Nym-pho escrita por Ugly Duckling


Capítulo 3
Capítulo III - Thomas Fabian Ole


Notas iniciais do capítulo

Hiya.
Este capítulo tem uma conotação quase só informativa... gostei de o escrever, mas não é, de longe, dos meus favoritos. Ainda hoje postarei o próximo, que penso ser muito mais... sumarento C:
Muito obrigada a quem lê! E obrigada pelos comentários maravilhosos, Victoria Belikov♥
Boa leitura!



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Thomas Fabian Ole faleceu no dia vinte e um de novembro, tinha ele dezassete anos. Tinha uma constituição forte, fruto do trabalho árduo no campo, a pele torrada pelo sol e o cabelo baço cortado muito curto, de maneira a não atrapalhar nas suas tarefas.

Apesar de abençoado com a força física necessária para aquilo que fazia, Tom nunca deveu nada à beleza. O seu rosto era estranho, nem bonito nem feio, mas algo nunca parecia certo. Talvez fosse o nariz alto e os olhos afastados que pareciam fora de lugar. Ou as orelhas um bocadinho grandes demais. De qualquer modo, não era agradável de se olhar, mas completamente fácil de esquecer. A sua personalidade não era particularmente marcante. Era modesto e educado, mas poucos assuntos lhe interessavam para além da colheita e dos animais. Na aldeia tinham-no em boa consideração, conhecido como o filho trabalhador dos Ole que tratava sempre de ir vender produtos no mercado local.

 Os estudos não o incomodavam, mas não o cativavam da maneira que cativavam a sua irmã – eu. Os nossos pais sempre repartiram o amor muito bem pelos dois, apesar de o facto de que o orgulho e empenho em mim depositados ser muito maior ser perfeitamente evidente. Ele nunca se queixou. Já o que ele sentia por mim, não faço ideia. Para mim ele era apenas um irmão estranho, penso.

Não é com tristeza que relembro a morte de Tom, mas mais como uma espécie de ritual de passagem. Há os dias antes e os dias depois, cuja margem é delimitada pela sua morte e as semanas seguintes.

*

Eu estava em casa, fechada no quarto com um livro de histórias, quando ouvi a minha mãe a gritar. Não pedia por socorro, mas urrava como se estivesse em grande sofrimento, uma agonia palpável na sua voz. Apressei-me a correr até à parte de baixo da casa, onde rapidamente dei com a minha mãe ajoelhada no chão a chorar nos braços de um senhor da aldeia que ia lá ajudar por vezes.

— Não fiques assim… Provavelmente foi quase instantâneo – Dizia.

— Não, não! Levem-me ao meu filho! Tom! – Gritava ela.

— Acalma-te, Marine, acalma-te. Aposto que foi indolor.

Corri para a beira dela e perguntei o que se passava, a tremer com medo de toda a situação. Nunca antes vira a minha mãe tão descomposta.

— Francine – Chamou-me o senhor pelo nome que me conheciam na aldeia, colocando uma mão no meu ombro – É o Thomas. Ele… bem, foi tudo muito rápido, já veio uma ambulância e tudo, o teu pai está lá agora… o que aconteceu foi que o trator capotou. Pode ter sido uma simples distração, mas, ao saltar de lá de cima, aquilo acabou por lhe passar por cima… quer dizer, provavelmente foi assim que aconteceu, mas quem viu foi a mulher do Pentsgold e nessa altura ele já estava… sabes… morto. – A minha cara congelou com o choque, e eu fiquei para ali de boca aberta enquanto a minha mãe soluçava a meu lado. – Sinto muito.

Antes de eu ter tempo de dizer alguma coisa, os meus avós entraram e tudo ficou o caos, com os gritos e o choro, seguidos pelas pessoas da aldeia que já tinham ouvido a notícia e queriam dizer o quão tristes estavam pela perda, e como o Tom era tão bom rapaz, e como nenhuma família merecia tal tragédia, e quando é que era o funeral.

Não aguentei. Corri porta fora e os meus pés guiaram-me ao único refúgio que conhecia neste mundo: o lago. Passaram-se muitas horas até que alguém me encontrasse. Durante esse tempo permaneci sempre no mesmo sítio, na mesma posição, os olhos fixos no céu, abraçando os joelhos e tiritando de frio. O vento de fins de outono não era gentil na minha pele coberta somente por um vestido de malha e um fino casaco. A noite caía como em todos os outros dias.

— Sabia que estarias aqui, Leo.

Uma voz extremamente familiar soou muito perto. Leigh acocorava-se à minha frente, tal como da primeira vez que o vira, todo aquele tempo atrás. O seu rosto de adolescente enrugava-se de preocupação, e não pude deixar de o amar mais um bocadinho por ele se ter lembrado de ir ao lago procurar por mim sem levar ninguém consigo.

Desdobrei-me e procurei o seu abraço. Passei-lhe os braços pelo pescoço e envolvi-lhe os ombros e as costas com uma força que não sabia deter, afundando a cabeça no seu pescoço. Senti o seu cheiro e inspirei. Aquele ato teve reações imediatas em mim. Reações intensas. Desejei-o para lá da razão.

O abraço dele também era apertado, as palmas a amparar-me as costas, o tronco firmemente encostado a mim. Sabia agora que aquele rapaz era um homem, e, embora o seu objetivo fosse não a sedução, mas sim o reconforto perante a perda de um ente querido, não houve um único segundo daquele abraço em que Tom perturbasse os meus pensamentos.

Não sei quanto tempo ficámos assim, ajoelhados e agarrados. Só voltei à realidade quando Lysandre apareceu, arfando, obviamente apressado para chegar até nós. Sem necessidade de recorrer a palavras, ajoelhou-se à nossa beira e passou os braços pelos dois. Senti, pela enésima vez, que não éramos três, que éramos um.

E murmurei: - Obrigada.

*

O funeral de Tom, seis dias depois, um dia chuvoso e nublado, foi a primeira vez que o meu corpo viu água desde a sua morte. Em casa, o silêncio era rei. O meu pai tratou dos arranjos do funeral e do velório, já que a minha mãe se recusava a sair da cama ou a comer algo decente. Os meus avós viviam como mortos-vivos. Não foi só o meu aniversário que passou despercebido; a minha própria existência foi ignorada. Eu não os culpei. Imaginava que a dor de perder um filho fosse o suficiente para levar alguém à loucura.

Durante esses seis dias não me atrevi a sair de casa. Aliás, não saí do quarto. Comi apenas as bolachas que lá tinha escondidas e fazia visitas rápidas à casa de banho. Não tomei duche com medo de perturbar as pessoas com o som da água a correr.

No dia do funeral vi, pela primeira vez, toda a família Pentsgold reunida, e também vestida de negro. Leigh e Lysandre ficaram sempre perto de mim.

Depois de todas as cerimónias estarem completas, logo após chegarmos a casa, a minha avó teve um ataque cardíaco. Mais uma vez, o tumulto foi geral. A ambulância demorou demasiado, e ela morreu antes de chegar ao hospital. A tristeza abateu-se sobre mim como uma nuvem, e eu chorei para a libertar.

Assim, com a mãe e o filho mortos no espaço de uma semana, a minha mãe deixou de reagir e entregou-se à depressão. Chorava como uma torneira deixada aberta por esquecimento, tinha os olhos de um peixe morto e mal se conseguia manter de pé. O meu avô tentava manter-se robusto, determinado a suportar a tragédia, mas estava a fazer um péssimo trabalho. Era claro que ele queria chorar, era claro que ele não queria suportar estoicamente a perda da mulher e do neto. E, no entanto, lá tentava ele consolar a filha. Quanto ao meu pai, esse poucas vezes aparecia em casa. Quando finalmente chegava, limitava-se a resmungar e a atirar-se para a cama, a cara muito vermelha e o andar aos ziguezagues.

Este foi o início da passagem, o gatilho de todas as situações que levariam à verdadeira e maior mudança na minha vida.

Sem nada a perder, eu perdi o medo. Tomei banho e arranjei-me, fiz-me bonita outra vez. O meu irmão não era a minha vida; aliás, com ele morto, era como se nunca tivesse existido. Exceto que algo no meu corpo não concordava comigo, por certas coisas estranhas que ele me fizera e às quais eu me habituara e, mesmo sabendo-as completamente erradas, não podia deixar por preencher. Sentia falta do toque de alguém, de uma palavra de afeto. Com todos deixados para morrer na minha casa, tal como o negócio, ou assim me parecia, fiz-me à porta de saída.


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Notas finais do capítulo

Como sempre, agradeço sugestões, opiniões e críticas!
Estou extremamente feliz por estar a conseguir dar forma a esta história. Faltam talvez dois capítulos, mais ou menos, para chegarmos à segunda fase, em que muitos personagens serão introduzidos e uma nova dimensão abrir-se-á.
Espero que não tenha sido demasiado aborrecido... Perdão. Mas preciso deste setting todo para construir o que quero.
Phew!
Obrigada por lerem até aqui♥



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