito? Qual é, vamos com calma. -ele parecia nervoso e seus olhos pareciam ficar mais arregalados a cada segundo que passava.

—Vá na frente. -segurou-o pelo ombro deixando-o de frente para a porta e encostando a ponta de sua lâmina fundo em suas roupas, até sentir sua pele. -Aja naturalmente e, se tudo correr bem, você sai dessa inteiro.

Ele assentiu e parecia ficar mais nervoso conforme ela falava, era bom saber que ele a temia tanto.

Ele bateu na porta e uma pequena janela foi aberta onde apenas um par de olhos castanhos os recebeu.

—O que foi? -a voz dizia do outro lado da porta, era assustadoramente grossa e rouca, como se fosse a voz de um monstro enorme de um desenho animado

—Como “o que foi”? Sou eu, Levi! -a reação do par de olhos teria causado uma explosão de risadas em Katherine se ela não achasse aquela situação tão perigosa, Leviathan perdeu a paciência e seu tom de voz mudou completamente ficando ficando mais grave e direta, ele não estava mais brincando. -Diga ao Dex que eu estou aqui e tenho alguém para apresentar a ele.

A micro janela foi fechada sem que nenhum comentário fosse feito, ela não sabia se ele havia falhado ou não.

—E agora? 

—Já vão abrir, estão falando com o chefe. 

—E quem é esse Dex?

A porta foi aberta com um estrondo, os dois se encostaram na parede do elevador e Katherine procurou ter certeza de sempre ter Leviathan em seu campo de vista e quando encontrou-o, assim que a poeira abaixou, observou-o também procurando por ela.

—Dex é o chefe, o maior feiticeiro de todos os tempos, o mandachuva! -um homem de cabelos verdes estava parado na frente da porta escancarada, ele vestia uma bermuda azul piscina cheia de lantejoulas e um robe dourado que brilhava como se fosse feito de cristais, apenas a presença dele era excêntrica. -E também é este belo espécime que vos fala, nem tão mortais.

Seus olhos cor de rosa passavam de um para o outro com uma rapidez chocante, seu sorriso mal parecia caber no rosto, ele estava animado, sem dúvidas.

—Levi, querido! -puxou a mão do moreno e apertou-o num abraço animado e cheio de chacoalhões no qual Levi parecia mal conseguir respirar. -Senti sua falta, odeio quando você fica recluso. Você é a alma deste lugar! -ele fez um gesto abrangente para o local ainda mais excêntrico do lado de dentro das portas, uma fumaça suspeita cobria o teto e dezenas de seres estavam sentados em pufes coloridos fumando cigarros e a maioria deles mal vestia duas peças de roupa. -Esta é a pessoa que quer me apresentar? Ora, é tão pequena que mal chega a ser uma pessoa completa! Muito prazer, me chamo Dex, o maior fornecedor de artigos para feitiçarias, armas e prazeres de todos os tipos. -ele estendeu a mão para que ela o cumprimentasse de volta e a garota se perguntou se aquilo tudo não era um sonho.

Surreal, tudo era muito surreal.

—Katherine. -apertou a mão de Dex e sentiu seus dedos frios se fecharem ao redor de sua mão devagar, ele possuía quase o dobro de sua altura e era musculoso, apesar daquilo ser a última coisa a ser notada debaixo de todas aquelas coisas espalhafatosas.

—Katherine, ótimo. -o sorriso que ele ofereceu a garota tinha sido de orelha a orelha, literalmente. Então em um segundo ele já havia soltado sua mão e falava freneticamente com Leviathan mais uma vez. -Vocês tem que entrar! Estou tão feliz por vê-lo! Embora esteja me perguntando quais são suas intenções trazendo esta garota até aqui.

 -Bom, é… -Dex levava Levi sob seu braço o tempo todo por dentre os corredores de pessoas dentro daquilo que parecia ser uma boate, o problema é que ela não conseguia ouvir quase nada do que eles estavam conversando. -... Então pensei que trazê-la para te conhecer seria uma boa.

Uma grande cortina vermelha se estendia por quase toda a parede ao fundo da boate, Dex abriu caminho pelo tecido e teve a gentileza de esperar pela garota, o tecido daquela cortina era denso como óleo, não se parecia com nada que ela já tivesse visto ou sentido. Talvez fosse fruto da dita “magia” de Dex, ela ainda não havia decidido se acreditava na história de feiticeiro dele, ela sabia que no mundo humano muitos diziam ser bruxos ou feiticeiros sem ter nenhum traço de energia mágica dentro de si.

—Ah sim, tem razão. Então, Levi estava me dizendo que você acabou encontrando-o enquanto ele estava fugindo da sociedade naquele hotel podre e acabado que ele tanto gosta, e que por mais que achasse você amedrontadora, ainda quis ser seu amigo. -ele riu e bagunçou os cabelos de Levi com afeto, as mechas pretas lisas envolviam os dedos brancos de Dex como fitas. -Mas está claro para todos aqui que você não parece estar a procura de amizades, com todas essas facas e esse olhar fechado. Entretanto, você se sujeitou a vir até aqui com ele, um completo estranho, para conhecer alguém que você não fazia a mínima ideia de quem é ou de como isso seria… Eu diria que de duas, uma: ou você não sabe se proteger direito ou você de alguma forma, por algum motivo decidiu confiar nele.

Ele sentou-se num pufe vermelho gigante que estava no chão e Levi logo se acomodou numa pequena cadeira dourada ao lado dele, Katherine se sentiu como se estivesse em algum tipo de julgamento.

—Sei me cuidar muito bem, Leviathan me pareceu uma pessoa gentil e eu queria ter contato com alguém depois de um longo tempo, além de que ele não parecia disposto a me deixar em paz. 

—Ela tem razão, eu insisti muito para que ela deixasse eu me aproximar. -Leviathan comentou baixo para Dex, que mantinha a mão no queixo e os dedos nos lábios, ele a analisava com uma intensidade tão forte que chegava a causar calafrios na garota.

—Além de que, se ele oferecesse qualquer ameaça a mim eu acabaria com ele em menos tempo do que você imagina. -completei deixando claro que eu realmente não era uma pessoa de muitas amizades, mas havia decidido confiar em Leviathan e que eu poderia tomar conta de mim mesma muito bem.

—Não tenho dúvida sobre isso, com toda essa energia dentro de você, seria capaz de transformar todos aqui em cinzas em minutos. -Dex falava sério e olhava nos olhos de Katherine que naquele momento teve plena certeza de que ele era um feiticeiro, e não qualquer feiticeiro. 

Ele não devia conseguir detectar que ela possuía energia mágica dentro de si, ela tinha feito um feitiço de proteção para que aquilo não acontecesse.

Para que eles não a encontrassem.

—Energia? -Leviathan esticou a cabeça ficando a frente de Dex, ele não fazia a menor ideia do que eles estavam falando, felizmente.

—Sim, mas não se preocupe. A meu ver vocês dois podem se ajudar muito no futuro, e você querida, sempre será bem-vinda aqui, venha quando quiser qualquer coisa. -Dex colocou um braço sob seus ombros e sussurrou em seu ouvido. - Posso conseguir coisas para qualquer feitiço e tiro informações até mesmo de homens mortos. E eu notei o feitiço que fez, não vou contar nada para Levi, você é quem sabe. Mas ele parece te admirar muito, não deixe ele de fora.

—Não pedi para que ele grudasse em mim.

—Mas não o impediu também, não estou te julgando, fiz o mesmo. É impossível resistir aos charmes desse garoto, afinal. -ele soltou-se da garota e segurou Leviathan pelas bochechas como se ele fosse algum tipo de criança.

—Vamos embora, eu estou com fome. -chamou Levi e observou no que ele se levantou num pulo com um sorriso gigante nos lábios. 

—Você viu? Ela me chamou, somos amigos agora! -saltitou para fora da “sala” de Dex.

As pessoas a encaravam como se ela estivesse brilhando em verde fluorescente, algumas até tentavam tocá-la, a garota segurou uma de suas menores facas e apontou no rosto de uma das criaturas mais abusadas, uma com forma musculosa e dedos longos e finos que havia segurado sua coxa.

—Tire sua mão de mim ou eu vou cortá-la fora. -sibilou.

—Ei! Calma aí. -Levi tentou abaixar a faca, mas Katherine o empurrou. -Eles estão drogados demais para pensar em fazer qualquer coisa com você, ele só deve ter te achado bonita.

Olhou de um para o outro e abaixou a faca com cuidado, a mão da criatura continuava em sua coxa.

—Viu? Ele nem sequer mexeu um músculo mesmo com a sua ameaça.

Se soltou do agarro da criatura e seguiu em direção a saída, onde o par de pequenos olhos castanhos se revelou ser um ser gigantesco, que mal cabia no recinto, com quatro olhos pequenos e castanhos e uma argola grande e cheia de glitter pendurada no grande nariz de porco, a criatura não os dirigiu a palavra nenhuma vez ao abrir a porta.

—Para onde agora? -questionou o garoto, cada vez mais animado com a ideia de serem uma dupla agora.

—Não faço a menor ideia, você conhece melhor a cidade, me diga você. 

Ele sorriu e não conseguiu conter uma risada ao ouvir aquilo, na cabeça dele eles seriam como Batman e Robin, ou Bonnie e Clyde, já que ela é uma garota…

Katherine não conseguiu evitar sorrir ao ver a animação do garoto ao seu lado, tê-lo por perto poderia mesmo ser algo bom.


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Notas finais do capítulo

Leviathan precisa ser amado e protegido ok?



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