De repente, você escrita por calivillas


Capítulo 9
Temor




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Os sinais visíveis do temporal tinham ficado marcados no condomínio e na areia da praia, com os galhos arrancados pelo vento, muitas folhas espalhadas pelo chão e sobre os carros, grandes poças d’água nas ruas e calçadas, mostravam que haveria muito trabalho para fazer no dia seguinte. Da chuva, restavam apenas alguns pingos, que insistiam ainda em cair, sobre Charles e Joana que caminhavam juntos na direção de casa. Charles se divertia chutando pedaços de galhos pelo caminho, contando algo sobre o time de futebol por qual torcia, enquanto Joana se esforçava para entender, mas para agradá-lo do que por interesse genuíno, assim chegaram na frente da porta da casa dela.

— Chegamos – Joana disse, de modo tristonho, pela despedida iminente. – Você quer entrar?

— Não. Acho que não é uma boa hora – respondeu Charles, segurando a sua mão, depois um abraço e beijos e mais beijos, em uma despedida que parecia não ter fim, foi quando a porta se abriu, abruptamente, e Maria apareceu

— Eu sabia que tinha ouvido alguma coisa aqui fora! – Maria exclamou, surpreendendo o casal, que se separou em um pulo – Eles estão aqui! – gritou para dentro da casa. – Joana e o namorado!

— Eu já estou indo! – Charles tentou escapar, sem graça, dando um leve beijo nos lábios de Joana, com o rosto rosada pela vergonha, mas antes que ele conseguisse dar meia-volta e ir embora, Lilian apareceu na porta, sorridente.

— Ah! Você deve ser Charles? – Lilian cantarolou, feliz, em satisfazer sua curiosidade. – Sou Lilian, madrasta de Joana. Gostaria de jantar conosco? Já estávamos à mesa.

— Não, muito obrigado, eu tenho que ir – o rapaz respondeu, sem jeito.

— Por quê? – Lídia quis saber, metendo a cabeça entre a mãe e a irmã.

— Porque sim, Lídia – Joana quis defender o namorado.

— Porque sim, não é resposta – replicou Lídia.

— Podemos jantar agora? – Rodrigo apareceu atrás da mulher e das filhas.

— Charles, esses são o meu pai, Rodrigo, e minhas irmãs Lídia e Maria – Joana os apresentou.

— Eu estou convidando Charles para jantar conosco – esclareceu Lilian para Rodrigo, um tanto irritado pelo atraso do jantar.

— Então, rapaz, vamos logo, pois eu estou faminto – Rodrigo disse, sem rodeio, virou-se para sala.

Joana e Charles trocaram olhares de pesar, ela deu de ombros e ele reconheceu que não tinha saída.

— Eu fico para o jantar – Charles afirmou com um sorriso vencido, entrando na casa.

— Desculpe – Joana sussurrou para ele.

— Não tem problema – ele devolveu para ela.

A família se reuniu em torno da mesa, Lilian não perdeu tempo e bombardeou Charles com um monte de perguntas sobre a família dele, planos de futuro, por quanto tempo pretendiam ficar. Joana e Elisa, envergonhadas, tentavam desviar, a todo momento, a conversa para o primo recém-chegado, mas quando esse começava a responder alguma pergunta, Lilian se voltava para o pobre Charles, que respondia tudo, educadamente.

— A casa onde vocês estão é muito grande – Lídia se intrometeu. — Você poderia dar uma festa nela.

— Uma festa? Eu não tinha pensado nisso – respondeu Charles, pego de surpresa.

— Lídia, por que ele tem que dar uma festa na casa dele? – Elisa interveio, sem disfarçar sua irritação.

— Por que não? A casa é grande, ele tem dinheiro. Por que ele não pode dar uma festa? – Lídia replicou, dando de ombros.

— Lídia! – Joana exclamou, atônita pela indiscrição da irmã.

— Não, Joana! Por que eu não poderia dar uma festa? Acho uma boa ideia! – Charles respondeu, sorrindo com simpatia.

— Viu, sua boba – Lídia respondeu, sentindo-se vitoriosa, dando a língua para a irmã mais velha.

— Lídia! Olha os modos! – Lilian lhe chamou a atenção.

— E quando será essa festa? – Maria quis saber, animada com a ideia.

— Bem, tenho que falar, primeiro com as minhas irmãs, para decidirmos a data.

— Mas não demore muito! – Lídia ordenou, petulante.

— Lídia, por favor! Agora, chega! – Finalmente, o pai falou sério.

— Desculpa! – pediu Joana.

— Não tem problema. Acho que todos gostariam de uma festa – Charles declarou.

— Até Dani? – A pergunta escapou da boca de Elisa, sem saber porque pensou nele naquele momento.

— Dani não é uma pessoa muito sociável, mas, no fundo, é um cara bem legal quando se conhece ele melhor.

Elisa pensou até tão fundo se precisaria ir para encontrar aquele cara legal, apesar de ele tê-la salvo na praia hoje, pela manhã, deveria estar lhe grata por isso. Porém, havia algo em Dani, que a incomodava muito, o que não conseguia saber, talvez fosse aquele seu ar de arrogância, como se sentisse melhor que o resto do mundo, mas o que notava era que toda vez que estava perto dele, sentia-se estranhamente diferente, era alguma coisa que não conseguia compreender, nunca ninguém a perturbou tanto assim como aquele cara.

 

Dani olhava através da janela do seu quarto, a ressaca, o mar revolto pela tempestade, as ondas quebrando com força na areia, o céu pesado e cinzento, às vezes, pensava que sua alma era assim, revolta, urgindo dentro dele, mas explodindo com força no limite do mundo exterior, muitas vezes respingando naqueles que não tinham nenhuma culpa disso. Sentia-se desse modo há muito tempo, pois desde a morte inesperada e prematura do pai e o comportamento inconsequente da mãe, deve que adotar esta postura, a máscara de cara sério e maduro que passou a usar, adulto e responsável demais para sua idade. Contudo, por causa da irmã mais nova, ele precisava ser forte, pois Laura era apenas uma criança, na época do desastre que tirou a vida do seu pai, incapaz de entender e assimilar todas aquelas mudanças das suas vidas. E o fato de ter precisado crescer tão urgentemente rápido, o fez ficar muito exigente com o resto do mundo, principalmente, com as pessoas que o cercava, exigindo dos outros o que exigia de si próprio. Assim, quando gostava de alguém era porque a essa pessoa fazia por merecer isso, como seu amigo Charles, que se tornou quase como um irmão para ele. Então, por essa amizade, Dani até aturava suas irmãs fúteis, cujo único atrativo era a beleza, porém eram mimadas e frívolas. Contudo, havia aquela garota, Elisa, com o seu olhar tão intenso e caloroso, que o queimava por dentro, apesar de não a achar bonita como a irmã, na primeira vez que a viu, ela possuía algo que o atraía, fazendo-o querer estar sempre junto a ela. Elisa possuía algo que o incomodava, aquele ar orgulhoso, aquela confiança como se soubesse muito bem o que queria da vida. Dani se lembrou daquela manhã, da coragem dela, quando foi apanhada pela correnteza no mar, como Elisa havia confiado nele, parecia não ter medo, aquilo o impressionou.

Lá fora, a tempestade começou a se acalmar, Dani pensou se um dia a outra tempestade, a da sua alma, também se abrandaria, e se ele encontraria um pouco de paz.


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