A Criança Pesadelo escrita por Lirah Avicus


Capítulo 7
O Estrondo




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Olhos vidrados.

Mãos trêmulas.

Pele pálida.

Naquela sala bem iluminada, duas pessoas se encaravam. Um homem de meia idade, grisalho, bem vestido, um tanto desgrenhado, sentado numa cadeira. De frente para ele, também com sua própria cadeira, estava uma moça de aspecto abatido e doentio, usando um vestido sem graça e sem cor, e com a cabeça raspada.

Esta poderia ser uma visão passiva de esquecimento. Não fosse que o homem chorava. E a moça também.

Havia uma parede de vidro num dos lados da sala. Detrás dele, vários homens vestidos de branco, com pranchetas nas mãos e canetas inquietas, observando tudo, anotando tudo, debatendo tudo. Entre eles estava o Dr. Hyslop. Ele era o único que não anotava. Tinha o olhar fixo no que acontecia do outro lado do vidro.

O homem grisalho soluçou. Queria se levantar e ir embora. Mas não podia. Não podia por que suas mãos estavam amarradas bem firme detrás de suas costas, presas juntas e atadas à cadeira. Ele olhava ora a moça, ora o Dr. Hyslop. Tinha olhos suplicantes. Suor escorria de sua tez. Implorava sem palavras.

—Por favor… — finalmente disse. — Não façam isso… Eu juro não fazer mais perguntas, eu juro!

Vee olhava o homem implorar pela vida, e tremia como uma vara. Todo o seu corpo parecia querer desabar. Ela também queria se levantar e ir embora, mas não podia. Não por que estava amarrada. Não estava. Mas ela simplesmente estava presa ali. Sua alma estava trancafiada naquele lugar.

Ela cerrou os olhos, tentando se concentrar. O homem voltou-se para ela, os olhos lívidos de pânico.

—Não… Por favor! — ele chorava como um bebê agora. — Não faça isso!

Vee respirou fundo. Seu coração retumbava como um tambor dentro de seu peito. Seus músculos doíam, e seu couro cabeludo ardia. Ela se remexeu na cadeira, procurando uma posição mais confortável. Não encontrou.

—Não faça isso! — o homem continuava, visivelmente tentando se soltar. — Eu tenho família!

Vee voltou-se para o vidro. Não queria fazer aquilo. Mas só encontrou o olhar metálico do Dr. Hyslop, encarando-a de volta e assegurando-a do que deveria ser feito.

Ela olhou o homem, voltando a se concentrar. Soluçava, e isso ruidosamente agora. Sua respiração estava acelerada, e seus dedos estavam cravados na madeira da cadeira.

O homem soltou um gemido de dor. Seu rosto estava molhado de lágrimas. Ele juntou as sobrancelhas, aparentando estar sob muito sofrimento. Se bem que era difícil saber quem estava sofrendo mais naquela sala.

Vee cerrou os olhos. Lágrimas escorriam por eles. Ela gemeu. Daí soltou as mãos da cadeira, passando os dedos com força pelo rosto e enxugando algumas lágrimas. Olhando para o vidro, balançou a cabeça negativamente.

O Dr. Hyslop comprimiu os lábios.

A porta se abriu num estrondo. Enfermeiros pegaram Vee pelos braços, erguendo-a da cadeira, enquanto outro enfermeiro foi até o homem e sacou um revólver.

—Não!!! — o tiro ecoou.

Violet Hunter sentiu suas pernas enfraquecerem. Ela foi arrastada para fora da sala, atravessando corredores e passando por pacientes e cuidadores. Alguns pacientes assistiam a cena. Outros a ignoravam. Um deles ria. Ela foi carregada até outra ala do hospital, esta encontrando-se no subterrâneo. Ela se debateu, gritou. Clamou por ajuda, mas ninguém veio. Levada escadas abaixo, seus calcanhares sangravam pelo choque contra os degraus. Chegando ao subterrâneo, a luz era escassa. O chão era esverdeado e frio, e algumas goteiras pendiam do teto. Um dos loucos esticou a mão na direção dela, murmurando baixinho uma reza. Numa sala muito mais ampla, Violet foi solta, caindo sentada no chão, de frente para o Dr. Hyslop.

Ele a olhou de modo condescendente.

—Pobre criatura… — murmurou. — Precisa tanto de minha ajuda.

—Estamos prontos, doutor. — avisou um enfermeiro.

O Dr. Hyslop assentiu.

—Você me desobedeceu. — ele disse, muito calmamente. — E agora vou ter de te disciplinar. Saiba que isso é culpa sua.

Violet voltou a chorar. Um enfermeiro prendeu-a numa camisa de força, a despeito de seus gritos, e outros dois a levantaram do chão e a carregaram até uma caixa de vidro imensa, jogando-a lá dentro. Ela caiu, batendo a cabeça no chão de vidro, e forcejando para se levantar. A caixa foi lacrada. Foi quando um enfermeiro abriu a torneira...

Vee abriu os olhos verdes esmeralda, percebendo que aquilo não era real. Suas mãos ainda tremiam, e ela as guardou dentro dos bolsos de seu casaco, que havia secado e ela havia acabado de vesti-lo. Olhou em volta, vendo-se numa aconchegante sala de visitas. Seria um cômodo normal, não fossem os rabiscos que Tesla infringira à parede.

Estava na casa de Frederick Abberline. E por enquanto, lá era seguro.

Ela se levantou, observando os desenhos desleixados do inventor. Caminhou sobre o tapete, tinha os pés descalços, sentindo o felpudo tecido sob a pele calejada de seus pés. Ainda tinha os olhos colados aos desenhos. Esticou a mão, tocando-os de leve. Subira no sofá, e seus dedos roçavam no malfeito boneco sem saia. Fechou os olhos, respirando fundo.

—Como provar que Watson é inocente? — disse Abberline, olhando os colegas um a um. Estavam na cozinha, ele, Lestrade, Tesla e Holmes, que vez por outra checava a sala. — Aquela roupa, aquela camisola, é o suficiente para que o condenem até mesmo a Tyburn.

—Aquela roupa não pertence a Rosie. — afirma Holmes.

—Watson poderia comprovar isso. — diz Lestrade.

—E olhe onde ele está. — comenta Tesla.

—Poderíamos comprovar isso também.

—E vamos acabar dividindo cela com ele.

—Nossa prioridade é tirar John Watson do Bedlam. — Abberline solta um suspiro. — Só Deus sabe o que estão fazendo com ele lá.

—Estão enlouquecendo ele. — afirma Holmes. — Até não ser possível acreditar em uma palavra sequer que saia de sua boca.

—Watson é durão. — diz Lestrade. — Precisarão de muito para deixá-lo louco.

Abberline ergue uma sobrancelha.

—Claro, seria necessário algo terrível como ter a filha desaparecida, visões de outro mundo e ser preso num hospício sem motivo válido… Espera...

—E se pedirmos reforços para invadir o lugar? — diz Lestrade.

—Vão enviar reforços para nos prender, isso sim. — murmura Abberline.

—Ela pode ser útil. — Tesla aponta para a sala. — Se ela consegue mover coisas com a mente poderá muito bem abrir coisas também.

—Não vou levá-la lá. — diz Holmes.

—E tem alguma ideia de como vamos entrar?

—Sabemos como arrombar portas, não será problema. — Abberline se senta numa cadeira, colocando as mãos sobre a mesa. — O desafio será primeiro: encontrar Watson. Segundo: sair sem chamar a atenção. Hyslop tem influência, e seremos presos se ele nos entregar antes de provarmos a inocência de Watson.

Enquanto os homens conversavam, Vee fechou os olhos novamente. Sua mente saiu daquela sala, daquela casa, daquele bairro. Ela não procurava nada que estivesse lá. Ela procurava outra coisa. Outra pessoa.

Ela plantou a mão sobre o desenho do boneco sem saia.

—John... — saiu de seus lábios.

***

John olhou seu braço. Virou a palma para cima, analisando a região onde estavam o pulso e corriam outras veias vitais. Passou os dedos por aquela pele mais clara e mais sensível, notando pequenos relevos avermelhados.

Ele se lembrava do que acontecera. Lembrava-se de ter ouvido a filha, e de ter seguido o som até a ala subterrânea. Lembrava-se do chão molhado de sangue. Das marcas deixadas por um monstro. E dos restos que ele provavelmente não quis comer. Mais do que isso, ele se lembrava de ter entrado numa sala mais ampla, tendo um pedaço de ferro nas mãos, segurando-o como arma, e visto uma caixa de vidro imensa, conectada a uma torneira por meio de uma pequena mangueira. John já vira algo parecido no Exército. Era um método de tortura muito bom que não deixava marcas.

Ele estava coberto de suor, seus pés sujos de sangue deixavam pegadas por onde andava. A barra de ferro tinha ferrugem, e machucava seu braço.

Ele vira aquela caixa, e viu mais. Viu desenhos na parede, muito parecidos com os desenhos que vira no apartamento de Sherlock Holmes. Desenhos extremamente detalhados e monocromáticos, de lugares que ele conhecia, mas não atinava quais eram. Ele vira aquilo e entendera.

Por isso ela tinha a cabeça raspada.

Ele viu mais, mas não conseguiu pensar mais. Estava exausto, e o que vira era demais para sua mente cansada. Cambaleara sem rumo e caíra encostado a uma parede aleatória, onde mais tarde foi encontrado pelos enfermeiros e pelo Dr. Hyslop.

Os enfermeiros tentaram convencê-lo de que tudo fora um sonho. Deram todo tipo de desculpas imagináveis. John abriu um sorriso, baixando o olhar novamente.

Seu braço estava todo arranhado.

“John…”

Ele olhou ao redor, atento. Ouvira algo.

“John…”

Ele levantou da cama, indo até a porta. Olhou pela janelinha, não vendo ninguém no corredor. Voltou para a cama, sentando-se. Estava começando a ficar paranoico.

Levou a mão até debaixo do colchão, tirando uma das madeiras de apoio da cama. Estranhamente ela tinha uma ponta mais fina que o normal. John apoiou a madeira contra o ferro da cama, exercendo força e voltando a afiá-la. Tirara a camisa do hospital, ficando com a regata de baixo, e fazia força para apontar aquela madeira.

“John!”

Watson caiu no chão. Caiu de bruços, cravando as mãos no chão gelado. Soltou um gemido de dor. Parecia que tinham aceso uma fogueira dentro de sua cabeça, e que seus cabelos acabariam caindo de seu couro cabeludo. Uma voz gritava dentro de sua cabeça, chamando-o incessantemente a ponto de ele não conseguir ouvir mais nada. Não ouvia nem mesmo sua própria voz.

A porta se abriu. Enfermeiros irromperam por ela, correndo até ele e levantando-o do chão, deitando-o na cama e segurando-o para que não batesse a cabeça. Diziam coisas, mas Watson não os ouvia. Não ouvia a eles, nem aos seus próprios gritos.

Ele fechou os olhos, apertando-os. Quando os abriu, teve um sobressalto.

Viu à sua frente uma sala aconchegante e ampla, com uma parede cheia de desenhos malfeitos...

***

—Vee? — Holmes arriscara, aproximando-se passo a passo. Ele deixara os homens debatendo na cozinha e fora até a sala para ver como ela estava, e encontrou-a em cima do sofá, parada, com uma das mãos na parede. Chegando mais perto, pôde ver que ela tinha os olhos fechados, e parecia sentir dor. Ele ergueu uma das mãos, mas temeu tocá-la. — Vee, está me ouvindo?

O rosto dela ficou plácido. Ela perdeu as forças, todo seu corpo desabando. Cairia no chão, não fosse por Holmes que a amparou, tirando-a de cima do sofá e levando-a até uma poltrona, colocando-a nela.

As luzes começaram a piscar, ao mesmo tempo em que parecia que ela estava sonhando.

—O que está acontecendo? — disse Abberline. Holmes encarou-o, sem palavras. Quando voltou-se para Vee, ela já abrira os olhos.

A moça olhou-o de modo estranho. Levantou-se, numa postura totalmente diferente, e coçou a cabeça. Olhou ao redor, confusa. Daí voltou-se para Abberline.

—Você... — rosnou. — Você me colocou neste lugar!

—Quê? — soltou Frederick.

—Estou preso por sua causa! — ela avançou na direção dele, mas Holmes se interpôs entre os dois. Ela soltou som de raiva. — Não tente me impedir, Holmes, eu poderia estar buscando minha filha e já a teria encontrado, não fosse esse bastardo maldito!

Holmes deixou o queixo cair. Não acreditava no que via.

—Watson?

—Não sei como vim parar aqui... — ela olhou ao redor novamente. — Talvez eu esteja viajando novamente...

—Watson?

—Você já disse isso! — ela abriu os braços. — O que foi?

—Como isso é possível? — gagueja Abberline, parecendo que ia vomitar a qualquer momento.

—Vocês deveriam parar de me encarar como se eu fosse um fantasma e fazer algo útil. O que descobriram enquanto estive fora? Não sabem o que passei, estou ficando louco... Eles... São maus comigo... E eu descobri por que a moça tem a cabeça raspada!

—Ah é?

—Eles a torturavam. Imersão. Há um tanque de água gigante no subterrâneo. Não sei se era apenas para ela, mas há desenhos muito parecidos com os que ela fez naqueles papéis da Baker nas paredes. Sei que são dela.

—Watson...

—O quê?

—Por que você não dá uma olhada em si mesmo?

—Por quê? — ela abaixa a cabeça, e tem um sobressalto. — Por que estou de vestido?

—Por que você... — Holmes disse. — Não é você.

—O que quer dizer com isso?

—Watson, você está ainda no hospício.

Ela pensou algum tempo. Seu rosto denotou medo. Esticou a mão na direção de Holmes.

—Por favor, venha me buscar.

Ela tonteou. Holmes foi até ela, passando os braços ao seu redor. As pernas dela fraquejaram, e ele teve de se ajoelhar no tapete.

—Watson? — ele a sacudiu sem força. — Watson, se está me ouvindo, eu estou indo te buscar!

Tesla e Lestrade chegam à sala.

—O que houve? — pergunta Lestrade.

Vee abriu os olhos, marejados por lágrimas.

—Eu perdi ele.

Batidas fortes na porta.

—Sr. Holmes! Sr. Holmes!

Abberline vai até a porta, abrindo-a e deparando-se com um menino maltrapilho de cabelos cacheados.

—Moleque?

Dustin caiu de joelhos no chão, sendo amparado por Frederick, que o segurou pelos braços. O garoto chorava desesperadamente, tremendo tudo o que seu pequeno corpo permitia. Estava mais sujo que da última vez, e seus olhos estavam vermelhos de choro e pânico. Abraçou o detetive, aterrorizado.

—Tem algo no Hyde Park!

—Acalme-se, menino. — disse Abberline, abraçando a criança. — O que aconteceu?

—Ele o comeu! — Dustin exclamou. — Comeu ele! Comeu ele!

—Quem comeu quem?

—Era enorme! E escuro! Estou com tanto medo!

—Fique calmo.

—Ele vai me comer também!

Abberline carregou o menino até a sala, sentando-o no sofá.

—O que houve, Dustin? — pergunta Holmes.

—Há alguma coisa no Hyde Park... — Dustin agora falava entrecortado. Tesla surge com um copo de água com açúcar, entregando-o ao garoto, que bebeu tudo num gole só. — Algo grande, não sei o que é, mas ele comeu um mendigo!

Holmes mira um olhar de alerta para Abberline, que sai da sala, voltando com uma espingarda. Ele abre a arma, checando a munição.

—O que vai fazer? — diz Lestrade.

—Eu vou caçar. — Abberline dá um tranco na espingarda, que se fecha num estalo seco.

—Ele veio para nosso mundo. — diz Tesla. — O que Watson viu está aqui, você não pode enfrentá-lo.

—E o que espera que eu faça? Quer que eu fique aqui? Olhe o estado do menino, seja lá o que ele viu comeu um mendigo! Como vamos saber se ele já não fez isso antes? Ninguém dá falta de mendigos, só notamos as crianças por que elas tinham família! — o olhar de Abberline era duro. — Eu vou atrás dele. Lestrade, você vem?

—Você tem outra espingarda?

—Venha comigo.

Os dois homens saem. Tesla encara Holmes.

—O que vai fazer?

Holmes olha Vee por alguns instantes.

—Tenho de chegar até Watson. De alguma forma tudo isso gira em torno dele e Rosie. Eu vou para o Bedlam.

Tesla assente.

—O que posso fazer para ajudar?

—Pode espantar os seguranças do hospício?

—Só me deixe ir até minha casa.

—Não pode ir lá. — diz Vee. Ela acaricia o rosto de Holmes. — Não pode ir lá.

—Eu tenho de salvar meu amigo. — ele a coloca de volta na poltrona. Ele encara Dustin, que estava bem mais calmo. — Pode cuidar dela para mim?

Dustin faz que sim, secando o rosto com uma das mãos. Holmes se levanta, saindo pela porta da frente. Vee cobre o rosto com as mãos, balançando para frente e para trás.

—Pare com isso. — diz Dustin. — Está me assustando.

Ela para, olhando para o menino.

—Vá ajudar Tesla. — disse.

—Mas o Sr. Holmes disse para eu cuidar...

Vee ergue uma das mãos, e neste exato momento um dos vasos sobre o guarda-pó estoura.

—Vá agora.

Dustin arregala os olhos, levantando-se e saindo correndo também pela porta da frente.

***

—Somos dois idiotas completos.

Lestrade dissera estas palavras com certeza absoluta. Caminhando na companhia de Abberline, tendo apenas algumas luminárias para iluminá-los, e pisando sobre uma névoa densa e leitosa, ele sentia-se a pessoa mais idiota do mundo. Nem mesmo a lua fazia-se presente, pois encontrava-se encoberta por nuvens pesadas.

As ruas eram apertadas e calcadas em pedras úmidas de chuvas anteriores. As casas pareciam estar adormecidas, assim como seus proprietários, e não se ouvia ruído além de raros gritos de coruja. Eles se dirigiam ao Hyde Park, e para o bom inspetor, isso era uma decisão estúpida. O lugar era lindo e convidativo durante o dia, mas durante a noite ele se transformava, tornando-se um lugar sombrio onde coisas horríveis podiam acontecer sem que ninguém testemunhasse.

Frederick Abberline caminhava como um soldado. Tinha postura ereta, era alto, e tinha a arma já em punho, como que aguardando ser atacado a qualquer momento. Lestrade o imitou. Nunca se sabe.

Abberline parou. Olhou algo na calçada. Estavam em frente a um dos portões do parque, e Lestrade sentiu certo alívio ao não entrar imediatamente.

—O que encontrou?

—Rastro de sangue. — Abberline disse, grave. — Ele foi por ali.

Lestrade seguiu o dedo indicador de Abberline, que apontava para uma rua que dava a volta no parque, e era uma das vias que levava diretamente ao Bedlam. O inspetor engoliu em seco.

—Não sei se quero fazer isso.

—Não faça. — Abberline se endireitou, voltando a caminhar. — Vá para casa.

—Espera... — Lestrade apertou o passo, tentando acompanhar os passos largos de Frederick. — Não está nem um pouco assustado? Quero dizer, olhe em volta! Sangue, névoa, escuridão, o que isso te lembra?

—Meu maior inimigo...

—O quê?

Abberline sacudiu a cabeça, irritado.

—Olhe, Lestrade, se você está com medo agora que não encontramos absolutamente nada, é melhor você ir embora antes que encontre algo realmente assustador.

—Mas não posso te deixar sozinho! Somos policiais, e se você...

—Eu conheço esta Londres melhor que qualquer um! — Frederick se vira para Lestrade. — Eu pertenço a essa escuridão! Ela faz parte de mim, portanto ela não me assusta. Estou mais preocupado com a possibilidade de mais pessoas virarem rastros de sangue, e vou tentar impedir que isso aconteça, então, ou você me ajuda, ou para de me atrapalhar!

—Você está falando como Holmes...

—Ele é como eu. — Abberline volta a andar. — Também faz parte do escuro.

—Vou com você. Não posso deixá-lo.

Frederick encara Lestrade, abrindo um sorriso.

—Deus te abençoe, Gregory Lestrade.

Eles caminham algum tempo, chegando a ver o hospício de longe. Neste momento, são cercados por homens armados.

—Soltem as armas! — ordenaram.

Frederick observa os homens, percebendo que detinham armas pesadas, e que estavam visivelmente assustados.

—Estamos atrás da mesma coisa que vocês. — diz ele.

—Soltem as armas!

—Ele saiu do Hyde Park e veio para cá. Por isso estamos aqui.

Os homens se entreolham. Daí apontam suas armas.

—Espere.

Estalos ecoam ao longe. Luzes azuis os iluminam. Os homens começam a tremer.

Caminhando na direção deles vinha Nikola Tesla, segurando dois globos de vidro, um em cada mão, de onde saíam raios azuis e amarelos.

—Obedeçam ao detetive! — exclamou. — Ou vou levá-los comigo!

Os raios ficam mais intensos. Eles se espalham pela rua, atravessando o corpo de Tesla e iluminando seus olhos com uma luz branca cegante.

—Meu Deus! — um dos homens gritou. Eles permanecem parados, estáticos de temor.

—Eu disse... OBEDEÇAM! — Tesla ergueu as mãos, e os raios pareceram partir em direção ao céu. Ele abriu a boca, e mais raios saíram dela e de seus olhos, fazendo-o ser uma visão aterradora. Os homens gritaram de pavor, soltando suas armas e correndo como baratas tontas, desaparecendo em seguida.

Tesla baixou as mãos, encarando Abberline e Lestrade, que jaziam encolhidos no chão, e abriu um sorriso matreiro.

—Pode desligar, garoto! — os raios esvaneceram. Logo surge Dustin, segurando uma maleta, abrindo-a em frente ao inventor, que guardou os dois globos e fechou-a em seguida. — Vocês estão bem?

—Não. — rosna Lestrade.

—Isso foi... — suspirou Dustin. — Incrível.

—Se isso não atrair a tal criatura... — diz Abberline. — Não sei o que vai atrair.

***

Vee permanecia sentada na poltrona. Tinha as pernas encolhidas juntas ao corpo, e apertava os joelhos com as mãos. Tirara a peruca, esta começara a pinicar-lhe a cabeça, e olhava ao redor com receio. Sozinha na casa de Abberline, atentava a qualquer barulho. Qualquer simples ruído a alarmava, e a fazia se encolher cada vez mais na poltrona.

Do lado de fora, começara a chover. Ela sentia sono. Mas não fecharia os olhos, não podia, estava muito assustada para isso. Queria comer também, mas não tinha coragem de descer da poltrona e ir até a cozinha. Assim ficava ali mesmo, assustando-se com tudo ao seu redor. Notou um mosquitinho voando ao redor da luminária, e distraiu-se com ele. O mosquitinho parecia feliz. Nada ameaçava o mosquitinho.

A luz começou a piscar, espantando o mosquitinho. Vee sentiu-se retesar. Começou a tremer, apertando ainda mais os joelhos. Tinha os olhos bem abertos, trincara os dentes e pareceu deixar de sentir a poltrona debaixo de si. Estava tão assustada que não conseguia se mexer. Finalmente fechou os olhos, concentrando-se.

—John... — gemeu. — Me ajude...

Um estrondo vindo do outro cômodo. Vee abriu os olhos, disparando escadas acima. Encontrou uma porta fechada, daí com um chute certeiro arrombou-a, entrando no quarto. Fechou a porta, trancando-a. Puxou o grande guarda-roupa, arrastando-o até a porta e derrubando-o, fazendo dele um bloqueio. Caminhou pelo quarto, procurando algo para usar como arma.

—Não há nada aqui para te proteger! — ela disse, levando as mãos à cabeça.

Silêncio. As luzes voltaram ao normal.

Vee cambaleou para trás, sentindo-se tonta. Ao retornar a si, quis chorar, pois perdera a conexão com John Watson e assim não conseguiria que ele a ajudasse, nem que lhe cedesse uma força que ela não tinha. Ela já fizera isso antes com outras pessoas, Hyslop a forçava a fazer isso, mas nunca tivera uma conexão tão forte quanto com Watson, era como se os dois fossem um só. Só assim para arrombar a porta. Só assim para arrastar aquele guarda-roupa. Só assim para ela conseguir correr tão rápido.

Novo estrondo, bem mais próximo. Algo grande foi partido. As luzes voltam a piscar, desta vez fazendo isso como loucas. Vee retrocede trêmula, encostando-se na parede, escorregando até o chão. Fechou os olhos, começando a chorar, enquanto todas as luzes pareciam dançar ao seu redor.

—Violet! — ela ouviu em meio ao ruído de coisas se quebrando.

Violet sente seu coração retumbar.

—Sherlock! — grita com todas as forças. — Sherlock! Sherlock!!!

A porta é forçada, até que ela é partida, lascas de madeira voando para todos os lados. Holmes passa pela abertura que conseguiu abrir, saltando o guarda-roupa e correndo até Violet, puxando-a para si e indo até a janela, abrindo-a. Os dois saltam a janela, equilibrando-se no telhado molhado, pois ainda chovia torrencialmente. Holmes escorrega até a beirada do telhado, apoiando os pés na calha, e estica os braços.

—Venha!

Violet faz o mesmo. Eles seguem pela calha, quando sons de coisas se partindo começam a ficar cada vez mais próximos. Holmes segura Violet pela cintura, movendo-se mais rápido até conseguir chegar ao final do telhado e virar para detrás da parede de tijolos. No momento em que ele fez isso, o vidro da janela estoura. Os dois se encolheram detrás a parede, ouvidos em alerta. Um rosnado gutural ecoou através das gotas de chuva.

Holmes esticou a mão, alcançando um cano que descia desde a chaminé e ia até o gramado lá embaixo. Segurou-se nele, usando-o para descer até o chão. Os dois correram até a rua, disparando para longe daquela casa.

***

John Watson voltara a si naquele instante. Olhara ao redor, ainda em posição de guarda, e vendo-se novamente na Sala de Documentos, ouvindo os enfermeiros do lado de fora tentando arrombar a porta, que aguentara bravamente até agora. John voltou a ler a ficha que tinha nas mãos.

Nome do interno: Violet Hunter

Médico responsável: Theophilus Bulkeley Hyslop

Documento classificado como confidencial.

Watson leu todo o prontuário. Tudo o que haviam feito com Violet estava relatado ali com os mais sórdidos detalhes. Assim como todos os testes, e o que ela era capaz de fazer. Ele dobrou o documento e meteu-o dentro da camisa, voltando-se para a porta, que ainda aguentava todos os golpes que recebia.

John não estava lá havia alguns minutos. Há alguns minutos, estava na casa de Frederick Abberline, arrombando portas, derrubando guarda-roupas, ouvindo estrondos de coisas quebradas. Não entendia como aquilo acontecera, mas sabia que conseguia ver através dos olhos de Violet, e pelo visto era algo recíproco, pois quando voltara a si, estava dentro daquele depósito de prontuários, com a ficha dela nas mãos. O único problema agora era sair de lá. Ele se enveredou entre aquelas estantes grandes e apertadas, avistando uma saída pelos fundos. Abriu a porta, correndo pelo corredor longo e sem portas, chegando a uma escadaria e descendo por ela. Tinha de sair dali, tinha de encontrar sua filha. Algo estava atrás de Violet, algo grande, e provavelmente era a mesma coisa que perseguira Rosie e a fizera desaparecer.

Outro documento fora colocado por Violet nas mãos de Watson. Não era um prontuário, mas estava assinado pelo próprio Hyslop. Um documento que registrava datas, lugares e nomes. Os nomes: William Byers, Barbara Holland... George Phillip Handsman, Lucille Ball, Hansel Fisher, Theodore Dickinson...

Tantos nomes. Todos desaparecidos.

Não era algo aleatório. Todos eram mendigos, com exceção das crianças. Ninguém sentiu falta deles, ninguém sabia de suas existências sôfregas. Eles desapareceram, e ninguém se deu ao trabalho de atinar o porquê. Mas agora John sabia o porquê. E tudo o que podia fazer era salvar sua filha, e talvez destruir a criatura que estava fazendo aquilo.

Tiros ecoaram. Watson parou de andar. Começou a correr. Subia os degraus de três em três. Abriu outra porta, começando a sentir uma tonteira conhecida. Viu-se no hall de entrada.

Violet estava caída no chão. Lestrade também. Abberline acertara um enfermeiro com o cabo de sua espingarda, enquanto Holmes desviava de um golpe de lado. Ele correu na direção deles, esperando ajudar de alguma forma.

—Holmes! — exclamou.

Um tiro. John sentiu seu ombro queimar. Ele caiu para trás, ouvindo gritos irreconhecíveis. Seu corpo tombou, mas para a surpresa de John, ele não se chocou contra o chão. Ele simplesmente continuou caindo.

Caindo... Caindo...

***

—Watson... — Holmes foi jogado no chão por homens fortes que conseguiram subjugá-lo.

Hyslop aproximou-se dele, apontando sua arma ainda fumegante contra a cabeça do grande detetive. Ele encarou Abberline, ainda de pé.

—Solte a arma, detetive.

Frederick hesitou. Daí obedeceu, sendo imediatamente derrubado.

—Levem todos ao subterrâneo. — ele caminha até Violet, pegando-a no colo e seguindo os outros. Olhava-a com um sorriso largo. — Como é bom te ter de volta.

Eles desceram as escadas, atravessando o corredor cheio de musgo e gelado, chegando à sala ampla com uma parede de vidro num dos lados. Todos foram colocados de joelhos, ao passo que Hyslop sentou Violet delicadamente numa cadeira.

—Onde está Watson? — diz Lestrade. — Para onde o levaram?

—Nós não o levamos a lugar nenhum. — diz Hyslop, fingindo-se confuso.

—Mentira!!!

—É verdade... — diz Holmes, sem tirar os olhos de Violet. — Watson levou a si mesmo.

—Sim, ele está certo. — Hyslop dá um passo à frente. — Ele vai e volta. Normalmente ele acaba aqui, então é só uma questão de esperar que logo ele aparecerá.

—Você está tão encrencado...

—Engana-se, inspetor. Vocês invadiram minha instituição, procurando libertar um suspeito insano. Até onde sei vocês atacaram meus seguranças e enfermeiros, nós estamos apenas nos defendendo e nos certificando de que não sejamos novamente ameaçados. É pura e legítima defesa.

—Seu parasita intestinal!

—Não faça isso, inspetor Lestrade. — Hyslop parecia realmente ofendido. — Devia ser mais educado, como seus colegas ao seu lado. Veja como se comportam bem.

—Eu vou pessoalmente destruir você. — murmura Abberline, o cenho inexpressivo.

—Bem, vinda de você essa ameaça me assusta... Sua fama no submundo é notória, detetive. O que vai fazer? Me matar?

—Vou te destruir... Se Holmes não fizer isso antes.

—Tudo o que ele fez foi me atrasar. — Hyslop coloca as mãos na cintura, começando a andar em círculos. — Estou tentando arrumar essa bagunça, mas ninguém deixa! Acham que eu gosto disso? Que isso me apraz? Eu quero salvar vidas, e vocês não estão deixando eu fazer isso!

—Encobrindo assassinatos? — diz Frederick.

—Cometidos por uma criatura, não por mim! Tudo o que quero é...

—É deixar que ela coma todo mundo menos você! — estoura Lestrade.

—É compreendê-la! Algo tão magnífico, tão temível a ponto de se tornar uma cantiga para crianças dormirem na hora certa... É simplesmente lindo.

Gregory solta uma risota.

—Então você deixa que o bicho cace a vontade enquanto você estuda os hábitos alimentares dele.

—Não se destrói o que a natureza criou com tanto capricho. Eu faço tudo pelo conhecimento. Por isso criei este lugar. O conhecimento nos libertará. E libertará estes coitados dos quais cuido. Eu amo meu trabalho.

—Você vai ficar desempregado no que depender de mim, meu amigo.

—Você não é tão ameaçador quanto seu colega, inspetor.

—Eu sou um homem da lei!

—E eu o derrotei! Derrotei a todos! — os olhos de Hyslop brilhavam. — Vocês não são perigosos, eu sou! Descobri uma maneira de abrir portas para outros mundos, logo John Watson me mostrará como atravessá-las, e depois aprenderei como controlá-las. E eu farei o que for preciso para completar o que comecei, para o bem da humanidade! — o doutor se acalma, voltando-se para Sherlock. — Está silencioso, Det. Holmes. Algo o incomoda?

Holmes faz que não.

—Só estou aguardando.

—O quê?

Holmes encara Hyslop.

—Sua queda.

—Poderia ser mais específico?

—Enviei Nikola Tesla para falar com Hiram Judge. Ele também é amigo de Charles Fisherman, e, portanto conseguirá acesso às provas do caso Watson como pagamento de um favor. Tesla é um gênio, conhece meus métodos, e ele mostrará que aquele vestido não pertencia a Rosie Watson e mais, que aquela mancha vermelha sequer é sangue. Sendo esta a prova principal, e única, da culpa de John Watson, eles terão de libertá-lo imediatamente, e Tesla convencerá Judge a iniciar uma investigação contra sua instituição, e por que vocês quiseram condenar Watson utilizando-se de provas falsas. Isso resultará numa prisão cautelar para você e sua corja, e como você não esperava por essa reviravolta, acredito que Gregson e seus parceiros encontrarão coisas apetitosas neste lugar, prontas para te jogar no círculo mais profundo do inferno. Eu sei dos experimentos, e posso prová-los. Nós nos veremos no tribunal, Dr. Hyslop, e eu me certificarei de que você não saia dele sem um par de algemas embelezando-lhe os pulsos, e o caminho certo até Holborn. Você machucou John Watson, eu pretendo lavar meu deerstalker no seu sangue. Você é perigoso, doutor, mas eu também sou.

Hyslop tinha o rosto endurecido. Controlava a respiração. Ele segurou o olhar de Holmes algum tempo. Daí caminhou até Violet, que lentamente recuperava a consciência. Ajoelhou-se diante dela, acariciando-lhe a cabeça.

—Ao menos... — disse. — Minha pequena bailarina você não terá... Não é mesmo, minha querida?

Violet encarou-o, daí afastou o rosto do doutor, empurrando sua mão.

—Sherlock... — ela soluçou, apontando para o grande detetive.

Hyslop bufou de raiva. Levantou-se, olhando para os homens ao seu redor.

—Enfileirem eles! — ordenou. Os homens obedeceram, colocando Abberline, Holmes e Lestrade em fileira, sacando suas armas em seguida. Hyslop pegou Violet pelo braço, levantando-a e arrastando-a até uma caixa de vidro que nenhum dos três homens notaram a existência. Violet gritava, lutando contra o doutor, enquanto este abria a caixa e a atirava com força dentro dela, lacrando-a em seguida.

—O que vai fazer? — diz Lestrade.

Hyslop não respondeu, apenas abriu a torneira. A caixa começou a se encher de água.

Violet entrou em pânico. Levantou-se, chocando-se contra o vidro, os olhos lívidos de terror. Batia no vidro, gritando por ajuda, enquanto a água cobria seus joelhos.

Aquela caixa de vidro era seu pior medo. Ela nunca conseguia sair de lá. Hyslop a deixava lá até que quase sufocasse, só para tirá-la quase asfixiada, e bem mais dócil. O pavor de voltar para dentro da água a deixava assim.

Holmes se debatia contra os homens que o seguravam, os olhos pregados naquela caixa.

—Não faça isso!

Hyslop saiu da sala. Os homens destravaram suas armas.

Violet chocava-se contra o vidro, seus pés não mais tocavam o chão. Ela apalpava o teto de vidro, as paredes, tudo, procurando um modo de abrir aquilo. Seu rosto tocou o teto. A caixa se enchera muito rápido.

Ela podia ouvir Holmes gritando seu nome. Afundou naquele redemoinho de bolhas e água, olhando através do vidro e vendo os homens a apontar suas armas e um deles dar o sinal. Iriam atirar. Cravou os dedos no vidro, tremendo. A água parecia começar a ferver.

Violet gritou. Mesmo debaixo da água, foi possível ouvi-la. O vidro estourou, assim como as armas, que se partiram e acertaram os homens que as empunhavam. Tais caíram no chão, mortos. A água espalhou-se como uma onda pela sala, jogando todos contra a parede, junto a espuma e cacos de vidro. Rachaduras subiram pelas paredes, e todas as celas no hospício se abriram.

Sherlock Holmes foi o primeiro a se recuperar. Levantou-se, encharcado, e foi cambaleando até Violet, levantando-a da água que escorria e checando seu estado. Ela estava consciente, apenas fraca, e com alguns cortes. Ela o encarava, começando a chorar.

—Me desculpe. — disse.

—Não precisa se desculpar, você nos salvou.

Abberline se levantou, caminhando até a porta e abrindo-a, atraído pelos gritos vindos de fora.

—Santo Deus...

—Me desculpe. — ela repetiu. — O Bicho Papão... Fui eu... Eu... Eu sou o monstro.

—Não. Você nos salvou.

—Ele me fez...

—Não importa. — Holmes apertou o abraço. — Não importa...

—Salve John Watson... Tenho de salvá-lo.

Holmes sorriu tristemente.

—E quem é que vai salvar você?


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