Querido Sr. Han escrita por Mel Yule


Capítulo 3
2


Notas iniciais do capítulo

Música do capítulo: https://www.youtube.com/watch?v=l1RCPzR1qEw

Novamente, precisei alterar as falas e um pouco da história do jogo para torná-lo mais real. Isso será constante daqui pra frente. Espero que compreendam =)



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Everyday do you notice that we're never free

Why can't you be happy with me? — Happy with me (Holychild)

 

Gastei algumas horas do meu dia atrás de informações passadas sobre as festas da R.F.A e como Rika conseguia organizar tudo. Quando me dei por satisfeita, e já com a cabeça dolorida de tanto forçar a visão, fui obrigada a procurar no guarda-roupa da ex-moradora alguma toalha para, enfim, tomar banho. Torci para que V jamais descobrisse essa minha pequena ousadia.

Debaixo da água quente do chuveiro, comecei a pensar no giro de 180º que minha viagem levou. Até ontem, eu estava correndo atrás de pontos turísticos, registrando tudo em fotos no Instagram e em “mini-vlogs” que mandava para Jane. Para uma pessoa tímida feito eu, ser obrigada a interagir com pessoas de outro país e me expor em fotos era demais além da conta.

Agora, além disso, ainda precisaria organizar uma festa, entrando em contato com vários magnatas coreanos. Com o que diabos eu tava na cabeça?

Continuei gastando um bom tempo para entender o que me levou a aceitar tão facilmente o convite da R.F.A. A voz de Jane continuava reverberando nos meus ouvidos: “Faças coisas novas!”.

Eu não precisava seguir tão à risca, né?

Só quando saí do box do banheiro, percebi que precisava vestir a mesma roupa com a qual passara o dia. Não me sentia bem nem de pensar em usar os trajes de Rika – e, mesmo se eu fosse capaz de tanto, duvidava muito de que algo naquele guarda-roupas coubesse em mim. Por isso, liguei quase desesperada para Seven.

Ele não atendeu de primeira.

Continuei insistindo.

Nada.

Eu já estava prestes a desistir e a pedir ajuda para Jaehee, pelo amor de todos os deuses, quando finalmente ele me atendeu:

— Deus Seven falando! Qual o desejo que a jovem Greta gostaria de realizar?

— Roupas! – disparei sem pensar muito sobre como aquilo soaria. — Não posso ficar presa num apartamento vestindo a mesma coisa, Seven.

— Isso quer dizer que você está... – escutei a risada que ele inutilmente tentou abafar. Respirei fundo e ignorei aquele risinho sacana.

— Precisando de roupas. De preferência as minhas – me dirigi à cozinha, enrolada à toalha. A geladeira estava praticamente vazia. — E comida também. Tem como você providenciar essas coisas pra mim já que, tecnicamente, estou presa?

— Greta, Greta, você não está me ajudando a raciocinar direito – a voz dele ganhou um tom cheio de duplo sentido. — Mas acho uma completa maldade que você esteja andando pelada por aí. Vou falar com a Jaehee para te ajudar com essas coisas mais básicas. Posso perguntar qual tamanho você veste?

 — Provavelmente, nenhum que exista nas lojas daqui – suspirei. — Tem certeza de que vocês não podem pegar minhas coisas no albergue onde estou hospedada?

— Isso seria te por mais em risco ainda. Estou dando o meu melhor para pegar o hacker o quanto antes, mas não posso te garantir que ele não está nos observando – Seven deu uma risadinha. Pelo pouco que eu conhecia dele, sabia que não viria coisa boa. — Você se incomoda em usar coisas menos femininas?

— Tipo...?

— Tipo... as minhas roupas?

Era isso mesmo ou aquele rapaz estava flertando comigo?

— Eu só me incomodo em estar presa num apartamento, sem comida e sem ter o que vestir – concluí, não dando margem para alongar aquele tipo de assunto. — E estou preocupada em ter de deixar o albergue sem dar qualquer satisfação.

Na verdade, havia várias outras coisas que me preocupavam, porém eu queria manter minha imagem segura e decidida. Se eu havia entrado nessa, iria até o fim.

— Vai ser por pouco tempo, prometo. O V não vai demorar muito a decidir a data da festa, e eu sou muito bom no que faço. Pode ter certeza de que a gente vai acabar com esse hacker.

— Obrigada, Seven – o tom de voz dele me deu algum conforto. Talvez fosse a fome. Pelo ronco que meu estômago deu, percebi que já fazia consideráveis horas que eu não comia.

— Vou falar com a Jaehee. Até mais.

Não havia dúvidas de que eu, de fato, teria uma porção de histórias para contar à Jane.

*

Seven não mentiu quando falou sobre as suas roupas.

Aparentemente, eu era alguns centímetros menor do que ele, então acabei ficando pequena dentro dos moletons, das camisas coloridas e com estampas nerds e das calças jeans. Também recebi algumas caixas de compras, que davam para me sustentar ali durante um mês – o que eu sinceramente esperava que não fosse o caso.

Conversei um pouco com Jaehee antes de tentar dormir, e ela me falou sobre as altas expectativas que tinha sobre mim. Disse que eu não deveria me sentir pressionada e que só falava aquilo porque queria me orientar e fazer tudo acontecer da forma mais perfeita possível. Indubitavelmente, eu a compreendi e não me afetei pelo excesso de precaução. Se fosse comigo, também estaria preocupada em ceder uma posição tão importante na organização de uma festa para uma estrangeira maluca que caiu do nada ali.

O sono demorou a chegar. Cabeça vazia, oficina do diabo. As lembranças costumavam me confrontar com frequência, me mostrando que, talvez, eu não estivesse cem por cento recuperada. Talvez eu nunca estivesse.

Eu estava a quilômetros longe de casa e, ainda assim, trazia algumas memórias comigo. Não a saudade dos meus gatinhos, do perfume das minhas plantas ou mesmo do aroma dos livros empilhados na minha livraria. Por mais que eu tentasse me focar nas coisas boas, no desejo de voltar para a Inglaterra com várias histórias para contar, aquele pensamento insistente permanecia na cabeça, me mostrando que não dava para jogar tudo num poço todas as lembranças ruins. Há certas marcas na alma que jamais conseguirão ser apagadas.

Era frequente eu ficar comparando a minha vida de agora com a de antes e, inevitavelmente, acabava me lembrando de Rupert. Não pensava mais em como eu gostava de deslizar meus dedos por seus cabelos ruivos, ou de como seu sorriso parecia se iluminar ao me encontrar. Isso ficou numa realidade muito distante. O que voltava a minha cabeça eram as palavras grosseiras; a manipulação psicológica; o ciúme doentio; a distância que ele criou entre eu e meus poucos amigos, fazendo com que eu virasse sua propriedade. Um ano e seis meses atrás, jamais imaginaria viajar para tão longe de casa. Rupert não me permitiria; ele controlava qualquer um dos meus passos.

Foi por isso que Jane me mandou para a Coreia, sem ter chance de argumentar. Eu precisava sair, respirar um ar totalmente diferente e longe das minhas lembranças. Não estava funcionando cem por cento ir para pubs, curtir um cinema com minha irmã e minha cunhada, visitar meus pais na Irlanda, tentar paquerar outra vez. Nada disso era transformação, e Rupert havia estragado consideravelmente esses poucos passeios que eu fazia. Em casa, rodeada pelos meus livros, ainda encontrava uma válvula de escape para as dores que meu ex me causou.

Mas aquilo não era a vida real. Infelizmente, não era.

Cansada de remoer o passado, afastei as lembranças ruins e peguei o celular para reler as conversas do chat da R.F.A. Era o meu primeiro dia naquela confusão imensa e eu precisava entender quem era quem, como interagiam, como se apresentavam. Revi as fotos que os membros mandavam entre si e ri dos emoticons personalizados deles. Era tão... fofinho.

E enquanto eu olhava, sorrindo feito boba, percebi que alguém me chamava via chat.

“Ainda acordada, Greta?”

Jumin Han. Respirei fundo, observando sua pequenina foto.

“Apenas à procura do sono. Você também não deveria estar dormindo, Jumin?” – eu só o conhecia há um dia e por chat, porém havia algo nele que me deixava... Curiosa. Ao contrário de todos os membros da R.F.A., Jumin era fechado e demonstrava ser uma pessoa extremamente séria e cartesiana. Talvez o mundo dos grandes negócios endurecesse um pouco seus funcionários.

“De fato. Porém, estou resolvendo algumas pendências. E, aproveitando que estamos conversando, gostaria de dizer que estamos todos bastante entusiasmados em poder organizar festas novamente. Graças a você.”

Fui pega de surpresa. O que responder?

“Mas pessoalmente”, Jumin continuou, “não estou muito certo se devemos celebrar antes de termos a data da festa confirmada. Então, expressar animação antes do tempo é praticamente uma complicação para mim.”

“Há algo de errado em se entusiasmar antes do tempo?” , perguntei. Tão pragmático.

“Não gostaria de trabalhar para nada, se é que me entende.”

“Então você não quer se frustrar, certo?”

“Basicamente. Mas, mudando de assunto, me diga: você gosta de gatos?”

De fato, foi uma brusca mudança de assunto. Pisquei algumas vezes, tentando entender a conexão entre a festa e gatos, porém eu não me incomodava nada em falar sobre felinos.

“Tipo esses aqui?”, e enviei as fotos dos meus três gatinhos ao sol: Brownie, Snow e Pudim.

“Seus?”

“Meus três lindos bebês. Sou uma mãe orgulhosa.”

Em pouco tempo, a foto de uma gata branca e peluda saltou à tela. Não pude deixar de sorrir.

“Ela é um belo exemplo de uma bela gata”, Jumin digitou. “Parece elegante em qualquer pose.”

“Jumin Han também é um pai orgulhoso, pelo que podemos ver.”

“Nunca me vi como pai da Elizabeth 3ª. Mas concordo em dizer que ela é a minha melhor companhia. Eu gostaria de que pudéssemos passar mais tempo juntos, mas minhas viagens a negócios estragam os meus planos.”

“Compreendo perfeitamente bem. Eu também sofro quando fico longe dos meus gatos.”

“Você viaja muito, Greta?”

Quase nunca.

“De vez em quando, resolvo me aventurar num mochilão pela Ásia e ser caçada por hackers. Gosto da adrenalina, sabe como é.”

Não sei se Jumin tinha senso de humor para entender minhas péssimas piadinhas. Eu mesma não era a melhor pessoa do mundo para fazer qualquer um rir, mas tentava dar os meus pulinhos.

“Você é uma pessoa curiosa”, digitou. E lá estava o homem de negócios novamente. “Muito curiosa.”

“Segunda vez que não sei se está me elogiando ou não, Sr. Han. O que devo pensar?”

Jumin demorou a digitar. Não encarei isso de uma boa maneira, porém.

“Foi bom conversar com você hoje à noite. Não durma muito tarde e se certifique de fazer todas as suas refeições, certo? Tenha um bom sono, Greta.”

Ele saiu sem me dar a oportunidade de responder. Por isso, preferi pensar que Jumin Han havia me elogiado.

Era mais fácil de digerir.


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