Reino da Magia escrita por semita13


Capítulo 16
Três crianças serão reprovadas no teste.




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           Aquelas palavras soam na cabeça de Nicolas como o badalar de um sino que ecoa infinitamente: “Aprendiz de feiticeiro, aprendiz de feiticeiro, feiticeiro...”. Ainda surpreso com a revelação feita por Victoria, o garoto a observa espantado, parecia não acreditar no que ela havia dito. Saiu de sua casa por desconfiar ser esse tipo de criatura, tão mal vista nos vilarejos, abominável nos condados, ‘criatura da noite’ como disse seu amigo Wendel. Fugiu para escapar de um futuro negro reservado para ele e para aqueles que um dia o conheceram e preferiu se distanciar de tudo, principalmente da ideia de ser um feiticeiro. E agora está ali, num castelo que ensina e treina pessoas a serem feiticeiros. Ele olha para todos que estão à sua frente: Victoria, Mark e depois para as crianças. Será que todas estão ali para serem feiticeiros? E Serena e Lucius, que sabiam sobre o castelo. Será que eles o levaram para uma armadilha?

—Olhem só para ele! - comenta Ricardo, chamando a atenção dos outros - Finalmente caiu em si, percebeu que está no lugar errado. Aliás, esse pivete parece ser todo errado. Ah! Ah!

         Nicolas, ainda em estado de choque, caminha devagar para o banco onde Serena e os outros estão. Mark o observa.

—Não se preocupe, garoto! Não como carne de segunda. - diz o professor, lhe dando um sorriso, mostrando os dentes.

          Nicolas acelera o passo se afastando dele enquanto Victoria lança um olhar de reprovação para Mark que apenas lhe faz um gesto com os ombros, com um leve sorriso no rosto. Os professores se reúnem e conversam sobre os preparativos para o teste de aptidão. Nicolas se aproxima de Serena e Lucius se acomoda ao lado esquerdo dela. A conversa entre os professores é rápida, os testes irão começar. Nicolas senta-se rente ao corredor, ao lado de Serena, e permanece olhando para frente, calado.

—Nick, você está bem? - pergunta a garota, sem receber resposta.

—Ele deve tá assim por causa daquele licantrope que correu atrás da gente. Até eu me assustei. - afirma Lucius.

—Nick, não se preocupe! Estamos juntos nessa. - diz Serena, tocando o braço dele. Mas Nicolas repele seu gesto. - O que foi, Nick?

—Parem de falar comigo! - rebate o garoto, para espanto dos outros. - Vocês sabiam né? Sabiam e não me contaram. Agora eu entendo! O fogo na carroça, me convenceram a vir ao castelo, mostraram o caminho... Bem que Véi Zuza falou que tipos como vocês não são confiáveis. Me enganaram direitinho...

           Serena e Lucius trocam olhares e voltam a interrogá-lo.

—Do que é que você tá falando? Você não queria fugir da carroça, é isso?

—O que foi que a gente fez pra você falar assim? Vir ao castelo não fazia parte do plano?

—Vocês... Vê se me esquecem!

          Nicolas volta a sua posição anterior e Serena e Lucius decidem não incomodá-lo. A professora Flora se vira para a parede onde faz aparecer um grande baú apenas com o movimento circular de uma das mãos. Apesar do tamanho do objeto, aparentemente nenhuma das crianças notou sua aparição repentina, já que a professora estava na frente, encobrindo a visão delas. Dentro dele encontram-se vários pergaminhos. Ela retira um e o desenrola um pouco. Não há nada escrito naquele pequeno pedaço de papel em suas mãos. Victoria lhe faz um gesto afirmativo com a cabeça e se dirige ao centro da sala.

—Muito bem, crianças! Vamos começar com o teste de aptidão. É um teste simples, apenas para averiguarmos a capacidade de vocês para a realização de feitiços. Todas as entidades de ensino fazem esse teste que é um pré-requisito essencial para a admissão em uma escola de magia. Aquele ou aquela que eu escolher deve se dirigir até a mesa central, que será usada para a realização do teste. É claro que, se alguém precisar de algum item especial, é só me pedir. A Professora Hilda irá retirar um fio de cabelo do candidato. Não se preocupem, não dói nada! Então, seus dados serão transcritos para o pergaminho e a Professora Flora irá identificá-los e guardá-los. O Professor Mark nos ajudará nos testes. Bem, vamos começar por... VOCÊ!

          A professora aponta seu indicador esquerdo para Nicolas. Ele se assusta. A sensação era de pavor e parecia que ela havia lhe dado um tiro. Sem saber o que fazer, ele junta as mãos como se fosse pedir ajuda aos céus, mas logo percebe que nada do céu iria ajudá-lo no meio daquelas ‘criaturas da noite’. E outro comentário de seu amigo bêbado lhe vem à mente: o fato dessas criaturas matarem crianças para fazerem poções. Não podia contar com a ajuda de Serena e dos outros, não confiava mais neles. “Lucas!”, pensa Nicolas em seu amigo imaginário. Mas é outra pessoa que o salva daquela situação.

—Professora, isso não é justo! - diz Munique, se levantando - Estou sentada na primeira fila, no primeiro banco, praticamente sou a primeira pessoa que a senhora deveria chamar. Por que chamar alguém lá de trás?

—Estou de acordo com ela, Professora! - é a vez de Alice se manifestar. - Nos sentamos nos primeiros lugares para sermos os primeiros a fazer o teste. Por que mudar a ordem?

           Logo as crianças nas primeiras filas começam a falar. Mas Victoria não desiste de mudar sua decisão.

—Crianças! Todos terão a sua vez. Apenas... Decidi começar de maneira aleatória. E por aquele garoto ali!

          Parece não haver mesmo salvação para Nicolas. Mal tinha sentado e teria que se levantar de novo. E o pior é ter que fazer esse tal teste de aptidão que ele nem sabe por onde começar. Mas a ajuda veio novamente de onde menos se esperava.

—Acho que essa Senhorita tem razão, Vick! Por que você não começa por ela? Assim os outros irão ver que o teste é simples e rápido. - sugere Mark.

—Está bem, está bem! - cede Victoria, que olha para Munique e faz um gesto para que a menina vá até a professora Hilda.

          Com um leve sorriso de satisfação, Munique se dirige até a Professora Hilda, sob os olhares de todos. Especialmente Nicolas, curioso para saber o que fazer no teste.

—Hunf! Só quer ser a filhinha da mamãe - diz Paula.

—Ela tem que ser, senão a mamãe põe de castigo. Ih! - diz Margot. Munique finge não ouvir os comentários.

—Se for assim, eu sou a segunda!  - se alegra Clara.

—Peraí! E os homens? Quando vai chegar a nossa vez? - retruca Allisson.

—Depois das mulheres, oras! - comenta Bertha num tom áspero. - E vamos logo que eu já estou com fome!

             Nem o fato de Bertha ter feito menção sobre comida fez Nicolas mudar sua posição. Se todos são feiticeiros como ele julga, então é melhor sair dali o quanto antes. É melhor ser reprovado nesse teste e ser expulso do castelo. Ele observa atentamente o teste de Munique. A Professora Hilda se aproxima da garota e com uma das mãos, puxa um fio de cabelo preto do meio da cabeça da menina. Em seguida, ela o mostra para a Professora Flora e o deixa cair sobre a superfície do pergaminho que a colega segurava. O papel parece absorver aquele fio de cabelo, que se mexe e se espalha pela parte superior da folha, como uma serpente nadando num rio. Mas ao invés de formar pequenas ondas enquanto nada, forma letras que aos poucos se agrupam, preenchendo linhas, até parar de se movimentar. Nesse momento a professora Flora inclina o pergaminho e lê as palavras que se formaram.

—Munique Lane! Idade: 14 anos. Classe: minemosine. Subclasse: previdente.

          As crianças comentam, mas Nicolas e seu grupo só entenderam parte da informação dada por Flora. Ele não tira os olhos da menina.

—Muito bem, Senhorita Lane! Pode começar o teste. Precisa de algo?

            Munique olha para a mesa e depois vira-se para Victoria.

—Não! Obrigada, Professora.

—Então...

            A garota olha para as crianças a sua frente, como se procurasse algo. Depois volta a falar com Victoria.

—Três crianças serão reprovadas no teste. - afirma a garota, sorrindo.

       As crianças voltam a comentar as palavras de Munique, que permanece de pé diante da professora e ora olha para ela, ora olha para as crianças. Nicolas se surpreende. “Ué, só isso? É só ir lá na frente e falar? Que teste mais besta! Então eu vou dizer que dez crianças vão ser reprovadas. Assim, quando eu errar serei expulso”.

—Puf! Que previsão mais fácil! Todos sabem quem serão os expulsos. - diz Ricardo.

—Querida, poderia ser mais específica? - pergunta Victoria, fazendo uma expressão de que não se impressionou com a previsão da garota.

—Uma garota e dois garotos! - assegura Munique.

—E como saberei...

—Eles irão se denunciar, Professora!

         Alguns tentam disfarçar o olhar, mas era nítida a direção que Victoria estava seguindo. Ela percorre o corredor e caminha até o banco onde Nicolas está. Ele procura desviar o olhar. Os que estão ao seu lado também se olham entre si e para o chão. A diretora fica parada ao lado dele. Um choro começa a ser ouvido.

—Que lugar é esse, mana? Aonde nós viemos parar? - lamenta Derek.

—Estou com medo, quero ir pra casa! - diz Joshua.

—Feiticeiros, lobos... Oh, meu Deus! O que será de nós? – lamenta Gabrielle, segurando firme as mãos dos irmãos.

       Nicolas, Serena e Lucius olham para eles. Victoria faz uma expressão de desânimo e com uma das mãos pede para Nicolas lhe dar passagem. Ao perceber que ela se aproxima, Gabrielle e seus irmãos saem rapidamente do banco e ficam encostados nas mesas laterais.

—Acalmem-se, crianças! Não vou fazer nada, só quero conversar.

          A diretora se aproxima lentamente do pequeno trio apreensivo e assustado, encolhidos no canto da sala. Victoria junta as mãos à frente e ao abri-las mostra para elas um estranho pó branco.

—Vejam! Quero que olhem fixamente para as minhas mãos. Estão vendo este pó? Olhem!

          Os irmãos se olham entre si. Gabrielle aproxima seu rosto das mãos da diretora, que continua dizendo que era um simples pó e só queria que elas olhassem para ele. Derek e Joshua seguem o exemplo da irmã.

—O-o que a senhora quer que a gente veja?

—Isto que está na minha mão! Não conseguem vê-lo? Aqui, bem no centro.

—O que tem aí? - pergunta novamente Gabrielle.

—O futuro de vocês. - responde Victoria, de maneira séria - Impactus!

          Inesperadamente todo pó que estava nas mãos da professora é assoprado para os rostos das três crianças que se afastam, mas já era tarde. Elas se mexem de um lado para o outro, espirrando e esfregando as mãos nos olhos.

—O que foi que ela usou? - pergunta David.

—Pó de mimosa, eu acho. - lhe responde Margot.

          Serena, Lucius e Nicolas se afastam. Passados alguns segundos, as três crianças param de se mexer e espirrar, na medida em que o estranho pó desaparece no ar. Elas se mostram mais calmas, tranquilas, como se nada tivesse acontecido. Sem perda de tempo, Victoria olha para eles e, após fazer um movimento giratório com uma das mãos, faz com que as três crianças desapareçam, sem deixar nenhum vestígio de que estiveram ali. Nicolas leva um susto tão grande que quase cai do banco.

—O que ela fez agora? - David.

—Ela usou o Viramundo.  - diz Margot novamente. - Pare de fazer perguntas! É isso que dá não estudar durante as férias.

—Até parece que você estudou durante as férias, Margot. - rebate Clara.

—A vida de uma feiticeira não é só diversão e passeios, queridos! O aprendizado é para a vida toda. Há! Deixa prá lá! Vocês são novatos, ainda tem muito que aprender.

          Victoria refaz o caminho de volta, passando por Lucius, Serena e por último, Nicolas, que a olha com espanto.

—O que você fez com eles? Cadê eles?

—O que? Ah... Eles estão bem. Usei o pó de mimosa para apagar a memória deles, não se lembrarão de onde estiveram ou como foram parar no orfanato de Devlon, para onde eu os mandei. Não passavam de comuns, pois se tivessem algum dom mágico, não iriam espirrar ao sofrerem o efeito do feitiço. Bem! Muito bom, Senhorita Lane! Passou no teste.

          Alegre, Munique volta para seu lugar no banco ao mesmo tempo em que Clara se levanta. Poucos aplaudem a atuação da garota, que faz uma cara de desaprovação. Flora enrola o pergaminho e coloca-o de volta no baú, pegando outro pergaminho em branco. Antes que Victoria pudesse voltar, Sidney a interpõem com uma pergunta.

—Professora! Meus pais disseram que somente quem possui magia consegue atravessar os espelhos-portais. Como a senhora soube que eles eram comuns? Apenas usando o Pó de Mimosa? E se eles tiverem um dom mágico que ainda não sabem como usar?

—É! Parece que ele quer defender ‘aquela garota’ de todo jeito. - sussurra Renan para Allison, que dá um leve sorriso concordando com o amigo.

—Vou explicar, já que sua dúvida também deve ser a de outros. Pessoas sem magia não conseguem passar pelos espelhos-portais. Não conseguem ver esse castelo, ou melhor, não conseguem ver onde a magia se manifesta. Porém, se tiverem ao lado daqueles que possuem o dom mágico ou, o que eu acho mais provável, ao lado daqueles que passaram pelos portais e se esqueceram de fechá-los por desconhecimento ou propositadamente, também esses comuns podem passar por eles. O Pó de Mimosa foi útil para saber se tinham ou não magia em seus corpos e essencial para o meu próximo passo: mandá-los para fora sem prejudicar seus corpos ou suas mentes com resposta que certamente não entenderiam. – antes de caminhar em direção à mesa, ela toca no ombro de Nicolas. - Sua vez!

          Ele fica preocupado. Depois do que viu, se fosse reprovado iriam fazê-lo desaparecer como fizeram com Gabrielle e seus irmãos. E quem garante que eles realmente estão bem e num lugar seguro? Agora é a sua vez de encarar o medo e tentar sobreviver a ele.


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