Coletânea: Realidade Abandonada escrita por Cloo Muller


Capítulo 2
Lâmina da Violência


Notas iniciais do capítulo

Propositalmente, deixei este texto bem vago. Espero que gostem.



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O sino soou, avisando o término da aula.

Os alunos começaram a guardar seus pertences com rapidez, era tarde de sexta-feira e todos queriam correr para suas casas, quase todos. Esther, uma morena clara de cabelos escuros, aparentemente de doze anos. Guardava seus materiais na mais calma possível, porém, seu coração palpitava desesperadamente, já sabendo o que estava por vir naquele fim de semana.

Chegando em casa, sua mãe a recebeu com um abraço sem dizer uma sequer palavra, mas os olhos claros refletiam sua alma e traduzindo o silêncio, estava triste, angústia… Com medo.

As horas se passaram e ele ainda não havia chegado, ambas só poderiam jantar caso estivesse junto. Porém, hoje estava atrasado. Talvez, esse dia terminasse sem dor, sem choros, como raramente acontecia.

Infelizmente não, ele chegou embriagado e muito alterado, como todas as que bebia. Adentrou a casa cuspindo por onde passava e sentou-se na mesa para jantar. A comida não estava do seu agrado, ele queria um “cardápio mais caprichado, novo”. Esther pode entender quando uma lágrima escorreu nos olhos daquela mulher a sua frente e correu para o quarto.

Tentava tapar os ouvidos encolhida atrás da porta, esperando.

Mas os tapas e gritos de dores davam para serem ouvido de qualquer maneira. Seu desejo era sair correndo pedir ajuda, porém, as duas haviam sido ameaçadas de morte se ousassem algo parecido.

Abriu a mochila desesperadamente atrás de um fone de ouvido, seu refúgio, mas não os encontrou. Sentindo-se a pessoa mais covarde naquele miserável mundo, pegou um canivete escondido debaixo do colchão e tirou a calça jeans que estava vestida, deixando amostra as várias cicatrizes dos cortes que fira em si mesma por meses a fio. Jogou-se na cama fechando os olhos, e a cada som, a cada gemido e choro, um corte era desenhado em pequenas linhas retas. Ninguém sabia deles, sempre usava calças ou bermudas até os joelhos para escondê-los. Sua mãe sofreria se descobrisse, mais do que já sofria apanhando de um homem maldito todas às sextas.

Um tapa, outro corte…

A escola era o porto seguro, se esforçava ao máximo para tirar as melhores notas, afinal, naquele inferno sua mãe ao menos poderia sorrir com o boletim da filha e com elogios feitos pelos professores.

De qualquer forma,seu pai sempre dizia: “Notas ruins, merecem castigo”

Um gemido, outro corte…

Ninguém entenderia. Cortar-se enquanto a mãe é espancada era a única forma de sentir a dor dela, já que sua mãe não a deixava apanhar também “Quando eu der um sinal, corra para o quarto. É uma ordem”.

Aquela tortura estava no fim. Escutou ele avisando com aquela voz medonha.

Então, um último choro abafado e a lâmina do canivete escorregou profundamente na parte interna da coxa, fazendo o sangue jorrar para fora do seu corpo já debilitado. Assustada, arrancou o lençol da cama, pressionando-o no ferimento. Acertara a artéria.

Antes de gritar por socorro, ouviu a porta da sala sendo batida com brutalidade, então chamou a mãe, mas desmaiou antes que a mesma chegasse ao seu encontro.

A luz era branca, assim como as paredes daquele cômodo desconhecido, fazendo os olhos de Esther arderem com a tentativa de abri-los.

Com a visão turva, não conseguiu identificar um homem de farda azul usando um colete preto posicionado a porta, tão pouco o rosto roxo e inchado da mãe. Lutando contra o cansaço do corpo para manter-se acordada, viu o soro pendurado, pingando lentamente, suas vistas voltaram a escurecer, mas antes, pode reconhecer a voz da mãe, ela estava calma, sentia um alívio vindo dela.

—  Pode descansar minha pequena, estamos livres.


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Notas finais do capítulo

Como vocês perceberam, abordei mais de um tema. Se puderem comenta-los e junto expressar suas opiniões, ficarei muito feliz.
bjs e até a próxima :*