Anhanguera, Goiás – Brasil.

Ele andava cabisbaixo e chutava todas as pedras que apareciam em sua frente como se isso fosse resolver seus problemas. Andava sem destino pelo acostamento da estrada principal que levava a pequena cidade do interior do Brasil para as cidades grandes. Era sempre assim. Sempre fazia isso quando algo em sua vida não ia bem, principalmente naquele dia. Porém era a primeira vez que se aventurava a sair durante a noite.

Paulo dos Santos era um garoto comum de dezoito anos, alto, de vastos cabelos negros encaracolados, grandes olhos negros e pele clara acetinada. A noite ia alta. Passava das oito horas e vagava sozinho pela estrada. Gostava de ficar assim quando algo o preocupava: sozinho. Dessa forma, podia pensar em paz sem ninguém para perturbá-lo. E naquele dia em especial precisava disso. Precisava de um tempo para pôr seus pensamentos em ordem, pois havia acabado de brigar com seus pais. Eles discutiram por algo que Paulo julgava banal. Queriam controlar sua vida, a hora que chegava, com quem saía, as suas amizades e coisas do tipo. Ele havia dito coisas para eles das quais se arrependia. Entretanto não havia como voltar atrás em suas palavras proferidas. O que eles haviam dito um ao outro, havia machucado demais, ferido demais. Será que seus pais não enxergavam que ele não era mais nenhuma criança? Ele sabia se virar sozinho. Pelo menos era o que ele achava.

Morava em Anhanguera, uma cidadezinha no interior do estado de Goiás com pouco mais de mil habitantes, próxima ao estado de Minas Gerais. Como se tratava de uma cidade pequena, todos na cidade se conheciam e devido a ser minúscula, uma discussão entre o filho do vereador e seus pais não passaria despercebida. Por isso, optou por deixar sua casa – logo após fechar a porta atrás de si com um forte estrondo – e ir dar um passeio para anuviar seu pensamento. Aquela discussão seria um prato cheio para as vizinhas beatas fofoqueiras.

Estava tudo tão calmo e em silêncio que ele podia ouvir os sussurros noturnos. A estrada estava deserta. Era difícil aparecer alguém por ali. A estrada era usada principalmente quando os habitantes de Anhanguera queriam ir a alguma cidade grande.

Ventava fortemente. Ele fechou o zíper do casaco que usava para proteger seu corpo do frio e pôs as mãos dentro dos bolsos da vestimenta. Estava distraído, perdido em pensamentos, entretanto um barulho chamou-lhe a atenção. Olhou para trás e nada viu. Deu de ombros. Sentiu um arrepio em sua espinha, contudo resolveu ignorar. Continuou sua caminhada silenciosa e reflexiva.  Havia tomado uma decisão. Quando retornasse para casa pediria perdão para seus pais.

Seus pensamentos foram interrompidos quando esbarrou em alguém. Como estava de cabeça baixa não viu quem era, apenas tratou em desculpar-se:

― Me desculpe, eu não o vi.

Ele levantou a cabeça para saber a quem se dirigia. O que viu fê-lo tremer de medo e pavor. Ficou paralisado ao perceber que diante de si estava um homem com o corpo totalmente decomposto, como se fosse um zumbi. Não conseguiu emitir uma única palavra, tamanho era seu medo. Ouviu o monstro proferir a palavra “culpado”, e a última coisa que teve consciência foi de seu abraço apertado, sufocante.

Paulo já não existia. Em seu lugar havia uma árvore seca com forma humana. O monstro que o transformara partiu para o interior do vale que cercava a estrada.