A Herdeira do Olimpo escrita por Nogitsune Walker


Capítulo 1
Pesadelos : A primeira noite




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/720282/chapter/1

Maya

 

Três dias antes das aulas começarem, comecei a ter pesadelos. Não, melhor dizendo, algumas velhas lembranças começaram a me atormentar um pouquinho mais que antes.

Olá, meu nome é Maya Walker, tenho quinze anos e sou uma meio-sangue. De que olimpiano sou filha? Bem, prefiro não falar disso por enquanto (até por que, nem eu sei) e, quando descobri a verdade sobre mim, bem... não sou exatamente uma Helena de Troia. 

Você deve estar pensando "Nossa! Que incrível, você é uma semideusa. Como é o acampamento, e as lutas com as espadas e blá blá blá...?", sinceramente, a única coisa que mudou na minha vida foi que eu comecei a ser perseguida por monstros que queriam por que queriam me matar (obrigado sangue olimpiano) e que eu fui para um lugar onde consegui fazer todos lá me odiarem mais ainda. 

Um breve resumo da minha história: minha mãe me tratou como um lixo desde o primeiro dia que me viu e sempre deixou bem claro que me odiava, que eu era um peso para ela e que nem devia ter nascido (se não fosse por minha tia que cuidou de mim até eu aprendera me virar, eu nem estaria aqui para contar essa história), ah e só uma nota nessa parte: minha mãe me espancava. Enfim, continuando, quando eu tinha cinco anos ela me largou na casa dos pais dela quando descobriu que estava gravida do namorado dela, a nova "família perfeita" não incluía um erro como eu.

            Meus avós me criaram como se eu fosse sua filha, mas por conta do tempo que eu passei com minha mãe, acabei desenvolvendo um gênio forte e foi difícil para eles, mas eu acabei cedendo e tentando não trazer problemas demais para eles. Até aceitar um carinho, talvez? Quando completei seis eles acharam que já estava na hora de eu ir para a escola, me colocaram um pouco adiantada e eu acabei no sexto ano com dez anos. 

Do meu primeiro ano na escola até o começo do fundamental eu fui a estranha que só causava problemas, a excluída. Eu via coisas estranhas como quando eu tinha sete e um cara grande e estranho de capuz foi me buscar na escola, eu jurava que tinha visto só um olho na cara dele, mas quem acreditaria? Quando contei para os meus avós, eles ficaram aflitos e me mudaram de escola quase imediatamente, situações parecidas ocorreram e eu acabei passando por muitas escolas até começar o sexto. Mas vamos pular logo para a história. Mega resumo antes dos onze: bullying, monstros me perseguindo, sou diagnosticada com TDAH, todo mundo acha que sou louca.

Bom, vamos lá. Como eu ia dizendo antes de me enrolar na minha apresentação, três dias antes das aulas na faculdade começarem, eu tive meu primeiro pesadelo. Lá estava eu, uma garota de dez anos no sexto ano na frente da classe me apresentando pela centésima vez. Mesma coisa padrão de sempre.

"Turma, temos uma nova aluna" Diz a professora.

"Sou Maya, só Maya, dez anos." Me apresento e antes que a professora pudesse falar qualquer coisa mais, ando até o fundo da sala e sento numa carteira do canto que tinha visto vazia. Sentia o olhar de todos na sala sobre mim e pelo menos três segurando o riso, mas já estava acostumada. Todos estavam de uniforme exceto eu, meus avós eram de classe média-baixa então digamos que eu só iria de uniforme quando a aposentadoria deles chegasse. Eu estava vestindo uma calça jeans velha, uma blusa preta de manga curta, coturnos e um moletom azul escuro de zíper e capuz. A professora começou a dar a aula dela e eu fiquei quieta no meu canto, já sabia tudo o que ela ia explicar mesmo. Minha avó tinha lido comigo os livros da escola e eu tenho uma certa facilidade para aprender as coisas sozinha, mas o TDAH não me deixaria prestar atenção na aula. Tudo estava indo bem até que ouvi um estalo e então o sonho ficou estranho. 

Correntes brotaram do chão e prenderam minhas mãos a carteira e meus pés ao chão. Todos na sala começaram a mudar de forma se transformando em monstros horrendos com garras e presas enormes, pelagem escura e os olhos vermelhos brilhantes. A sala de aula começa a queimar e a mudar, as mesas somem e de repente estava numa espécie de caverna em chamas. Os monstros se viram em minha direção e começam a avançar lentamente emitindo um ruído do fundo da garganta que parecia muito com uma risada.

"Não!!! Se afastem!" Grito para eles enquanto me debatia e lutava contra as correntes tentando me libertar. Os monstros, vendo que sua presa estava indefesa, pulam sobre mim e começam a me arranhar e morder. Grito de dor enquanto sentia minha pele rasgar e arder com os ataques. Caio no chão com a força dos golpes e tento ao máximo permanecer viva e inteira e então, uma voz sibilante surge no meio dos gritos e risos dos monstros.

" Sse afasstem, me deixem passsar." Sibilou, e eles saem de cima mim. Estava no chão, encolhida, toda cortada e sangrando na minha frente ela aparece, uma mulher com a parte de baixo de uma cobra no lugar das pernas, um cinto com um punhal, as presas pontiagudas se abrindo em um sorriso vitorioso e as cobras no lugar dos cabelos se movendo impacientemente. Reconheci a górgona dos livros de mitologia que minha avó me mostrava.

"O que quer de mim?" Pergunto entre lágrimas e soluços de medo.

A górgona me pega pelo pescoço e me ergue alguns centímetros acima do chão.

"Vosssê vai lutar por nóss meio ssangue, ou ssssua família vai sssofrer ass consssequências" Ela corta as correntes com o punhal e enquanto me debatia e gritava, ela me arrastava para a escuridão.

O sonho mudou, agora eu estava com os pulsos presos às costas por correntes e os braços amarrados fortemente junto ao corpo. Estava com a mesma roupa do sonho anterior, mas dessa vez ela estava toda rasgada e suja de sangue. Minha pele ardia com os cortes e arranhões e a górgona me empurrava pelo corredor de um luxuoso cruzeiro chamado Princesa Andrômeda até o que parecia ser a cabine do capitão. A górgona abre a porta e me empurra para dentro com força. Entro de cabeça baixa na sala e tento resistir ao impulso de olhar para o que parecia ser um enorme caixão no fundo da sala. 

Fico parada com as garras da górgona apertando meu ombro. 

"Pode ir, quero ter uma conversa a sós com nossa convidada" Diz uma voz masculina. Ela larga meu ombro, agora um pouco dolorido e ouço um som semelhante ao de uma áspera lixa no assoalho de madeira enquanto a górgona sai da sala e fecha a porta. Permaneço imóvel, o medo me impedindo de fazer qualquer movimento. Ouço o homem se aproximando, ele segura meu ombro e gentilmente me leva até uma cadeira de madeira na frente da mesa dele.

"Sente-se" ele diz e, sem escolha, faço o que ele manda. Ele se senta na cadeira reclinável atrás da mesa. Sinto seu olhar sobre mim enquanto mantenho o olhar fixo no chão e remexo os pulsos apenas fazendo minha pele ficar irritada. Depois de quase um minuto, ele quebra o silêncio. 

"Sabe, não é nem um pouco educado evitar olhar para o seu anfitrião." Com receio, ergo a cabeça para encará-lo. A visão de seu rosto me surpreende. Meu "anfitrião" aparentava ter dezenove anos, cabelos loiros cor de areia, olhos azuis intensos e uma cicatriz no lado esquerdo de seu rosto, ele era...lindo.

"Espero que Katie tenha explicado a situação para você." Ele disse e me olhou esperando uma resposta.

"Não. Fui mordida e arranhada por umas coisas peludas e depois presa por uma cobra antes de poder perguntar qualquer coisa." Respondo sarcástica. Ele dá um meio sorriso.

"Creio que isso seja um não" Ele se inclina, coloca os pés encima da mesa e começa a limpar a sujeira embaixo das unhas com um canivete. Usava uma calça jeans simples, um tênis, uma camiseta laranja com um cavalo alado escrito Acampamento Meio-Sangue e uma espada embainhada presa no cinto. 

"Bem, você é uma meio-sangue, ou semideusa se preferir, o que significa que um de seus pais é um deus grego, normalmente o que não está presente e o fato de que meus monstros te encontraram ainda tão nova significa que é filha de um olimpiano poderoso. Teve sorte de esses monstros estarem do meu lado, ou não seriam tão gentis. Atualmente pretendo travar uma guerra contra os olimpianos ao lado de lorde Cronos. Bem esse é o resumo." Ele me olhou com uma certa expectativa. Tento sustentar o olhar dele, mas seus olhos azuis me deixavam desconfortável. Desvio o olhar e me deparo com um espelho ao meu lado esquerdo, cara...eu estava horrível. Meus longos cabelos castanho-escuros quase pretos estavam um ninho de ratos, embaraçados e cheios de nós, a pele morena estava toda marcada por hematomas, meus olhos verde-mar tinham perdido um pouco do brilho e os lábios carnosos estavam ressecados.

"Acho que está errado senhor...?" Começo.

"Luke Castellan, e por favor, não me chame de senhor, me faz sentir velho" ele responde.

"Enfim, acho que está errado Luke, não tem como eu ser um meio sei lá o que, acho que meu perfil não se encaixa nessa descrição. Você diz que um dos meus pais, o que não está presente é um deus grego, eis meu argumento: fui abandonada por eles quando nem me entendia por gente. Acho que não se importaram o suficiente para me dizer esse tipo de coisa.".  Luke me olha meio entediado como se já tivesse tido essa conversa milhares de vezes.

"Bom, ninguém aceita isso de primeira, mas com o tempo, você vai começar a perceber a verdade, e se Katie trouxe você é por que é uma semideusa. Seu parentesco não me interessa, preciso de soldados e você vai lutar do meu lado." Ele diz sério.

"E se eu não quiser? Pode me matar, vai me poupar de uma vida que eu desejaria muito não ter." Respondo.

Luke dá um meio sorriso. Ele abre uma gaveta e pega dois objetos. Uma pequena caixa de madeira e um globo de cristal do tamanho de uma manga. Depois, levanta da cadeira e dá a volta na mesa de forma que ficasse atrás de mim. Coloca a caixa de madeira na mesa e posiciona o globo na altura de meus olhos.

"Não vou te matar, mas tenho certeza de que você não gostaria de vê-los sendo mortos na sua frente." Diz. De início, a única coisa que vejo é o meu reflexo, mas então, uma imagem aparece no globo. Vejo minha avó na sala com meu avô, sentados um do lado do outro tomando café e assistindo à televisão. A temperatura na sala pareceu cair dez graus e sinto um calafrio. Começo a suar frio e a tremer.

"O que vai fazer com eles?" Pergunto trêmula.

"Se você fizer o que eu mando, vai ficar tudo normal como se nada tivesse acontecido." Ele responde. Engulo em seco e falo:

"O que quer que eu faça?" Sentia um bolo se formando na minha garganta.

"O acampamento ainda não sabe de você. Há um mensageiro deles na sua escola atual, ele vai se aproximar de você para ter certeza que é uma meio-sangue e depois vai te levar até lá, quando isso acontecer, você vai agir como se não soubesse que é uma semideusa e vai fingir que não me conhece. Eu estarei lá, mas por tempo indeterminado e se eu precisar sair você vai me manter informado de tudo o que está acontecendo lá, ou pode dar adeus a seus avós" ele explica.

"Certo, mas não toque neles." Digo. Uma lágrima rola pelo meu rosto. Todas as memórias dos bons momentos que passei com eles passam por minha cabeça, como quando vovô me ensinou a andar de bicicleta e a fazer meus próprios brinquedos, quando vovó me contava mitos gregos até eu dormir, me colocava em seu colo e lia livros para mim e quando ficávamos nós três, meus avós e eu sentados na varanda vendo o pôr do sol. Eles não mereciam acabar mortos por esse tal Luke e seus monstros e não queria que essas únicas boas lembranças acabassem.

"Ótimo, agora você vai voltar para casa e fingir que nada disso aconteceu"

"E como vou te informar se tenho que fingir que não te conheço?"

Ele coloca o globo na mesa e abre a caixinha de madeira. De dentro dela, tira um bracelete de prata com um pingente de foice e o coloca em meu braço. Sinto o bracelete gelar no meu pulso e um calafrio faz meu braço arrepiar.

"Quando precisar, esfregue o pingente e fale, vou ouvir claramente. E não tente nenhuma gracinha Maya, estamos te vigiando" ele diz. Nesse exato momento, a górgona entra na sala.

"Pode levá-la Katie, ela já sabe o que fazer" diz Luke enquanto voltava a seu assento. A górgona me agarra pelo braço e começa a me empurrar para fora, ainda atordoada pelo que acabara de acontecer e penso se minha vida poderia ficar pior. Pouco antes de sair da sala, ouço uma voz grossa e retumbante que parecia ter saído do caixão fez minha cabeça doer enquanto dizia: 

"Devia ter fugido ou se matado enquanto pôde criança, agora sofra sozinha" ouço um barulho agonizantes como se milhares de pessoas gritassem de dor a agonia ao mesmo tempo com um estrondo, a porta se fecha.

Acordo nesse momento, alguém me balançava desesperadamente gritando meu nome.

"MAYA! MAYA! ACORDA CRIATURA" era Rachel, minha colega de quarto na faculdade.

"O quê??... Ahn? O que foi? Onde é o incêndio?" Respondo ainda meio sonolenta.

"Nenhum incêndio hahahahaaha, meu Deus" Rachel cai sentada na minha cama rindo como uma hiena, os cabelos ruivos encaracolados amassados e os olhos inchados indicavam que ela tinha acabado de acordar. " você estava tendo um pesadelo, Hahahahaaha, estava gritando igual uma doida" explicou ela entre risos. Ela já estava chorando de tanto rir e apertava a barriga. Pego o travesseiro e jogo na cara dela.

"Ha ha engraçadinha." Digo. Sinto o suor frio na minha blusa mas tento disfarçar, minhas mãos ainda tremiam.

"E então, qual foi o pesadelo da vez?" Ela pergunta se recompondo da crise de risos e colocando o travesseiro de lado.

"Não lembro" minto, "deve ter sido o mesmo de sempre"

"Sua mãe?" Ela pergunta.

"Minha mãe." Respondo, mas lembrava claramente de cada detalhe sobre Luke e aquele encontro. Olho em volta, o quarto relativamente em ordem, havia alguns livros na escrivaninha, a estante do quarto lotada de livros sobre mitologia e arte intactos. Pela janela do quarto, vi que o céu ainda estava escuro.

"Ainda é de madrugada?" Pergunto indignada.

"Você começou a gritar no meio da noite, me acordou e eu preciso do meu sono de beleza para começar o ano letivo de bom humor" diz ela enquanto voltava para a cama dela.

"Desculpe senhorita Dare se desperdicei uma das suas treze horas de sono diário" digo fazendo uma mesura "suponho que não vai conseguir dormir depois disso, não é?"

"Tem como? Você deve ter acordado o prédio inteiro" diz ela sentada na cama esfregando os olhos e tentando arrumar o cabelo.

"O que acha de irmos ao shopping?" Pergunto e vou até o armário pegar uma calça jeans e uma blusa.

"Ás 4 da manhã?" 

"Shopping 24 horas, dã"

"De onde você tira tanto dinheiro garota?" Rachel pergunta já se levantando e andando pelo extenso apartamento procurando a carteira dela e depois voltando ao quarto para se vestir.

"Se eu te contasse que ele simplesmente aparece quando quero você acharia estranho?" Pergunto terminando de calçar os coturnos e o moletom cinza.

"Não mais estranho do que as coisas que eu já vi." Ela responde. Estava terminando de se vestir, pegou a bolsa e enfiou nela sua carteira e celular.

"Vai na frente, eu tranco tudo aqui." Digo enquanto procurava meu colar e o colocava no pescoço.

"Certo, não esqueça o celular" ela diz e sai do apartamento.

Pego a mochila na cômoda e o celular na gaveta. Antes de fechá-la olho para um pequeno objeto brilhante no fundo. As lembranças daquela época começam a voltar e, com a mão tremendo, pego o bracelete. O pingente em formato de foice permanecia intacto apesar de meus esforços para destruí-lo. "Já passei por muita coisa por sua causa" penso "por que você simplesmente não se desintegra?" E com raiva enfio aquela porcaria no bolso, tranco o apartamento e desço pelo elevador para encontrar Rachel.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Herdeira do Olimpo" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.