Anoitecer escrita por Samantha Silva


Capítulo 6
Capítulo 5




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MAITE

O quarto estava frio.

Havia uma coberta em algum lugar ali, mas Maite não queria levantar para pegar, não queria se mover.

A cama era pequena, mas ela e Christian pareciam a metros de distância, cada um em uma ponta, com todo aquele ar circulando entre eles.

O silêncio parecia prestes a enlouquecê-la, mas não fazia ideia do que podia dizer e sabia que era injusto esperar que fosse Christian a dizer algo, afinal, foi ela que o colocara naquela situação.

Pensou seriamente em se levantar e ir até o banheiro ligar para a amiga e perguntar o que Dulce faria em seu lugar, contudo, seria ridículo e não adiantaria de nada. A amiga nunca se meteria em uma situação daquelas. Ela tinha que se virar sozinha.

Quando a intensidade do que acabaram de fazer se dispersou e tudo que restou foram corpos suados e exaustos, Christian saiu de cima dela e se esticou em uma ponta da cama. Ela permaneceu onde estava, sem saber se aconchegava-se nos braços dele ou era melhor esperar que ele a buscasse, ficou com a segunda opção, mas ele não tomou atitude alguma.

Quando ela virou-se para o lado a fim de olhar o lado de fora através da janela, seu corpo ficou ainda mais distante do dele e, de costas, sabia que não passava a melhor das mensagens. O que mais ela podia fazer?

Do lado de fora, a rua ia ganhando cada vez mais sons, o amanhecer estava próximo. Conforme seu corpo ia esfriando, ela se deu conta de que permanecia nua e exposta. Precisava fazer alguma coisa, mas Christian fez primeiro.

— Preciso ir – ele disse, levantando-se da cama e pegando sua calça jogada no chão.

— Sem problemas – ela se ouviu dizer.

Mas é claro que havia problemas.

Virou-se para olhar para ele e ver se em seus olhos havia a frieza que havia em sua voz, mas eles estavam focados em seu corpo, ainda mais exposto sob a luz que entrava pela janela. Não lhe incomodaria ver desejo nos olhos dele, mas ela não conseguiu decifrar aquele semblante. Intuitivamente ela se viu encolher, constrangida e receosa.

A atitude pareceu confundi-lo e voltou a se vestir.

— Posso te deixar em casa.

— Não precisa. Vou ficar um pouco mais, tomar um banho e depois pego um ônibus.

— Certo. – Ele não voltou a olhar para ela. – Estamos perto da sua casa.

— Eu sei.

Sem chamar atenção, ela puxou o lençol embolado na cama e cobriu-se, sem que ele percebesse. Não entendia essa necessidade tremenda de mostrar segurança, mas foi como acabou se comportando.

Quando percebeu que ele já estava completamente vestido, seu coração titubeou. Ele estava prestes a partir.

Não conseguia aceitar que estava problematizando algo que era comum para tantas outras pessoas. Não era possível que todos que se aventuravam em sexo sem compromisso ficassem a ponto de enlouquecer como ela estava. Ela o arrastara para aquilo, ela pediu que ele não a deixasse e concordara com tudo que os levaram até aquele quarto.

Será que toda aquela neura estava apenas na cabeça dela? Será que com todo mundo tudo que restava no fim era aquele clima carregado de coisas não ditas? Ela não queria promessas ou palavras vazias, não queria que ele lhe chamasse para tomar café da manhã ou a convidasse para jantar em um outro dia. Nem mesmo esperava vê-lo de novo, não parecia haver espaço na vida dele para ela e ela sabia que também não era capaz de assegurar-lhe um relacionamento estável, já que era provável que ela acordaria um dia se dando conta de que não sentia nada por ele, como foi com o anterior.

Foi com pesar que ela percebeu que tudo que queria era um pouco de gentileza. Um pouco do olhar doce que ela conseguiu enxergar por baixo de todas as luzes daquela boate. Um pouco do homem que a tratou como a mulher mais incrível do mundo, enquanto se amavam naquela cama.

Se amavam... Como ela era ridícula.

Agora ele estava com a chave do carro nas mãos e indo em direção a porta.

Enquanto o via cruzar o quarto, ela só conseguia repetir em sua cabeça “Não seja esse tipo de cara. Por favor, não seja.”

 

CHRISTIAN

A chave do carro pesava nas mãos de Christian. Saber que estava prestes a ir embora deixando Maite para trás o fazia sentir mais raiva do que o alivio que esperava.

Estava tudo errado ali. Desde que se afastou do corpo dela sabia que a cada minuto de silêncio e falta de atitude as coisas só iam piorando. Mas ele estava confuso demais para qualquer coisa.

Durante todo o tempo que a teve em seus braços sentiu-se extasiado e vivo como nunca havia sentido. Tudo nela o deixava inebriado, perto demais de perder a cabeça.

Quando já não havia mais forças para continuar com aquilo e seus corpos se afastaram abruptamente, se deu conta de que havia ido longe demais. Não pelo sexo, mas pelas coisas que começavam a lhe devorar as entranhas.

Ele podia tê-la aconchegado em seus braços, se permitido relaxar um pouco e acaricia-la os cabelos ou simplesmente ter olhado para ela e fazê-la entender que ele estava feliz por estar ali. Mas não fizera nada disso. E quando ela lhe deu costas, sabia que tudo estava arruinado, que o momento havia passado e agora ele seria para sempre o homem insensível que ela guardaria na memória.

Não conseguia entender como conseguia ter um mínimo de dignidade com todas as mulheres com quem ficara por ficar, mas não podia ser um pouco gentil com aquela que lhe despertava algo mais.

Era melhor ir embora de uma vez e parar de tortura-la com sua presença.

Ao ouvi-lo anunciar que iria embora, Maite virou-se para ele e a visão deu seu corpo despido o deixou angustiado. O que ele havia feito? Ela esperava algo dele, claro que esperava.

Tentando preencher o quarto com algo menos denso que seus pensamentos, ele se ofereceu para deixá-la em casa, mas ela preferiu ir sozinha. É claro que não faria questão de estar com ele um minuto a mais.

Pronto para ir embora, ele deu uma última olhada pelo quarto, com medo de deixar algo para trás, mas não havia nada, aparentemente.

Ao chegar na porta e sentir a maçaneta gelada sob sua mão, percebeu que não podia ser aquele tipo de pessoa. Não era ele que orgulhava-se de ser diferente? De tratar as pessoas, desde seus clientes a seus vizinhos, da melhor forma que pudesse? Por que faria diferente justamente com aquela mulher que não tinha culpa dos seus problemas e que só precisava de um pouco mais de atenção?

Largou a maçaneta, guardou a chave do carro no bolso da calça e voltou para o meio do quarto. Maite o acompanhava com os olhos cheios de perguntas, sentando-se na cama e agarrando-se ainda mais ao lençol que a cobria.

— Me desculpe – ele pediu, sentando-se na beira da cama ao lado dela.

Não é que ele esperasse que ela o desculpasse, sorrisse e lhe dissesse que estava tudo bem, mas a forma como ela encolheu ainda mais e manteve-se em silêncio o machucou.

— Sei que estraguei tudo – ele admitiu. – Que arruinei qualquer boa lembrança que possa ter dessa noite, sendo um tremendo babaca, mas não foi por sua causa. As coisas saíram um pouco do controle na minha cabeça.

Não havia nada mais que ele pudesse dizer e a resposta dela demorou a vir.

— Eu nunca fiz isso ou algo parecido – explicou ela, baixando a guarda.

— Isso o que?

— Isso – olhando para a cama -, assim, na primeira noite, sem conhecer a pessoa direito.

O rubor que tomou o rosto dela fez seu peito queimar, queria tomá-la nos braços novamente e repetir o que viveram há pouco, ainda com mais sofreguidão.

Cruzou os braços junto ao corpo, tentando conter qualquer ímpeto.

— Se vamos falar sobre primeira vez, digamos que foi minha primeira vez também – ele confessou.

— Não acredito – Maite declarou diretamente.

— Não, não foi minha primeira vez com uma total desconhecida, mas foi a primeira vez que depois de tudo, eu quis ficar. – Ele fixou seus olhos nos dela, para que ela não pudesse encontrar nenhum vestígio de dúvida no que ele estava prestes a dizer. – A primeira vez que quis saber mais do que o nome e a bebida preferida. Que me vi desejando o que vem depois, o dia seguinte, os próximos encontros e todas as responsabilidades. E tudo isso me deixou assustado, por isso, eu estava...

— Christian - ela o interrompeu, se aproximando -, você não precisa me dizer todas essas coisas.

— Mas quero dizer, porque estava prestes a fazer algo ruim. Estava indo embora sem ao menos me despedir, correndo o risco de deixá-la imaginando coisas que não são verdade sobre si mesma. – Ele desistiu de lutar contra si mesmo e a tocou no rosto, acariciando-o com o polegar – Me desculpe, por favor.

Maite colocou sua mão sobre a dele e ergueu-se sobre os joelhos, o lençol deslizou por seu corpo e a deixou vulnerável ao ar gelado novamente. Christian ergueu a cabeça para olhá-la nos olhos e entender o que ela queria. Os olhos dela estavam marejados e ainda mais escuros, o peito arfava, quase como um reflexo do dele e, então, ele a envolveu em seus braços e prometeu a si mesmo que não cometeria os mesmos erros uma segunda vez.


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