Ishizu nunca entendeu o conceito de inveja, nunca viu a lógica em se ressentir pelo que outra pessoa possui, seja material ou não. Sempre pensou nisso como um sentimento fútil e mesquinho, afinal, você deve agradecer pelo que tem e lutar para ter o que quer, não ficar se remoendo pelas conquistas dos outros.

Bem, pelo menos era nisso o que acreditava até Akefia e ela passarem por uma dessas noites melancólicas em que beberam um pouco à mais, bem no começo da relação. Ishizu não tem certeza do que fez Akefia lhe dizer todas aquelas coisas, se foi o álcool em seu sistema ou a vontade de desabafar, talvez fosse a chuva que caía lenta lá fora junto das batidas ritmadas das gotas contra a janela. Ela realmente não sabe dizer de onde veio, mas de repente o clima tranquilo pôs sexo se tornou melancólico.

Akefia respirou fundo, lhe fazendo cócegas – Às vezes te invejo, Ishizu. – murmurou abafado, o rosto parcialmente enterrado entre seus seios e os olhos erguidos para olha-la.

— Besteira, você é o Rei Ladrão, pode ter o que quiser. – correndo os dedos pelos fios brancos ela respondeu com um sorriso irônico, mas este logo se desfez ao notar a expressão dele – Akefia?

Ele não respondeu por um minuto ou dois, apenas fechou os olhos e gemeu para a sensação dos dedos suaves em seu cabelo. Sem precisar de palavras ela continuou com aquilo, descendo lentamente para a nuca e omoplatas, onde esfregou a pele quente sentindo os músculos relaxados ondularem sob seu toque.

Suspirando novamente começou a falar, num tom baixo – Sempre estive sozinho, não conseguia confiar nas pessoas, por isso me convenci de que não precisava de ninguém. Eu era um tolo. – deu uma risada seca e continuou – Diferente de mim, você teve seus irmãos, e ainda os tem grudados na barra da sua saia como seus filhos e você consegue retribuir isso a eles, não só com eles, você expressa o que sente com tanta naturalidade. Parece besteira, mas invejo isso.

Aquilo a fez parar, ouvir aquelas palavras lhe apertava o peito e teve que lutar contra o sentimento de pena, ele não a perdoaria se demostrasse pena. Mas não era isso o que sentiu, estava apenas abalada e incomodada em vê-lo vulnerável, logo Akefia que sempre foi forte, atrevido e cheio de si. Talvez ela estivesse o superestimando demais.

De repente se deu conta de tudo que ele passou e isso pesou sobre ela de uma vez, não tinha percebido o quanto aquilo ainda mexia com ele, mas já devia imaginar, ninguém esquece ou supera aquele tipo de coisa assim fácil. Se sentiu uma completa estúpida.

Respirando fundo envolveu os braços nos ombros largos, beijou os cabelos brancos e depois os lábios, se demorando um tempo até se darem por satisfeitos e se afastarem aos poucos. Ela sorria e lhe segurava o rosto com as mãos, quase amassando as bochechas. Ele quis rir da situação, mas o riso morreu assim que notou o olhar sério.

— Ah, não...— pensou desanimado esperando palavras cheias de pesar.

— Não me importo com jeito ríspido, com toda sua teimosia e gosto duvidoso para comida. E você não está mais sozinho, eu estou aqui, não estou? Você é uma parte importante da vida agora. E meus irmãos te adoram, não precisa ter inveja de nada disso, até porque eles me enlouquecem. – terminou com muxoxo desanimado.

Dessa vez ele riu e teve que apoiar a testa no ombro alheio. Sentia o peito leve – Você não existe, Ishizu. – disse e beijou-a no pescoço – Onde você esteve no Antigo Egito? – questionou divertido.

— Não sei, servindo ao Faraó e tentando te impedir, talvez? – respondeu revirando os olhos e isso o fez rir novamente. Ah, as ironias da vida.