Presa no Tempo escrita por Menina Improvável


Capítulo 9
Capítulo 9: Você tomou café no hotel dos corações partidos


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem! Boa leitura! :D
(link da musica do título nas notas finais)
.
"Não se pode planejar o futuro pelo passado."
~ Edmund Burke
.
#MeninaImprovavel



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/716664/chapter/9

~ 12:16, Sábado, Junho, Ano: 2140

 

Sai do jardim e fui para a porta de entrada, não acredito que ele achou que ia ser tão fácil assim, parece que ele se esqueceu de tudo que veio depois desse momento.

Fui para a porta de entrada e percebi passos atrás de mim.

— Por que saiu do jardim? - Rafael perguntou.

Estava de costas pra ele.

— Eu adoro me lembrar disso Rafa, mas... Eu não quero me lembrar do que vem depois.

— Por que lembraria?

— Por que NÃO lembraria?

— Porque isso não vai acontecer de novo! - ele disse encostando na porta da cozinha.

— Até porque ela já morreu. - disse sem pensar.

Ele deu um soco na porta com tanta força que o barulho ecoou na casa inteira.

—VAI SE FUDER! - ele gritou.

O som do grito ecoou junto com o som do soco.

— ... - fiquei em silêncio.

"Porra, Helena. Por que você foi dizer isso?"

— Desculpa. - pedi - Eu disse sem pensar.

Rafael não respondeu nada e saiu de casa.

— Vamos embora. - ele disse.

Concordei. Ele estava bravo, não iria discordar, vai que  ia embora sem me levar. Sai da casa, fechei a porta e subi na moto.

— Oi? - ouvimos uma voz atrás da gente e viramos juntos para olhar.

— Dona Ana! - disse.

Ela veio até mim e me abraçou.

— Meu Deus eu achei que nunca mais veria vocês dois! - ela disse enquanto abraçava o Rafa.

Dona Ana é uma moça que conhecemos quando mais novos, ela era nossa vizinha, ultimamente parecia mais velha do que antes. Tinha cabelos muito brancos e curtinho, rugas pelo rosto e olhos azuis maravilhosos.

— Quer ajuda? - perguntei para ela que estava carregando muitas sacolas.

— Não, não precisa querida pode deixar. Meu Deus, fico tão feliz de ver vocês dois! Vocês formam um casal tão lindo! - ela se virou para Rafa -  Sua mãe ficaria muito feliz, Rafael.

— Sim... Ela ficaria. - ele sorriu para D. Ana.

— Não estamos juntos, Dona Ana. Somos amigos, estamos passeando. - disse.

— Que pena... Por que não estão?

— Hã... Já tentamos, não deu muito certo. - respondi

 - Era o que eu achava quando encontrei meu marido. - ela riu -  Vocês cresceram tanto espero que estejam bem sucedidos!

— Estamos trabalhando juntos! - sorri para ela.

— Que ótimo! Ai um cuida do outro. Bom, tenho que ir embora, meu marido está em casa esperando pelo almoço.

— O Senhor Fernandez está bem? - perguntei.

— Querida! Ele está melhor que vocês dois juntos! - ela riu - Se cuidem, tchau!

Ela partiu em direção a casa dela. Rafael ligou a moto, mas não acelerou, ele olhou para baixo.

— O que foi? - perguntei.

— Eu te desculpo.

 

**

 

Eu abri a porta da garagem do prédio para que ele pudesse me deixar mais próxima da entrada. Ele parou na frente das portas do hall do prédio, deixou a moto ligada, saiu de cima e deu a mão para me ajudar a descer.

— Eu consigo descer sozinha. - dei risada.

— Eu sei. - ele disse.

— Obrigada. - dei um beijo no rosto dele para me despedir e virei para ir embora.

— Ow! - ele me chamou.

Olhei para ele, que estava encostado na moto, se eu tivesse uma câmera bateria uma foto e mandaria o holograma ficar para sempre ligado, ele estava muito gato, havia me chamado de propósito. A moto preta com detalhes vermelhos destacava sua jaqueta de couro preta fosca, sua calça era azul marinho com uma bota de motoqueiro da melhor qualidade e usava um colar que eu dei que na ponta tinha uma palheta. Era uma visão perfeita pra qualquer mulher.

— O que foi? - perguntei.

— A Dona Ana tinha razão, por que nunca mais ficamos juntos? - ele perguntou passando a mão nos cabelos perto da nuca.

Eu fiquei envergonhada.

— Não confio mais em você para esse tipo de relacionamento.

Ele olhou para o lado.

— Eu não vou mais fazer aquilo.

— Sei que não. - sorri pra ele e ele ficou confuso - Mas eu... Tenho medo.

— Não tenha. - ele foi segurar minha mão e eu desviei.

— Não pensa que o nosso mundo é que nem um mundinho de fanfics que você diz alguma coisa romântica e eu caia à seus pés. - disse - Você nunca me disse para onde foi depois daquele dia.

— Eu não me lembro direito. - ele disse.

— Por que?

— Passava a maior parte do tempo bêbado em um balcão de bar.

— Você me deixou sozinha sabia? - eu falei pra ele cruzando os braços.

— ...

— Me deixou sozinha com todas as SUAS responsabilidades.

— Desculpa.

— Eu te desculpo Rafael. Eu te desculpo de verdade eu te entendo. Mas, você acha que ELA te desculpa? Sua mãe?

Ele ficou em silêncio ouvindo cada palavra minha.

— Depois que ela morreu você nunca foi ao cemitério falar com ela. Sei que você acha isso estranho, sei que você vai falar que está falando com uma "pedra" mas... É o mais próximo que você vai estar dela nesse momento, você devia ter dado mais valor quando a tinha. Leve isso como uma bronca.

Ele mordeu o canto do lábio e virou o rosto.

— Nunca te disse o que houve quando você foi embora. Nem você me disse o que aconteceu com você quando foi embora. Você praticamente me abandonou. Com todas as suas responsabilidades, depois que sua mãe começou a passar mal e o médico disse que ela tinha poucos dias de vida você fugiu de casa com medo de ver ela morrer. Eu cuidei dela todos os dias, eu gastei dinheiro, tempo e me desgastei também. Eu não dormia e sabe quem ela mais queria ver? Você.

Ele continuou quieto e me olhando fixamente.

— Nos seus últimos dias, perdeu completamente memórias em longo prazo e ela começou a achar que eu era filha dela. E eu comecei a chama-la de mãe e se esqueceu completamente de você.

Ele virou novamente o rosto dessa vez passando a mão do lado que eu não conseguia ver e limpando a mão na roupa.

— Depois que ela faleceu, eu estava com uma divida enorme no banco e entrariam em processo nem lembro por que, não sabia o que fazer então eu fui pro bar naquela noite. Chegando lá sabe quem eu vi? Você.

Ele se virou.

— Eu não me lembro de ter visto você. - ele falou depois de um tempo quieto.

— Eu sei, você estava bêbado. - dei risada -  Tanto que você saiu correndo do bar pegou uma moto qualquer e foi embora. O dono da moto foi correndo atrás de você.

— Ai caralho agora eu me lembro de onde saiu àquela moto. - ele disse pondo a mão no rosto - Eu roubei!

Ri.

— Sim! E sabe o que é mais foda?

— O que?

— Você foi embora e quando voltou, eu não sei como conseguiu tudo que tinha. Não sei onde conseguiu aquele apartamento enorme no penúltimo andar, não sei onde conseguiu aquela moto fodona, não sei de nada. Te arrumei um emprego junto comigo na Empresa Spies para cuidar de você.

— Obrigado por cuidar de mim. - ele sorriu.

— E sabe por que te odeio? Por que mesmo depois disso eu ainda... gosto de você... - disse - Mas não tenho coragem de ficar com você, e é por esse motivo que eu também me odeio.

Do nada umas gotas começaram a cair do céu.

— Vai começar a chover, vou entrar. Tchau Rafa. Obrigada pelo passeio. - dei um beijo em seu rosto e fui para dentro.

— Tchau... Heleka.

Quando passei a porta de vidro, olhei para trás. Ele subiu na moto, olhou pra mim, fez a moto roncar alto e foi embora acelerando rapidamente derrapando os pneus de trás por conta da chuva. Ele não é nenhum cavaleiro em um cavalo branco, mas um motoqueiro é bem melhor que contos de fadas.

 

**

 

~ 17:09, Ano: 2140 ~

 

~ NARRAÇÃO DE RAFAEL ~

 

Uns finos pingos de chuva começaram a cortar o meu rosto.

— Porra Helena, eu odeio quando você faz isso. Vai se fuder.

Parei no farol.

“Não acredito que to meio... chateado... Deveria arranjar outra garota? Desistir dela talvez... Não aguentar mais essa ansiedade de tê-la?” – pensei - "Faz tempo que não vou naquele bar... Acho que preciso de uma folga.”

Acelerei rapidamente para a rua da frente quando o farol estava fechado e desviei de dois carros que vinham pela minha direita. Os dois motoristas me fizeram sinais com a mão, eu não parei de acelerar. Continuei desviando dos carros, passando entre eles absurdamente rápido, virei rapidamente num beco e freiei.

"A troca dos freios fizeram bem pra ti." - disse desligando a moto.

O beco era escuro. A chuva ainda caia forte, entrei no bar pela porta dos fundos.

Estava o mesmo ar de sempre, quente, meio abafado, barulho de copos por todos os lados e risadas altas. As paredes eram de madeira assim como o chão. Luzes iluminavam fortemente o local e o som de rodas de robôs servindo mesas se misturavam com as risadas.

"Da ultima vez que me encontrei com um desse eu arranquei a cabeça dele." - dei risada sozinho.

Ao lado da porta tinha um telefone com fio, é uma raridade. E na cadeira, uns panfletos de autoajuda, isso é irônico. Tinha um som de fundo tocando Piledriver Waltz, do Arctic Monkeys uma musica bem antiga, mas que eu conheço por que Helena mostrou para mim. É uma musica que eu particularmente gosto muito, mas meio depressiva, que combinava bem com minha depressão pós Helena.

— I etched the face of a stopwatch… On the back of a raindrop…* - cantei super baixo.
(* Cauterizei a face de um cronômetro... Por trás de uma gota de chuva...)

Do lado esquerdo da sala tinha um pequeno grupo de garotas que me olhavam cantar baixinho, dei um sorriso envergonhado para elas e virei pro outro lado, a água da chuva começou a escorrer pelo meu rosto novamente, eu as ignorei e sentei no balcão. As gotas pingaram.

— Tá frio hoje. - disse o Barman para mim limpando aonde as gotas do meu cabelo tinham caído - Estamos servindo hoje um coquetel quente. Vai?

— Sim. - respondi olhando em volta – Vocês fizeram umas reformas né? Ta mais parecido com bar de filme antigo.

— Sim, queremos deixar um pouco da cultura dos bares viva. - ele disse fazendo meu coquetel.

— O que vai ai? - perguntei

— Se chama Irish Coffee, vai café, whisky e chantilly, é leve, porém esquenta bastante por conta do café e do whisky.

 

 

— Ah, entendi.

— Creme? - ele me perguntou.

— Não, valeu. Se puder por mais um pouco de whisky...

— Ok.

— Vê se faz dois. - ouvi uma voz grossa atrás de mim e me virei, sentado à mesa havia um homem com barba longa, cabelos compridos e pretos.

— Rick. - disse levantando da mesa e batendo na mão dele que havia estendido pra mim, sentei na sua frente - Ainda vem aqui.

— Você sumiu. Abandonou a gente, cara.

— Eu parei de beber tanto quanto antes, o que eu bebo é nas festas do moto clube.

— Você ainda fica com essas viadagens de moto clube. - ele deu uma risada grossa.

— Sim, são como uma família.

Um robô veio entregar nossas bebidas, peguei a minha e dei um gole, um calor desceu pela minha garganta e se instalou no meu corpo.

O robô foi para trás de mim, colocou suas mãos  gélidas sob meu cabelo e jogou um ar quente nele, secou em menos de um minuto mas parecia que eu tinha sido atacado por leões. Mexi a cabeça passando a mão nos fios.

— Você ainda me deve um dinheiro... Ou esqueceu? - ele me disse batendo a taça já pela metade na mesa.

— A mesa é barata, mas as taças não. - disse o Barman.

Ele lançou um olhar para o Barman que abaixou o rosto.

— Cadê meu dinheiro?

— Ah, não sei ta em algum lugar por aí. - respondi tomando mais um gole – Em algum iate no Guarujá talvez.

No meio do meu gole ele debruçou por cima da mesa, me agarrou pela gola da minha jaqueta e me puxou com força pra perto dele.

— Seu cuzão eu não to brincando, ou você da meu dinheiro agora ou eu acabo com você aqui.

— Me solta agora ou você não vai mais conseguir mexer suas mãos pelo resto da sua vida. - disse segurando os pulsos dele e os torcendo - E vou enfiar o dinheiro num lugar que você não vai conseguir alcançar.

De repente mãos geladas me seguraram meus braços, me puxaram para trás e fizeram o mesmo com ele.

— Não briga. - uma voz metálica falou.

Eu me mexi puxando meus braços e o robô me soltou.

— Entendi porque parei de vir aqui. - disse virando o líquido da taça na minha boca até a ultima gota.

Deixei o dinheiro da bebida no balcão e fui pra saída. Quando fui subir na minha moto alguém me agarrou desprevenido pela jaqueta e me empurrou contra a parede mais próxima.

— Olha aqui seu idiota você deve se achar o fodão com essa moto idiota, essa roupa ridícula de motoqueiro mas eu juro... - ele tirou uma faca do bolso de trás da calça e pois no meu rosto - Se você não me pagar agora, eu acabo com essa sua cara.

— Você pode cortar o meu rosto a noite inteira, porque o seu dinheiro não está comigo. - eu respondi nem se quer fugindo da faca.

— Aonde tá?

Ele me disse passando a lamina afiada na minha bochecha, senti um líquido quente escorrer e uma dor bem fraca.

— Se vira com o Hector, ele quem cuida dos negócios do grupo. - disse pegando na mão dele e torcendo o que o fez derrubar a pequena faca.

Peguei ela do chão e a segurei na altura do ombro pela lâmina.

— Você só fez isso porque não sinto mais dor com esse tipo de tortura. Já você.

Ao dizer isso joguei a faca acertando-lhe a perna o deixando imóvel e com dor.

— Da próxima vez vê se arruma essa barba, é ridícula, tampa seu rosto de corno inteiro e não deixa você com menos cara de retardado.

Subi na moto, fiz um 360 no lugar jogando toda a água empoçada na beira do beco nele.

 

~ FIM DA NARRAÇÃO DE RAFAEL ~


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Gostaram? Comentem! Isso ajuda muito! :D obrigada por lerem!
.
Link da musica do título e do capítulo:
https://www.youtube.com/watch?v=OrUqC6zZk94
.
#MeninaImprovavel



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Presa no Tempo" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.