Estigma escrita por CarlaC


Capítulo 2
Lost Boy


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem :*



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ANTES


Taehyung passou pelas vigas de madeira quebradas que ficavam na porta do prédio abandonado, naqueles momentos, ele agradecia por ter o corpo esguio. Quando estava no meio do corredor que dava para a porta principal ele riu baixinho lembrando a diferença de como estava da primeira vez que entrou ali. Naquele dia, ele queria ficar sozinho, não queria que ninguém fosse atrás dele, estava cansando demais de tanta informação que a cidade lhe dava, eram tantos sons, tanto barulho, tantas cores que o fazia ter enxaquecas que duravam dias. Ele estava tão mal que quase tinha sido atropelado por não ter visto o carro enquanto atravessava a rua. A sua cabeça estava muito cheia naquele dia, ele saiu andando pela cidade procurando algum lugar que pudesse ficar sozinho, verdadeiramente sozinho, e o único local que tinha pensado era o hotel abandonado considerado assombrado pelas pessoas, sabia que ninguém nunca entraria ali, as lendas de gritos e barulhos estranhos à noite afastava todas as pessoas do local. Sua respiração estava acelerada, seu coração parecia que iria sair pela boca, suas mãos suavam tanto que a cada minuto que passava, ele precisava passa-las pelas calças, mas de certo modo, aquele frio, aquele silêncio, lhe passavam uma certa tranquilidade. Em menos de cinco minutos no local, já sentia que sua mente se acalmava um pouco. Os primeiros dias foram os piores, ele tinha tanto medo de ver alguma coisa ou ouvir algo que as pessoas tanto diziam que ouviam.

Agora ele já não ficava mais nervoso, ainda ia para lá quando sua cabeça ficava cheia demais ou quando queria passar o tempo, mas não sentia mais àquela taquicardia, sua respiração não ficava acelerada, nada, apenas tranquilidade. Ainda tinha que esperar a rua ficar deserta para poder entrar, o que não era difícil, já que não era um lugar movimentado, e para ele, valia a pena o esforço. Fazia dois anos que ia, pelo menos, uma vez por semana para aquele lugar, e mesmo que passasse algumas noites lá, nunca escutou nenhum barulho. Ele agradecia mentalmente por isso, morria de medo de fantasma. Caminhou um pouco pelo lugar, já estava acostumado com o cheiro de mofo, o barulho das tábuas rangendo aos seus pés, as paredes descascadas, conhecia aquele lugar como conhecia a palma de sua mão, do lado esquerdo do prédio tinha a porta que ia dar direto na antiga cozinha e depois aos depósitos, não era o lugar favorito do Tae depois que tinha visto um rato passando por lá. Em frente, tinha uma escada de madeira que levava para os outros andares, mas Taehyung não gostava de usa-las, sempre parecia que iria cair a cada degrau que ele subia, pensara uma vez que os cupins faziam uma festa diferente a cada dia em cada um dos degraus. No lado direito, tinha seu lugar favorito, o quarto antigo que ele não sabia a quem pertencera, mas era o maior do local.

Nem pensou, andou direto para o lado direito do prédio, passando pelo velho piano que já não tocava mais nenhuma nota e foi direto para o seu lugar favorito. Tinha um grande espelho em uma das paredes, que já estava cheio de manchas escuras nele. Taehyung parou na sua frente e ficou olhando o reflexo, seu cabelo estava na altura dos ombros, sua expressão parecia cansada, ele respirou fundo e encostou a testa no espelho, não costumava se sentir tão fraco. Afastou-se do espelho e foi em direção a uma mesa que ficava do outro lado da sala, nela tinha várias garrafas de vidro, algumas inteiras e outras quebradas pela metade. Tae nunca tirou nada do lugar, nunca levou nada de lá, parecia que iria tirar certo tesouro do seu lugar, pegou uma tesoura que estava no meio dos cacos de vidro, ela parecia enferrujada, mas ele não se importou, precisava de algo para cortar. Voltou para frente do espelho e segurou uma mecha do cabelo, cortando-a. A mecha caiu no chão como uma pena, levemente e com delicadeza, e ele continuou cortando, não muito curto, só queria diminuir um pouco porque aquilo já estava começando a incomodar.
 
Se Taehyung não estivesse tão concentrado no que fazia, provavelmente, teria escutado as risadas dos meninos fora do prédio, já que aquilo definitivamente não era normal. Seis garotos andavam em um grupo, rindo e conversando bobagens, um  deles ia a frente, fazendo poses e caretas para que os outros rissem. Outro ficava mais afastado, mas era o que mais chamava atenção pelo cabelo colorido, ele tinha o andar despojado, e mesmo que risse com os outros, era o que mais se diferenciava deles. Os outros quatros andavam juntos, em duplas, cada um com o braço em cima do outro. Hoseok, o que estava mais a frente, parou de repente. Os meninos olharam confusos para ele e ele foi correndo para perto dos outros, sorrindo. O mais novo, Jungkook, que estava ao lado de Jimin, sabia que nada de bom viria daquilo.

— Tive uma ideia. – Hoseok disse e todos pararam. Até Yoongi, que estava mais afastado, voltou um pouco para escutar o que ele iria dizer.

— O que? – Namjoon perguntou, e o garoto ao seu lado, Jin, sorriu um pouco.

— O que acham no nosso caçula entrar no prédio mais assombrado da cidade? – Hoseok falou e fez um gesto apontando para o prédio como se tivesse feito uma mágica.

— Não! – Kook disse e deu dois passos para trás. Jimin, que estava ao seu lado, como estava com uma das mãos em suas costas, o empurrou para frente novamente. Ele não sabia de onde o Hoseok tinha tirado aquilo, mas não queria fazer aquilo de maneira nenhuma.

— Vamos lá, Kookie, a gente sempre defende você de tudo, você precisa se arriscar um pouco também, para... – Jimin começou dizendo e parou um pouco como se estivesse pensando no que queria dizer. – Crescer. – Jimin completou.

O mais novo ainda relutava e negava com a cabeça, desde pequeno escutava histórias sobre aquele local, antes tinha medo até de passar na frente dele, agora não tinha mais tanto medo, mesmo assim nunca imaginou ter que entrar ali. Ele olhou para o resto dos meninos para ver se alguém o apoiava, mas todos o olhavam com divertimento, até o Jin, que, sendo o mais velho, sempre cuidava dele.

Ele não queria parecer medroso, gostaria de não ter dado aqueles dois passos para trás que tinha dado antes, mas por que teria que ser ele? Só porque era o mais novo? Aquilo não era justo. Ele queria bater no Jimin por ainda segurar as suas costas o fazendo ir um pouco para frente com um maldito sorriso no rosto, queria bater no Hoseok por dar aquela ideia maldita. Queria bater em si mesmo por ter tanto medo de um prédio.

— Vá, Jungkook, nós vamos esperar você aqui. – Jin disse e Jungkook olhou para ele agradecido, mas ele não confiava no resto dos garotos.

O mais novo revirou os olhos e balançou a cabeça afirmando. Yoongi e Hoseok riram enquanto Jimin batia em suas costas. Ele viu que Jin e Namjoon sorriam para ele discretamente, se fosse para escolher dois que Jungkook mais confiava seria neles dois, o sorriso que Jimin ainda estava lhe dando não lhe fazia sentir mais seguro, apenas parecia que iria sair correndo no momento que entrasse. Ele se virou para frente do prédio e começou a andar, evitou ao máximo hesitar ou parar por um segundo. Escutava os meninos atrás de si fazendo apostas para saber se ele entraria ou não, mas não conseguia diferençar quem era que falava, e naquele momento, ele andou com mais confiança até as tiras de madeira da fachada do prédio. Não gostava que ninguém duvidasse dele, e quanto mais rápido ele fizesse isso, mais rápido acabaria.

Quando chegou perto o suficiente da madeira, viu que elas eram meio quebradas pelos cantos, o suficiente para conseguir afasta-las um pouco. Ele não sabia que alguém já tinha notado isso, mas imaginava que não, já que significaria que teria que entrar no local. Quando conseguiu passar a segunda perna pelo espaço entre as tiras, escutou passos rápidos na rua, no momento que se virou, viu os meninos correndo para longe do prédio.

— Óbvio. – Kook sussurrou baixinho. Ele pensou em sair dali, ir atrás dos meninos, gritar ou fazer qualquer coisa, mas não o fez. Ele já estava ali, os garotos já tinham duvidado dele e ele estava ali dentro, agora ele poderia terminar logo seu medo e ver que não tinha nada ali dentro.

Ele estava em uma espécie de entrada, não precisa de mais de dez passos para chegar a uma porta principal, que já estava aberta. Ele respirou fundo, mas seu coração começou a palpitar quando deu o primeiro passo e escutou o barulho de madeira, mas respirou fundo quando percebeu que era apenas o chão rangendo aos seus pés. Quando passou pela porta, o cheiro de mofo logo o invadiu. Ele coçou um pouco o nariz e piscou os olhos algumas vezes para se habitar a mudança na luminosidade. O local estava sujo, com as paredes desgastadas e na sua frente tinha uma escada que ele não se arriscou a utilizar. Andou um pouco para o lado e viu um piano de cauda no canto da sala, pensou que devia ser muito bonito limpo, se aproximou dele e apertou uma das teclas, mas não fez nenhum som. Jungkook ficou um pouco despontado, sempre achava lindas as notas que os pianos faziam.

O silêncio do local era grande, ele não estava acostumado com aquilo. Sempre vivia escutando música ou com as risadas dos meninos, então aquilo o fazia sentir um pouco desconfortável. Até que ele escutou um barulho bem fino de ferro, então ele paralisou, não sabia se tinha escutado direito, até que escutou de novo. Sua garganta se fechou um pouco, ele gostaria de correr naquele momento, não sabia se sua cabeça estava pregando peças em si mesmo, mas o que quer que fosse estava o deixando apavorado.

— Quem está aí? – Gritou, sabia que, se houvesse alguém ali, ele não seria respondido, o que pensariam? Que ele seria um louco por ter entrado ali por vontade própria, mesmo que não fosse. Ele também não sabia que se houvesse alguém ali, talvez fosse um louco.

Até que ele escutou os mesmos rangidos que tinha escutado quando entrou, tinha realmente alguém ali e estava andando para a sala. Jungkook não sabia por que, mas parecia mil vezes mais seguro ficar atrás daquele piano. Até que o som parou e ele esperou um pouco. Os segundos pareciam demorar muito mais agora. Até que um garoto colocou a cabeça na porta, procurando algo. O jeito como ele estava, fazia com que Jungkook pensasse que estava vendo uma criança verificando se não tinha um monstro dentro do armário e Kook teve vontade de sorrir. E quando o garoto viu o mais novo, franziu as sobrancelhas e saiu do cômodo.

— Quem é você? – o garoto perguntou a Jungkook, que agora respirava aliviado. O menino tinha uma voz grossa, mas aveludada, se é que poderia se falar isso de uma voz. Estava vestido todo de preto, assim como o mais novo, mas não parecia um fantasma. Seu cabelo parecia cortado em uma parte, mas que não tinha terminado ainda.

Kook imaginou se não parecia meio ridículo ficar atrás do piano como se fosse um cachorrinho assustado, então saiu de trás do mesmo e limpou a parte da frente da camisa que tinha ficado com um rastro de poeira que estava no instrumento.

— Meu nome é Jungkook. – O mais novo disse e o garoto se aproximou um pouco mais. Pela janela que tinha no cômodo, era possível ver os olhos castanhos escuro do menino, e o cabelo da mesma cor.

— O meu é Taehyung. – O garoto que agora tinha um nome disse e esticou a mão para o outro apertar. – Mas pode me chamar de V.

Jungkook olhou para a mão do garoto confuso, mas mesmo assim, apertou a mesma.

— Porque V? – Jungkook perguntou quando ambos abaixaram as mãos.

O Taehyung sorriu e voltou a andar para o quarto onde estava antes.

— De vitória. – V disse e Jungkook o seguiu até o quarto. Viu um colchão desgastado no chão, uma janela com tiras de madeira como as que tinham na parte da frente do prédio; uma mesa com garrafas de vidro e um grande espelho na parede do canto. Viu os fios de cabelo no chão e uma tesoura equilibrada perigosamente no canto da mesa junto com as garrafas. – Por que está aqui?

Jungkook voltou a sua atenção ao menino da sua frente que ia em direção a mesa pegar a tesoura.

— Meus amigos me... Desafiaram a entrar aqui.

V fez um som com a boca concordando e foi para frente do espelho tirar o resto dos fios longos que continuavam em seu cabelo.

— E mesmo assim você entrou? – V perguntou, mas não olhou para Jungkook para fazer a pergunta, parecia que os fios eram mais importantes.

— Sim.

— Então se eles desafiassem você para fazer qualquer coisa você faria? – Taehyung se virou para o mais novo e esperou uma resposta do menino.

Jungkook não gostou do tom da pergunta, ele, com certeza, não faria tudo que os meninos o desafiassem, ele só tinha entrado ali porque eles tinham duvidado dele, e ele odiava aquilo.

— Eu entrei aqui porque eu quis. Eles duvidaram que eu tivesse coragem e eu mostrei que estavam errados. – Jungkook disse e não sabia por que tinha se arrependido das palavras que tinha dito, não soavam como uma resposta bela, apenas como uma criança tentando justificar algo.

Taehyung balançou a cabeça afirmando, não como um tom de deboche, apenas como se entendesse o que queria dizer, e se virou para o espelho novamente. Jungkook respirou fundo e ficou olhando o garoto cortando o cabelo na sua frente.

— Por que você está aqui? – O mais novo perguntou e encostou-se à parede, ao lado da porta, não estava mais com medo, aquele garoto não parecia mais ameaçador.

— Gosto daqui. Ajuda-me a pensar. – V disse e jogou a tesoura no chão quando terminou o que queria.

Jungkook achou que o cabelo do V não tinha ficado tão ruim, se fosse ele, provavelmente teria vários fios maiores que outros em sua cabeça, caso tentasse fazer isso. O mais velho balançou os fios com os dedos e se virou para Jungkook.

— Pensar em que? – Jungkook perguntou e V parou um pouco fazendo bico, depois balançou os ombros e fez um gesto negativo com a cabeça. Jungkook não sabia por que ainda não tinha corrido para longe do prédio quando viu o mais velho, mas a aparência do garoto não lhe transmitia perigo, apenas tinha ficado curioso com ele.

— Em tudo. – Taehyung respondeu.

— Por que aqui? – O mais novo perguntou e Tae riu.

— Você é curioso. – V andou até o colchão e se sentou nele, balançando os pés. – O silêncio. – V sussurrou e apontou para cima com os olhos fechados.

Jungkook parou um pouco e percebeu o quão silencioso era o local, o suficiente para escutar tanto a sua respiração quando a do garoto que continuava com os olhos fechados.

Jungkook olhava confuso para o garoto, gostaria de dizer que parecia que tinha algo de errado com ele, mas não parecia, ele só parecia... Diferente. Ele ainda estava curioso em relação ao menino, gostaria de saber o que ele escondia. Alguém que ia para um prédio apenas para pensar poderia ter muitos segredos, mas não poderia descobri-los agora, ele tinha que ir embora. Ainda estava com raiva dos meninos por tê-lo deixado ali sozinho, estava com raiva até do Jin que disse que ficaria o esperando e ainda estava nervoso por está com alguém que não fazia ideia de quem era.

— Você também está pensando agora, não está? – V disse sorrindo e Jungkook olhou para ele curioso e sorriu um pouco.

— É. Eu acho que funciona. – O mais novo disse e limpou a parte de trás da sua roupa. – Eu vou indo. Ainda tenho que procurar os meninos.

V olhou para ele com uma expressão que Jungkook não conseguiu descrever o que significava, se levantou e andou um pouco pelo quarto.

— Não diga a ninguém que eu estava aqui, tudo bem? – Taehyung disse baixinho como se tivesse feito um pedido muito importante. – Por favor.

Jungkook sentiu certa pena do V naquele momento. Aquele lugar realmente parecia importante para ele, sentiu como se tivesse invadido uma casa que não era sua. Jungkook balançou a cabeça afirmando e V sorriu.

— Obrigado. – V disse e voltou a se sentar no colchão. – Volte aqui qualquer dia, é legal falar com alguém também.

Jungkook sorriu um pouco e balançou o cabelo com a mão.

— Tudo bem. – O mais novo disse e se virou para a porta do quarto. Estava um pouco mais feliz que não tinha incomodado o garoto, não queria estragar nada. Virou um pouco o rosto para olhar para o mais velho. – Você vai estar aqui amanhã?

V olhou para ele confuso e sorriu. Fazia tempo que alguém falava com ele, que alguém era legal com ele, pela primeira vez em muito tempo imaginou que poderia fazer um amigo.

— Sim. – V disse e Jungkook balançou a cabeça afirmando, voltando a andar até a porta que tinha passado alguns minutos antes. Ele olhava para o resto do prédio para ver se via alguma coisa sobrenatural ou algo que pudesse causar medo nas pessoas, mas não achou nada, a coisa mais aterrorizante que tinha ali era parte do corrimão da escada caído de um lado, balançando tão devagar que se olhasse rápido diria que estava imóvel.

— Não se preocupe. – Jungkook escutou a voz do garoto que estava no quarto. – Já fiquei aqui tempo suficiente para saber que não tem nada assustador.

Jungkook balançou a cabeça afirmando e agradeceu mentalmente, se dirigindo para a saída. Antes de sair, olhou para os lados pelas vigas para ver se não tinha ninguém na rua e passou por elas da mesma maneira que entrou, mas ao se apoiar em uma delas, uma pequena farda entrou em seu dedo, ele gemeu baixinho vendo o líquido rubro saindo do pequeno furo em seu polegar, e levou o dedo a boca tirando o pequeno pedaço de madeira com os dentes e o jogou fora.

Ele olhou novamente para o prédio e sorriu um pouco, sempre imaginara que era um lugar tão horrível por dentro como era por fora, mas estava surpreso, não acreditava que tinha tanto medo daquele lugar antes de ter entrado ali.


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Notas finais do capítulo

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