Camp Paradise - Interativa escrita por Aninha


Capítulo 4
Prólogo III - Brigas, festas e muita lama


Notas iniciais do capítulo

Oi! N demorei tanto dessa vez, né? Considerem esse capítulo como presente de ano novo adiantado.

DEDICO ESSE CAPÍTULO À: Todas as meninas do grupo - Maria_Misty,Time Lady, Jenni, Sayume Nimble, AURORA, Bonnie Blow e Greetings from Califournia! Obrigada garotas por responderem minhas perguntas (por mais estranhas que sejam às vezes), por me motivarem e por serem simplesmente incríveis e muito especias ♥ *enxuga as lágrimas*

A música do capítulo é Mad Hatter - Melanie Martinez ^.^

Boa leitura!



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Oliver Bier, Ollie

Suspirei sentado em um degrau da escadaria que levava ao Refeitório. Alguns campistas passavam por mim de vez em quando, a maior parte acompanhada e rindo como idiotas. Aqueles que me olhavam com sorrisinhos amigáveis logo o perdiam ao ver minha cara fechada e minhas sobrancelhas levemente franzidas. Olhei para o céu claro com poucas nuvens e em seguida para a imensa floresta de coníferas que balançava levemente com a brisa.

Enxuguei uma gota de suor que escorria pela minha têmpora e lembrei-me da hora anterior quando entrei no Refeitório, assim como dezenas de campistas, e me arrependi deste simples ato.

 Assim que você passa pela grande porta de madeira se vê num espaço amplo e bem iluminado, com grandes janelas e lustres espalhados. Uma mesa com seis cadeiras grandes e acolchoadas com as cores de cada Irmandade fica de fronte a porta de entrada. As outras seis mesas — uma para cada Irmandade e outra para as Larvas — ficam espalhadas de modo organizado pelo resto do ambiente. As mesas e cadeiras dos campistas são compartilhadas e não são acolchoadas, apesar de serem surpreendentemente confortáveis. O que diferencia uma mesa de outra são as toalhas com cores das Irmandades e bordadas com os animais de cada uma.

Então, obviamente, não foi pelo ambiente que me arrependi de entrar no Refeitório, mas sim pelo barulho infernal que todos aqueles campistas faziam na hora. Rindo, conversando e gritando tão alto que tive vontade de atirar na cabeça de cada um ali. Mas tudo aquilo valeu a pena quando todos ficaram em silêncio, chocados demais com o que a Líder disse. Ainda lembro muito bem de suas palavras: Todos coloquem seus celulares e aparelhos eletrônicos nas caixas que estão sobre a mesa. Vocês estão proibidos de utilizar esses aparelhos durante sua estadia. Em caso de necessidade de falar com alguém no exterior temos telefones nos Chalés e na recepção. A Biblioteca possui computadores para o caso de emergências e vocês podem escrever quantas cartas desejarem que daremos um jeito de entregá-las.

É claro que a essa declaração surgiram muitos barulhos de protestos, mas ela silenciou a todos com um simples Seus pais sabiam disso quando os colocaram aqui e assim todas as ofensas foram dirigidas aos progenitores. Um a um os campistas carrancudos foram colocando seus aparelhos nas caixas e depois o almoço teve início. Funcionários entravam com cardápios e fazíamos nossos pedidos dentro de algumas opções: três vegetarianas, três carnívoras e três onívoras num típico almoço à francesa, como uma garota sentada ao meu lado disse animada a sua amiga.

Foi nesse exato momento, no meio de um devaneio, que alguém tropeçou em mim e quase caiu. Pisquei voltando ao presente e dirigi meu olhar à criatura de tamanha inteligência e me deparei com um garoto com cabelos na altura da cintura, pele negra, olhos castanhos escuros e uma barbicha ridícula.

— Cara, isso não é lugar pra sentar! — Ele exclamou me encarando com raiva.

— Como é? — falei, me levantando e ficando alguns centímetros mais baixo que ele. — Você que é besta demais pra saber para onde está andando. Estou aqui há mais de uma hora e você foi o único que tropeçou em mim.

— Talvez porque eu tenha algo na cabeça ao contrário da maioria — ele falou, estralando os dedos.

— É, piolho — falei com deboche e respirando fundo.

Nesse momento o garoto me puxou pelo colarinho da minha camiseta até ficar a centímetros do meu rosto.

— É melhor você ficar quieto se não quiser apanhar, magricela.

— De quem, de você? Garanto que a Líder do Búfalo me garante uma briga bem mais divertida do que você.

O garoto me deu um soco de direita direto no rosto, me soltando e jogando para trás. Cambaleei por alguns instantes, mas logo me firmei e dei-lhe um soco no estômago, mas ele antecipou o movimento e tentou me derrubar. Soltei-me e desci os degraus de costas, os olhos cravados nele. O garoto desceu atrás de mim e reparei em seus músculos avantajados, nas mãos grandes e nos caninos estranhamente afiados. Mas não engoli em seco nem dei pra trás, apesar de saber que ele provavelmente acabaria comigo. Afinal de contas, não importa o quanto você bate, mas sim o quanto aguenta apanhar e continuar.

Como estávamos relativamente longe demais para usar os punhos, ele tentou me fazer cair com uma rasteira, mas antecipei seu movimento e saltei sobre suas pernas. Olhei ao redor e percebi que alguns campistas se aproximavam diante da possibilidade de uma briga logo no primeiro dia, e esse foi o meu erro.

Num momento eu estava de pé, olhando ao redor após ter escapado de uma rasteira e no outro estava no chão com o garoto em cima de mim me dando vários socos no rosto, garganta e lateral do corpo. As pessoas ao redor começaram a entoar "Briga, briga, briga!" como o bando de sem cérebros que são. Eu sentia sangue escorrer do meu nariz e minha têmpora começar a latejar quando alguém o tirou de cima de mim.

Tudo ficou tão estranhamente quieto que me perguntei se teria desmaiado. O sol invadia meus olhos de forma direta o que apenas piorava minha dor de cabeça. Estreitei os olhos e uma figura feminina se ajoelhou ao meu lado, se inclinando sobre meu rosto. Reconheci o cabelo castanho comprido, a pele clara, os lábios vermelhos e principalmente os olhos penetrantes de Elizabeth Manson.

Ela examinou rapidamente meus machucados e ordenou que dois campistas me ajudassem. O Líder dos Ursos e um campista dessa Irmandade se aproximaram com uma espécie de maca que depositaram do meu lado. Com um movimento rápido e doloroso, me colocaram sobre o que constatei ser uma maca de madeira com espaços nas extremidades que permitiam que essa fosse carregada. Olhei levemente para o lado e vi Jason Blood segurando o garoto que havia me batido, que apesar de me encarar furioso parecia levemente arrependido.

Depositaram-me num carrinho modificado e com o sacolejar do mesmo entrei no mundo do inconsciente.

Algumas horas depois...

Acordei e estreitei os olhos. A luz branca que vinha do teto era muito forte, a ponto de fazer minha cabeça latejar. Tentei levantar, mas meu corpo inteiro doeu e tudo girou. Voltei a deitar, batendo a cabeça com força no travesseiro.

Percebi que estava deitado em uma cama nem muito macia nem muito dura, com um lençol levemente áspero me cobrindo da cintura pra baixo. O travesseiro fofo e macio parecia diminuir minha dor de cabeça. Fechei os olhos e me concentrei em meu sentido preferido: a audição, o ver sem enxergar. Algo apitava ao lado da minha cama, provavelmente um aparelho que media meus batimentos. Uma agulha estava presa a minha veia, injetando um soro muito provavelmente transparente. Do lado de fora era possível ouvir sons de passos, pessoas conversando baixo e mais ao longe de gritaria e risadas. Franzi ligeiramente as sobrancelhas, o que fez alguém rir pelo nariz. Alguém muito perto de mim.

Abri os olhos e me sentei de supetão, olhando para o lado a fim de enxergar quem é que esteve ali do meu lado todo aquele tempo, tão silencioso quanto um espírito. Mas tudo o que consegui foi uma forte tontura.

— Calma, campeão — uma voz feminina disse, enquanto mãos gentis, porém fortes me empurravam para baixo. — Acho que uma batalha por dia está mais do que bom pra você.

Mantive os olhos abertos e pude encarar os olhos claros de Elizabeth que me olhava de volta, num misto de diversão e raiva. Assim que me deitei, ela voltou a se sentar na cadeira que estava do lado da cabeceira da minha cama, pegando um livro (Sherlock Holmes, Volume 1 – Arthur Conan Doyle) do assento. Ela folheou o livro por alguns minutos até achar a parte que queria e voltar a se concentrar completamente na leitura. Reparei que ela usava óculos de armação grossa e quadrada e que seu cabelo estava preso num coque alto com alguns fios caindo sobre seu rosto.

Ficamos alguns minutos em silêncio. Fechei os olhos e de fato constatei que se não soubesse que a garota estava ali eu poderia muito bem afirmar que estava sozinho. Por fim, cansado de tudo aquilo, respirei fundo e esfreguei meus olhos com os dedos.

— Veio até aqui só para ler? Achei que uma Líder fizesse mais do que se esconder com moribundos.

Ela sorriu de lado e ainda sem desviar os olhos do livro disse:

— É fascinante como uma mente culpada sempre acaba se entregando, querendo ou não — ela falou, marcando a página como uma folha de árvore e fechando o livro. — E sobre se esconder, é você que o faz através de uma fachada arrogante, Oliver, não eu.

— Certo — falei, sarcástico. – Você se esconde no Me respeitem, sou a Líder.

Elizabeth depositou o livro e os óculos no armário do lado da cama, se levantou e sentou na cama, ao lado do meu quadril. Fiquei quieto, encarando-a e ela sustentou meu olhar. Por fim, suspirou e sorriu de lado de modo macabro.

— Sim, me escondo nessa máscara enquanto não posso revelar minha verdadeira forma. Mas cansei de brincar com você. Já ouvi a versão dos fatos de Kenai, agora quero a sua.

Engoli em seco. Não, Oliver Bier. Não vai me dizer que está intimidado por uma garota que é uns 20 centímetros mais baixa que você!

— Então o nome dele era Kenai — falei com um sorriso de deboche.

— Kenai Nimble, 18 anos, da Filadélfia, Pensilvânia. Agora se quiser parar de enrolar, como você mesmo me lembrou, sou uma Líder e tenho mais o que fazer.

— Por que quer ouvir minha versão? Vai fazer o que depois, me punir?

— Pode deixar que dessa parte eu cuido — ela falou, desviando o olhar para a janela que eu não tinha reparado. — Apenas fale, Oliver. A menos que queira voltar para aquela terra de caipiras. A escolha é sua.

Respirei profundamente e a encarei, mais irritado comigo mesmo do que com ela. Relaxe, Oliver, tudo isso está no sistema. Ela não pode ler mentes. Ou será que pode?

Franzi ainda mais as sobrancelhas, esfreguei os olhos e encarei o teto. Por fim, falei para ela minha versão dos fatos. Ela fez algumas perguntas e devo dizer que a maioria não fazia sentido para mim. Por fim, falou:

— É verdade que ele te alertou? Mandou você parar, avisando que bateria em você, mas você apenas o irritou ainda mais?

Eu sabia que aquela pergunta poderia definir muitas coisas. Eu poderia falar que ele não me alertara e que apenas partiu pra cima, ou seja, mentir. Eu poderia falar que ele me deu um soco e depois alertou, ou seja, mentir. Ou eu poderia falar que sim, ele me alertara e eu o ignorei. E foi exatamente isso que eu falei, pois meu orgulho me impede de me rebaixar a um mentiroso.

Para minha surpresa, ao ouvir isso Elizabeth riu a ponto de gargalhar como eu nunca tinha a visto fazer. Acho que foi a primeira vez que a vi mostrar qualquer emoção que não fosse determinação ou raiva. Ela tinha descido de seu pedestal, tirado sua máscara e estava gargalhando. Seus olhos cinzentos e geralmente gelados como navalhas adquiriram um tom leve de azul ao redor da íris.

— Você... — ela falou entre risadas, segurando a barriga – É realmente... Realmente um idiota, Oliver.

— O que? — falei, sumindo com o sorriso mínimo que estava nos meus lábios. — Por quê?

— Talvez ache corajoso sair por aí, arranjando briga, sendo magricela do jeito que é. Apanhando para mostrar o quanto aguenta sem cair, sem chorar feito um bebezão e sair correndo pra mamãe — ela falou, me encarando séria. Suas íris tinham voltado ao normal. — Mas não é. Não há nada de digno em ser um saco de pancadas, motivo de risada dos demais. Reparou em todos aqueles campistas que estavam ao redor de você e Kenai? Cinquenta por cento estava com dó de você e os outros cinquenta estavam rindo. Então faça um favor a mim e a si mesmo. Antes de pensar em arranjar briga, antes de levantar esses braços finos, lembre-se disso e lembre-se do que vou dizer agora: É seu primeiro dia no Acampamento, por isso vou ser anormalmente compreensível. Mas da próxima vez, não conte com isso.

— Disse à garota que se esconde atrás de uma fachada. Seus amigos conhecem você, Elizabeth? Realmente te conhecem? Hein? — perguntei com raiva.

Séria, ela se levantou e caminhou até a porta. Quando estava a cinco passos da mesma, se virou para mim, a expressão vazia.

— Você irá para o Chalé das Larvas assim que sair daqui. Mandarei alguém ir com você para garantir que faça isso.

— Não preciso de uma babá.

Ela estava com a mão na maçaneta, quase saindo do quarto, quando se virou para mim, sorrindo de canto.

— É exatamente disso que precisa, Oliver. De uma babá e de amigos. E antes que eu me esqueça, é proibido caçar os animais da propriedade. Tenha uma boa temporada.

E saiu, fechando a porta tão silenciosamente que nem parecia que esteve ali. Fechei ainda mais a cara e bufei, sem saber se gostava dela ou não. Poucos minutos depois um enfermeiro entrou no quarto e examinou meu nariz, assim como a têmpora avisando que eu tivera uma pequena contusão, mas que ficaria bem. Ele chamou uma garota do Búfalo com cara de buldogue, dizendo que ela me levaria até o Chalé.

Tirei a camisola típica de hospitais e coloquei minhas roupas de novo. A garota estava esperando do lado de fora da porta e me acompanhou em silêncio até um carrinho. Percebi que a Enfermaria não era um chalé feito de madeira, mas sim uma casa de dois andares com aparência normal. Uma casa que você encontraria em qualquer lugar e que parecia estranhamente deslocada ali.

A garota deu partida e dirigiu em direção ao norte do Acampamento, passando pelo portão da entrada e dando uma leve guinada para a direita. Quando ela entrou na floresta pensei em perguntar se ela sabia onde estava indo, quando vi ao longe um chalé rodeado por campistas. Eu conseguia ouvi-los como se estivessem do meu lado.

Suspirei e falei:

— Malditos hormônios.

A garota riu e balançou a cabeça em negação.

— Effy estava certa quando disse que você parece um velhote reclamão.

— Ela e muito menos você me conhecem, então cale a boca.

Ela sorriu sem parecer se importar com meu palavreado.

— Você que pensa. Effy tem olhos em todo lugar. Conhece todas as idades, nomes e origens de cada campista, se duvidar sabe até do passado de cada um.

Ela ficou tanto tempo em silêncio que achei que tivesse terminado, mas então ela disse:

— E ninguém tem certeza sobre o dela.

Franzi as sobrancelhas. Então eu estava certo? Os amigos de Elizabeth de fato não fazem ideia de quem ela é de verdade? A garota estacionou a alguns metros da escada que levava a porta, completamente absorta em seus pensamentos. Desci do carrinho sem falar nada e caminhei para o Chalé das Larvas, avaliando-o.

O Chalé tem o tamanho de uma casa de campo de dois andares. Uma escadinha leva até a porta de entrada que possui uma pequena varanda na frente. Uma varanda bem maior circunda todo o segundo andar. O Chalé é feito de madeira escura com as vigas pintadas de branco. Duas grandes janelas, uma de cada lado da porta, dão vista para a sala de TV e a sala de estar. No andar de cima, onde parece ser os quartos, todos aparentemente têm sacadas.

Subi as escadas e entrei. No meu lado direito estava à sala de TV, com uma grande televisão de tela plana presa na parede da lateral do imóvel. Um tapete creme felpudo estava diante da TV e do sofá escuro, cheio de almofadas coloridas. Cortinas verde musgo estavam abertas permitindo que a janela desse vista para frente do Chalé. Alguns pufes de cores neutras estavam espalhados dos dois lados do sofá. Um armário baixo, que devia ter a altura dos meus joelhos, de madeira clara e porta de vidro mostrava cobertores e mais almofadas. Debaixo da TV, um armário um pouco maior feito principalmente de gavetas possui um aparelho de DVD, um de som, diversos filmes, boxes de séries e CD's. Uma plaquinha em cima dizia Para os dias chuvosos.

Alguns campistas estavam sentados no sofá ou espalhados no chão vendo um filme de aventura qualquer.

Do meu lado esquerdo fica a sala de estar. Outra cortina verde musgo enquadrava a janela. Um tapete com estampa de flores, borboletas e larvas ficava no chão entre várias poltronas marrom claro. Um lustre luxuoso estava pendurado no teto. Na parede lateral do Chalé um quadro grande mostrava a paisagem de um lago com uma igreja ao fundo, ambos cercados de árvores. Em baixo do quadro e do lado direito do mesmo — se você estivesse de frente para ele — uma estante marrom clara sem portas estava abarrotada de livros, de todos os tipos.

— Você deve ser Oliver Bier — alguém falou, desviando minha atenção do ambiente. — Sou Sam Cooper, uma espécie de guia para os novatos. Estava te esperando.

— Estava é? — falei com deboche, me virando para o garoto.

— Sim, você foi o único que não tinha vindo ao Chalé das Larvas ainda — ele falou, sorrindo, completamente alheio ao meu humor. — Tenho que te mostrar o Chalé e seu quarto. Acompanhe-me.

Ele me deu as costas e começou a andar pelo primeiro andar, me mostrando o ambiente. Sam com seu cabelo curto cor de areia, olhos escuros, pele nem morena nem branca, estatura mediana e magricela estava mais para um nerd do que para um campista. Ele tropeçou no próprio pé uma vez e quase derrubou a estante de livros, me mostrando que apesar de ser esforçado não parecia ter cérebro.

Atrás da sala de estar, separada por um balcão com superfície de granito preto, fica a cozinha com mais utensílios domésticos do que minha casa. Perguntei-me por que precisávamos de tanta coisa se tínhamos o Refeitório. O piso era de lajota cerâmica na cor branca e na parede lateral e a dos fundos do Chalé a cerâmica era verde folha. Os eletrodomésticos são de inox, assim como a maioria dos utensílios. Duas janelas que abrem para o lado de fora estavam com suas cortinas creme fechadas. No meio da cozinha, uma ilha com cadeiras amarelas ao redor serve de mesa.

E em uma delas uma garota de cabelo bem curto tingido de vermelho, pele clara e olhos mel estava sentada comendo um sanduíche. Assim que percebeu que tinha companhia, a garota engoliu e sorriu amarelo.

— Eu sei que a festa é daqui menos de duas horas, mas me deu fome então...

— Tudo bem, Evelyn, não precisa se explicar — Sam falou, rindo. Então se virou na minha direção. — Oliver, essa é Evelyn Brooke de São Francisco, Califórnia. Lyn, esse é Oliver Bier de Jackson, Wyoming.

A garota sorriu para mim, simpática. Apenas franzi as sobrancelhas e a encarei. Se uma pessoa precisa se desculpar por estar comendo, essa pessoa não é pra mim.

— Certo... — Sam falou, constrangido. — Vamos continuar. Tchau, Lyn.

Segui Sam até a parte de trás da sala de TV. Uma parede de vidro sinalizada por um adesivo de árvore, borboletas e flores separava aquele cômodo dos demais que eram estrategicamente interligados. Dentro daquela sala ficava outra televisão, sofá, tapete peludo e pufes com a única diferença que ali as caixas de som eram melhores e que o aparelho eletrônico estava conectado a vídeo games. Uma mesa de sinuca e outra de tênis de mesa também ocupavam o local, assim como jogos de fliperama. Uma estante estava com suas prateleiras cheias de jogos de tabuleiro e para vídeo game enquanto as gavetas eram ocupadas por controles e fios. Máquinas de refrigerantes e besteiras ficavam num canto, enquanto no outro, jogos de dança e de corrida estavam sendo disputados por alguns campistas.

No meio da parede dos fundos uma porta francesa dá para uma pequena varanda. Passando por ela, pude ver uma porta que dava para a cozinha, do lado esquerdo se você estivesse dentro do Chalé. A varanda dos fundos tem vista para uma clareira, com troncos deitados ao redor de um círculo de pedras.

— Essa sala possui paredes revestidas, que não permitem que o som passe, por isso a parede de vidro — Sam falou, enquanto me guiava para fora da sala. — Agora vamos subir e conhecer logo o seu quarto.

Sam caminhou até uma escada de madeira com o corrimão que imitava ferro que se encontrava no meio de tudo, ao mesmo tempo interligando e separando os ambientes e fiquei chocado comigo mesmo por não ter reparado naquilo antes. Subimos a escada e paramos no topo. O segundo andar é divido em três corredores — um para direita, outro para a esquerda e o último em frente. Todo o chão é revestido de um carpete claro e as paredes são brancas com vários quadros de paisagens, fases da vida de borboletas e plantas pendurados.

— Vocês realmente tem algo com borboletas — falei, examinando um quadro.

— Ora, esse é o Chalé das Larvas. Larvas. Vocês estão aqui, sendo apenas larvas, na esperança de que um Líder note vocês para que possam entrar em seus casulos e se tornarem lindas borboletas. Na verdade, não vão se tornar borboletas, mas você entendeu.

— Patético — falei, olhando para o teto. Mas em vez de encontrar madeira ou uma laje, dei com o céu. Aquela parte do teto é de vidro de modo que parece que você está a céu aberto. Arregalei os olhos de leve e franzi a testa pensando em quanto aquele Acampamento arrecada por mês.

— Legal, né? – Sam falou do meu lado, olhando para cima com um ar sonhador. — Devia ver a sala do Líder das Corujas ou a da Effy. Deixa isso aqui no chinelo.

Voltei meu olhar para os corredores, começando a me irritar de verdade com Sam e todo seu jeito nerd lunático de ser.

— Então, onde é o meu quarto?

O garoto voltou seus olhos para mim como se acordasse de um devaneio e olhou para os papéis de sua prancheta que eu nem havia reparado que ele carregava. Quando pareceu se localizar, pegou o caminho da direita e eu o segui. Passamos por várias portas escuras, dos dois lados do corredor e Sam me informou que todo ano o Acampamento recebia de 20 a 30 campistas novos. Avistei no final do corredor uma janela com vigas de madeira branca em forma de cruz, com uma mesinha de madeira marrom clara logo abaixo. Um vaso verde escuro com margaridas estava sobre a mesa.

Três portas antes da janela, Sam parou, bateu na porta da esquerda e aguardou. Passado alguns minutos, alguém abriu e ao reconhecer aquele rosto, olhei para Sam e falei:

— Você só pode estar de brincadeira.

Ele deu de ombros.

— Só estou seguindo ordens. Effy mandou que você e Kenai dividissem o mesmo quarto porque a) você está com uma contusão e pode ter problemas a noite e como b) foi Kenai que bateu em você, nada mais justo que ele cuidar de você. Considere-o como sua babá particular — estava erguendo meu punho para lhe dar um soco na cara dele quando Sam ergueu as mãos em sinal de rendição, se encolheu e continuou — Palavras dela.

— É, faça isso — Kenai falou com deboche, o quadril apoiado no batente da porta e os braços cruzados sobre o peito. — Bata no assistente dela e veja o que a garota é capaz de fazer. Aposto que ela some com seu corpo em menos de uma hora.

— Cala a boca — falei.

Eu estava fervendo de raiva. Elizabeth estava com certeza brincando comigo, me testando. Eu só queria minha espingarda para explodir seus miolos. Mas, apesar de tudo, tenho que admitir que ela está certa. Eu odeio esse Acampamento com seus campistas cheios de hormônios e sem cérebro, mas eu odeio ainda mais Jackson. Eu não gostaria de ser expulso e ter que voltar para casa e ser zombado pelo resto da minha vida por não conseguir ficar nem um dia num Acampamento.

Esfreguei os olhos com força e respirei fundo.

— Certo — falei, por fim, empurrando Kenai com o ombro e entrando no quarto — Mas a cama da direita é minha.

— Nem vem, Magricela — o garoto falou, se despedindo de Sam e fechando a porta. — Minhas coisas já estão do lado direito do quarto.

— Então as tire — falei, pegando minha mala que estava no chão.

Mas antes que Kenai retrucasse ouvimos um berro feminino vindo do final do corredor, seguido pelo barulho de portas sendo abertas e passos apressados. Kenai escancarou a porta enquanto eu apenas colocava minha cabeça para fora, revirando os olhos para tudo aquilo.

— Você tá de brincadeira! — Uma garota que reconheci como sendo Evelyn gritou do final do corredor.

— Qual é o problema? — um garoto alto, loiro e de pele clara usando a camiseta azul da Raposa perguntou.

— Ela coleciona insetos!—– Evelyn exclamou indignada apontando para sua colega de quarto. — Insetos!

— Telma? — o garoto da Raposa perguntou calmamente se dirigindo a garota de sobrancelhas grossas, cabelo meio mel e camiseta com estampa de borboletas.

— Não vejo nada demais nisso. São insetos, cara, insetos! — Ela falou visivelmente animada. — Sabia que o que mais existe no mundo são besouros? Deus definitivamente gosta deles, então qual é o problema de colecioná-los?

— O problema é que são nojentos, Telma. Livre-se deles — Evelyn falou.

— Nem pensar — a garota falou, indignada, mexendo no cabelo. — Eles estão mortos, dentro de caixas de madeira com tampa de vidro. Eles não fazer nada — e antes que a outra retrucasse, ela falou séria — Não. Se. Meta. Com. Os. Meus. Insetos. Você não disse que adora conhecer coisas novas? Pois então.

Mas, infelizmente, antes que as coisas pudessem esquentar o garoto Raposa falou.

— Telma está certa, Evelyn. Os insetos estão mortos e vão ficar do lado dela do quarto, não podem incomodar você. E imagine-se no lugar dela. O que faria se Telma mandasse você jogar fora algo de que gosta muito e que você sabe que não vai fazer mal a ela.

As duas ficaram em silêncio. Evelyn roeu algumas unhas enquanto pensava, por fim suspirou e sorriu constrangida.

— Vocês estão certos. Desculpe por tudo isso, meu ódio falou mais alto. Pode continuar com eles Tel se me garantir que eles vão ficar na caixa. Obrigada, Dylan.

Revirei os olhos e entrei no quarto, indo arrumar minhas coisas. Kenai continuou no corredor por mais alguns segundos, mas logo me seguiu fechando a porta.

— Bom... Então, Magricela? — Kenai falou colocando suas roupas no seu armário. — Preparado para a festa?

— Se não quiser briga apenas cale a boca.

Kenai riu com gosto enquanto entrava no banheiro.

— Você fala como se batesse muito, Magricela.

 

Mavis Bittencourt, Mavis

Encarei-me no espelho para ter certeza que estava tudo em ordem. Meus olhos verdes pareciam maiores graças à maquiagem. Minha pele clara estava impecável. Meus cabelos acima dos ombros, meio mel meio ruivos estavam soltos, bagunçados de um jeito bonito. Olhei para meu vestido preto de renda, justo na parte de cima, mas que se abria numa saia levemente rodada e para meus sapatos preto com prata de salto alto. Conferi tudo uma última vez no espelho de corpo inteiro no meu quarto, no Chalé do Búfalo.

— Mavis, é apenas uma festa num Acampamento! — Effy gritou do andar debaixo. — Se você não descer agora, vou sem você.

Bufei e revirei os olhos, ouvindo os passos da garota vulgo minha melhor amiga subindo a escada. Caminhei para o banheiro e estava terminando de passar meu batom vermelho quando ela abriu a porta do quarto e me encarou com raiva.

— Por favor, me lembre de chegar uma hora atrasada no dia do seu casamento, assim terei que esperar apenas uma hora e não duas por você — ela falou apoiada no batente da porta.

— Ok, rainha do drama, já estou indo — falei, saindo do banheiro e caminhando até ela, sorrindo. — Como estou?

— Linda, perfeita — Effy falou, sem nem me olhar, dando-me as costas e saindo do quarto.— E não a pra menos, estou te esperando faz quase uma hora. Todos do Chalé já saíram! Que ótimo exemplo de Líder você é — falou, sarcástica.

— Obrigada, fico feliz que tenha reparado — falei, descendo atrás dela. — Não pode me culpar, não é todo mundo que nasce divando como você. Sou uma mera mortal.

Effy revirou os olhos e riu. Chegamos ao térreo do Chalé e constatei que de fato todos do Búfalo já tinham ido à festa. Juntas, fechamos todas as janelas e cortinas rosa escuro para o caso de uma chuva de verão. Olhei para minha amiga e sorri de lado. Effy usava uma saia que ia até seu pé com estampa de galáxias, um cropped preto sem mangas, mas com alcinhas finas, levemente decotado que deixam parte de sua tatuagem de corvo amostra com um colar de pingente de raposa prata, uma sapatilha azul anil que mais parecia um tênis e seu cabelo estava preso num enorme coque bem feito, com alguns fios caindo charmosamente sobre seu rosto.

— Alguém com certeza vai ter um treco assim que te ver — falei, sorrindo marota.

Effy revirou os olhos e riu envergonhada, saindo pela porta da frente me mandando parar de enrolar. Entramos no carrinho e a Líder das Raposas dirigiu pela propriedade até o Lago, onde diversas tendas foram montadas ao redor do mesmo e de uma grande fogueira. Tochas fincadas no chão iluminavam o ambiente. Em baixo da maioria das tendas, mesas cheias de comida e bebidas, pufes, almofadas e tapetes para os campistas se sentarem e mesinhas baixas. Na maior tenda, uma pista de dança com DJ. Vários campistas estavam embaixo das tendas e no cais comendo, conversando e dançando.

Estacionamos perto dos outros carrinhos e começamos a caminhar pela grama em direção à festa quando comecei a ter problemas para andar. Effy, que caminhava na frente não percebeu que graças aos meus sapatos de salto agulha, eu estava afundando na grama a cada passo. Eu estava abrindo minha boca para chamá-la quando Jason Blood, Lucian Gonzalez e Matthew Morningstar se aproximaram, me fazendo esquecer momentaneamente do meu problema.

Jay estava com uma camiseta branca justa que destacavam seus músculos, uma calça jeans surrada e tênis de corrida. Seu sorriso cafajeste como sempre estava estampado em seu rosto e seus olhos azuis estavam incrivelmente penetrantes. Já Lucian vestia uma camiseta com estampa do Capitão América, uma calça jeans escura e coturnos nos pés. Perguntei-me se ele não estaria com calor, já que coturnos são extremamente quentes, mas ele sorria animado como se estivesse muito bem, obrigado. E por fim, Matt usava uma calça jeans com uma camisa social verde escura e all star.

Jay sorriu para mim quando o vento ergueu levemente meu vestido, numa típica cena de Marilyn Monroe e eu sorri de volta, levemente constrangida. Effy parou perto dos rapazes e começou a conversar com eles, quando se virou para trás me procurando. Ela me olhou confusa, perguntando-me por que não me aproximava quando seus olhos focaram meus pés e ela começou a gargalhar. Ótima amiga mesmo.

A princípio os garotos olharam para ela se questionando qual seria seu problema, quando Effy apontou para os meus pés e todos começaram a rir. Encarei-os com raiva, mas por fim fui vencida e comecei a gargalhar com eles.

— Não acha que está muito chique para uma festa no Acampamento, Mavis? — Lucian falou, se segurando para não rir enquanto Matt se aproximava para me ajudar.

 

Meus amigos não andam, eles correm

Mergulham nus em buracos de coelho por diversão

Estourando, estourando balões com armas

Ficando chapada de hélio

Nós pintamos rosas brancas de vermelho

Cada tonalidade de uma cabeça de pessoa diferente

Nesse sonho, tem um assassino

 Ficando bêbado com a lagarta azul

 

Ri e mostrei-lhe a língua.

— Você não tem que cuidar do seu irmão ou algo assim, Mamãe Coruja? — falei, segurando o braço forte de Matt e caminhando para uma das tendas com todos.

— Como assim? — Effy perguntou, olhando séria para Lucian. — Não vai me dizer que você ainda fica em cima dele, Lucian. O garoto já tem 14 anos! Se você continuar assim ele vai te odiar.

Lucian cruzou os braços atrás das costas e sussurrou algo para ela. Sorri de lado e puxei o braço de Matt para que este andasse mais rápido como se fosse uma criança o que o fez rir. Chegamos à tenda e corremos para a mesa que estava repleta de comida, eu com Matt e Jay de cada lado. Effy e Lucian tinham sumido no meio da multidão.

Eu estava me servindo de um sanduíche de atum quando Jason bateu na minha bunda, me assustando.

— Agora sim nos cumprimentamos devidamente — ele falou, sorrindo cafajeste com um copo na mão. Revirei os olhos e ri enquanto Matt parecia procurar alguém desesperadamente.

— Qual o problema, Matt? — perguntei, pegando o copo de Jason e tomando um gole, o que fez com o que rapaz me olhasse levemente indignado. — O que? Você bate na minha bunda e eu pego seu copo. Estamos quites.

— Só estou procurando alguém pra deixar vocês dois a sós. Já fui vela de Effy hoje, não preciso de outra rodada.

Jason e eu trocamos olhares cúmplices e com sorrisinhos safados começamos a fingir que nos agarrávamos na frente de Matt.

 

Estou descascando a pele do meu rosto

Porque eu realmente odeio estar segura

Os normais, eles me fazem sentir medo

 Os malucos, eles me fazem sentir sã

 

— Deixem Effy ver isso — Lucian falou, sorrindo e se aproximando sozinho.

— A Raposinha não pode falar nada — Jason falou com uma mão na minha cintura. — Ela com todas as suas regras de não pode fornicar, não pode isso e aquilo... Como se ela não ficasse se agarrando e fornicando com Dylan. *

Olhei atentamente para Lucian e reparei que o rapaz engoliu em seco. Soltei-me de Jason e coloquei a mão sobre o ombro de Gonzalez, perguntando suavemente:

— Onde Effy está?

— Está com Dylan — Lucian falou, tomando um gole de seu refrigerante.

Boa Mavis! E o prêmio de pessoa capaz de levar o humor dos outras ao centro da Terra vai para... Mavis Bittencourt!. Pigarreei e numa atitude idiota, dei uma encoxada em Lucian, o que fez o rapaz pular surpreso e rir.

— Vocês estão muito desanimados! — Exclamei. — Qual é galera, isso é uma festa, ânimo! Vamos todos para a pista dançar até o chão.

 

Sou doida, querido, sou maluca

A amiga mais louca que você já teve

Você acha que sou psicopata

Você acha que eu estou chapada

Diga ao psiquiatra que algo está errado

Pirada, completamente biruta

Você gosta mais de mim quando enlouqueço

Te digo um segredo, não estou alarmada

E daí se sou louca? As melhores pessoas são

 

As melhores pessoas são loucas

As melhores pessoas são

 

Dei as costas aos rapazes e comecei a rumar para a tenda onde o DJ tocava algumas músicas, animando os campistas. Olhei para trás e me certifiquei de que o grupo me seguia. Passei em algumas mesas pelo caminho, pegando comida e sendo cumprimentada pelos campistas do Búfalo.

Chegamos à pista de dança e começamos a balançar nossos corpos ao som da música. Matt deu um jeito de escapar dizendo algo como "Campistas do Urso fazendo merda". Jason logo saiu também alegando que o papo estava bom, mas que ele precisava dar uma volta e conhecer gente nova.

— Sei — Lucian falou, rindo.  Você quer é conhecer as meninas.

Jason riu e deu seu sorriso cafajeste.

— O que posso fazer se todas me querem?

Lucian e eu rimos com gosto enquanto ele caminhava para longe de nós. Dançamos mais um pouco e decidimos dar uma volta para ver o movimento. Reconheci algumas novatas com quem eu tinha conversado à tarde. Avistei Telma, Dominique, Calíope, Maxine e Ártemis sentadas em pufes numa das tendas, comendo e conversando. A novata do Urso, Dawn, interagia com seus novos companheiros de Irmandade. Kenai e Oliver que estavam no soco há apenas algumas horas atrás agora conversavam com Matt perto do Lago. Vi Effy sentada na ponta do cais conversando com Dylan, o irmão mais novo de Lucian, Carl, e com uma garota de cabelo vermelho que eu ainda não tinha conhecido. **

Lucian e eu sentamos numa tenda e ficamos em um silêncio constrangedor por um longo tempo. Não que não sejamos amigos, mas as coisas quase sempre ficam constrangedoras quando estamos só nós dois. Lembrei-me de quando nos conhecemos e sorri.

Eu estava no Acampamento há dois anos e Effy a três. Naquela época já conhecíamos Jason e Matt — ambos tinham se tornando amigos de Elizabeth no ano que ela foi para o Acampamento e eu não. Naquela temporada, Carl de onze anos entrara no Acampamento acompanhado de Lucian, de 15, que veio para o Paradise apenas para cuidar do irmão. Deste modo, Lucian estava extremamente desanimado com relação a tudo, pois acreditava que ficaria dois meses cuidando do irmão no meio do nada. Foi então que Effy o conheceu e mudou a visão pessimista que o garoto tinha, mostrando-lhe todas as coisas interessantes que o Acampamento pode fornecer, todas as aventuras e pessoas incríveis.

Quando ela apresentou Lucian a Jason, a amizade entre os dois foi instantânea graças a um ponto em comum: basquete. Os dois jogam basquete, os dois assistem basquete, os dois amam basquete. Tanto que Lucian foi para o Lobo. Com Matt as coisas foram mais difíceis porque ele sempre foi meio pé atrás, mas não tardou que simpatizasse com Lucian e se tornassem companheiros também. Mas comigo as coisas foram quase impossíveis. Entenda, eu conheço Effy desde que me lembro. Crescemos e estudamos juntas, em Ottawa. Nossos pais são amigos, vivíamos na casa uma da outra. E do nada Lucian aparece e Effy não fica mais tanto comigo. Ela passa a conversar e conhecer mais os Gonzalez. Se fiquei com ciúmes? Fiquei e bastante. Isso fez com que eu erguesse um muro contra Lucian e tornasse nosso início ainda mais difícil.

Quando aquela temporada chegou ao fim, fiquei extremamente feliz porque acreditei que Effy e Lucian não se veriam mais até o próximo verão. Porém, como os pais da menina estão sempre ocupados, ela passou a viajar para a casa dele, em Miami, nas férias de inverno e feriados. Quase brigamos por causa disso, mas percebi o quão irracional estava sendo e permiti que Lucian se aproximasse.

— Sabe no que estou pensando? — Lucian falou, me desviando dos meus devaneios.

— Talvez não tenham te informado, mas ainda não leio mentes.

Ele riu.

— Estava pensando se nosso grupo vai se desmanchar nesse verão.

— Por que diz isso? — perguntei chocada, o encarando.

— Bem, Jay vai sair esse ano. Matt vai sair ano que vêm e todos sabemos que ele só anda com a gente por causa de Jay e Effy. E como ela está passando cada vez mais tempo com Dylan... Você provavelmente vai ficar com ela e eu...

— Ora, não seja besta, Lucian. Tudo bem, Jay vai sair esse ano, mas vamos continuar nos falando. Matt gosta de você. Acho que gosta mais de você do que do Jason, na verdade — sussurrei num tom conspiratório. — E tudo bem, Effy está com o Dylan, mas eu não sei você, porém não vou deixar aquele loiro levar ela assim, independente de quanto tenha pegada. E mesmo que ele leve, ela gosta de você, Lucian, não vai simplesmente apagá-lo da vida dela.

— Eu não sei... — ele falou, olhando os dois sentados no cais. — Ouvi eles brigando mais cedo. Ele reclamou de ela passar os feriados lá em casa, dizendo que ele é o namorado dela, não eu. Também falou que ela passa muito tempo com Matt, comigo e com Jason e que Jay bate na bunda dela e ela não faz nada. Como se ela pudesse fazer — ele falou, erguendo as mãos para cima.

— E o que ela falou? — perguntei, me inclinando em sua direção.

— O mandou ficar quieto. Disse que é nossa amiga antes de ser namorada dele e que nada mudaria isso, pelo menos não para ela. E que ele sabe muito bem porque ela não faz nada com relação à Jay.

— Por causa da divida — sussurrei.

Lucian confirmou com um aceno. Olhei para Effy e Dylan e pensei se ela terminaria com ele se o mesmo reclamasse do nosso grupo ou se romperia com a gente. E constatei que não sabia a resposta.

— Tudo bem, o clima de funeral acaba aqui! — Exclamei me levantando e puxando Lucian pela mão. — Estamos numa festa e nada vai estragar isso.

 

Onde está minha prescrição?

Doutor, doutor, por favor, ouça

Meu cérebro está disperso

Você pode ser Alice

Eu vou ser o Chapeleiro Maluco

 

Lucian riu e me acompanhou até a mesa de bebidas. Encontramos Jay e começamos a rir e conversar perto do Lago e logo Matt se juntou a nós. Curtimos com a cara dele sobre suas desculpas esfarrapadas para não dançar e o arrastamos até a pista de dança, onde esbarramos com Effy sozinha que veio saltitando literalmente na nossa direção.

— Oi! — Ela berrou por cima da música no meu ouvido.

— Caramba, Elizabeth, quer me deixar surda?! — Berrei de volta com as mãos nas orelhas.

— Pra que tanta animação, Raposinha? — Jason perguntou com um sorriso cafajeste.

Effy mostrou a língua para ele como uma criança birrenta e em seguida puxou Matt para fazê-lo dançar. Rimos de Effy que apostaríamos que estava bêbada se não fosse por a) ela repudia qualquer tipo de bebida alcoólica porque b)é menor de idade e c) não tem bebida alcoólica no Acampamento.

 

Estou descascando a pele do meu rosto

Porque eu realmente odeio estar segura

Os normais, eles me fazem sentir medo

Os malucos, eles me fazem sentir sã

 

Puxei Effy pelo braço para que pudéssemos dançar juntas.

— Onde está o Dylan? — perguntei sem querer saber.

— Se não quer ouvir a resposta não pergunte — ela falou, rindo.

Revirei os olhos sorrindo.

—Você me conhece bem demais.

— É claro, quem mais já viu você fazendo xixi nas calças? – berrou essa última parte me deixando da cor de um pimentão.

E é claro que meus amigos de araque não perderam a oportunidade para rir da minha cara.

— Eu tinha três anos — falei em minha defesa.

— Treze — Effy falou, rindo. — Foi na escola, você estava rindo da apresentação de natal e fez tanto xixi que pingou no chão.

Mais uma rodada de risos.

— Grande coisa! Pelo menos eu não tirei a roupa no meio da sala de aula.

 

Sou doida, querido, sou maluca

A amiga mais louca que você já teve

Você acha que sou psicopata

Você acha que eu estou chapada

Diga ao psiquiatra que algo está errado

 

— Você o que? — Lucian perguntou, chocado, olhando para Effy. — Como nunca ouvi essa história antes, Mavis?!

— Por que você fez isso? — Matt perguntou, espantado.

Effy deu de ombros como se fosse nada demais.

— Eu pedi para ir ao banheiro porque precisava trocar de roupa para um jantar importante do serviço do meu pai. E precisava ser naquele momento porque em menos de meia hora o motorista iria aparecer para me levar direto para a festa. Mas o professor não deixou e como eu não podia sair, me troquei ali mesmo.

— Queria ter visto a cara do seu pai quando as fotos vazaram — falei.

— Deveria ter visto a cara do Sr. Fisher quando o demitiram por "não deixar os alunos usarem o banheiro".

— Vantagens de ter um pai Ministro — falamos todos juntos.

 

Pirada, completamente biruta

Você gosta mais de mim quando enlouqueço

Te digo um segredo, não estou alarmada

E daí se sou louca? As melhores pessoas são

 

Tínhamos acabado de sentar para comer em uma das tendas, quando uma chuva de verão começou a cair. Alguns campistas gritaram e correram para debaixo das tendas enquanto outros davam partida nos carrinhos. Effy, Lucian e eu trocamos olhares cúmplices, nos levantamos e empurramos Jason e Matt para debaixo da chuva. Começamos a rir de baixo da tenda quando Jay e Matt nos puxaram para a água também.

Effy soltou um gritinho fino quando as grossas gotas de chuva começaram a molhá-la. Comecei a rodopiar de olhos fechados de baixo do temporal quando uma bolota de lama atingiu meu rosto. Olhei para o culpado e vi Jason gargalhando da minha cara. Agachei e peguei uma punhado de lama e joguei na direção do garoto, que desviou. Malditos reflexos. Fui atingida na barriga e atirei uma nas costas de Matt. Em cheio! Logo nós três e Lucian estávamos tacando lama um no outro enquanto Effy mantinha uma distância segura.

 

Você acha que sou louca

Você acha que eu estou chapada

E daí se sou louca? As melhores pessoas são

E eu acho que você é louco também

Eu sei que está chapado

Provavelmente essa é a razão

Que nós nos damos bem

 

Ao nosso exemplo, vários campistas começaram a entrar na brincadeira transformando aquilo numa guerra de Irmandades. As Larvas eram os alvos mais fáceis porque não tinham um Líder pré-determinado para seguir. Como Effy não entrou na brincadeira e ficou apenas observando de longe ou os campistas de sua Irmandade entravam no time dos outros ou ficavam na deles, o que a maioria fez.

Depois de quinze minutos, quando estávamos todos molhados e sujos e a chuva diminuía de intensidade, Jason atirou uma bola em Effy que estava distraída, olhando para sua Irmandade que comia debaixo de uma tenda. Quando viu algo se aproximar do seu rosto pelo canto do olho, Effy virou na direção da bola e em uma posição de arte marcial deu-lhe um soco, os olhos injetados de ódio.

Ficamos em silêncio, apenas encarando a garota esperando que esta se vingasse de Jason ou algo assim. Mas quando Effy viu que o que iria atingir-lhe era nada mais do que lama, seus membros tensos relaxaram e ela pigarreou.

— Muito bem — disse, voltando-se para os campistas que ainda estavam ali. — O toque de recolher é daqui dez minutos. Quero todos nos Chalés.

Lucian e eu trocamos olhares, sem entender nada. Decepcionados por não verem uma boa briga, os campistas começaram a caminhar para os carrinhos ou para as tendas. Jason todo sujo e molhado correu na direção de Effy, que começou a correr, fugindo. Mas como esportes não são o forte da garota, ele logo a alcançou e lhe deu um abraço por trás, erguendo-a do chão.

 

Sou doida, querido, sou maluca

A amiga mais louca que você já teve

Você acha que sou psicopata

Você acha que eu estou chapada

Diga ao psiquiatra que algo está errado

Pirada, completamente biruta

Você gosta mais de mim quando enlouqueço

Te digo um segredo, não estou alarmada

E daí se sou louca? As melhores pessoas são

 

— Jason Blood me solte agora! — Ela gritou com cara de nojo.

Nos aproximamos rindo. Effy nos olhava suplicando com o olhar para que alguém desse um chute nos países baixos de Jay.

— Ou o que, Raposinha? — ele perguntou sorrindo cafajeste.

— Ou você vai se arrepender — uma voz rouca e nada amigável falou vinda de trás de nós.

Effy, que estava de frente para a pessoa assim como Jason, parou de espernear e ficou dura nos braços do amigo. Sem precisar olhar eu já sabia que encontraria um Dylan muito bravo atrás de mim. E assim foi feito.

Jason com uma carranca no rosto colocou a garota no chão, que permaneceu imóvel no lugar. Lucian olhava preocupado para ela ao passo que Matt parecia prestes a meter um soco na cara de Dylan. Assim como Jason. Assim como eu.

— Ora, vejam se não é o estraga prazeres? — Jay falou, sorrindo irônico.

— Jason, não — Effy sussurrou.

Faíscas pareciam sair dos olhares. Os campistas que estavam ao redor pareciam em dúvida se cumpriam o toque de recolher ou se ficavam e aguardavam o circo pegar fogo. Dylan passou os olhos por cada um de nós, avaliando-nos. Effy parecia tremer como uma vara verde. Quando Dylan deu um passo pra frente e abriu a boca, tive certeza que iria socar Matt, que era o que estava mais próximo. Mas para minha total incredulidade, ele começou a gargalhar.

Trocamos olhares sem entender nada. Dylan se curvou para frente e Effy deu um passo em sua direção, com um sorriso no rosto e compreensão no olhar.

— Esse cara é um louco de pedra — Jason falou, chocado.

— Quando... — Dylan começou se recompondo e dando um sorriso estonteante. — Quando Effy disse que se eu agisse como um babaca com vocês, todos acreditariam que de fato sou um porque não me conhecem fiquei intrigado. Devo parabenizar minha namorada por mais uma vez se mostrar certíssima. Peço desculpas pela cena, só queria testar essa teoria — ele falou, dando de ombros e colocando as mãos nos bolsos.

— Achei que você iria socar o Jason — Effy falou, se aproximando.

Dylan a abraçou por trás e sussurrou algo em seu ouvido. Matt fingiu que ia vomitar e eu me segurei para não rir. Lucian murmurou algo sobre precisar ver como o irmão estava e se retirou rapidamente.

— Vocês com certeza são um péssimo exemplo de Líderes a ser seguido — Effy falou, séria, olhando para mim, Jason e Matthew. — Mas com certeza são um ótimo exemplo de Líderes a ser seguido. Hoje vocês divertiram a todos e ainda uniram as Irmandades! Estou tão orgulhosa que poderia cancelar as reuniões de amanhã.

— Sério? — Matt perguntou, esperançoso.

— Não — Effy falou, rindo. — Pelo menos, não a última parte. Boa noite, galera.

— Boa noite e desculpem-me pela encenação — Dylan falou, sorrindo de lado e levando Effy pela mão.

Ficamos alguns segundo parados no lugar, em silêncio, ainda digerindo toda a esquisitice daquilo. Por fim, nos despedimos e acompanhamos os campistas para os Chalés. No meio do caminho, um garoto de 12 anos com tamanho de uma criança de oito puxou a saia do meu vestido e falou desapontado:

— Quando você acha que a briga vai começar ela termina.

Ri com gosto e o abracei de lado.

— Você nunca esteve tão certo, Carlos.

 

As melhores pessoas são loucas

As melhores pessoas são

As melhores pessoas são loucas

As melhores pessoas são


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Notas finais do capítulo

*Apesar do que Jason diz, Effy não fornica e segue as regras direitinho;
**A garota que Mavis não reconhece é Evelyn.
*** No primeiro capítulo eu me enganei e coloquei q o nome do namorado da Effy era Alex. N é. Alex n existe e na verdade se chama Dylan ahush Desculpem.

Oliver: https://s-media-cache-ak0.pinimg.com/736x/f3/c7/bb/f3c7bbd89aa009ee2c852ef080ce1cea.jpg

Mavis: http://www.melhorsaber.com/wp-content/uploads/2016/07/cortes-de-cabelo-curto-para-ruivas.jpg

Dylan: http://data.whicdn.com/images/178681727/large.jpg

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Tia Mad.