Obscuro escrita por Benihime


Capítulo 4
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Desculpem a demora em postar, mas de hoje em diante a história vai estar entrando em hiato. Problemas pessoais.
Posto mais quando puder. Beijos a todos.



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Já era tarde quando Nia acordou na manhã seguinte. Estava frio e o céu permanecia cinzento, mas já não chovia. A jovem deslizou para fora da cama, ainda sonolenta, e desceu as escadas até o quarto de sua irmã.

— Cass. — A morena chamou. — Cass, é hora de acordar.

Mas Cassie não estava ali. Nia decidiu procurar na cozinha, mas também não a encontrou. Nem em nenhum outro lugar da casa. Preocupada, Nia saiu para a varanda, esperando ver a irmã ali fora, porém também nem sinal dela.

— Bom dia!

A voz familiar a fez dar um pulo de susto. Rindo, Cassie saiu de trás de alguns arbustos que cresciam ao lado da casa. Provavelmente haviam sido bonitos anteriormente, podados em formatos decorativos de animais, mas os anos de abandono os haviam feito crescer de forma desordenada e selvagem.

— O que diabos você pensa que está fazendo? — A mais velha repreendeu. — Sair desse jeito sem me avisar! Que merda, Cass! Quer me matar do coração?

Cassie riu mais uma vez, fazendo uma careta de desaprovação para sua irmã. Mesmo contra a sua vontade, a mais velha sentiu seus lábios se curvarem em um sorriso. Era bom ver sua irmãzinha se recuperando tão rapidamente.

— Não exagere, Nia. — A loira bufou ironicamente. — Eu deixei um bilhete avisando que tinha saído.

— Não deixou coisa nenhuma.

— Deixei sim. — Cassie fincou as mãos nos quadris, contrariada. — Estava na penteadeira no canto do quarto. Você deve ter visto.

— É sério, Cass, não vi bilhete nenhum.

— Então deve ter caído. — A moça mais nova deduziu. — De qualquer jeito, desculpe por ter assustado você.

— Sem problemas. — Nia relaxou e cedeu a um sorriso. — E aí, o que está aprontando?

— Só dando uma caminhada. — Foi a resposta. — O médico disse que preciso me exercitar. Quer me fazer companhia?

— Boa ideia. Preciso mesmo esticar as pernas.

Cassie ainda tinha limitações físicas por conta do acidente e fora instruída a fazer apenas exercícios moderados. As duas irmãs resolveram caminhar ao redor da casa. A construção era ainda maior e mais imponente do que haviam pensado, apesar do ar de abandono.

As duas irmãs vislumbraram uma clareira entre as árvores e, curiosas, resolveram investigar. Tratava-se de um pequeno lago de águas muito escuras, cuja aparência denunciava sua profundidade. Como um teste, Cassie pegou um galho quebrado e o mergulhou na água o máximo que pôde. Não encontrou vestígio de fundo.

— Decididamente é bem fundo. — A loira anunciou. — Acho melhor ficarmos longe. Sabe-se lá o que pode ter aí embaixo.

Nia assentiu, fitando as águas plácidas com desconfiança.

— Esse lago é assustador.

— Todo lago é assustador para você, Nia. — Cassie provocou, batendo o ombro contra o de sua irmã num gesto brincalhão.

A morena meramente balançou a cabeça, sem sequer esboçar um sorriso. Tendo quase morrido afogada quando criança, Nia morria de medo de água. Nem mesmo em uma banheira se sentiria segura, quanto menos em um lago.

— É diferente, Cass. — A morena disse gravemente, seu olhar perdido em algum ponto do outro lado do lago. — Não é por causa da água. Esse lugar … Tem alguma coisa errada aqui.

Fique longe do lago, Natalia. É perigoso. Faça o que fizer, fique longe da água.

Nia massageou de leve as têmporas ao ouvir aquela voz. Era como o eco distante de um sonho quase esquecido, familiar porém estranho.

Fique longe, Natalia. É perigoso. Prometa para mim.

A morena balançou a cabeça, seus olhos novamente se voltando para o lago. A água estava perfeitamente parada e refletia a cor cinzenta do céu. Uma fina camada de névoa pairava sobre o lago, dando-lhe uma aparência quase fantasmagórica.

— Ei, Nia, olhe! — Cassie exclamou, arrancando a irmã mais velha de seus pensamentos. — Tem alguma coisa ali.

As duas irmãs foram até o lugar. Era um alçapão aninhado entre as raízes de um enorme carvalho. Nia sorriu consigo mesma, satisfeita.

— Boa, maninha. — Ela disse. — Parece a entrada de um porão. Vamos ver o que conseguimos aqui.

A morena se pôs de joelhos em busca de uma forma de abrir a porta misteriosa, até enfim encontrar um puxador enferrujado que puxou com toda a força possível. Nada aconteceu, e a jovem praguejou em voz alta.

— Calma. — Cassie disse, dando um tapinha carinhoso no ombro de sua irmã. — Esses porões antigos normalmente tem duas entradas, não tem? Podemos procurar a outra mais tarde.

— É, tem razão. — Nia concordou. — Aposto que a segunda entrada é dentro da casa. Podemos entrar e dar uma busca.

— Boa ideia. Vamos em frente, então.

As duas voltaram para dentro e fizeram sanduíches, que comeram em silêncio antes de se lançar numa busca infrutífera da entrada para o misterioso porão. Nia estava decidida a encontrá-la.

Na manhã seguinte, a morena foi a primeira a acordar. Seus sonhos pareciam provocá-la, deixando-a com uma tremenda dor de cabeça. Eram imagens nebulosas que de algum modo ela sabia estarem conectadas a seu passado, porém tentar compreendê-los apenas a exauria.

Com um suspiro ela se pôs de pé e decidiu correr para espairecer. Mal amanhecera e a umidade era espessa, grudando em sua pele. Estremecendo de frio, Nia aumentou o ritmo até não aguentar e precisar parar para recuperar o fôlego. Uma vez recuperada, decidiu caminhar ao redor da casa antes de encerrar o exercício.

Ao chegar ao alpendre dos fundos, deparou-se com uma pequena janela do tipo basculante que só poderia ser do porão. Curiosa, pôs de joelhos para investigar, mas não encontrou nenhuma tranca. Tentou empurrá-la, mas sem melhores resultados. Era como se a própria casa estivesse decidida a não revelar seus segredos.

Rangendo os dentes de frustração, decidiu voltar logo para dentro e tomar um café. Enquanto preparava a bebida, esbarrou em uma antiga cristaleira, agradecendo aos céus por nada ter caído.

Olhando mais atentamente, seus olhos foram atraídos para um espaço estreito entre a estante e a parede, apenas o bastante para que se colocasse a mão. Ao fazê-lo, a jovem sentiu algo diferente da parede fria que esperava encontrar. Não era tijolo ou concreto, era madeira.

Nia descobriu que a cristaleira era muito mais leve do que parecia e ao movê-la descobriu uma porta. A maçaneta era fria como gelo ao toque, e seu coração disparou em expectativa.

Abrir a porta revelou uma escada antiga também de madeira, envolta em sombras. A morena abriu um largo sorriso e procurou rapidamente por uma vela antes de descer.

O porão era extremamente escuro e o halo fraco da vela não ajudava muito. O cheiro lá embaixo era horrível, uma mistura de bolor e umidade, porém Nia continuava decidida a explorar aquele lugar.

Na parede mais próxima havia uma estante feita de madeira que um dia fora clara, uma peça surpreendentemente leve para um lugar como aquele, e com cada centímetro de seu espaço recheado de livros antigos, encadernados em couro. Nia colocou a vela em uma das prateleiras e começou a investigar os tomos mais próximos. Muitos deles estavam escritos em latim, outros em italiano e outros ainda numa língua estranha que Nia nem sequer reconheceu. Enfim, ao pegar um dos últimos volumes daquela prateleira, a jovem sorriu. Estava escrito em inglês.

— Nia! — A voz familiar de Cassie soou, abafada pelas grossas paredes do porão. — Nia, cadê você?

Ligeiramente contrariada com a interrupção, a morena recolocou o livro na estante e decidiu subir, jurando a si mesma que voltaria para lê-lo assim que tivesse uma chance.

Naquela mesma noite, esperou até ter certeza de que Cassie estava dormindo antes de se esgueirar de volta até o porão. Não sabia por quê não contara à sua irmã sobre a entrada, mas guardar o segredo parecia o certo a fazer.

  À luz de uma vela, uma vez que não queria arriscar ser descoberta acendendo nenhuma lâmpada ali embaixo, Nia sentou-se de pernas cruzadas no chão empoeirado para ler.

O tomo era uma coletânea de pensamentos, poesias, esboços e perguntas, tudo escrito em uma elegante letra cursiva. Alguns trechos estavam em latim, e Nia passou diretamente por eles. Perto do final, algo lhe chamou a atenção, uma anotação rabiscada na mesma letra elegante, porém ligeiramente mais confusa, como se tivesse sido escrita às pressas:

 

Eles agora sabem o que sou, e com certeza virão atrás de mim. Não temo por mim mesma, mas por minhas filhas. Elas são apenas crianças inocentes, não merecem ser arrastadas para essa guerra sem sentido. Nunca me perdoarei se algo acontecer a elas. Por que não podiam simplesmente ter nos deixado em paz?

 

A data no topo da pequena anotação era de vinte e cinco anos atrás. Nia voltou a ler ainda mais avidamente, porém as páginas depois disso estavam todas em branco. Somente na última página do livro havia outra anotação, esta escrita em uma letra diferente. Era mais firme, quase agressiva em sua simplicidade negra contra as páginas amareladas.

Natalia,

Espero que esteja lendo isso, e que ainda não seja tarde demais. Porém, se você está aqui, provavelmente é. 

Siga as pistas, minha filha, e saberá a verdade. Se as coisas chegaram ao ponto de você estar de volta a este lugar, somente isso poderá ajudá-la. Sinto muito não poder estar aí para protegê-la, mas sua mãe e eu fizemos uma escolha e agora é hora de enfrentar as consequências.

Nunca se esqueça de que amamos você e a sua irmã, hoje e sempre.

Seu pai,

Gabriel

Nia deixou o tomo cair, seu arquejo de surpresa soando alto na quietude. A jovem não fez nenhum movimento para recuperar o livro, simplesmente encarou as sombras lançadas pela vela na parede, borradas pelas lágrimas que se acumulavam em seus olhos até parecerem silhuetas de um mundo fantasmagórico.

— Nia. — Ela sussurrou para si mesma. — Natalia … Esse lugar … Não … Não pode ser …

Algumas lembranças nebulosas estavam começando a retornar, rondando os cantos de sua mente como flashes de um sonho há muito esquecido. Um sonho do qual Nia não tinha certeza se queria se lembrar

Com gestos rápidos, a morena pegou a vela e saiu do porão o mais rápido que pôde. Uma vez lá em cima, desabou com as costas contra a cristaleira que escondia a entrada, abraçando os joelhos enquanto chorava copiosamente.


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