Momentos da Vida (Wolverine e Ohana) escrita por lslauri


Capítulo 47
E no Brasil, um casal de mutantes aprende também o que é “saudade”




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texto em itálico são pensamentos

palavras em negrito são enfáticas na entonação

os nomes de quem fala estão antes de cada fala, em negrito apenas para que saibamos quem são

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E NO BRASIL, UM CASAL DE MUTANTES TAMBÉM APRENDE O QUE É "SAUDADE"

Já em Ellesmere, Ororo e Warren se preparam para dar adeus àqueles que os ajudaram, de certo modo, a se reencontrar. Foi pelo dia a dia com aquela comunidade pacata que, em especial Warren, percebeu valores há muito esquecidos. Os anciãos dariam uma festa de despedida naquela noite, no meio da neve e do frio, entre fogueiras e o calor das bebidas e da amizade daqueles humanos e mutantes que conviviam em paz e os dois convidados de honra não poderiam deixar de comparecer.

Ororo: Em minha tribo tínhamos muitas dessas festas de despedida, desejando bons auspícios àqueles que partiam. Muitas vezes, para nunca mais voltar… Eram guerreiros, anciãos, exploradores e, até mesmo, para os infratores fazíamos uma cerimônia para que não houvesse interesse em voltar por parte deles. Aqueles banidos… - e ela então sentiu-se como uma banida, não pela sua família, mas pela tribo à qual fazia parte. Suspirou e, voltando-se ao presente, completou: E como farão isso por nós, devemos estar presentes, Warren. Mesmo que preferíssemos continuar aconchegados aqui.

Eles estavam deitados na tenda que haviam designado ao Anjo, sendo que pelas roupas misturadas no chão, podia-se perceber que haviam retornado da conversa aérea entre mais que beijos e carinhos. Warren se espreguiçou esticando as pernas e as asas e sorriu abertamente, ele abraçava a Deusa dos Ventos pelas costas e, passando a mão direita no braço dela, sentenciou:

Warren: Então vamos! Eu sou preguiçoso por natureza, ainda mais em teus braços, não pretendo levantar, vamos logo! Antes que me arrependa… - beijou-a na face e se levantou.

A africana então se apropriou de toda a pelagem estendida no chão e ele pôde admirar mais uma vez aquele físico impecável, melhor que muita modelo de capa de revista com quem ele havia saído tantas vezes… Ela sentou-se e pegou a camisa dele que estava no chão, cobrindo-se e sorrindo, enquanto seu dedo indicador apoiava embaixo do queixo “caído” de Warren na ida dela à toalete.

Ororo: Não precisa babar, Warren… Desse jeito eu vou pensar que você nunca esteve com uma mulher bonita, meu querido… - e riu, desfilando.

Warren: Sabe de uma coisa, eu começo a achar que nunca estive mesmo?… Estou percebendo que beleza física não é nada sem conteúdo, e que esse conteúdo realça, e muito, o físico também! Está de parabéns, hein?… É o pacote completo para qualquer homem que tem a sorte de ser escolhido por você.

Ororo falava de dentro do outro cômodo, enquanto se trocava: Creio que seja um encontro de almas, Warren. Muitos homens não deram valor ao “pacote”, só tinham olhos para uma das qualidades e, normalmente, é a mais perecível. Se alguém consegue enxergar além da superfície, esse sim tem a capacidade de aproveitar de verdade, não é? - e ao sair, abrindo a cortina, ela finaliza: E como estamos aproveitando, hein?!

Ele a abraça, linda que era e entra também para se trocar. Eles se vestem com um sobretudo local que havia sido entregue no dia anterior da partida, feito de peles e metais nobres, cravejado com algumas pedras preciosas. Era possível, pela grossura e técnica da costura, usar somente eles por sobre a pele e não congelar no exterior. Dentro da tenda, então, era impossível de ficar sem passar muito calor, percebendo isso, Ororo avisa da sua saída para a porta da tenda e o espera lá.

As peles usadas no casaco de Ororo eram brancas, salpicadas de preto e já as de Warren eram avermelhadas, servindo para contrastar perfeitamente com seus tons de pele. Eles pareciam rei e rainha de alguma civilização esquecida. Warren havia comentado que não conseguiria vestir o sobretudo devido às suas asas e uma das costureiras da cidade disse que arranjaria isso; realmente, ela fez duas aberturas perfeitas para encaixar as asas e, ainda assim, manter a quentura. Aproveitou-se de as penas serem um isolante térmico natural e fez o fechamento a abertura em duas camadas, para que penas da base das asas pudessem preencher esses espaços e manter o calor do corpo do mutante. Tudo estava perfeito e era pensado para que eles sentissem menos frio possível.

O local da cerimônia era em forma de alvo, com várias fogueiras concêntricas e, no centro, local para que as pessoas conseguissem se reunir e participar. A “jornada” dos dois iniciaria dos círculos mais externos ao centro, onde os anciãos descreviam como eles haviam chegado em Ellesmere, com os corações quebrados, dispostos à mudanças, mas sem as forças necessárias para realizá-las; no caminho, foram esquecendo-se do ego e até do que aquela jornada significava; passando a outro círculo onde, finalmente, conseguiram se olhar e ver o interior próprio e do outro companheiro. Jornada finalizada com cantorias e comilanças para que nada faltasse no caminho, incluindo um ao outro. Eles se beijaram e foi como se tudo fizesse sentido, sem sofrer pelos amores passados, como na música “Mi tengo” da Laura Pausini, onde cada experiência vivida é um degrau para algo melhor e maior, não algo que deva ser combatido ou enlutado para sempre. Viver é caminhar, sempre com consciência do passado, sabendo o quanto cada minuto nos fortalece, mas também com vistas ao futuro.

Ambos sentiram as energias diferentes que eles mesmos emanavam e, como Ororo estivesse exultante, a Aurora Boreal acabou aparecendo antecipadamente por ali, todos sorriram sabendo que isso era fruto dela e, portanto, não deixava de ser um agradecimento a todos eles. Warren beijou a mão dos anciãos e, antes de retornarem para suas tendas e casas, ele arrancou duas penas de cada uma de suas asas e os presenteou! E nesse clima de agradecimentos e felicidade, a noite passou. Inclusive com alguns “dormindo de menos”, pois “amaram um pouco mais”.

Empreenderam a volta usando a mesma costa que os aviões usam para voar, mas com menor altitude, parando quando queriam, matando a sede quando precisavam, comendo e se amando quando sentiam vontade. Algumas vezes, a viagem era tão boa que esqueciam de comer! Mas de fazer amor, isso eles não esqueciam! Até mesmo voando os dois aproveitavam as oportunidades. Como Warren podia se aproveitar de correntes de vento quentes e ascendentes, como o fazem alguns rapinantes, Ororo podia esquecer-se de aproveitar essas mesmas correntes e sentir prazer sem precisar ficar focando em sua mutação durante todo o momento. Bastava ao Anjo abrir as asas e mantê-las assim, circundando, beijando e carinhando sua Deusa.

Ao chegarem à costa brasileira se deliciaram com as praias do nordeste. Passaram alguns dias em Barra do Sai e perceberam que não era só a natureza do país pródiga, senão que quase ninguém os encarava ou questionava se eram mutantes ou se era Carnaval fora de época para ele tivesse aquelas asas. Eles eram aceitos como eram, de modo muito natural por todos os nativos que encontraram. Outros haviam citado sim, dizendo que aquela era uma mutação muito bonita, um outro que eles eram um lindo casal. E desse modo, o clima, as pessoas, a natureza, tudo foi corroborando para encantar os dois que avisaram na Mansão precisar de mais tempo no Brasil para seres úteis.

Claro que eles notaram a incrível discrepância social do país, óbvio também ficou “o jeitinho brasileiro”, uma corruptela para corrupção… E foi então que passaram a ser úteis aqui também, no país do Cruzeiro do Sul, utilizando fosse sua atuação mais humana quanto suas táticas de combate para auxiliar os mais necessitados. Eles focavam em idosos e crianças, mas salvaram muitos motoboys malucos também quando a descida deles pela costa os fez chegar no Rio de Janeiro e aprofundar um pouco para São Paulo.

Foi num desses momentos que ambos viram, de cima, duas crianças maltratando insistentemente um gatinho muito jovem numa clareira. Eles normalmente não se envolviam para defender animais, mas esse caso em particular tinha que ser reprovado pela crueldade. O gatinho já havia sido mergulhado num balde com água e, depois de beliscado e raspado no chão, agora iam cobrir sua cabecinha com um saco plástico! Ororo não resistiu! Fez uma lufada de ar levar o plástico da mão de uma das crianças enquanto descia, com a cara muito braba e os olhos brancos, na frente delas. Pousou como uma pluma e as duas crianças se assustaram, largando o gatinho. Elas iam correr, mas a africana queria ter certeza de que não iam repetir isso com algum outro animal… Ela ficou preocupada, pois havia lido em tabloides sobre a “Teoria do Elo”, ligando maus tratos animais com pessoas que, futuramente, poderiam desenvolver traços sociopatas e machucar outras pessoas também. Com um leve desejo, uma parede de vento os impediu de continuar correndo e eles então viraram-se para ela:

Criança 1: O que é você, dona? Um fantasma? - tremendo todo.

Criança 2: Deixa de ser bobo! Fantasma num “existi”! Ela deve ser uma mutuna, isso sim!… - esse era o que mais maltratara o gatinho, pois as ideias surgiam da mente dele e o outro era levado a executar.

Ororo: E se eu for o fantasma de todos os outros animais que vocês mataram?!

Criança 1: Dona! Não! Eu nunca matei nenhum, esse é o primeiro, eu juro! - e os três olharam para o gatinho que miava fraco, chamando a mãe que não aparecia.

Ororo: Se isso for mentira, vocês vão começar a sentir tanto frio como se estivessem no polo norte! - e nesse momento a temperatura começou a descer. - E vão se juntar aos animais que morreram! Vão deixar de ver sua família! Vão deixar de existir pra sempre!

Os dois choravam, a primeira criança até fez xixi nas calças, implorando para que não morressem. Foi aí que Ororo sentiu ser o momento certo para “apertar” um pouco mais, fazendo-os levitar com um leve e efetivo turbilhão de ar.

Ororo: Adeus, crianças maldosas! Esse é o destino para aqueles que não se arrependem e não prometem nunca mais maltratar um animal…

E então os dois começaram a pedir perdão, desesperadamente, o menino mais maldoso era o que mais gritava e ela, então, parou de subi-los, deixando-os cair de bunda e sentenciando que jamais fizessem algo assim de novo, ou iam se ver com os Espíritos!

Eles correram pela picada no matagal e sumiram. Ororo foi até o gatinho e viu o quanto ele precisava de atenção veterinária. Ela esperava que não fosse tarde demais! Avisando Warren por um intercomunicador que ia procurar uma clínica veterinária ele logo se uniu a ela. Tentando dissuadi-la, mas ela foi inflexível. Questionou até que ponto podemos decidir qual vida vale mais e eles, a caminho da veterinária, entraram na famosa discussão sobre porque os juízos de valores e morais são sempre antropocentristas. Assim fica complicado assegurar o bem-estar animal quando tomamos por base o nosso bem-estar. Somos animais, claro! Mas tão “degenerados”, tão distanciados da Natureza que não nos parece possível asseverar sobre o melhor bem-estar de outros animais. Apesar de tomarmos como nossa responsabilidade essa tarefa, nos falta muito conhecimento científico e de campo para discernir esses termos e, acima de tudo, para colocá-los em prática!

A veterinária fez o que podia, checou os pulmões e verificou que o mergulho no balde poderia levar a uma pneumonia por aspiração no futuro, mas que dentre todos os problemas, esse era algo preocupante no “depois”. Indicou um sucedâneo para o leite da gata, informou que deveria mamar, no máximo, de três em três horas e que deveria ser pesado todos os dias, para calcular a quantidade de leite dada. As feridas exteriores foram tratadas e, agora, restava aos dois mutantes cuidar das feridas psicológicas. Dando um tratamento baseado em amor para que ele fosse capaz de sobreviver.

Ororo: Você entende que eu devo cuidar dessa criatura, não, Warren? Ela é minha responsabilidade agora e, olhe só seus olhos, pedindo auxílio a quem possa se condoer! Como não o amar e fazer o melhor de mim para que ele viva? - a veterinária tinha enrolado-o num cobertorzinho para manter seu calor e também disse que era necessário mantê-lo aquecido, pois os filhotinhos perdiam muito calor para o ambiente e, com isso, Ororo criou um microclima ao redor do gatinho. Com a temperatura exata de 39°C e saíram de lá com uma lata de sucedâneo e várias dicas, além da melhor delas: “e mesmo fazendo tudo isso senhora, pode ser que ele não viva, então, adicionaria rezar a uma das práticas também, ok?”

Warren: Assim me parece muito cômodo ser veterinária, não? Faço gastar um monte, dou várias indicações, mas pode ser que nada funcione! Isso é um absurdo!

Ororo: O que você queria, Anjo? Ela não é Deus! Vai mesmo depender dele a sobrevivência, não é? É como um médico humano faz. Exatamente igual, não acha?

Warren: É… não tinha parado pra ver por esse lado… É mesmo, vai! E ele, realmente, é uma lindeza! Que cor de pelos ele tem, não? Parecem betume! E esses olhos castanho penetrantes, tão grandes para seu pequeno rostinho… Realmente, dá pra se apaixonar, Ororo. - e a protegeu com uma das asas, como quem ia também estar do lado daquela criaturinha dali pra frente.

Ambos sorriram e foram conduzindo o pequeno tesouro até a casinha que haviam alugado. Prometeram não ficar entre os ricos das cidades que passavam, sempre se hospedando entre os mais humildes e não ostentando adornos ou poderes sem necessidade. Passando algumas semanas entre eles eram capazes de fazer um diagnóstico da situação e saber em quais pontos o Estado faltava e onde poderiam ajudar. Sempre que possível, contatavam as Associações locais para saber o que lhes faltava para agir mais incisivamente e, quando elas não existiam, buscavam entre os habitantes locais possíveis líderes para que elas fossem criadas. Eles sempre incutiam o pensamento: “juntos, vocês são mais fortes”, “não precisam esperar o governo para agir em determinadas problemáticas” e, assim, criavam comunidades fortes e centradas em resolver seus problemas o que criava pequenas bolhas de sucesso que acabavam sendo copiadas pelos vizinhos.

Adentraram a casinha simples e iniciaram a preparação da alimentação do gatinho, depois, com um algodão molhado em água morna excitaram a parte do ânus para que ele excretasse depois de comer e, assim, eles ajeitaram várias toalhas ao redor do corpinho do gatinho em cima da cama, pois perceberam que ele adormeceu; foram para a sala, Warren sentou-se no sofá e Ororo deitou-se em seu ombro, com os pés para cima, estavam relaxando depois de uma maratona para que o filhote comesse, acabaram adormecendo e, depois de algumas horas, acordaram com o gatinho miando forte, pedindo por mais. Desdobraram-se novamente, acalentaram, prepararam o “leite”, limparam e acariciaram e assim fizeram por toda a noite, hora Ororo, hora Warren, voltando a dormir no sofá abraçados. Na manhã seguinte eles checaram que ele mamou num intervalo bem menor que o máximo, isso era muito bom! E eles o pesaram e havia ganhado alguns gramas, outra notícia boa. Continuaram o revezamento, praticando para quando e se decidissem ser pais, pois não há nada mais próximo da mater- ou paternidade do que cuidar de um filhote, seja de gato, cão ou silvestre! É uma prova de amor e de desprendimento, são seres abnegados que conseguem realizar essas proezas! E existem tantos por aí!

No terceiro dia eles estavam exaustos! Prefeririam mil vezes lutar contra Magneto a passar mais um dia assim, cuidando exclusivamente daquele pequenino! Ororo, percebendo o sacrifício de Warren pediu a ele que saísse um pouco para comprar víveres, distrair um pouco no mercado, na caminhada, enfim, e que demorasse bastante nessa empreitada. Ele agradeceu, mas disse que também percebia o quanto ela estava se sacrificando e, portanto, voltaria logo para que ela também pudesse sair um pouco para espairecer.

Warren: Volto antes da próxima mamada, minha linda! Confie em mim! - e saiu voando pela varandinha.

O tempo entre as mamadas era de uma hora e meia, portanto ela poderia descansar nesse ínterim. Foi o que fez e teve um sonho de enlouquecer com suas próprias crianças, duas beldades, uma negra e outra loira, acordando de supetão e assustada pelo realismo. Fato é que ela nunca pensou em ter filhos e, ao que parece, nem Warren. Isso não sendo um sonho comum, não teria necessidade de ocorrer e, portanto, se sentissem necessidade de uma companhia, poderiam adotar! Como tantos que necessitam de um lar amoroso e de pais equilibrados em suas vidas…

Warren entrou pelo mesmo local da saída alguns minutos depois de a mutante despertar. Depositou as sacolas na pia e foi ver o gatinho. Quando entrou no quarto, chamou Ororo:

Warren: Amor… Aconteceu algo muito engraçado com o gatinho… Você pode vir ver? - com a voz calma, para não gerar pânico desnecessário.

Ororo: Que foi, querido? Ele aprendeu a desvencilhar das cobertas? - e levantou-se, caminhando sem pressa em direção do quarto.

Qual não foi sua surpresa ao ver, no lugar onde antes estava um filhotinho de gato uma criancinha morena, de cabelos pretos, a mesma cor dos pelos do gatinho, totalmente nua?! Uma menininha! Sua boca abriu e ela olhou para o Warren de modo indagador.

Warren: Eu também ia perguntar se você estava sabendo de algo, mas seu olhar já me respondeu! Já tinha ouvido falar de mutação ativa com essa idade, além do James?

Ororo: Nunca, Warren! Isso é incrível… E, ao mesmo tempo, assustador! Deve ter alguma mãe muito desesperada por aí? Ou ela é uma gatinha que mutou para humana? Estou sem saber… Só acho que pode ser mais um padrão das futuras mutações; será que as crianças começarão a nascer assim? Mas talvez o Prof. Xavier saiba. - e concentrando-se, a africana acessou aquele local em sua mente onde sabia encontrar o Professor; mas ele estava vazio!… Ela tentou encontrá-lo de alguma outra maneira, sem sucesso e expressou isso através da face.

Warren jamais pensaria em gatos mutacionando para humanos! Porém, depois de tudo que viu na vida, aquilo não seria menos possível… Seria? Ao ver o rosto de Ororo ele também tenta contatar o Professor Charles sem sucesso. Que teria acontecido? Estaria o pessoal da Mansão ok?

A gatinha-bebê dormia tranquilamente, um leve sorriso brincava nos seus lábios e ambos decidiram colocar panfletos pelos arredores, com a foto da criança e a frase “ENCONTRADA”. Anjo também se lembrou que muitas vezes os brasileiros colocavam anúncios desse tipo nas padarias, onde muita gente ia todo dia pra comprar o pão. Ele decidiu passar na mais próxima e ver se não havia algum cartaz de “PROCURA-SE”. A surpresa dele foi encontrar sim um cartaz desses colado no caixa da padaria. Ele anotou o telefone e voltou para a casinha. Tinham que decidir o que fazer, mas antes disso precisavam ter certeza de serem os pais a procurarem por ela!

Ao entrar deparou-se com uma linda cena: Ororo acalentava a pequena nos braços, com tanto carinho que era possível sentir o amor. Ela o chamou com uma inclinação de cabeça e mostrou as mãozinhas da bebê com as características “almofadinhas” rosas dos membros dos gatos; foi ele tocar e o nariz dela ficou felino e, passados alguns segundos, a negra agora segurava numa só mão um filhotinho de gato que se agitava.

Ororo: Eu fui testar para ver se o toque humano era um gatilho, mas ela aceitou o meu normalmente. Ao que parece, o toque masculino parece ser o disparo da mutação… O que me faz pensar no pior, Warren!…

E o homem a olhava de forma indagativa. De que pior estaria ela falando?

Ororo: Que a situação de estresse ocorreu dentro de casa, por algum homem na vida dela e, desse modo, ativou a mutação para se proteger… Ela poderia sofrer abusos no lar! Seria o local ideal pra levá-la?

Warren: Ororo! Eu posso até entender sua preocupação, mas entendo que isso é uma teoria! Nós temos muitos meios de provar, não? Antes de julgarmos a família. De qualquer modo, alguém está sofrendo pela ausência dela e não temos o direito de mantê-la aqui.

Ororo concordou com a cabeça e como não tivesse conseguido encontrar o Prof. X avisou Warren que apelaria para Jean, então. Concentrou-se, contatou a amiga, acalmando-a sobre não ser nada ocorrido aos dois e explicou a situação pedindo um auxílio na hora que fossem encontrar os pais da bebê. Claro que Jean concordou em ajudar, ela também aproveitou para tentar sondar a mente da criança, mas não conseguiu fazê-lo, dizendo que havia alguma barreira imposta pela própria menina e ela não ia tentar forçar, com medo de machucá-la. Ororo explicou o fato dela estar transformada em gatinho naquele momento e Jean pensou que esse poderia sim, ser um motivo plausível para não conseguir acessar sua mente.

Ororo: Bom, Warren, esperemos ela voltar a ser criança e aí ligamos para marcar com a família, não é mesmo? Afinal, não sabemos o quanto eles sabem…

E foram necessários outros três dias para que ela voltasse à forma humana. Ororo já a segurava no colo sem perigo de ela voltar a ficar felina e, desse modo, chamaram as pessoas do cartaz de “PROCURA-SE” para irem até a casinha deles, onde explicariam tudo, caso eles já não soubessem e poderiam ter certeza de não a entregar a abusadores.

Jean foi chamada e compareceu no ato, aproveitando para checar se conseguia acessar a mente da bebê e, de fato, ela conseguiu. Os pais chegaram em 20 minutos, pareciam bem humildes. A bebê tinha puxado muito da mãe que era morena e tinha os cabelos escuros, o pai era moreno de Sol e tinha grandes olhos verdes e, ao verem a criança no colo da africana sorriram profusamente; ao verem as asas nas costas de Anjo eles diminuíram o sorriso, mas mantiveram o bom humor até o momento que notaram não ser só chegar-pegar-a-bebê-e-partir. Quando Warren os convidou a sentar eles fecharam a cara, entreolharam-se e permaneceram em pé:

Mãe: Só vim pegar minha filhinha, não precisamos nos sentar… - ao mesmo tempo que estendia a mão para recebê-la nos braços.

Ororo: Infelizmente, não será tão fácil assim, senhora… Precisamos conversar sobre as circunstâncias onde a encontramos e sobre o fato de tentar compreender alguns pontos pendentes. Vamos nos sentar, sim?… - e ela mesma sentou-se no sofá contrário aquele que era oferecido ao casal recém-chegado.

Perguntaram se tinham outros filhos, e a resposta foi “sim”, se trabalhavam, e a resposta foi “nós dois”, quiseram ver uma foto dos irmãos dela ao que o pai abriu a carteira orgulhoso para mostrar um garoto. O mesmo garoto que estava mandando o outro ferir a gatinha; Ororo olhou com terror para Warren e ele compreendeu essa parte, comentando que o filho era lindo, ambos agradeceram e comentaram o fato de ser muito sapeca como um defeito, explicaram que ele cuidava da bebê durante a ausência deles e que a mãe conseguia trabalhar dia sim, dia não, como faxineira. O pai era pedreiro e, algumas vezes, ausentava-se por semanas do lar. Ao menos, isso parecia encaixar no perfil da criança mutar quando um homem a segurava, o homem seria o irmão! Mas ainda havia a questão: ele queria matá-la! Por quê?

Sem saber como abordar um assunto assim, Warren resolve descontrair, indo até a cozinha para oferecer salgadinhos e bebidas para todos. Enquanto isso, Jean confirmava as histórias dos pais e, acessando a mente do irmão compreendeu que ele quis matar a gatinha sem saber que a mesma era sua irmã; ele a maltratava com beliscões e a deixava, muitas vezes, quase o dia sem comer nada, reclamava que cuidando dela não tinha como ir brincar com os amigos, mas entrou em pânico quando foi no quarto e viu um gatinho no lugar da irmã. Achando que ela tinha sido raptada ou trocada por aquele ser resolveu matá-lo na esperança de que a irmã voltasse ou que ele tivesse que explicar o rapto para a mãe! Isso tranquilizou o casal de mutantes e, então, engolindo seco, Ororo começou a narrar do começo, inclusive falando sobre o filho que maltratava o gatinho. Os dois não entenderam quase nada, mas prestaram muita atenção e ficaram perplexos ao ouvir que a gatinha era a bebê e que, portanto, isso a fazia mutante, como eram Warren e Ororo.

Pai: ‘Cês tão achando que porque nóis é simples, nóis é burro?! Que história mais sem pé nem cabeça é essa? Me dá nossa bebê e nóis sai sem chamar a polícia, seus maluco! - e estendeu a mão, ao que Ororo resolveu arriscar e dar ao pai a bebê que, em questão de segundos se transformou diante dos olhos deles! O pai largou o gatinho gritando “é feitiço!” e se não fosse Warren estar bem perto e usar a asa aberta para criar um escorregador de plumas o gatinho estaria encrencado!

Ororo: E ela foi tão maltratada pelo irmão que liga a presença masculina à dor e, por isso, se transforma em gatinho, tentando se proteger! Mas isso só piora a situação!… Escutem, não estamos mentindo, nem tirando um sarro de vocês, estamos sendo totalmente honestos! E, sem consultar meu namorado, eu acho que ela não devia voltar com vocês… O irmão vai continuar maltratando-a – falava isso olhando para o Warren – e vocês não parecem estar preparados para lidar com um mutante e, nessa idade, sinceramente, nem muitos de nós estamos…

Mãe: Creia em Deus-pai! Eu já assisti muito sobre mutantes na TV, ela é minha filha! Ela vem comigo… Nem que eu tenha que viver sozinha, senhora… - e esticou os braços para pegar a gatinha, aninhando-a de tal modo que eles sentiram o amor que nutria por ela.

Pai: Eles parece pessoas endinheirada, Malu! Se querem ficar com essa aberração, que fiquem! Eu num vô vorta com isso!… - muitos mutantes tinham “roubado” o emprego de amigos dele no setor da construção e isso o fazia ter ódio do Homo sapiens superior, sem nenhuma razão.

Malu: Como eu falei, Eustáquio, então tu vai procurar um amigo pra passar a noite, porque essa gracinha volta comigo! Ela é nossa filha, você querendo ou não… Eu nunca te falei nada, mas uma das casas que eu limpo, a que me paga e valoriza melhor, é de um casal de mutantes! Eles levam comida pra mesa, a tua mesa! E você acreditando nessa ladainha de que os mutantes tão roubando trabalho de pessoas normais… Tudo balela! Teus amigos foram mandados embora porque bebiam no serviço, Eustáquio! A culpa foi deles mesmo… Pronto! Falei! - e toda cheia da razão, ela voltou-se para os X-Men e concluiu: Podem deixar que eu não vou mais sair de casa sem a bebê. Vou ter uma conversa com o irmão dela e vou garantir que ele não fique sozinho com ela nunca mais, até que ela consiga se defender sozinha. Capaz que até aprender a unhar e morder, né? Agradeço muito vocês… - e foi pra direção da porta, dando uma gargalhada.

Ororo: Espera, dona Malu! Eu vou te dar o leite que a veterinária passou pra ela, não vamos usar em mais nada… - e enquanto isso, o Eustáquio saiu pisando firme, Warren se preocupou, caso ele fosse violento e, adivinhando (ou lendo?) seus pensamentos, a mulher respondeu:

Malu: Olha, fica tranquilo que ele nunca me levantou a mão. Ele vai ver que eu estou com a razão e, daqui um tempo, ele volta… Fome eu não passo, moço. Sei cozinhar, costurar, não tenho preguiça de trabalhar, viu?…

Ororo: Nesse caso, quer trabalhar aqui em casa? Os seis dias que passamos com a bebê*

Malu: Eita! Que vocês não sabem o nome dela, né? É Caroline, mas podem chamar de Carol. E eu aceito sim, vir cuidar da sua casa, senhora. Tudo pra vocês ficarem com menos saudades – e piscou.

Warren: Então, deixa eu nos apresentar, eu sou Warren, conhecido também como Anjo e essa é a Ororo, conhecida como Tempestade. Será um prazer acompanhar por algum tempo o crescimento da Carol e, ainda ser útil para você, Malu. No que precisar da gente, pode contar!

Jean havia ficado em “off”, observando os acontecimentos. No momento em que Ororo disse sobre a bebê não voltar para os pais, uma luz de esperança acendeu na ruiva, mas a certeza com que a mãe reivindicava seu direito e o amor que a inundou quando falava da filha a fizeram perceber que se quisesse um filho, teria de ir atrás de uma adoção ela mesma…


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