Coração de Soldado escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 5
Capítulo 05 – Libertação


Notas iniciais do capítulo

Oi, pessoal.
Eu queria muito ter postado esse capítulo antes, mas, infelizmente, por problemas de saúde isso não foi possível.

Quero agradecer a Vi Reed pela recomendação e dizer que amei muito, e que de forma alguma estava esperando por esse presente. Muito obrigada!




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Rosalie havia se distraído olhando-o se afastar, até ouvir Lizzie chamando por ela novamente.

— Vou servir o café em alguns minutos – avisou a Emmett. Em seguida, começando a subir as escadas depressa para ver o que a caçula precisava.

Encontrou Lizzie aos prantos, sentada na cama, agarrada a sua mantinha lilás. A menina começou a falar do pesadelo que tinha tido com o pai. Onde Emmett havia se transformado num monstro que tentava fazer mal a eles. E, então, Rosalie descobriu que ela havia também feito xixi na cama, um ano e meio após ter parado.

Rosalie ouviu com tristeza que Matthew também havia tido pesadelos envolvendo o pai. Ela se viu consolando aos dois mais uma vez, desde a partida do marido para o Iraque. Quando os dois já estavam bem mais tranquilos, lhes contou sobre a conversa que teve com o pai deles.

Os ajudou a se aprontar para irem à escola. E serviu o café na cozinha. Emmett preferiu tomar café sozinho no quarto, ainda não tinha coragem de olhar no rosto dos filhos depois do incidente na noite anterior envolvendo a mãe deles.

Logo depois de ter mandado as crianças pra escola no ônibus, Rosalie pegou o telefone e ligou para o consultório do psiquiatra agendando uma consulta para Emmett. Por se tratar de uma consulta para o genro de Carlisle, conseguiu um horário para as dez horas da manhã do dia seguinte.

Logo depois, fez uma maquiagem no pescoço de maneira que pudesse disfarçar as marcas escuras e pôs o lenço em volta. Não queria ninguém olhando, fazendo perguntas das quais não queria e nem saberia como responder. Então, finalmente, deu tchau para Emmett e entrou no carro a caminho da floricultura.

Voltou no horário do almoço. Ester estava lá, e tinha preparado o almoço para eles. Pouco depois, os três foram de carro até o Centro de Reabilitação em Seattle.

Esme ficou de receber as crianças quando elas retornassem da escola.

À noite, novamente em casa, Emmett evitou os filhos. Rosalie levou o jantar dele no quarto e ele acabou jantando sozinho mais uma vez. Ela voltou à cozinha e jantou com os filhos à mesa. Eles tinham feito perguntas e ela disse apenas que o pai deles não se sentia bem.

Quando Rosalie levou Lizzie para cama, a menina deixou claro que não tinha se esquecido do ocorrido na noite passada pedindo para dormir com ela. Matthew também não havia se esquecido, mas, diferente da irmã, preferiu dormir na própria cama.

No dia seguinte, depois de mandá-los para a escola, ela e Emmett entraram no carro e partiram para a primeira consulta com o psiquiatra.

O consultório ficava num bairro movimentado de Seattle, num prédio grande e antigo. Sempre mancando por causa da prótese temporária, Emmett caminhou o tempo todo ao lado de Rosalie. Enquanto estavam no elevador, ela desejou como nunca que ele segurasse sua mão. Que lhe desse um beijo. Mas ele mal olhou para ela. Estava nervoso, podia notar pela forma como mexia os dedos das mãos.

— Que bom vê-lo, soldado – o médico falou quando Emmett entrava no consultório.

— Não sou mais essa pessoa – ele respondeu, com certa amargura, passando para o lado de dentro com passadas mancas. Apesar da calça e dos sapatos muitos ainda percebiam, pelo jeito de andar, que era um amputado.

— Um soldado nunca deixa de ser soldado – O doutor Jones lembrou.

— As pessoas me olham, veem minha perda amputada e já pensam que esse é o meu maior problema. Quando, na verdade, vai muito além disso.

— É claro. E nos vamos discutir cada um deles.

— Vamos levar muito tempo nisso? Não sei se estou pronto...

— Aqui é você quem manda; eu sou o soldado raso. Apenas obedeço – acrescentou, fechando a porta atrás das costas de Emmett, que deu uma breve olhada na esposa sentada na sala de espera.

[...]

Alguns dias depois...

No decorrer dos dias, com psicoterapia e o uso adequado de psicofármacos, Emmett começou demonstrar os primeiros sinais de melhora. Estava gradualmente retomando a normalidade de vida.

O homem que fora antes estava sendo reconstruindo.

O álcool tinha desaparecido de vez de sua vida.

Coisas relacionadas à profissão ainda o incomodava. Detestava pensar que nunca mais fosse voltar a pilotar. A família inteira evitava esse assunto durante reuniões; almoços e jantares.

Após várias noites sem ir até o quarto do pai, Lizzie finalmente tomou coragem de voltar lá. A porta estava aberta, ela então deu uma olhadinha para o lado de dentro, meio que se escondendo atrás do batente, imaginando se ele seria malvado outra vez.

Encontrou-o na cama, recostado aos travesseiros junto à cabeceira, lendo um livro.

Ao sentir que era observado, Emmett parou com a leitura, mas sem afastar o livro do rosto. Levantou as vistas devagar, deparando com o rostinho de Lizzie e suas mãozinhas gordas apoiadas ao batente.

O coração amando novamente aquela criança como no dia em que ela nasceu.

— Toc-toc – ele fez com a boca, enquanto olhava pra ela sobre o livro. – Quem está aí?

A menina sorriu, recordando-se das muitas vezes que ele fez isso antes de partir para o Iraque em missão.

— Lizzie – ela respondeu em voz baixa, ainda desconfiada.

— Lizzie-bonequinha – ele acrescentou. – A garotinha do papai?

Então, Lizzie tomou coragem e apareceu de corpo todo no umbral da porta. Vestia pijama vermelho com chinelinhos de dormir. E carregava sua mantinha lilás pendurada no ombro.

Emmett abaixou o livro até deixá-lo em cima da cama, ao lado da perna residual. Então, muito lentamente, abriu os braços num convite.

— Abraço de urso, Lizzie-bonequinha!

A menina abriu um sorriso largo, de dentes pequenos. Sem pensar duas vezes, correu para junto dele. Hesitando apenas ao lado da cama, olhando o espaço vazio no colchão onde deveria estar à perna esquerda do pai.

— Bonequinha? – Emmett chamou. Seus braços ainda abertos, esperando por ela.

Lizzie subiu na cama, atirando-se nos braços dele. Emmett a abraçou apertado, sentindo seu cheirinho de menina e shampoo infantil. Depois de tanto tempo tinha, finalmente, a filha nos braços outra vez. Isso lhe trouxe inúmeras lembranças. Sentiu que finalmente estava voltando para casa.

O coração batendo juntinho ao dela. Reconhecendo um ao outro. Lizzie chorou, apertando os bracinhos em volta do pescoço dele.

— Eu te amo, Lizzie-bonequinha – ele declarou emocionado.

— Meu papai – a menina murmurou ao ombro dele entre um soluço e outro. – Meu papai voltou. Meu papai voltou.

— Me perdoe anjinho, eu nunca quis te magoar. Eu nunca quis isso. Nem a seu irmão e a sua mãe. Vocês três são o que de mais valioso tenho na vida.

Lizzie se afastou do pescoço dele. Esticando o braço, encostou a mão gordinha na perna residual.

— Eu não ligo que você perdeu sua perninha. Você ainda é o meu papai.

— Sim – Emmett finalmente sorriu após muito tempo. – Eu sou o seu papai. Com um defeitozinho ou outro, mas, ainda assim, o seu papai. Vou me esforçar para ser o papai que você conhece. Eu juro.

— Você tem uma perna que põe e tira.

— Você acha que tudo bem o papai ter uma perna assim?

— Ahã. É uma perna especial. Você pode ser um super-herói. É muito mais legal ter um papai assim.

Emocionado, Emmett voltou a abraçá-la. E beijou no alto da cabeça dela. Lizzie gargalhou. O irmão, que assistia tevê na sala, ouviu sua gargalhada. Desconfiado, levantou do sofá e saiu guiado pelo som. Parando ao perceber que vinha do quarto do pai. Pela porta aberta avistou aos dois, rindo, abraçados.

O coração de Matthew bateu tão depressa que ele mal conseguiu respirar. Algo dentro dele estava despertando, e o nome disso era esperança renovada. Apesar de sentir um pouco de ciúmes por nãos ser ele a rir com o pai.

— Lizzie? – ele chamou. Queria ter dito papai, mas lhe faltou coragem. A irmã virou o rosto para olhar pra ele, os olhinhos azuis, cintilando em alegria.

— O papai voltou, Matthew! – disse. E então ficou de pé no colchão, saltitando. Sem querer bateu na perna residual.

O irmão se desesperou. – Para Lizzie! – E para surpresa de Matthew, o pai não se queixou ou mesmo fez cara feia. O menino pareceu confuso.

— O papai voltou você não ouviu? – a menina repetiu.

Meio desconfiado, Matthew arriscou. – Papai...?

— Oi, rapazinho – Emmett abriu os braços.

O garoto caminhou desconfiado para junto da cama.

— Vem cá, rapazinho. Não tenha medo.

E então Matthew se deixou abraçar pelo pai.

— Eu sinto muito filho... – Emmett lamentou, recordando o quanto o havia magoado. – Estou me esforçando para ser o mesmo de antes. Eu realmente sinto muito por ter magoado você. Eu te amo, Matthew. Eu amo muito vocês dois.

Matthew agora estava chorando nos braços dele.

— Acha que pode me perdoar um dia, filho?

O menino balançou a cabeça, enxergando a figura do pai através de lágrimas.

— Você também tem de me perdoar, papai. Eu tenho sido malcriado desde que você voltou.

— Está tudo bem, filho – Emmett bagunçou os cabelos dele com a mão, e novamente o puxou para um abraço. Dessa vez, porém, Lizzie estava junto.

E foi naquele momento que Rosalie apareceu na porta do quarto. A consciência do que estava acontecendo a emocionou. Secou as lágrimas que escorregaram por seu rosto e em seguida retornou à sala, deixando que pai e filhos se entendessem. Que voltassem a sentir o amor um do outro.

Sentada no sofá, com um dos brinquedos de Matthew na mão, ouvia o entusiasmo e a felicidade das crianças em poder contar para o pai tudo o que tinham feito na ausência dele. Emmett ouvia a tudo com devida atenção e ao final sempre fazia perguntas.

Os três juntos conversaram até tarde da noite. Mesmo sabendo que tinha de acordá-los cedo para irem à escola no dia seguinte, Rosalie deixou que ficassem com o pai pelo tempo que quisessem.

Somente quando o silêncio se instalou, voltou lá e os encontrou dormindo. Cada um de um lado do pai, amparados pelos braços dele. Sentindo o calor e a proteção que a muito não sentiam.

Rosalie entrou no quarto e, com muito cuidado, puxou a coberta para cobri-los. Beijou no rosto de cada um. E antes de sair, apagou a luz. Voltou pela sala de estar e subiu as escadas. Sentia que finalmente estavam prontos para recomeçar.

Na manhã do dia seguinte, quando as crianças foram para a escola, felizes como não as via há bastante tempo, Rosalie se sentou ao lado de Emmett no sofá da sala e lhe entregou o saco plástico com os pertences pessoais dele.

— Eles entregaram para você? – murmurou, recebendo o pacote. Enxergando através do plástico transparente suas medalhas e insígnias, a aliança e o camafeu prateado com a fotografia da família que ela tirara do pescoço para ele levar para o Iraque.

Emmett abiu o pacote e retirou a aliança para pôr de volta no dedo.

— Ainda posso ficar? – pediu a ela.

— Só se prometer que é para sempre.

— Para sempre – repetiu ele. E então levou uma mão à nuca dela, e, com a outra lhe acariciou o rosto. Beijou-a no canto dos lábios com leveza e cuidado. – Para sempre – tornou a dizer. Voltou à atenção ao pacote. Retirando dessa vez o camafeu. – Ele está com um aranhado – explicou, olhando o objeto prateado na palma da mão. Separou as duas metades, reconhecendo a fotografia deles dois com os filhos. A mesma fotografia que olhou todas as noites antes de dormir enquanto esteve longe de casa.

Abriu o fecho da corrente e passou em volta do pescoço de Rosalie. Ela levantou os cabelos enquanto ele fechava. Finalmente ela segurou no camafeu, olhando a foto deles juntos, recordando bons momentos.

— Senti sua falta – contou-lhe.

Emmett deixou que a mão deslizasse pelo pescoço dela alcançando o maxilar onde roçou sua barba, despertando nela a sensação de reconhecimento e saudade, selando, finalmente, seus lábios com um beijo. Um beijo cheio de saudades e promessas.

Rosalie agarrou-se a ele. Despertando. Finalmente saindo do casulo de solidão que se tornara sua vida nos últimos meses. Trazendo de volta a ambos a maravilhosa sensação de estar vivo. Ela o queria. Queria o amor de volta, mesmo o amor imprevisível e perigoso.

Ele a queria com a mesma intensidade.  Mesmo com o corpo ferido. Mesmo depois de tê-la afastado. Se perdido num mundo estranho de dor e medo. Ele queria Rosalie como nunca desejou outra mulher em toda vida.

Ainda enquanto tentavam se recuperar do beijo, Rosalie ficou de pé ao lado do sofá, segurando na mão dele.

— Me faça sua mais uma vez... – deixou escapar num murmúrio. Enxergando nele exatamente o que buscava: Ele a queria tão forte e desesperadamente quanto ela o queria.

Emmett levantou-se com a mão na dela. Os olhos em momento algum quebrando o contato visual. E então caminhou ao lado dela até o quarto e fechou a porta. Diante da cama, segurou o rosto dela entre as mãos. Seus corpos tão pertos. Tão quente. Tão cheio de saudades. Queimando em brava por um desejo guardado há tanto tempo.

Memórias do que foram juntos um dia, se acendendo. O desejo os guiando.

Eles voltaram a fazer amor, finalmente. Foi lento, demorado, diferente de tudo o que já experimentaram juntos. Não pela perna que faltava a ele. Mas pelo reencontro, pelo redescobrimento. Amaram-se sem pressa alguma. E adormeceram nos braços um do outro, extasiados.

Quando acordaram, era por volta do meio-dia. Não resistiram à força do desejo, da saudade, e voltaram a fazer amor. Só saíram da cama quando já estava perto do horário de as crianças chegarem da escola.

Pela primeira vez desde que Emmett voltou, Rosalie pôde ajudá-lo com o banho. Quando já estavam prontos, foram juntos esperar pelas crianças do lado de fora.

Emmett quis que fosse como antes. Quando acontecia de estarem em casa no horário de eles chegarem e então saiam para recebê-los.

Por isso, quando ouviram o barulho do motor do ônibus se aproximando, sentiu-se ansioso. Estava finalmente em casa. A vida estava retomando seu curso. No entanto, restava ainda uma pitada de medo. Medo de que algo desse errado no meio do caminho.

Quando o ônibus amarelo entrou no campo de visão deles, Rosalie apertou na mão de Emmett com a sua. E ele lhe sussurrou:

— Eles estão chegando.

Rosalie olhou no rosto dele, sorrindo de maneira resplandecente.

O ônibus escolar parou a poucos metros da casa. As crianças se puseram de pé no interior do veículo amarelo, com as mochilas nas costas.

— Fazia tanto tempo – Emmett falou consigo mesmo.

— Eles vão ficar tão felizes – Rose lhe disse.

Naquele momento, a porta do ônibus se abriu com um barulho forte. As crianças saltaram. Matthew sempre ajudando a irmã menor.

Lizzie foi quem os avistou primeiro.

— Olha lá! – gesticulou para que o irmão olhasse. – O papai está esperando pela gente ao lado da mamãe.

Matthew olhou para onde a irmã pedia. Ao avistá-los de mãos dadas, com rostos sorridentes, sorriu também.

— Vamos Lizzie! – se precipitou, segurando na mão da irmã menor. Na outra mão, Lizzie segurava a lancheira. No instante seguinte, os dois corriam ao encontro dos pais, que aguardavam por eles em frente a casa.

Lizzie soltou da mão do irmão e disparou pela entrada de veículos. O irmão logo atrás. Os dois chegaram praticamente juntos onde Rosalie e Emmett estavam. O impacto da correria das crianças, na hora do abraço, fez Emmett cambalear um pouco para trás. Ele aprumou a prótese no chão conseguindo manter o equilíbrio.

As crianças se afastaram, olhando-o com um misto de apreensão e medo. Esperando por uma reação mal-humorada. Em vez disso, Emmett abriu os braços.

— Abraço de urso! – convidou a todos.

As crianças voltaram a abraçá-lo, sorridentes. Emmett pegou a caçula no colo e Rosalie tirou a mochila das costas dela. Tirou também a de Matthew.

— Como foi na escola hoje? – Emmett pediu. Num instante, Matthew e Lizzie dispararam a falar sobre o dia que tiveram. Ele pôs Lizzie de volta no chão e segurou em sua mão pequena.

Logo os quatro passavam pela porta, conversando e dando risadas.

Nem Rosalie, nem as crianças se importavam de ele mancar enquanto caminhava. O mais importante era tê-lo de volta, e isso eles haviam conseguido.

[...]

Na última semana da primavera, Rosalie o levou ao Centro de Reabilitação para buscar a nova prótese.

Durante todo o trajeto, Emmett observou pela janela do carona a fina garoa que caia no para-brisa.

Griffin os aguardava na recepção.

— Veja só você. Parece bem mais motivado agora. Nem consigo acreditar que consegue andar tão bem com esse troço horrível.

— Não foi o que disse quando me obrigou usá-la pela primeira vez.

— Eu não podia dizer a verdade. Vamos! – indicou o corredor fazendo um gesto com a mão. – Você precisa ver sua nova prótese, ela é toda moderna. Uma belezura.

Os três seguiram juntos pelo corredor até o setor de próteses.

Logo que a porta foi aberta, Emmett reconheceu o cheiro de plástico. Viu braços, pernas, mãos e pés artificiais que pendiam em paredes em volta deles.

Griffin deus alguns passos à frente e chamou pelo rapaz que cuidava do setor.

— Emmett McCarty está aqui. E, pode apostar, ansioso demais para ver essa nova belezinha.

O homem jovem, com óculos de grau, apareceu no campo de visão, trazendo consigo uma nova perna mecânica.

Emmett ficou impressionado. Em nada se parecia com a que estava usando agora. Era torneada, quase bonita. Com aquele pé, podia usar qualquer tipo de sapato.

Griffin recebeu a peça nova da mão do colega e, em seguida, se ajoelhou na frente de Emmett. Retirou sua prótese temporária e a deixou encostada a uma cadeira. Como havia mencionado antes, o coto encolhera bastante nos últimos meses. Por isso precisava cada vez mais de meias de gel para manter o encaixe da prótese bem justo.

As meias foram retiradas até que restou apenas uma. Essa foi cuidadosamente esticada para que ficasse bem lisa. Por fim, encaixou a prótese nova.

— Caramba! – exclamou Emmett, olhando sua nova perna com um tipo novo de alegria. Em nada se parecia com a anterior.

Ele deu dois passos à frente, impressionado com a leveza e a facilidade de movimentos.

— Caramba – voltou a dizer. – É quase como ter minha perna de volta. – Ele olhou pra Rosalie. Os olhos cintilando de alegria. – Eu seria capaz até de dançar agora. – Novamente olhou para Griffin. – Posso correr e jogar bola com meu garoto?

— Vamos com calma, ok. Não se apresse. Cada coisa no seu tempo.

O som da gargalhada de Emmett surpreendeu a todos.

Quando saiu do setor de próteses parecia uma criança, falante e agitada. As covinhas sempre no rosto, escancarando sua felicidade.

Por uma hora inteira ele esteve na sala de fisioterapia trabalhando duro na reabilitação. Por mais de uma vez arrancou risos da esposa e também de Griffin. Sentia-se renovado. Cheio de energia. Saltitou como uma criança. Talvez alguns dos outros pacientes tenham pensado que se tratava de um maluco, mas ele não se importou nenhum pouco com isso.

Ao fim da sessão, Griffin se despediu.

— Foi um prazer conhecer você recruta.

Emmett suspirou. Sentindo gratidão. Caminhou até ele quase sem mancar e sem sentir dor no coto.

— Obrigado. Sem sua ajuda eu não teria conseguido.

— Sempre foi você, recruta. O mérito é todo seu.

Emmett recebeu um breve abraço.

— Aproveite a vida. Não desperdice essa nova chance. Saia por aí e seja feliz. Viva a vida, Emmett. Viva a vida.

— Não sou mais o mesmo.

— A vida muda a todos nós.

Rosalie também se despediu de Griffin. Ambos acenaram para ele quando passavam pela porta.

Durante todo o trajeto de volta, Emmett não conseguiu deixar de olhar para sua nova perna. Ficava levantando a barra da calça toda hora. Era quase impossível não sorrir. Por mais de duas vezes, Rosalie segurou na mão dele e sorriu.

Quando chegaram em casa, subiu na entrada de veículos com o carro e estacionou.

No interior da casa, as crianças aguardavam por eles na companhia dos avós maternos.

Rosalie abriu a porta. Lizzie e Matthew imediatamente se levantaram do tapete onde jogavam um jogo de tabuleiro com o avô. Correndo para juntos deles, sendo recebidos com beijos e abraços.

Emmett estava tão empolgado com sua nova perna que, ao se juntar com os filhos, Rosalie teve a impressão de ter mais uma criança em casa. Ele se mostrando e falando sem parar no quanto àquela prótese era melhor que a outra. As crianças estavam adorando saber de tudo.

Esme vinha da cozinha com um pano de prato na mão. Ela e Rosalie começaram a falar sobre o jantar e, sem que se dessem conta, estavam entrando na cozinha. Trabalharam juntas no jantar daquela noite, ouvindo o tempo todo as vozes de Emmett, Carlisle e das crianças. E todos eles pareciam felizes.

[...]

Uma semana depois...

A família inteira se encontrava reunida no jardim dos fundos, aguardando o almoço. Num sábado ensolarado de verão. O sol brilhava apesar do clima chuvoso da cidade.

Matthew havia desistido do acampamento de verão para ficar com o pai, que tinha adorado a ideia. Tinham ficado muito tempo longe um do outro, agora era tempo de estar junto. De fortalecer os laços.

Dorian, Carlisle, Jasper e Edward jogavam cartas. O barulho entre eles era constante.

Esme e Ester cuidavam do almoço na cozinha.

Rosalie, Isabella e Alice jogavam conversa fora. A verdade era que Rosalie estava mais interessada em olhar o marido batendo bola com os filhos ao lado de um rododendro gigante.

Matthew tinha voltado a ser o garoto amável e apaixonado pelo pai. Lizzie dificilmente chorava agora. Emmett tinha redescoberto a vontade de viver. Era novamente o pai e marido amoroso. Apaixonado pela esposa e pelos filhos.

De onde estava sentada, ouviu a risada dos três soando como sua canção favorita. Reconhecendo que todo seu mundo estava ali. Levantou-se e caminhou sobre a grama verde recém-cortada ao encontro deles.

— Vem jogar bola com a gente, mamãe – Matthew a convidou.

E então Emmett estendeu o braço, oferecendo a mão a ela. O sorriso trazendo as covinhas a brincarem em seu rosto. Ele havia se adaptado muito bem a prótese nova. Brincava com os filhos e até conseguia subir escadas.

Rosalie estendeu a mão alcançando a dele. Seus dedos se entrelaçaram com reconhecimento.

— É tão bom estarmos assim – gesticulou com a mão livre, mostrando em volta, a família na varanda jogando cartas –, em família. Isso não tem preço.

Emmett beijou na testa dela gentilmente, demorando mais que de costume.

— Estou adorando estar com minha família – disse ele, por fim.

Matthew chutou a bola pra Rosalie. Ela a segurou no pé. Ouviram Ester gritando da varanda que o almoço estava pronto. Lizzie ergueu a mão gordinha, oferecendo a mãe. Suas bochechas estavam vermelhas e o nariz pequenino, com gotinhas de suor.

— Vamos tomar um refresco – Rose sugeriu a menina, balançando suas mãos unidas.

Enquanto Emmett, Rosalie e Lizzie caminhavam de mãos dadas a caminho da varanda onde estava o restante da família, Matthew recolheu sua bola e saiu correndo na frente deles.

Emmett avisou.

— Espere só até eu ter minha mais nova prótese. Eles a chamam de lâmina. E já me disseram que com ela poderei correr feito o vento.

Matthew parou a um passo da varanda, com a bola nas mãos, olhando para trás.

— Quando eles irão entregar ela para você, papai? – perguntou.

— Em breve.

Então o menino olhou a família atrás dele.

— Sabiam que o capitão Thompson disse que com essa prótese toda moderna que o papai está usando é possível estar no comando de um helicóptero novamente? Não um tão grande quanto o Black Hawk, mas, ainda assim, um helicóptero.

Houve um burburinho entre os familiares na varanda.

— Não é nada certo ainda. Por enquanto é só uma ideia.

As palavras de entusiasmo vieram como ondas uma após a outra. Emmett olhou no rosto de cada um deles, pensando no quanto era bom tê-los ali. E, o mais importante, ter a chance de recomeçar.

Acordar todas as manhãs ao lado da mulher amada. Descer para o café e ser saudado pelo sorriso das crianças. Quantos dos seus colegas não tiveram a mesma sorte.

Rosalie o pegou olhando pra ela e lhe piscou um olho em resposta.

Emmett sabia que nem toda ajuda psiquiatra do mundo o teria resgatado de si mesmo, não fosse a maior força de todas; o amor por aquela mulher e aos dois filhos.

 

Fim

 


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Notas finais do capítulo

Obrigada a todos que tiveram a paciência de ler até aqui. Obrigada àqueles que tiraram um tempinho para me deixar um comentário.
Sei que muitos de vocês sentiram raiva de Emmett. Mas em momento algum ele foi ruim por decisão própria, ele estava doente e precisava de ajuda.
Independente de Emmett ter sido assim, digamos meio complicado, eu me realizei escrevendo essa pequena história. Sou dramática por natureza. Adoro trabalhar sentimentos e estudar a mente humana.
Novamente obrigada pela atenção de vocês.
Um beijo grande