13 escrita por Sora Inu


Capítulo 4
Lágrimas




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— Espere! — A voz de Guilherme foi ríspida, o homem elevou o olhar castanho para Raphael, que percebeu a raiva naqueles orbes escuros. — Quando foi a última vez que você falou com ela?

A pergunta chegou aos ouvidos de Raphael como uma ameaça, o tom possuía uma brutalidade que fez o mesmo dar automaticamente dois passos para trás.

— Ontem... Eu acho. — Respondeu, evitando o contato visual (olhando para baixo e balançando a cabeça como se procurasse algo para focar o olhar) com o antigo melhor amigo. — Eu não sei... Não tenho tido muita noção do tempo sem trabalhar ou estudar.

— Porra! — bateu com força no capô do carro, deixando um leve amassado na região. — Entra logo nessa merda de carro. Temos de voltar! — A ordem carregava toda a ira antes presente nos olhos.

Raphael não retrucou, apenas obedeceu, adentrando no automóvel. Guilherme fez o mesmo, saltando para o banco do motorista, girando a chave exatas três vezes até que o carro ligasse. Guilherme guiou o carro numa velocidade absurda, deixando o mirante, retornando ao município. Raphael puxou o cinto de segurança até o limite, assustado, temeroso, já havia andado no carro de Guilherme há muitos anos — treze para ser exatos —, ele já o presenciou andando rápido, no entanto, nunca desta maneira sem pensar, o motorista guiava o carro com pressa, notória em seus movimentos, a respiração de Guilherme estava descompassada, o silêncio dentro do carro era mórbido, e o único som que se podia ouvir era do motor a mais de cem por hora e os pneus cantando no asfalto a cada esquina virada. O medo que emanava do carona era distinguível pelas pupilas dilatadas. Já Guilherme só emanava ódio, irá e decepção, só não era possível definir do quê e como esses sentimentos negativos apareceram. Os olhos do motorista não desviavam da rua por nenhum momento, e nem parecia raciocinar ao dirigir, atravessando faróis vermelhos e cruzamentos, como um piloto em fuga da polícia, tão habilidoso, não erra uma única manobra.

Na viagem, que durou menos de quinze minutos, Raphael reconheceu o bairro onde adentraram, era ali onde Érika morava. A cena a seguir passou como um flash para o carona, que viu o antigo melhor amigo bater com o carro com tudo numa parede qualquer, e devido a velocidade que o carro estava atravessou mais da metade do concreto, acertando uma árvore que fora plantada do outro lado. Por sorte ou qualquer força divina o atrito do carro entre árvore foi menos forte para si devido ao airbag e por estar pressionado ao cinto de segurança. Entretanto, Guilherme nem demonstrou sentir o impactado, pulando para longe do carro, mas antes de partir virou-se para Raphael, que tentava sem nenhum sucesso também sair.

— Fica aqui! Me espera! E por merda nenhuma saia desse carro! — ordenou com palavras curtas e grossas. — Só não me decepciona, não desta vez. — as últimas sílabas tomaram um tom mais ameno, deprimente e chateado.

Antes que Raphael pudesse dizer qualquer palavra, o antigo melhor amigo já não pertencia ao seu campo de visão. Tonto devido a batida e com muitos machucados ao redor do corpo, o rapaz já não raciocinava direito, porém, conseguiu sair do automóvel, ganhando o chão, sentindo-se dolorido, a dor era tão forte e aguda que não levou nem dez segundos para Raphael desmaiar ali mesmo, no terreno baldio.

Guilherme andava, dando passos largos e rápidos, o ódio parecia transitar dentre suas veias, apossando-se por todo seu corpo. Num gesto rápido abriu o lado esquerdo do sobretudo que trajava, retirando do bolso uma pistola — Beretta M92 Vertec 9mm — colocando o pente na arma. Quinze projéteis, nem um tiro a mais ou menos, pensou consigo mesmo.

Virou numa esquina qualquer, reconhecendo aquela rua e observando de longe a casa que já possuíra o tom verde, agora a cor já havia desbotado com o tempo, e a sensação de nostalgia tomou conta de Guilherme, que diminui a velocidade dos passos (mas ainda dando pisadas largas e pesadas), e quando se aproximou do portão que tanto visitara*******
 percebeu que o mesmo estava arreganhado, aberto, o que lhe fez levantar uma sobrancelha intrigado. Aquilo não era usual. Olhou para os dois horizontes da rua, primeiro para a esquerda, logo após, para a direita reconhecendo um carro preto estacionado não muito longe. Praguejou baixo, sabia o que estava acontecendo.

Entrou no quintal, passando pelo portão, desta vez com um andar calmo, sorrateiro e friamente calculado, olhando todo o perímetro, começou a subir a (não muito grande) escada de pedras, e a cada degrau escalado Guilherme observava tudo com mais cautela, porque sabia que poderia estar entrando numa armadilha, tal como um rato indo atrás do queijo na ratoeira.

Chegando ao topo da escada chegou a porta de madeira que dava acesso a sala, mexeu na maçaneta com cuidado, mas logo percebeu que está estava trancada. Seguiu então pelo corredor, recordando-se de que existia uma janela baixa por ali. Ainda evitando fazer qualquer tipo de ruído, chegou ao destino, observando pelas cortinas brancas e transparentes o interior da casa, por sorte durante todos esses anos nunca colocaram grades na mesma, devido a isto, a visão da parte interna era muito mais ampla. Ao chegar mais perto reconheceu a silhueta de Érika, que gesticulava o corpo com certa agressividade e os movimentos da boca mostrava que ela discutia com alguém. Entretanto, sua visão estava impedida, não tinha como ver com quem ela estava conversando. Ele precisava entrar.

Encostou-se à parede do corredor — que infelizmente não era muito largo, mas conseguiria ter o impulso necessário — e com um passo alto, saltou para dentro da casa, tampando o rosto com ambos os braços para evitar qualquer ferimento grave do vidro em contato consigo.

Caindo dentro daquele cômodo foi surpreendido por uma pancada forte em sua cabeça, que fez seu corpo ir direto para o chão, porém, conseguiu se virar mirando com a beretta no rosto daquele que o golpeara, e seu rosto se assustou ao reconhecer a face de Érika. Já a garota não conseguiu ter nenhuma outra expressão do rosto que não fôra ódio, que durou breves segundo, trocou a sua expressão para um misto de felicidade e medo, e as palavras que saíram da boca dela carregavam um cinismo e a falsa voz trêmula:

— G-Gui... Guilherme...?

Guilherme permanecia deitado no chão com as costas levemente feridas graças aos cacos do vidro quebrado da janela, olhando para o rosto daquela que era seu verdadeiro amor, mas não se prendeu muito naquele olhar, virou o rosto com certa agressividade e velocidade, procurando um terceiro indivíduo naquele cômodo, mas não havia ninguém. Chegou a conclusão de que Érika estava sozinha. Mas não era possível... Ele tinha certeza de que alguém havia estado ali.

— Quem estava aqui com você? — questionou bruscamente, lançando um olhar sério para a garota.

— Quê? — ela balbuciou assustada abaixando o corpo, ficando ao lado de Guilherme: — Não tinha ninguém aqui, eu estou sozinha em casa. — agachada, ela fala num tom mais alegre. — Levante. Eu quero poder te abraçar, meu amor.

O homem jogado no chão olhou de rabo de olho para a porta, vendo que está estava aberta, fechou os olhos por dois segundos, respirou bem fundo antes de dizer:

— Me ajuda a levantar, vai!

— Mesmo depois de treze anos você ainda me trata com brutalidade? Por que eu namorava com você mesmo?

— Porque eu sou o bruto mais amável que você já conheceu. E você sabe que eu sei como te fazer sorrir, não é mesmo?

— Fica quieto. Era uma pergunta retórica, não era pra responder, seu bobo. — ergueu o corpo, estendendo a mão para ajudar o (ex?) namorado a se levantar.

Ao tocar a mão de Érika Guilherme sentiu a pele macia dela em contato com a sua, e novamente, diversas lembranças afloravam sua mente, quando se pôs de pé puxou a garota pela cintura, a abraçando com força, repousando a mão no cabelo dela, aspirando o cheiro que emanava das madeixas. No entanto, observou a sala, caçando com seu olhar crítico em todos os cantos qualquer sinal de coisa errada. E encontrou. Na parede que ficava atrás da porta havia um símbolo que ele conhecia muito bem, aquele era o símbolo da Tears.

Poderia encher Érika de perguntas até arrancar uma resposta plausível sobre a razão pela qual aquele símbolo estava  ali e se a garota teria algum envolvimento com a organização, só que ele tinha conhecimento de que se ela realmente estivesse envolvida não abriria a boca. Por momento, resolveu ignorar aquele fato.

— Vamos nessa! Deixei um amigo que corre muito perigo sozinho, tenho de garantir que ele, assim como você, fique bem. — cortou o contato dos corpos, afastando Érika de si pelos ombros, andando para a porta com a jovem em seu encosto.

— Espera! — a morena agarra a mão de Guilherme, que instintivamente olha para os olhos dela, que continua: — Não acha que eu mereço um beijo pelo menos? — apesar de tentar manter um tom aparentemente normal na voz, o homem percebe que os olhos de Érika parecem esconder alguma coisa, as íris estavam levemente dilatadas. Anos de observação  o ajudaram a reconhecer certos detalhes nas pessoas.

— Sem tempo para isso, moça. Só vamos indo! — Guilherme exclamou, puxando sua mão das da garota, que apesar de não demonstrar com clareza, não gostou daquele ato e nem da forma seca com que o (ex?) namorado a tratou.

Ignorando essa sensação negativa, Érika acata as ordens de Guilherme e ambos seguem até a porta pronto para saírem. Antes, o rapaz para na porta e manda que a garota fosse na frente, estranhando, a morena obedece, e assim que seus pés encontram o corredor Guilherme a empurra para fora, trancando a porta que permanecia com a chave na fechadura. Rodopiou com o olhar o cômodo novamente atrás de qualquer objeto, e assim, encontrando um vaso de porcelana localizado na mesa de centro da sala, o pega velozmente e encosta na parede que faz divisa com a porta de madeira e a janela estilhaçada. O rosto de Érika surge na janela, pronto para reclamar com o invasor sobre o porquê daquele ato, mas antes de pronunciar qualquer palavra, Guilherme acerta com o vaso em cheio no queixo da garota, que com o movimento caí para trás, a cabeça acertando a parede do corredor, indo para o chão, desmaiada.

Guilherme salta pela janela, pegando Érika pelo pescoço e entre as pernas, descendo as escadas, levando-a para onde está o carro.

**-**-**

Raphael permanecia desmaiado no chão, não muito longe do carro. Não havia um único ser na rua, sendo ele animal ou pessoa, era como se todos tivessem simplesmente sumido naquele horário e momento. Os olhos de Raphael tremeram levemente, assim como os braços e abdômen, tentou abrir os olhos e se arrependeu no mesmo instante, sentindo toda aquela dor aguda voltar, fechou-os instintivamente, e logo os deixou semicerrados, observando o céu quase azul escuro sobre sua cabeça. Apesar da visão turva, Raphael podia sentir que alguém o observava de cima, só não conseguia distinguir nada além do vulto negro que estava na copa da árvore onde o carro batera, desaparecendo da mesma forma que surgiu.

Quando finalmente conseguiu abrir os olhos por completo, Raphael assimilou aquela coisa o observando e a situação em que se encontrava. Com certeza alguém o estava observando, só que havia coisas mais importantes para se preocupar.

Tentou se erguer e mais uma vez se arrependeu, se ajoelhou, tentando encontrar forças para levantar, mas estava sendo praticamente impossível. Virou o corpo com cuidado, encostando as costas no carro. Apertou fortemente o abdômen, sentindo o gosto de ferro em sua boca, levou a outra mão até os lábios, levando os dedos até os olhos, vendo o sangue que dali escorria. Abaixou o olhar para o corpo, vendo que na região do tronco o sangue manchava sua roupa. O medo começou a tomar conta de seu corpo, ergueu levemente a peça de roupa, vendo que próximo a barriga um corte havia se formado, suspirou ao ver que não se tratava de nada profundo ou muito grave. O machucado surgiu devido a batida, assim como o da boca, que obviamente deveria ser o lábio que estourou.

Com muito esforço Raphael conseguiu se erguer, sentindo os músculos doerem a cada movimentação, quando ficou de pé por completo viu que os ferimentos em si resumiam ao abdômen, a boca e alguns outros arranhões na perna e nos braços, nada alarmante.

Girou o olhar, apenas para constatar que estava realmente sozinho naquele local.

— Cadê aquele filho da puta...?

Raphael tentou dar um passo, mas percebeu que seria impossível, a dor do abdômen parecia afetar qualquer um de seus movimentos. Apoiou-se no capô, vendo o buraco onde metade do carro estava dentro daquele terreno. Raphael estava do lado direito do veículo, de seu ponto de vista não havia brecha alguma para que ele passasse através do carro ou menos no buraco. Tateando no carro, conseguiu se apoiar na parede, Raphael começou a andar, usando-a como uma espécie de muleta, procurando alguma forma de ir para o outro lado do muro, cada um de seus passos era lento e delicado, pois o rapaz sentia que um simples movimento era como estar sendo torturado.

**-**-**

Guilherme se aproximava do carro com Érika em seu colo, mas ao chegar mais perto do automóvel percebe que pelo vidro destruído da parte traseira de que Raphael não estava ali dentro. Bufando de raiva, acaba soltando o corpo da garota no chão, que acorda automaticamente por causa do susto, abrindo os olhos e erguendo a cabeça, colocando a mão na mesma, tentando amenizar a dor.

— Aquele lixo imprestável do caralho me desobedeceu de novo! — a raiva parecia ter voltado para Guilherme, que não parava de praguejar diversos insultos para o antigo melhor amigo. — Agora eu tenho que procurar aquele merda antes que ele morra!

Érika, ainda atordoada, consegue com muita precisão reconhecer a voz, elevando seu olhar observou com afinco aquele que tanto reclamava.

— Am... — se auto interrompeu, pigarreando antes de continuar. — Gui...? É... É você mesmo?

O homem apenas vira seu olhar para a voz, encarando a jogada no chão com uma expressão de desgosto, nojo. Ignora aquela pergunta, negando algo com a cabeça andando em direção ao carro.

— Guilherme! Espere! Venha cá e me explique o que está acontecendo! — gritou, tentando se erguer  do chão, mas uma dor na região da mandíbula a faz continuar no chão.

Guilherme para o passo ainda no ar, dando meia volta, caminhando rapidamente até Érika, que mesmo no chão, recuou um pouco ao ver a expressão feroz no rosto dele.

— O que é Tears? — a pergunta foi brusca e repentina, fazendo com que Érika não pensasse muito em sua resposta.

— Lágrimas...?

O rapaz solta um longo suspiro, revirando os olhos, estende o braço, mostrando a mão para que a garota se apoie nele.

— Tá... Melhor que nada. — levantou a morena do chão num único puxão.

— O que está acontecendo? — ela indagou mais amena, tocando novamente a mandíbula. — Por que estou com essa maldita dor no queixo?

— Depois eu explico direito... É que... Você estava se perdendo. — Érika apenas faz uma expressão confusa, encarando o rosto masculino. — Depois eu explico, já disse.

— Ok... — a garota pareceu aceitar aquela resposta nas atuais circunstâncias. Observou onde estavam e indagou o óbvio: — O que estamos fazendo aqui?

— Procurando um idiota! — foi o que se limitou a responder.

Caminhou até muro, onde passou por uma única brecha que estava do lado esquerdo donde era a parte do motorista, claro que também devido ao corpo magro ele conseguiu atravessar sem nenhum problema. Érika o acompanhou em silêncio.

Ao atravessarem, Guilherme viu um rastro de sangue no chão acompanhado de diversos pingos que revelaram o rastro para onde Raphael andara. Sem falar nada, entrou no carro, retirando do porta luvas um aparelho idêntico ao que entregou ao antigo melhor amigo, assim como uma caixa negra. Apertou um botão no aparelho, onde uma luz verde começou a piscar periodicamente.

— O que é isso? — Érika questiona confusa.

— Um telefone. — respondeu como se fosse óbvio demais. — Estou ligando pro Raphael. — encostou as costas no tronco da árvore, aguardando a resposta de Raphael, que nunca veio. Acabou desistindo, guardando o aparelho num dos muitos bolsos internos do sobretudo.

 — Tá... Vamos seguir esse rastro de sangue, com certeza iremos achá-lo. — disse com certo descontentamento na voz. — Me espera aqui! — fez um gesto com a mão para que Érika não se movesse.

Retornou para o lado avesso ao muro. Érika ouviu o barulho do porta-malas ser aberto e fechado quase que instantaneamente, o que a deixou de certo modo curiosa, mas antes de poder dar um passo, Guilherme já havia retornado sem nada nas mãos.

— Você... Foi pegar alguma coisa..?

— Ah... Sim fui. — respondeu vagamente, e a expressão que rosto da garota o fez compreender que ela estava curiosa quanto ao que. — Não ligue pra isso, já guardei também. Aliás, você está com seu celular aí?

Érika bateu com ambas as mãos nos bolsos da calça que usava, e ao constatar que não estava com o celular negou com a cabeça. Guilherme pareceu satisfeito com a resposta, jogando a caixa negra para a morena que a pegou prontamente no ar, a abrindo imediatamente, vendo um aparelho idêntico ao que o rapaz usou a poucos minutos atrás. Esperou uma explicação que nunca veio, e então com a mesma expressão impassível o guardou num dos bolsos traseiros.

— Vamos indo! — disse o rapaz, já contornando o carro, seguindo o rastro de sangue. Érika soltou um suspiro e o seguiu sem pronunciar uma única palavra.

Andaram alguns longos minutos sem que uma única palavra fosse trocada. A garota permanecia de braços cruzados enquanto Guilherme observava aquele terreno, que parecia ter a mesma quantidade de metros quadrados que um bairro.

— Que terreno é esse? — perguntou de supetão, a morena grunhiu. — Isso não existia quando eu vinha te visitar.

Érika para automaticamente, pensando em qualquer resposta que o (ex?) namorado acredite, e por fim fala:

— Eu não sei exatamente... O governo começou essa construção já faz alguns anos, mas eles só fizeram o muro e desde então ninguém pode entrar aqui. — explicou, voltando a caminhar, ainda de braços cruzados. — Só que eles nunca divulgaram o que isso aqui vai se tornar.

Antes que Guilherme pudesse dar sua tréplica, ele avistou o corpo de Raphael caído inerte no chão, se aproximou do corpo, sentindo a pulsação confirmando que ele havia somente desmaiado. O pegou entre os braços, girou o corpo encontrando o de Érika a poucos centímetros de si.

— Vamos voltar pro carro, estou cansado de andar.

Refizeram o caminho retornando ao automóvel, e mais uma vez o silêncio pairou entre eles. Chegava a ser cômico que o silêncio não trazia nenhum clima entre eles, não havia peso, romance, nostalgia, reencontro, mas nada, apenas a indiferença. O completo oposto dos sentimentos que ambos sentiam há treze anos.

Quando chegaram ao destino, Guilherme deduziu que seu carro não funcionaria mais, seria impossível que ele se quer conseguisse se deslocar tanto da árvore quando do muro. Pousou Raphael novamente no chão, voltando a encarar Érika.

— Tem um carro na sua casa, não é mesmo?

— Tem sim... — respondeu vagamente. — É do meu pai, eu só não sei onde estão as chaves e...

— Não tem problema. — a interrompeu. — Não irei precisar das chaves. Eu vou lá buscar, fica de olho nesse maldito e não o deixa sumir. Já volto!

Guilherme então sumiu do campo de visão de Érika, que não demonstrou nenhum gesto, tanto com as ordens quanto a interrupção. Os olhos da garota encontraram o corpo de Raphael no chão, ela com um pé cutucou o braço dele, repetindo o movimento até que o mesmo acordasse.

Raphael grunhiu ainda sentindo as dores, mas quando seus olhos abriram completamente, vendo o rosto de Érika ele se assustou, erguendo o corpo abruptamente.

— O que você está fazendo aqui? — questionou eufórico. Virando a cabeça para todas as direções. — Cadê o Guilherme?

— Não estou aqui porque eu quero, e sim porque eu preciso. — respondeu a primeira indagação, ignorando a segunda. — E eu acho melhor você calar essa boca se não quiser ganhar seu atestado de óbito.

Raphael percebeu que aquela ameaça vinda de Érika só poderia significar uma coisa.

— Você voltou? — a pergunta foi ignorada. E como sempre dizem "quem cala consente". — Eu achei que tínhamos combinado de que a Tears não ia mais fazer parte de nossas vidas.

— Não, queridinho. — a voz feminina era carregada de sarcasmo. — Você jurou isso. Aliás, você foi tão fraco que não suportou nem o treinamento básico onde nos colocaram. — pareceu cuspir essas palavras para Raphael, que a encarava sério. — Agora é melhor você parar de choramingar, Guilherme não pode desconfiar de nada.

— Eu vou agir como agi muito bem esses últimos tempos, fingindo que não sei de nada. — falou agressivamente, vendo a expressão de Érika passar de desgosto para raiva. — Façam o que quiserem, desde que não me afete...

— Você por acaso é idiota? — Érika o interrompeu, descruzando os braços, colocando ambas as mãos na cintura. — O Guilherme está aqui para te proteger, e não sei se você sabe, mas ele sumiu pelo mesmo motivo. Então não venha com esse papo de "não me afete", você já está afetado, afinal de contas, você... — enfatizou essa palavra. — é o motivo de isso ter, e estar, acontecendo.

— Érika, eu não tenho nada a ver com isso, por mim...

— Você ouviu por acaso meia dúzia das palavras que eu acabei de dizer? — era mais do que notório que Érika estava prestes a perder a paciência. — Ele não tinha nada a ver com isso, seu bastardo! — ela agachou, agarrando no ombro dele com força fazendo com que Raphael soltasse um grito mudo, devido as dores que ainda corriam pelo seu corpo. — Eu só não te mato agora porque deixaria mais do que na cara... Mas é bom você não baixar a guarda. — avisou, soltando-o, voltando a se levantar.

Quando Érika retornou a antiga posição, a figura de Guilherme aparece repentinamente através do carro, do mesmo local do murro onde havia o vácuo.

— Do que estão falando? — questionou se aproximando da dupla.

Érika lançou um olhar severo para Raphael, que não tardou a responder a pergunta:

— Ah, nada de mais. Só estávamos falando sobre um idiota que conhecemos por aí... — a ironia foi captada em casa sílaba.

— Vai se foder. — respondeu como se aquilo fosse um simples e corriqueiro "bom dia". — Vamos, o carro já está nos esperando.

Érika tomou à dianteira, passando pelo espaço apertado do buraco no muro. Guilherme também andou, mas ao perceber que Raphael continuava sentado no chão voltou até ele.

— Que foi Rapha? Já tá morrendo?

— Porra! Eu não consigo me mexer de direito, estou todo dolorido! — explicou como se tivesse tão claro como preto no branco. — Você foi bater a merda do carro...

— Claro! — interrompeu abruptamente o outro. — Você só faz merda. E também, se tivesse me obedecido e ficasse no carro... — deixou o resto da frase no ar.

Raphael não responde mais nada, sente o amigo agarrar sua mão, passando o braço pelo ombro, o ajudando a se levantar e também, guiando-o pelo estreito espaço, para que assim, ele o encaixasse no banco de trás do carro, onde Érika já estava sentada. Guilherme salta para o banco do motorista, ligando o carro e dirigindo.


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