O Dragão e a Rosa escrita por jameelah


Capítulo 3
A Lady da Maçã Vermelha


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo traz uma personagem original



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/710759/chapter/3

 

Um cesto com uma pilha de maçãs verdes e outro com maçãs vermelhas enfeitava o salão durante o banquete. Vez ou outra alguém se levantava para pegar alguma das frutas; a vermelha tinha preferência, como de costume, mas a verde tinha os seus apreciadores. Melodie Fossoway driblava os cães deitados no assoalho gelado enquanto recolhia alguns alimentos sobre a mesa para pôr dentro da própria cesta que carrega no braço.

Jardim de Cima estava cheio naquele dia. Senhores e Senhoras de toda a Campina marcharam para o castelo com o intuito de dobrar os seus joelhos para a nova rainha, ficando hospedados no lugar até o dia do grande e esperado casamento. A rainha Targaryen sentava-se em lugar de honra, ao lado da velha Olenna na mesa da frente. Contida, beliscava a carne de pavão e dava alguns goles no dourado da Árvore. O cabelo prateado de sua família se destacava devido o vestido negro de manga comprida e adornos vermelhos que ela estava usando. Melodie a achou bela, mas não tanto quanto os sussurros que ouvira durante a viagem diziam ser.

A atenção dos convidados se dividia entre a rainha dragão e o músico que tocava uma melodia agradável em um alaúde, ninguém pareceu dar importância ao que uma Fossoway estava fazendo andando para lá e para cá. Assim, Melodie não teve dificuldade de escapar do salão com a sua cesta, correndo pelo corredor feito uma menina que acabara de fazer alguma travessura.

A hóspede pôde vislumbrar as cavalariças depois de uma longa caminhada pelo castelo. Não conseguira evitar que a barra do seu vestido vermelho se arrastasse pela lama e pela grama, mas seguiu mesmo assim, sabia onde encontrar quem ela estava procurando. O clima estava estranho nos últimos dias desde que fora anunciada a mudança de estação. Ontem a neve chegou a assolar Jardim de Cima, mas o dia de hoje amanheceu quente e o sol tratou de derreter o que a neve havia coberto.  

Os homens e rapazes que estavam no lugar lançavam olhares curiosos para Melodie, que se viu forçada a distribuir sorrisos simpáticos por onde passava. "Ele tem que estar aqui em algum lugar". Encontrou Willas saindo de uma das cavalarias na companhia de dois homens que deveriam ser homens dos cavalos; estava trajando uma camisa de algodão branca e calça e bota de couro marrom, além da sinta que auxiliava a sua perna.  Se não conhecesse o Senhor de Jardim de Cima, o tomaria por mais um dos tantos maltrapilhos que passaram por ela.

— Willas! – disse Melodie, mais alto do que esperava. Longe do senhorio, ela se sentia como se só estivessem os dois ali.

Willas lançou um olhar de espanto em sua direção e, quando a reconheceu, acenou. Ela fez o mesmo, acenando como uma garotinha excitada por encontrar os primos depois de muito tempo. Quando chegou até ele, os dois sujeitos que o acompanharam já tinham sido dispensados.

— O que faz aqui, Lady Fossoway? – Ele disse todo cortês, mesmo trajando uma camisa suja do que parecia ser lama e estando encharcado em suor.

Encontraram-se ontem quando ela chegou ao lar dos Tyrell, mas não tiveram tempo de falar por muito tempo. Ela lamentou as mortes do Lorde Mace, Margy e Loras, contou-lhe sobre como ela e a senhora sua mãe passaram cinco dias e cinco noites chorando em Solar de Cidra quando o corvo vos trouxe a notícia e de como todos de sua família farão de tudo para buscar a cabeça da rainha Lannister.

— Lady Fossoway? Willas, por favor... Ou quer que o chame de Lorde Willas enquanto estamos sozinhos?

Quando menina, Melodie costumava ser trazida para Jardim de Cima ao menos uma vez durante o ano para fazer companhia a Lady Margaery, isso fez com que todos eles se tornassem bons amigos.

— Não, melhor. De Vossa Graça? – continuou Melodie, tomando o braço sujo do seu velho amigo. – Eu trouxe algo para a Vossa Graça comer, suponho que está com fome já que não compareceu ao banquete.

Willas deixou escapar um sorriso modesto através da barba desleixada que cobria o seu rosto, Melodie riu de volta e o arrastou até os fenos em frente a estrebaria. “Ele é tão lindo quando ri”, ela pensou.

— Não sou nenhum rei. – ele protestou. – Se fosse, seria o mais deselegante deles. Peço perdão por isso, mas uma guerra se aproxima e me parece mais urgente que o cavalheirismo da Campina.

Melodie deixou a cesta com os alimentos ao lado de Willas e o ajudou a sentar sobre a pequena camada de feno que formava um tapete sobre a grama em frente a estrebaria. Ele estirou a perna ruim e encostou as costas na parede até que descesse lentamente até o chão, enquanto isso contava para ela sobre o filhote que acabara de nascer e de como seu método de cruza de animais continuava a produzir os melhores de todo reino.

— Ainda sonha em gerar um cavalo alado? – Ela perguntou num deboche sutil.

Willas lançou um olhar divertido para ela enquanto terminava de mastigar um pedaço do pão que pegara da cesta.

— Ora, por que não? Se os dragões voltaram a existir, que mal haveria num cavalo com asas?

“Dragões”, Melodie se lembrou da rainha e o seu riso morreu.

— Eu sinto muito pelo Sor Imry Florent, soube que ele morreu na Batalha de Água Negra. – Willas falou após devorar o pão por completo.

— Ah sim... Ele era um bom homem, sinto muito a sua falta. – Ela mentiu. Não sobre a parte de ser um bom homem, mas sobre sentir a sua falta. – Uma pena que tenha lutado pela causa errada.

Melodie casou com o Sor Irmy Florent logo depois que o seu Willas partira para a Cidadela. Lembrou-se do dia que soube daquela notícia, de como se trancou em seu quarto e passou uma semana em greve de fome, na esperança de que seu sacrifício chegasse aos ouvidos do rapaz e ele desistisse da ideia. “Estou vivendo isso tudo de novo.”, ela pensou, “Os Deuses renovaram as minhas esperanças de casar com o homem que sempre amei só para arrancarem isso de mim outra vez”.

— Lutar pela causa errada... – Ele pegou a maçã vermelha que ela trouxe e lançou-lhe um olhar vazio. – Temo que os Tyrell não possam falar muito a respeito disso. – Disse com frieza na voz.

“Mesmo assim falaram”, pensou Melodie subitamente. Após a derrota do Rei Stannis em Porto Real, a Casa Florent foi encarada como rebelde e a Fortaleza de Águas Claras passou para o domínio da coroa. Lorde Mace parece ter convencido o rei garoto a entregá-la para o primo Sor Garlan.

— Fico feliz que tenham permitido que eu voltasse para Solar de Sidra. Garlan será um bom senhor para Águas Claras. – Tentou disfarçar a falsidade em sua voz. – Quando ele chegará?

— É, será. Em breve. Acredito que hoje mesmo ele deva chegar a Jardim de Cima. – Willas deu um gole na garrafa com vinho que trouxera e a jogou de volta na cesta. – Agradeço pelo almoço, Mel. Poupou-me uma boa caminhada. – Limpou a boca com as costas da mão.

“Mel”, ela amou ser chamada por esse nome. Era como ele, os primos e os irmãos a chamavam quando eram meninos. O apelido a fez sentir liberdade para agir como antigamente.

— Eu sabia que o encontraria aqui. – Disse uma sorridente Fossoway antes de tomar o braço do antigo amigo que estava em seu lado e deitar a cabeça sobre o ombro dele. – Não fez a barba, faltou a um banquete cheio de convidados importantes, veste trapos e cheira como um camponês, onde foi parar o seu cavalheirismo Lorde Willas Tyrell?

Melodie sentiu o ombro do amigo enrijecendo quando ela deitou a cabeça sobre ele, mas logo o mesmo relaxou e ela se sentiu mais confortável.

 – Soa como a minha avó. – Brincou Willas. – As pessoas costumam perdoar o aleijado pela ausência nesses eventos.

A hóspede deu uma leve tapa no braço do Tyrell, depois o apertou e voltou a se aconchegar em seu ombro.

— Isso é preocupante... – Olhava para frente, vendo pessoas carregando cavalos para cima e para baixo. – Será que minha prima Leonette está vindo com o seu primo?

Leonette era Fossoway da maçã verde e, assim como Melodie, também vinha ao castelo para fazer companhia a Margaery. Garlan crescera em Jardim de Cima e foi assim que eles se conheceram e se casaram. “Daria tudo para voltar para aqueles dias”, pensou ela, saudosa.

— É provável.

— Se lembra de quando éramos meninos? Gostávamos de imaginar que a Leonette casaria com o Garlan e eu com você.  

Uma rajada fria de vento passou por eles, obrigando Melodie a tirar a mecha de cabelo que tampou a sua visão. Willas permaneceu em silêncio por alguns segundos, até que resolveu responder:

— Lembro sim, como poderia ter esquecido? Foram bons tempos de jogos e brincadeiras de criança.

“Brincadeira de criança”, Melodie não gostou de ouvir aquilo.

— Temo que nossos primos tenham levado a brincadeira muito a sério. – Provocou ela sorrindo maliciosamente.

Antes que o lorde ensaiasse qualquer resposta, uma voz soou ao lado deles.

— Lorde Willas.

Era a rainha Daenerys acompanhada de duas ladies campinenses que deveriam ser as suas damas de companhia. Melodie se levantou rapidamente, como se se sentisse culpada e condenada por algum crime.

— Vossa Graça. – Ela disse, curvando-se.

Quando se recompôs, Willas já estava de pé com a sua bengala.

— Minha rainha. – Ele falou.

— Está na hora de alimentar os meus dragões. Como você não me procurou, vim conferir se ainda deseja me acompanhar.

O olhar da rainha era frio como uma pedra.

— Peço a sua licença, Lady Melodie. – Disse Willas antes de caminhar em direção da futura esposa.

Melodie respondeu com um aceno.

— Acabei me distraindo com lembranças de infância – Ele falou enquanto seguia até a rainha. – Peço perdão.

Daenerys o tomou pelo braço, ignorando quando o mesmo argumentou que estava sujo.

— Senhoras, podem voltar para os seus cômodos. Eu e o Lorde Willas iremos sozinhos a partir daqui.

— Sim, Sua Graça.

E os dois seguiram lado a lado ao encontro das bestas que a rainha trouxera do outro continente. Melodie recolhera a cesta do chão e assistiu a caminhada dos noivos em silêncio. “ele não a ama”, convenceu-se, “Esse casamento não irá acontecer”.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

A princípio ia usar a Leonette, mas resolvi que seria bom adicionar o Garlan nessa história também, mesmo que seja como um primo querido. Daí nasceu a Melodie.