O Verdadeiro Mundo Pokémon escrita por Ersiro


Capítulo 14
Botando pra quebrar!




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UMA ESPAÇOSA ESCADA DE PEDRA CINZENTA nos leva até o topo da negra montanha pedregosa que se ergue na nossa frente. Mesmo de onde estamos, consigo notar que seu pico é aplainado e que mesmo antes, em sua encosta, várias casas — também feitas do mesmo material de pedra cinzenta da escada — se projetam e criam várias ruelas por entre elas, formando um complexo labirinto de caminhos que além de se conectarem com outros que levam a casas mais acima ou abaixo, também chegam ao topo.

Quando começamos a subir, a longa escada me engana, pois ela me faz olhar para seu topo e, assim, algumas vezes acabo errando o passo ao pisar em seus degraus. Não me preocupo em passar vergonha, pois meus amigos estão na mesma situação. Começamos a rir um do outro.

— Essa maldita escada sempre faz isso com as pessoas que não mora na cidade! — diz Helene.

— Sempre faz isso? — pergunto. — Vocês já estiveram aqui?

— Sim, mas faz um tempo. Viemos em excursão de escola. Nos explicaram cada pontinho que existe nessa merda — responde Vector.

— E o que tem de tão importante aqui nessa cidade para ter excursões escolares? — Lucy pergunta, sem entender.

— Imagino que seja por ter o Prédio dos Governantes... — arrisca Ben.

— Isso mesmo — diz Helene com um sorriso no canto da boca.

Nunca tinha reparado, mas só agora, olhando aquele sorrisinho, noto na beleza de Helene. É diferente de qualquer outra garota que eu tenha visto. É uma beleza... selvagem.

— A escada, as casas e outras construções são feitas de mármore bruto — explica ela. — E o nome da cidade se deu por conta do local em que foi construída, como as antigas acrópoles, que além de outras construções importantes como os templos, também abrigavam os palácios dos governantes. No caso, o que tem aqui, serve como o local onde eles trabalham ou algo assim — ela riu e deu um soco de leve no braço de Vector. — Saca só, ainda lembro do que eles explicaram!

Olho mais atentamente para uma das casas ao meu lado. Os tijolos de pedra são irregulares e nao lisos. Por conta do sol que bate diretamente nas peças retangulares, sua cor mais se assemelha ao branco.

— Ah, já sei! — exclama Lucy, com o indicador levantado. — O grey vem de cinza, que é a cor das construções aqui da cidade! Acro-grey!

— Sim, querida — diz Helene com uma careta que dizia "Qual o problema dela? Isso é tão lógico!".

Eu rio e Vector me acompanha, escondendo o rosto com a mão. Acho que esse tipo de reação é uma raridade em se tratando dele.

— Vi em algum lugar que a cidade tem quatro saídas nos quatro pontos cardeais, cada uma levando para outra cidade — é Baker quem fala, coçando atrás da cabeça com os dedos, não muito certo do que dizia.

— Isso, são quatro escadas que indicam os pontos cardeais e cada uma leva para uma cidade — responde Vector, voltando ao seu estado sem ânimo. — Leste — diz ele, apontando para trás da gente, de onde tínhamos vindo de Luvander —, oeste — continuou, indicando à nossa frente —, norte — para a nossa direita — e sul — para a esquerda.

Pois é, meus preceitos que tinha da dupla estão sumindo aos poucos. Os dois se vestem desse jeito meio maluco, mas aparentam ser bem inteligentes. É... Vou parar de ficar pensando coisas sobre ele, até porque nem os conheço! Pra que vou ficar gastando tempo imaginando coisas?

Depois de alguns minutos — que mais pareceram horas — subindo aquela escadaria gigante, conseguimos finalmente chegar na parte plana da montanha e a admiração de nós três que nunca tínhamos visitado a cidade, foi notável.

As casas e construções aqui são mais elegantes que as que estão na escarpa. Os ladrilhos das ruas são feitas do tal mármore bruto e todas elas levam, no fim, para a construção central, ao longe: um prédio esplendorosamente bonito e grande, cercado por uma praça tão verde que dá vontade de correr para lá e deitar na grama refrescante. O legal é o espaço enorme que toda essa parte plana da montanha tem, dando lugar à tantas casas e lojas, que acho que um dia não seria necessário para visitar todas esses variados estabelecimentos.

— Nós vamos nos bares de show para ver se precisam de algum espetáculo ou algo do tipo — começa Helene. — Vocês vem conosco?

— Acho melhor não... — titubeio, pensando em meus amigos — Nós temos um propósito a cada cidade que passamos...

— Então que tal nos encontrarmos no Centro Pokémon quando o sol estiver baixando? — tenta Helene. Vector olha pra gente com uma cara nada boa. Parece não querer nossa companhia seja qual for o momento. — Aposto que até lá, meu irmão e eu já vamos ter achado um lugar para cantarmos e adoraríamos que vocês vissem nossa apresentação. Que tal?

O brilho nos olhos de Helene estão tão intensos que é impossível não ver que ela realmente quer que vejamos o show deles. Vejo meus lábios respondendo por conta própria:

— Tudo bem.

 

UM PESSOALZINHO COMEÇAVA A SE REUNIR na praça, criando burburinhos entre os moradores e segurando algumas placas e cartolinas. Não faço a mínima ideia do que estava escrito em qualquer uma.

Fomos os três juntos e ao mesmo tempo que Lucy perguntava de seu irmão de um lado, eu perguntava sobre a doença do outro.

Encontrei até mesmo um médico e ele me perguntou se minha mãe não teria sido picada por um Seviper ou outro tipo de cobra e respondi que não. Tinha certeza que não. Minha mãe teria me dito algo assim.

Ele continuou falando que aquilo era típico de serpentes e não sei mais das quantas. Não senti muita firmeza naquele doutor, é como se ele não estivesse nem um pouco interessado no caso, pois falava com desdém e ficava sempre olhando para seu relógio de pulso.

Agradeci e deixei ele ir para seu compromisso. O bendito acabou me deixando com a pulga atrás da orelha. Preciso achar um jeito de descobrir se minha mãe não foi picada por uma serpente.

Continuamos juntos perguntando e assim que o sol começou a abaixar, por incrível que pareça, já tínhamos perguntado para a grande maioria das pessoas que nos deram atenção. Com o tempo as pessoas ficam boas na busca daquilo que tanto querem ter. Estávamos ficando bons e ágeis na nossa procura.

É um pouco desconfortável fazer isso, confesso, pois muitos nos olham como se fôssemos daquele tipo de pessoa desesperada que, repentinamente, chega cheio de olheiras e com os cabelos bagunçados, perguntando com exasperação algo para elas. Mas não é bem assim. Não entendo por que elas não compreendem tal coisa e alguns até mesmo fazem questão de não nos ajudar, negando dar sua resposta. De qualquer forma, alguma coisa me diz que esse tipo de pessoa não tem nem uma resposta de valia para nós.

Foi legal ver que Ben nos acompanhou nessa procura aqui em Acrogrey, sendo que ele poderia muito bem ir descansar no Centro. Falando no Centro Pokémon, é nele que estamos chegando agora. Este, fica de frente para a praça que rodeia o Prédio dos Governantes. Estamos certo de que não vamos mais ver os irmãos e quando estamos pronto para entrar e deixar nossas mochilas, para irmos procurar algo para comer, Helene e Vector viram a próxima esquina. A garota faz um aceno e dá uma corridinha para chegar mais rápido.

— Vocês não vão acreditar! — ela exclama, animada. É engraçado como ela sempre se dirige para mim. Parece que sabe que fico meio que enfeitiçado com seu olhar direto nos meus. — Conseguimos arranjar um lugar para cantarmos — ela segura minhas mãos e as balança a cada palavra.

Lucy se coloca entre a gente e desfaz nossa ligação de mãos.

— Que legal, amiga — Lucy sorri falsamente. — Agora vai lá berrar um pouco que nós vamos comer.

Vejo que Helene respira fundo e se controla para não pular em cima de Lucy e esbofetear a garota.

— Vocês vão, não é? — de novo ela pergunta para mim.

— Sim, eu vou — respondo sem pensar, perdido naquele negro de seus olhos.

— Você quis dizer nós, não é Bake? — Lucy, está com os braços cruzados e me fita com os olhos semicerrados.

— É! — acordo do meu curto encanto. — Isso mesmo que eu quis dizer.

 

ESTOU NA FRENTE DO PC. No fim, fui o único a entrar dentro do Centro Pokémon e continuamos com nossas mochilas nas costas. Os outros estão lá fora, me esperando. Helene disse que a apresentação começaria daqui a pouco. Tenho apenas alguns minutos. Estou tentando formar uma conexão com o único PC de Montevasca, mas já estou na terceira tentativa e não dá certo.

 

Não conseguimos estabelecer uma conexão.

Desculpe o transtorno.

 

Terceira tentativa frustrada!

Nesse momento, Vector aparece na porta de entrada automática do Centro Pokémon.

— Vamos, cacetilde! Que demora é essa?

 

O PESSOAL QUE SE ENCONTRA na frente da praça estão em maior número agora. Estão protestando na frente do Prédio dos Governantes. Consegui ler de relance um dos cartazes que diz "Mudança já!!!".

O local onde a dupla conseguiu uma oportunidade para se apresentar é um bar pouco iluminado por dentro. Ali há muitas outras pessoas que se vestem como os dois irmãos. Estes, por sua vez, estão sentados ou de pé, conversando e rindo, tomando suas bebidas e fumando seus fumos fedorentos.

Paramos na frente do balcão e Vector chama a atenção do homem que está atrás do largo tampo negro de mármore liso.

— E aí — o homem cumprimenta, levantando um pouco o queixo. É careca e um fino cavanhaque com bigode se desenha em volta de sua boca. Seus braços descobertos pelo colete são tomados de tatuagens que não consigo distinguir na pouca luz do ambiente. Deve ser o dono do bar. — E quem são esses três perdidos aí?

— Nossos amigos deslocados — ri Helene. — Vieram ver a gente cantar. Tem como eles desfrutarem de algo aí, por conta da casa, Brutus?

Brutus faz um bico presunçoso, passando os pelos do bigode na ponta do nariz.

— A primeira vez de vocês aqui e já querem moleza demais...

— Nós podemos pagar, trouxe... — começa Ben.

— Pode deixar, não precisam pagar nada, desde que não peçam algo caro — interrompe Brutus. Atrás dele, várias longas prateleiras tomam toda a extensão da parede. Essas prateleiras estão abarrotadas de garrafas variadas e coloridas.  — Dessa vez passa, duplinha Patricinhas.

Parricidas — corrige Vector, prolongando o som do "s", mirando sem medo algum o dono do local.

— Vocês dois podem subir no palco — ordena Brutus apontando para uma elevação mais à frente. — Usem qualquer instrumento que quiserem.

— Sério? — pergunta Helene, maravilhada.

— É, mas é só os que têm lá. Se não tiver o que quiserem e ficarem com frescurinha pra tocar, é da porta pra fora.

— O que tem ali deve ser o suficiente — murmurou Helene, já se direcionando com Vector para o palco.

— Pra quem só ia se apresentar com um violão é mais do que suficiente. Vão lá e deem um pouco de agitação pra esse lugar — ele diz, sorrindo e murmurando um "Crianças!" — O que vão querer? — ele pergunta para nós.

— Como nós não bebemos bebidas alcoólicas, queria saber se tem algo para comer, por favor — pede Lucy, toda educada.

Brutus pisca algumas vezes, talvez não acostumado a ser tratado daquela forma.

— Certo. Vou pedir para a cozinheira fritar batatas e trazer com molho azedo de Berry. Pode ser?

— Sim, está ótimo. Obrigado.

Brutus dá de ombros. Chama um cara que termina de entregar algumas bebidas na mesa dos fregueses e manda ele falar para a cozinheira preparar nosso pedido e trazer também alguma coisa que crianças possam beber.

Lucy sorri para Brutus e ele retribuiu um sorriso torto, que denuncia que os sorrisos naquele rosto são raros. As aulas que o pai de Lucy pagou para ela, deram resultado. Se bem que foi algo simples o que ela acabou de fazer, penso, meio perdido entre aquele emaranhado de jaquetas pretas e fumaça de cigarros.

Um barulho elétrico faz com que minha atenção seja direcionada para o palco. Vector está com uma guitarra e faz sair sons dela com o movimento de seus dedos nas cordas. É rápido e constante, e aos poucos começa a culminar em algo frenético. O pessoal no bar se cala para observar o que aqueles dois estão aprontando. Os Parricidas tem a atenção do público que começa a se contagiar com o som.

Helene está com um pandeiro e começa a batê-lo em sua outra mão, criando uma boa harmonia com a guitarra. Ela chega perto do microfone.

— O que acham de ouvir um bom som? — diz ela fazendo uma voz rouca de excitação. A plateia retribui urra e alguns até batem palmas, apoiando. — Então estão prontos pra ouvir Rock! — grita Helene. O pessoal em volta uiva, estimulados.

Em um piscar de olhos, ela começa a bater o pandeiro em sua anca e pega o microfone com a outra mão.

O ritmo da guitarra fica mais pesado, mas ainda assim frenético e Helene começa a cantar. Sua voz aguda contrasta com o ritmo pesado e isso torna o som muito bom. Mas ela ainda tem muito a mostrar. Começa a mudar o tom e a modular a voz de forma tão precisa que a música se torna... perfeita.

Até mesmo Lucy parece estar animada, ouvindo a música, se esquecendo de suas pequenas intrigas com Helene.

Ficamos assim, ouvindo as várias musicas que tocaram depois e saboreando as batatas e petiscos que chegavam.

 

QUANDO SAÍMOS, a noite já caiu e as casas e postes estão com suas lâmpadas acesas.

O clima em volta do pessoal do protesto está mais agitado. A praça e as ruas estão apinhadas de gente. Nós cinco decidimos nos aproximar para assistir mais de perto o que acontece. Um homem está em cima de uma das mesas de mármore da praça, improvisando um palco. Ele segura um microfone e uma caixa de som amplifica e emite sua voz que grita no microfone.

— ... estamos aqui há um tempão e mesmo assim, eles nem sequer quiseram negociar o nosso bem estar. Mal tiraram a cara pra fora! — a multidão em volta dele apoia com gritos e palmas. — Ser Revolucionário é ser alguém que quer mudanças radicais. Estamos aqui para renovar tudo isso que comandam de forma errada, então...

Alguém toma o microfone de sua mão e o tira da mesa. Em sua jaqueta, um "R" está estampado. Meu coração já começa a acelerar quando penso ser Jeremy, mas não é ele. Esse cara eu não conheço, mas certamente é um Rocket.

— Então é por isso — começa ele, com um sorriso — que temos que chamar a atenção deles de uma maneira mais drástica. Vamos mostrar que eles têm que nos ouvir! Se nos ignoram, mesmo nós estando pacíficos, vamos fazer com que percebam nossa presença e poder!

Nesse momento algumas pessoas começaram a catar pedras no chão e a tacar contra o grande e largo edifício de mármore. Algumas delas acertam e quebram os vidros de algumas das centenas de janelas. Olhando mais atentamente, vejo que são Rockets que fazem isso.

É fácil distinguir os Revolucionários, pois eles não usam o uniforme dos Rocket, nem as curtas roupas que a maioria dos moradores de Acrogrey vestem. Na verdade grande parte dos Revolucionários levam roupas amarronzadas e amarelas. Eles estão quietos, sem saber o que fazer. O mesmo vale para os moradores que também estão misturados na multidão.

— Vamos nessa, não se intimidem! Como querer a atenção deles se não a chamam da maneira adequada? E vocês também moradores, se juntem a nós! — gritou o Rocket no microfone. — Vamos mudar tudo isso de uma vez por todas!

Depois daquele incentivo, alguns dos Revolucionários e moradores começaram a se juntar aos vândalos, enquanto outros se afastavam. O homem que estava com o microfone antes de ser empurrado pelo Rocket, berra para os que estão indo na conversa do outro:

— Ei, não façam isso! Não é preciso apelar para o vandalismo! — ele se achega mais perto do Rocket com o microfone e o agarra pelo colarinho, enquanto a confusão continua atrás deles, no ataque ao prédio. — O que você fez?! Não me lembro que no trato feito pelos nossos chefes tinha sido permitido esse tipo de coisa!

— Eles nem falaram nada do tipo! Então proibido não é! — ruge o outro em resposta e se soltando do Revolucionário.

A gritaria e horror de alguns se expande. As pessoas que não fazem parte da depredação, entram em desespero.

Choro de criança, cheiro de fumaça, empurrões. Estava tudo se tornando um pandemônio.

— Haha! Nessa eu entro! — diz Vector, correndo para o meio da bagunça.

— Não, Vector, volte! — grita Helene, indo atrás dele e sumindo na multidão que se empurra desesperada para se refugiar.

— Helene! — também grito, começando a ir atrás dela, mas uma mão me segura e impede.

— Não, Bake! Vamos sair daqui, deixe que eles se resolvam! — é Lucy quem pede.

Seus olhos suplicam para que eu fique. Ben afirma com a cabeça, apoiando a amiga.

Por um momento eu me seguro e penso em ficar, mas me solto e sumo na aglomeração.

Está quente; o aperto e empurra-empurra me sufoca, mas depois de muito esforço, consigo sair bem em frente ao prédio. Mais pessoas do que eu tinha imaginado, se juntaram ao vandalismo e acabam de conseguir arrombar a porta principal e entram como formigas dentro do prédio. Restam alguns que ainda ficam do lado de fora, quebrando o prédio, seja com pedras, martelos ou até mesmo com a ajuda de seus Pokémon. Uma das várias árvores está em chamas e a fumaça me sufoca.

Puxo a camisa para meu nariz e procuro mais atentamente Helene. Vejo Vector catando pedras no chão e tacando contra os vidros restantes do edifício. Corro pra lá e assim que chego, Helene também aparece.

— Chega, Vector. Você já se divertiu o bastante — diz ela, puxando o irmão pela manga da jaqueta dele.

— Que nada! Isso é maravilhoso! — grita Vector, estimulado. Ele lança seu Caterpie e pede para ele lançar Tiros de Seda no prédio o quanto puder. E ele obedece.

Um Revolucionário que estava há pouco lançando pedras, passa ao nosso lado, com a mão cobrindo a testa que escorre sangue.

— Droga, me ferrei! — ele resmunga, com uma careta de dor no rosto.

Droga digo eu! Está uma bagunça aqui! Nem sei como reagir a tudo isso, penso.

— É vamos, já deu — murmuro. Helene agradece com o olhar minha fraca ajuda.

Vector coloca uma pedra na minha mão.

— Se você lançar só essa, nós voltamos — ele negocia, com um sorriso no rosto. — Mas tem que lançar com toda a sua raiva que você tem contra eles. — Vector aponta para dentro do prédio. Eu sei que ele está se referindo aos governadores.

Olho fixamente para Vector e afirmo com a cabeça. Miro o prédio e toda a raiva que tenho por tudo o que já vi e que eles nem se importam em tentar ajudar, começa a se concentrar na minha mão que segura a pedra. Lanço-a com uma força que nem mesmo eu acreditava ter e ela se choca contra uma das janelas e a estilhaça por inteiro.

— Caraca! Isso foi incrível! Não deixou nem um pouquinho daquela janela pra mim!

Nao quero admitir, mas ele tem razão... Isso é... bom! Sinto como se uma parte da minha raiva escondida e acumulada tivesse sido dissipada. Me agacho e pego outra pedra. Faço a mesma cerimônia antes de lançá-la.

— Vocês são tão bobos — murmura Helene, fazendo cara feia pra gente.

— Diz isso porque nunca tentou! — falo.

— Haha! Está ficando bom de jogar pedras, nanico! — uiva Vector, animado e lançando mais pedras.

— Ei, vocês! Parem já com isso — esbraveja alguém. Nos viramos e vemos que é uma Oficial Jenny com vários outros policiais atrás dela.

— Ih, sujou! — diz Vector. — Vamos zarpar daqui!

Nos viramos para dar no pé, mas do outro lado os policiais também chegaram e já imobilizam alguns que conseguem segurar.

— Vector! — grita Helene.

Procuro por seu irmão e vejo que um policial puxa seu braço para trás e o obriga a se ajoelhar no gramado.

— Saia logo daqui, mana... — ele consegue dizer, com o rosto contorcido de dor.

Me viro para correr, porém sou parado por alguém mais forte que eu. O policial me segura com força, mas pra sua infelicidade, ele me agarrou de frente. Puxo minha perna para trás e desfiro uma joelhada na área entre suas pernas. Instantaneamente, ele me larga e geme de dor. Mesmo na adrenalina do momento, consigo enxergar rapidamente Helene — que estava parada, assistindo a tudo assombrada — e a puxo pelo braço, fugindo daquela área.

Nas mesma hora fico igual a um cego. Não consigo distinguir muito bem para onde estou indo; só quero sair daqui.

Meus pés estão cansados, meu peito queima, mas não paro. Minha respiração entrecortada impede que o ar entre em sua plenitude pelas narinas; o suor que escorre de minha testa, cai em meus olhos e embaça minha visão até que eu pisque.

Paro quando Helene começa a puxar o braço e a reclamar de dor.

— Chega! Você está machucando meu pulso! Faz tempo que estou te pedindo para me soltar e você não me escuta!

— D-desculpe — respondo, cansado e soltando-a.

Estamos em uma das ruelas que ficam na encosta da montanha. Não sei exatamente como consegui chegar aqui.

— Não tem mais ninguém atrás da gente há muito tempo. Vamos voltar — ela diz, passando a mão no pulso para aliviar a dor. Me sinto culpado e peço desculpas de novo. — Tudo bem, só vamos voltar — ela suplica.

Penso no que estava fazendo com Vector. Quase fui detido por isso. Esse seria o preço que pagaria por fazer o que fiz.

Mas que foi libertador... Ah, isso não posso negar.

 

CONSEGUIMOS PASSAR DESPERCEBIDOS do olhar dos policiais e entramos no Centro Pokémon. A primeira coisa que noto é como ele está cheio. Deve ter tido muitos feridos depois do pandemônio. Ou só estão aqui esperando tudo se acalmar para saírem de novo

Ben e Lucy estão sentados em uma das várias poltronas do pátio. Caminhamos até eles.

— Pensei que os policiais tinham te prendido! Que demora! — reclama Ben, quando nos vê.

Helene se joga na mesma poltrona que os dois estão sentados. Lucy  a analisa e depois procura algo em nossa volta.

— Cadê o outro esquisitão? — ela pergunta.

— Vector foi preso — Helene tem dificuldade para dizer isso. Suas palavras saem fracas e seus lábios tremem. Ela está se esforçando para não chorar, mas não consegue aguentar por muito tempo e as lágrimas começam a descer. — O que vou fazer agora? Como vou voltar pra casa sem ele? Papai vai ficar furioso... — ela desabafa, se debruçando sobre as pernas e soluçando.

Um momento de silêncio se passa, no qual ficamos ouvindo o choro de Helene. Algo em minha cabeça começa a remoer.

— Nós... Nós vamos tirar Vector de lá — digo, sem vacilar.

Helene olha pra mim. Seu rosto está todo molhado e a maquiagem preta em volta dos olhos, borrada.

— Não temos dinheiro para pagar fiança, Bake — diz Lucy, séria.

— Eu vou arranjar um jeito de tirar ele de lá sem que os policiais percebam — respondo.

Helene ainda olha pra mim. Seu olhar é um pouco confuso, como se ela perguntasse "Você faria isso?".

— Não pode fazer isso, Baker. É muito perigoso! — Ben alerta.

— Você não nos ouviu, fugiu e ainda assim demorou esse tempo todo pra voltar — esbraveja Lucy. É estranho ver Lucy nervosa por eu estar fazendo algo idiota. — E agora tá querendo arranjar confusão com a polícia? Tá ficando maluco?

Na verdade, desde o momento em que fui atrás de Helene, foi porque eu quis. É o que minha mãe sempre me disse, para fazer o que eu decidir fazer, sem a intromissão de ninguém. E foi o que fiz.

Já me privei de coisas que quis fazer e isso sempre me deixou um tanto frustrado. Dessa vez não vou me recusar a fazer algo que desejo!, grito dentro de minha própria cabeça. Preciso ajudar Helene!

— Não — murmuro, mas levanto a cabeça para mirar meus amigos e termino, convicto:  — Vou conseguir. É o que eu quero.


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Notas finais do capítulo

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