Consequências. escrita por MedusaSaluz


Capítulo 10
Nunca Mais


Notas iniciais do capítulo

Por mais incrível que pareça eu não desisti da fic. Consigo escrever mais no período de férias, por motivos de um terror diário chamado "Universidade". Paciência que um dia eu termino, mas pode demorar rsrs
Bem, espero que gostem :)



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A garota dentro do apartamento parecia adequadamente arrumada para um evento social. Ele não saberia identificar um em específico, porque suas vestes eram neutras e se estenderiam para uma festa de fraternidade à um show underground. Era no mínimo incomum ver aquela figura, conhecida de tantos anos, naquela postura e com os olhos tão... Vazios.

Foi quando ele decidiu que não tinha tempo para aquilo, fez da maneira antiga: entrando pela janela.

— Há quanto tempo ele sabe? – Não sentiu surpresa em sua amiga, da mesma forma que sabia que não precisava dizer sobre quem perguntara, já que ele havia notado uma movimentação incomum no localizador do comunicador de Mutano.

— Desde essa tarde. – Olhou para o rapaz vestido de preto e azul na janela, o cabelo negro e a máscara não deixavam dúvidas de sua identidade, pelo menos não para ela. – E você, Richard?

— Desde que saiu da Inglaterra. – Ela não esboçou surpresa. Não que pudesse haver qualquer surpresa naquela revelação, uma vez que Asa Noturna era aprendiz do Batman. – Não quis avisar desta mudança, a única informação que enviou foi um e-mail dizendo que estava na Itália há seis meses, então decidi garantir que estava bem por conta própria.

Não houve resposta.

Havia milhares de coisas que Asa Noturna queria dizer para a amiga. Sempre tivera problemas para se relacionar com as pessoas, assim como ela, e talvez fosse por isso que Ravena fosse a pessoa da equipe com quem ele mais conseguia se conectar. Ele estava com problemas em seu relacionamento e sabia que algumas palavras da empata poderiam lhe colocar no lugar. Afinal, ele sabia que, apesar de serem quase família, ela lhe considerava um passarinho chorão. Ele havia passado por coisas difíceis, é claro, mas ela achava que alguém que se priva das próprias emoções porque quer, uma situação muito diferente da que ela mesma passara desde o nascimento, estava se matando aos poucos. Por vontade própria, ele abria mão de algo que ela almejara a vida toda e provavelmente almejava mais ainda naquele momento: Sentir.

Talvez fosse por esse motivo, que tudo que Richard Grayson conseguiu dizer à Rachel Roth foi:

— Acha que ele dirá algo para os titãs? – A voz dele saiu mais seca que o comum, talvez por ser mais difícil manter o próprio controle em uma situação como aquela. Novamente, não precisava usar o nome de Garfield para que Ravena soubesse de quem estava falando.

— Não sei. Mas ele talvez tente falar comigo. - Por um momento ela conseguiu calar o líder dos titãs, mergulhando-o em dúvida naquela frase ambígua. – Ele levou o espelho de Nunca Mais.

— O portal da sua mente? – Richard sentiu a necessidade de perguntar, já que ela se demonstrava desapegada a um item que possuía muito poder, principalmente sobre ela.

— Sim. – A voz dela não demonstrava nenhum pensamento dela sobre a situação.

Richard se lembrava da estranha situação em que Garfield e Vic se meteram ao entrar no quarto de Ravena e, por acidente, na mente dela. Aquilo ocorrera enquanto ela ainda estava sob a sombra e vontade de Trigon, o que resultara num evento que ambos os titãs descreviam com fantasia e medo nos olhos. De toda forma, ninguém havia adentrado a mente de Ravena desde que o controle de Trigon sobre ela havia cessado. Ou quando todos haviam achado que este controle era apenas uma lembrança.

O líder titã se perguntou se ela mesma havia se permitido a adentrar o espelho nos tempos atuais.

— E por que você não tentou recuperar? Não pode atrapalhar seu estado atual? -  Era claro que para ele era muito mais do que estranho a atitude de sua amiga. Sabia da condição dela, só não fazia ideia de que aquilo era tão intenso.

— Não há nada que Garfield possa mudar em meu estado atual. – Ela disse, pegando suas chaves em cima do frigobar. - Estou saindo, feche a janela quando sair. – E tão simplesmente ela passou pela porta, fechando-a atrás de si.

 

O rapaz verde dava voltas no próprio quarto a ponto de quase desgastar o carpete. Não fazia ideia de como agir naquela situação. Agira impulsivamente ao roubar o espelho, mas o que poderia fazer com aquilo era uma incógnita até para si mesmo. Tinha uma relação mais íntima com aquele problema do que o restante dos titãs poderia imaginar. Havia encontrado Ravena no telhado, quando ela tomou a decisão; estava na enfermaria quando ela acordou; descobriu tudo que acontecia com ela, sem ela saber; havia passado o tempo que ela estava fora tentando achar uma solução para aquilo e, finalmente, foi o primeiro que a reencontrou. Ele era supersticioso o suficiente para saber que encontros não aconteciam por acaso. E, assim, sabia que tinha de fazer algo.

Não sabia exatamente porque havia pego o espelho, mas no pânico de vê-la não sendo ela mesma, foi a única coisa que pensou em fazer. Agora ele sabia que aquilo era uma imbecilidade sem tamanho, até para si mesmo. Se a resposta para os problemas de Ravena estivesse em Nunca Mais, ela mesma teria encontrado. Não teria? Ela sempre teve acesso ao espelho.  Então porque o cérebro de Mutano pulsava em ansiedade de adentrar a mente da empata? Seria o desejo de verificar a existência das emoções desta, ou saudade daquela amiga distante em todos os sentidos da palavra? Talvez fosse um bocado de ambos.

Não sabia se deveria invadir a privacidade de Ravena. De novo. Ele já havia feito isso algumas vezes. Mais vezes do que tinha orgulho de dizer. Aquilo era reflexo de ser extremamente curioso, tanto quanto era carinhoso com seus amigos. De alguma forma sempre soube que a ex-titã era reservada tanto sobre seu passado quanto suas dores e problemas. Talvez fosse por isso que sempre quisera adentrar a vida dela. O desejo de cuidar as vezes era maior do que seu amor pela própria vida, uma vez que Ravena sempre respondera com hostilidade a sua mania de tentar entrar na vida dela sem ser convidado.

Por outro lado, qualquer ação parecia melhor do que ficar trancado em seu próprio quarto encarando o portal da mente dela como um idiota. Bufou para si mesmo, não fazia ideia do que fazer. Pegou o espelho pelo cabo, como se encarar o mesmo fosse lhe entregar a resposta correta.

E foi assim que essa escolha foi feita, não por ele, mas pelo próprio espelho, que sugou-o para dentro de Nunca Mais.

Os olhos verdes estavam fechados como se há muito estivesse dormindo. Era essa a sensação que seu corpo tinha. Então, sentiu sobre onde estava deitado, grama, era inconfundível, e o cheiro era de... morangos? Foi então que abriu os olhos para ver um mundo cor de rosa. E sentiu sua cabeça doer. Só foi saber onde estava quando ouviu uma voz conhecida a gritar seu nome.

— GAR! – Virando-se na direção, viu sua amiga empata em sua forma comum, de cabelos púrpura, olhos da mesma cor, capa e uniforme, com duas enormes diferenças daquela que estava acostumado: A capa cor-de-rosa e o enorme sorriso no rosto.

— Rosinha? – Chamar as faces da personalidade de Ravena por apelidos era o método mais fácil de se comunicar com as mesmas, visto que não se lembrava muito bem as emoções que elas representavam e sabia que nenhuma delas eram a própria Ravena, mesmo que fossem.

— Que bom te ver de novo! Fiquei tão feliz quando te vi mais cedo! – Ela colocou-o de pé sem que ele tivesse tempo de processar o que acontecia e abraçou-o com força. Muita força.

— É bom... te ver... apertado.. – Ele disse, sentindo suas costelas se aprofundando mais ainda em seu peito.

— Opa, desculpe! Eu sempre fico feliz quando vejo um rosto amigo! E não tenho visto um há muito tempo! Vamos, você tem que ver as outras! – Sem que ele tivesse a oportunidade de responder, ela saiu correndo, puxando-o pela mão.

— Wow! – Seguiu-a sem hesitar, afinal, não tinha muita escolha: estava ali por acidente, ou pelo menos achava que sim.

Os acontecimentos que orbitavam Ravena normalmente não eram acidentais. Era como se ela fosse um imã para misticismos quase inexplicáveis. “Quase” porque normalmente era ela mesma que explicava e tentava resolver tudo sozinha para não ferir aqueles a sua volta. E ele era o ser que não aceitava que alguém agisse sozinho, quando começara a se tornar invasivo? Malchior surgiu em sua mente. Provavelmente não fora sua primeira situação invasiva, mas foi a primeira que veio a sua mente. Talvez porque ele não conseguia entender como tinha alguém com Ravena, depois de ele mesmo tentar tanto estar presente na vida dela. Devia ser só teimosia com ciúme.

... Ciúme?

Não teve muito tempo para pensar no que havia passado em sua mente. Sentiu-se tropeçando e rolando no chão, apenas para olhar para cima segundos depois e ver um arco-íris de Ravena o encarando.

—  Desculpa, Gar! – A rosinha que o puxara ria do tombo do rapaz verde enquanto flutuava no ar. Viu a Ravena de capa amarela voltar-se a risonha.

— Felicidade! Você trouxe ele aqui? – O tom de desaprovação era mais que audível.

— Ele pode nos ajudar, ué. Foi o primeiro amigo que vimos há tempos! – A Ravena de rosa respondeu, sem tirar o sorriso do rosto.

— Ele pode não querer ajudar... fomos más com ele... – A Ravena de capa cinza, escondida atrás da de capa amarela, falou baixo, de forma que Mutano só conseguira ouvir por sua audição naturalmente potente.

— Nós não fomos más. Ravena não consegue nos mostrar, lembra? Ele vai ajudar! – Uma Ravena de capa verde falou alto o suficiente para incomodar seu ouvidos.

— Não precisamos da ajuda dele, ele não se importou antes! – A de capa vermelha, incrivelmente mais controlada do que ele esperava, rosnou.

— Vocês todas querem parar? Ele é nosso amigo e está no chão até agora. – Uma Ravena de capa lilás chamou a atenção das outras, oferecendo a mão para ajudá-lo a se levantar. - Você está bem, Gar? Todas sentimos sua falta. – Ela sorria e sua voz era mais doce do que ele esperaria da amiga.

— Eu acho que sim... Senti a falta de vocês também. – Ao se levantar percebeu que aquela bagunça acontecia na cabeça de Ravena enquanto ela estava desligada do lado de fora. – Vocês... sabe, está todo mundo bem por aqui?

— Nós já tivemos dias melhores... – A Ravena lilás mantinha o sorriso doce.

—  Piores também. – A Ravena verde apontou para raiva, com um corajoso sorriso no rosto.

— Se não recolher esse dedo eu arranco ele! – Garfield sentiu um arrepio ao ver os quatro olhos vermelhos se formando. Era claro que a influência de Trigon era bem menor ali, mas ainda existia.

 - Vem tentar! – A verde mostrou a língua para a vermelha e, antes que o conflito começasse, a lilás interviu mais uma vez.

— Irmãs, o nosso bem estar vem primeiro. – Parecia claro que a Ravena lilás tinha voz ali dentro. Ele tinha dúvida de qual emoção tinha tanta dominância na mente da amiga. – Sabedoria, acredito que nosso amigo deva ter acesso ao arquivo.

Garfield estava acostumado a não entender muitas coisas. Não se considerava burro, apenas desinformado e as vezes desatento. Falhas comuns em um humano nada comum. Sua habilidade de se transformar em todo reino animal (extinto ou não), certamente compensava suas pequenas falhas. Mas ali não culpava essas falhas por não conseguir entender a que o fragmento lilás de Ravena se referia. Um arquivo? Na mente de sua amiga? O que diabos aquilo poderia significar?

— Não considero isso apropriado, Afeição. – Sabedoria, em sua capa amarela, expôs sua opinião sobre o misterioso arquivo e o ato de mostrá-lo ao titã verde.

— Se tem alguém que pode se comunicar com ela dessa forma... – Afeição continuava a falar com doçura, mesmo que sua interlocutora não parecesse se render a isso.

— Entendo, mas ele está aqui sem autorização. – Sabedoria cortou. Aquele ponto, Garfield assistia o debate como quem assiste uma partida de ping-pong.

— Ravena confia nele. Você viu. – A dúvida se estampou na face do verde, não dava para visualizar confiança nas ações de Ravena das últimas 7 horas. Pensando bem, não era possível visualizar nada.

— Ele é completamente leigo em assuntos mágicos. – Garfield não se sentiu ofendido por Sabedoria, aquilo era verdade. Nem ele sabia direito porque tivera a ideia de se meter na mente de Ravena novamente.

— Todos os não-leigos que conhecemos não possuem vínculos com Ravena. Ele é nossa única esperança. Acredito que deveríamos votar. – Afeição certamente sabia os caminhos para desviar das burocracias de Sabedoria.

— Parece racional. – A amarela limpou a garganta e inspirou antes de tomar postura de juíza. - Todas a favor de permitir o acesso levantem as mãos. – Afeição, Felicidade e Coragem, a verde levantaram a mão direita. Mutano também ergueu a própria mão, mesmo que seu voto não contasse.  - Contrárias? - Raiva e a própria sabedoria ergueram suas mãos. – Abstenções? – Tristeza, a cinzenta, levantou a mão. - Bem, afeição e eu iremos mostrar os arquivos, comportem-se.

Mutano não tinha certeza do que estava acontecendo, só seguiu Sabedoria e Afeição enquanto ouviu as outras Ravenas começando uma discussão atrás deles, fazendo exatamente o contrário que fora pedido por Sabedoria. Enquanto isso, ele caminhava na grama verde em direção a uma árvore estrondosa. Enquanto se aproximavam da árvore, podia perceber uma porta fechada. Quanto mais próximo ele podia ver detalhes. Uma tranca grande, feita em um metal claro e cintilante que mudava conforme a luz refletia em sua superfície. A tranca lembrava as cicatrizes que vira nas costas de Ravena.

Ao chegarem a porta, Afeição impôs ambas suas mãos sobre a tranca, fazendo que esta reluzisse mais, antes de se dissipar a frente de seus olhos. Ambas as partes de Ravena se voltaram para Mutano.

— Agora é sua responsabilidade, Garfield. – Sabedoria alertou. O titã verde ainda não compreendia nada do que estava acontecendo.

— Gar, é só entrar e fechar a porta. O restante o arquivo faz por você. Sei que você consegue. – Afeição disse, provavelmente por ter percebido a confusão nos olhos do amigo.

— Mas... o que tem ali dentro? – Não havia mal nenhum em perguntar, afinal o tronco oco de uma gigantesca árvore com uma porta mágica dentro da mente de Ravena parecia no mínimo preocupante.

— Será mais objetivo que veja por si mesmo. Assim não perderemos tempo conversando desnecessariamente. – A de capa amarela disse categoricamente. A de capa lilás sorriu para Garfield, entendendo de onde a sua pergunta havia surgido.

— Mas garanto que não há perigo.

— Ok...

Garfield inspirou profundamente antes de abrir a porta, como quem toma impulso para saltar em um abismo. Abriu a porta e, de olhos fechados, entrou na árvore, fechando a porta atrás de si.  Lá dentro ouviu sons urbanos, carros, buzinas, conversas se cruzando, tudo que sua audição potente permitia. E que

Abriu os olhos em desespero, vendo Ravena com sua aparência atual, em um beco, o encarando de frente. Exatamente como mais cedo naquele dia. Ele aguardou que ela iniciasse a conversa, como fizera mais cedo. Mas, não aconteceu. Em vez disso foi surpreendido por ela caminhando em sua direção e o abraçando forte.

— É bom te ver, Garfield. – O titã verde, em choque por ganhar um abraço de alguém que certamente nem mostrara surpresa em vê-lo mais cedo, demorou alguns segundos para retribuir o abraço. E, quando o fez, pode notar o susto ao vê-la se afastar tão rápido. – Você... sentiu meu abraço? – Ele não entendia porque era tão estranho para ela ele ter sentido ele. Não deveria ser o contrário? A menos que ela estivesse acostumada a não ter as reações normais as suas ações...

As peças se ligaram: Ele estava em uma memória de Ravena, mas não sabia porque ela sentia ali.


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