Start escrita por Queen Of The Clouds


Capítulo 49
Anastasia


Notas iniciais do capítulo

Aí está o último capítulo de Start.

Agradeço pelas pessoas que acompanharam e me incentivaram a continuar, vocês são incríveis e me ajudaram pra caramba, principalmente uma amiga em particular, Jhulia♡

Obrigada por chegarem até aqui, tenho certeza de que nunca vou me esquecer da minha primeira história e espero de verdade que vocês se sintam tão bem lendo quanto eu me senti escrevendo-a.

Boa leitura!♡



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6 ANOS DEPOIS

P.O.V ARMIN

Eu comecei a andar desnorteado pelos corredores do hospital, em desespero. As luzes no teto piscavam e acendiam aleatoriamente, me deixando zonzo.

Eu não conseguia acreditar. Não podia ser verdade.

—Não posso... eu não posso tê-la perdido...—Murmurei, com a voz vacilante. Minha garganta ardia.—Eu não poss...

—Tem certeza?—Escutei alguém perguntar. Olhei para todos os lados procurando pela voz, mas só a encontrei quando as luzes finalmente se acenderam.

A mulher no fim do corredor acompanhava cada movimento meu com um olhar insano. Ela usava roupas brancas de hospital e uma máscara de mesma cor. Eu não conseguia ver todo o seu rosto, mas, de alguma forma, eu sabia quem era.

—Acabou, Armin. Ela se foi.

Eu fechei a cara e me virei de costas, pronto para correr, mas de repente Rachel estava na minha frente, mais próxima ainda. Havia uma lâmina em sua mão. Senti o desespero percorrer o meu corpo quando ela retirou a máscara. Aquele rosto era como a personificação da morte para mim.

—Acho que agora você é meu, outra vez.

—Não. Você... você está morta!

Morta?—Ela gargalhou.—Eu estou longe de estar morta, Armin!

Ela sorriu e, com a lâmina, afastou o cabelo que caía sobre os meus olhos.

—Mas eu não posso dizer o mesmo sobre a sua querida Anastasia.—Suspirou, com falso pesar.—A vida é tão irônica... por acaso, você sabe qual é o significado desse nome? "Anastasia"?

Sua voz era de repulsa quando pronunciou o nome dela. Eu balancei a cabeça, devagar.

—Não sabe?—Ela abriu um sorriso.—Significa "ressurreição", Armin. Mas... acho que isso não vai acontecer, não é? Está ouvindo o mesmo que eu? Essa... música revigorante?

Eu cerrei os dentes, me esforçando para não chorar. Não era uma música, era o pior som do mundo. O som que me assombraria eternamente, ecoando pelo prédio. O último som do monitor dela.

Ela está morta, Armin. Não eu.

—Ela não est...!

—Está sim, e você não fez nada para salvá-la.—Ela me interrompeu.—Mas não se preocupe, eu estou orgulhosa por isso: eu comecei o trabalho e você o finalizou.

Por um segundo, quase acreditei que Rachel era um ser humano com emoções, quando ela levou a mão ao peito, comovida, e disse:

—Você a matou, meu amor... obrigada!

—Eu não a matei. Eu fiz tudo que pude para salv...

Shhh...—Ela repousou a lâmina sobre os meus lábios para me calar. Eu podia sentir o gosto do metal.—Agora podemos ficar juntos. Ela não está mais no nosso cami...

Eu tentei me afastar, mas ela me segurou e pressionou a lâmina contra a minha garganta. Eu não conseguia me mover. Como ela podia ser tão forte?!

Eu não terminei de falar.

—Eu jamais ficaria com você, Rachel!—Berrei, apesar das pernas trêmulas. Ela riu.

—Prefere ficar com a Anastasia? Ótimo. Então vou realizar o seu desejo!—A lâmina estava começando a afundar na minha pele. Eu sibilava de dor.—Boa sorte encontrando-a no inferno!

—Rachel! Não, não!!

Eu acordei num sobressalto e me sentei na cama. Pensei que meu coração fosse sair pela boca. Eu estava chorando, desesperado, apavorado. Nunca quis tanto correr para a cama da minha mãe como naquele momento.

Seis anos. Seis anos já haviam se passado e aquele dia ainda me aterrorizava, me fazia acordar de madrugada em pânico, sem ar.

Eu corri os dedos pelo cabelo e fechei os olhos. Contei até dez centenas de vezes, mas nada resolvia. Tentei regular minha respiração, inspirando e expirando profundamente, mas meu coração não se acalmava.

Nada me faria superar aquela época. Eu jamais me recuperaria daquilo e a única alternativa era esquecer. Eu precisava deixar para lá. Já havia passado.

Senti algo se mover na coberta ao meu lado, mas não me virei para olhar. Não queria que ela se preocupasse.

—Armin?—Ela tocou meu ombro e esfregou os olhos, se forçando a acordar. Eu a fitei.—O mesmo pesadelo outra vez?

Eu afirmei com a cabeça, enxugando rapidamente as lágrimas. Ela me puxou para si e passou os braços ao meu redor, acariciando meu rosto.

—Já passou... está tudo bem, ma vie.—Falou, tranquila, me fazendo suspirar.—Você sabe, ela está num lugar melhor agora...

Eu a empurrei.

—Já falei para não brincar com isso.

Annya riu.

—Desculpe, é inevitável! Eu acho tão fofo...

—Super fofo.—Resmunguei, tirando o lençol de cima de mim e me levantando da cama. Eu odiava quando ela fazia essas piadas de mau gosto. Annya se levantou e correu para a minha frente, bloqueando meu caminho.

—Okay. Você está certo. Eu preciso parar de brincar com isso.

—Você pode fazer piadas sobre literalmente qualquer coisa, mas eu detesto quando fala daquela época.—Ela abriu a boca para falar, mas eu continuei:—Foram os piores dias da minha vida, Annya. Eu chorei em todos eles, quase morria só de ver os enfermeiros cuidando de você sem que houvesse um único movimento da sua parte e... no dia que você teve a parada cardíaca...

Ela me empurrou até a cama e se sentou no meu colo, me abraçando. Minha respiração ainda estava pesada, descompassada.

—Eu estou aqui agora. Não é o que importa?—Perguntou, escondendo o rosto no meu peito.

Annya acariciava minhas costas com as pontas dos dedos, me acalmando instantaneamente e dando lugar para um outro sentimento tomar conta de mim. Eu respirei fundo e olhei para o teto, buscando alguma concentração divina que pudesse me ajudar a resistir à ela.

—Você não vai fazer isso de novo.

—Isso o quê?—Perguntou, fingindo inocência. Eu olhei para ela, sério.

—Você sabe muito bem o que está fazendo.

—Juro que não sei.—Murmurou, escondendo um sorriso. Eu já estava prestes a ceder.

—Essa coisa de me irritar e depois pedir desculpas sem pedir desculpas de verdade.

Ela sorriu e depositou um beijo no meu queixo.

—Não, Annya. Não vai funcionar.

Ela continuou distribuindo beijos por toda a extensão dos meus ombros e pescoco até subir à minha boca. Seus lábios deslizaram pelos meus por apenas um segundo, mas foi o suficiente para eu cair na tentação. Eu grunhi e a ergui no colo, deitando-a na cama. Ela não parava de rir.

—Está perdoada, ma chérie. Mas não pense que irá se safar da próxima vez.

—Você diz isso há seis anos, Armin.

—Mas dessa vez estou falando sério.

—Você também diz isso há seis anos!

Eu ri e me abaixei para beijá-la, mas parei na metade do caminho quando escutei um rangido na porta.

—Eca.—Uma voz aguda acabou soltando.

—Eles estão juntos outra vez...—Ouvi uma garotinha dizer.

Annya revirou os olhos, sorrindo.

—Okay, posso saber quem são os espiões atrás da porta?—Falei, alto. A garotinha de cabelo escuro empurrou a porta, seguida de perto por um menino ruivo com pijama de Star Wars. Annya apertou meu ombro, pedindo para que eu saísse de cima dela.

—Há quanto tempo estão aí?—Perguntou, ajeitando seu pijama. Eu fui até o banheiro para escovar os dentes.

—A gente acordou agora... mas a tia Rosalya já ligou para você, mamãe.

Eu cuspi a água na pia, me engasgando. Annya me encarou.

—Vocês esqueceram de novo, não é?—Samantha reclamou, fazendo beiço.

—Claro que não esquecemos, filha, nós já estamos acordados há horas! Já decidiram quais brinquedos vão levar?

Ela negou com a cabeça, animada.

—E precisa de ajuda?

Ela negou outra vez.

—Então pode ir, chéri...—Eu mal terminei de falar e ela já havia disparado corredor afora.—Não se esqueça de levar aquela bola colorida!

—Eu vou levar as três!—Ela gritou do outro quarto.

Eu sorri e guardei a escova de dentes.

—Marty?—Annya chamou o menino.—Por que está tão quieto?

Ele olhou para mim de relance, mas logo desviou. Lá vem...

—Eu estou com medo... tive outro pesadelo...—Balbuciou.

—Ah, mon cher... de novo?—Ele concordou com a cabeça quando ela o aninhou em seus braços.

—Eu não gosto de ter medo... é coisa de bebê.

—Não há problema algum em ter medo. O seu pai também teve pesadelos hoje.—Ela franziu o cenho, só então percebendo o que ele falou.—E você ainda é o meu bebê, mocinho! Nem pense em crescer!

Marty riu, tentando fugir dos beijos da mãe. Por um segundo, fiquei aliviado, até Annya voltar ao assunto:

—Me conte: com o que você sonhou dessa vez?

Eu me virei alarmado e comecei a gesticular para Marty, tentando impedi-lo de falar.

—Zumbis...—Ele murmurou, acanhado. Bati com a mão na testa.

Ainda corto a língua desse garoto.

Eu me virei rapidamente para o espelho e fingi estar distraído arrumando o cabelo.

—E onde você viu zumbis, Marty?

Eu conseguia sentir o olhar da minha doce esposa queimar minhas costas.

—No jogo do papai.

—Armin...

—Eu mandei ele ir para cama!—Tentei argumentar.

—Você sabe que não funciona com Marty, ele é curioso. Por que não trabalha essas coisas no seu escritório?

—Porque o meu escritório estava cheio de amostras de tecido, estampas e linhas de costura.

Ela me encarou com os olhos semicerrados, mas logo se voltou para o nosso filho.

—Marty, querido, zumbis não são reais. São apenas histórias, você sabe disso.

—Mas se zumbis não são reais, então por que existem tantas histórias sobre eles?

Annya o fitou, sem resposta.

—Sabe no que eu estava pensando? Podíamos passar na sorveteria antes de encontrar a tia Rosalya, não é?

—Sim!

—Legal! Então vai lá ajudar sua irmã a escolher os brinquedos!—Ela o dispensou, colocando-o no chão. Ele deu um beijo estalado em sua bochecha e correu. Annya se levantou, se esticou e me lançou um olhar ameaçador.

—Armin, se ele tiver outro pesadelo com zumbis...

—Ele não vai. Prometo.

Eu me aproximei e coloquei seus braços ao redor da minha cintura, beijando sua testa.

—Acabei de lembrar que... nós não terminamos o que havíamos começado...—Falei, sugestivamente.

—As crianças estão acordadas...

Eu deslizei minhas mãos até a sua nuca, massageando-a. Ela fechou os olhos e suspirou.

—Elas estão distraídas com os brinquedos...

—Mas ainda podem entrar aqui.

—Eu tranco a porta.—Falei, guiando-a para mais perto da cama.

—Armin...—Alertou, colocando a mão no meu peito para me parar. Eu a segurei e beijei seus dedos, um por um, subindo até o seu ombro. Ela me observava, aérea. 

—Sim, ma vie?

De repente, ela desviou o olhar e balançou a cabeça, como se saísse de uma hipnose. Eu lhe dei o meu melhor sorriso de inocência, fazendo com que ela batesse no meu braço, inconformada. 

—Você é um im-be-cil. Um imbecil muito perigoso e-e... sedutor!  

—Eu sou um romântico incorrigível.—Sussurrei, puxando-a para mais perto. Nossos narizes se tocaram. Ela deu risada.

—Um idiota incorrigível.—Insistiu, me fazendo rir. Ela segurou meu rosto e finalmente me beijou.

O tempo sempre parecia caminhar de forma diferente quando estávamos juntos. Era como se ele gostasse de passar um pouquinho mais devagar, só para nos dar mais dele... para compensar o que havíamos perdido. E eu esperava que ele continuasse o seu trabalho, fazendo com que cada segundo ao lado dela se transformasse numa eternidade.

Porque uma vida só jamais  seria suficiente para demonstrar todo o meu amor... por Annya e pelos nossos filhos.

 

P.O.V ANNYA

"Eu escutava vozes. Era só isso que eu escutava, o tempo inteiro: vozes abafadas, sussurros distantes... mas dessa vez era diferente. As vozes eram altas, preocupadas, carregadas de tensão e... alguém gritava meu nome.

Não era justo, eu estava sozinha num lugar lindo e tranquilo enquanto essas pessoas estavam desesperadas. Havia uma cachoeira de águas cristalinas logo à minha frente e, às minhas costas, um extenso campo de girassóis, banhado por um céu azul. Parecia o paraíso.

Mas, subitamente, tudo apagou... e eu fiz a péssima escolha de abrir os olhos. Tudo me voltou a memória de uma só vez: Rachel, os tiros, o sangue, as lágrimas do meu namorado sobre o meu rosto...

Eu pisquei algumas vezes, na tentativa de me adaptar à luz do quarto. Tentei me movimentar mas me sentia... pesada. Meus músculos pareciam rigidos como estacas de madeira. Quando movi a ponta dos dedos, senti algo entre eles... como fios de cabelo.

Olhei para baixo, sentindo meu coração bater mais forte. Ele estava ali. Era o meu Armin. Ele aguentou ficar ao meu lado mesmo depois de toda essa bagunça. As lágrimas não demoraram muito a aflorar aos meus olhos.

—A-Armin...—Sussurrei. Minha voz quase não saía.— Armin.

Eu me esforcei e ergui a mão para acariciar seu rosto. Ele ergueu a cabeça, sonolento. Seu rosto demonstrava puro cansaço: olheiras fundas e escuras, nariz avermelhado, cabelo bagunçado, barba por fazer... no entanto, mesmo assim, aquele ainda era o homem mais bonito do mundo.

—V-v-v-você...—Gaguejou, perplexo, me fazendo rir. Ele deitou a cabeça sobre meu peito, chorando e falou pesadamente:—V-você voltou pra mim...

—E você f-ficou comigo d-durante todo esse tempo...—Balbuciei, ainda sem acreditar.

—Onde mais eu ficaria?—Ele sorriu e beijou minha mão. Eu sorri, o que o encorajou a distribuir mais beijos, por todo o meu rosto.—Eu senti a sua falta. Senti falta da sua voz, dos seus olhos... de tudo. Você... conseguia me ouvir?

Eu franzi o cenho.

—Eu tive muitos sonhos... a maioria envolvia você. Mas não sei dizer o que era realidade e o que não era. Desculpe.

Ele balançou a cabeça.

—Não precisa se desculpar. O que importa é que você está aqui agora. E eu não vou deixar mais nada de mal acontecer a você.

Ele tocou meu rosto e limpou uma lágrima que havia caído. Ficamos nos observando por alguns segundos. Eu sentia como se tivesse dormido apenas algumas horas, mas Armin me explicou, assim como todas as outras "novidades", que fiquei em coma por mais de duas semanas. Era confuso demais pra mim o fato de não ter sentido a passagem de tempo. Para mim, era como se eu tivesse perdido todos os alarmes do despertador e me permitido tirar uma soneca.

Mais tarde, Armin chamou o doutor responsável por mim e nós conversamos por alguns minutos sobre a minha recuperação. Ele comentou que, na saída de um coma, era normal, dependendo do período de tempo, as pessoas apresentarem certa dificuldade na fala e na locomoção, já que essas áreas não estavam sendo exercitadas. Fiquei mais tranquila. Fisicamente, eu havia saído ilesa daquela noite.

Assim que o médico saiu do quarto, notei uma certa inquietação no meu namorado. Ele me olhava, suspirava e sorria, com as mãos escondidas no bolso.

—Está tudo b...?

—Eu preciso de um abraço.—Ele falou, impaciente. Eu ergui as sobrancelhas.

—Ahn... não sei se é uma boa ideia. Meus músculos ainda não parecem tão fir...—Ele se aproximou e se espremeu ao meu lado na cama, me fazendo rir.—Armin!

—Shhh... é só por um minuto.—Sussurrou, levantando a cabeça apenas para checar se a portava estava fechada.

Ele me abraçou e respirou fundo.

—Como está se sentindo?—Perguntei, depois de um tempo.

—Seguro.—Ele respondeu, prontamente. Eu mordi o lábio, me controlando para não falar o que pensei, mas não consegui segurar por muito tempo.

—Eu ia dizer que você está se sentindo seguro porque, caso a Rachel apareça aqui, você poderia me usar como escudo humano, mas acho que você ainda não está pronto para esse tipo de piada, não é?

—Definitivamente, não.

—Certo. Desculpe. Daqui a seis anos eu tento outra vez.

Escutei sua risada. Ele levantou os olhos para mim e sorriu.

Eu amo você, Annya. Para sempre.

—Eu também te amo, Armin. Para sempre."

Era impossível não sorrir a cada vez que eu me lembrava do dia que acordei. Depois de tudo aquilo, minha vida mudou totalmente, como se o meu limite de problemas já tivesse sido atingido.

Depois da minha completa recuperação, Armin finalmente conseguiu se dedicar e terminar o projeto do jogo que estava fazendo e... a resposta do público foi incrível. Todo o apoio, todos os elogios e críticas positivas que ele recebeu o incentivou a se empenhar ainda mais. E a melhor parte era:  Armin era absolutamente apaixonado pelo que fazia. Eu não poderia estar mais orgulhosa.

Não demorou muito para ficarmos noivos. Não sei exatamente como, mas Armin me pediu em casamento exatamente como no sonho que tive meses antes: num campo de girassóis, ao entardecer. Foi lindo, como uma cena saída de filme. Dessa vez, pelo menos, não fiz a besteira de dizer "não" para ele.

Rachel não existia mais em nossas vidas. Nós tivemos uma festa de casamento incrível, sem medo e sem nenhum incidente. Eu e Armin vendemos nossos apartamentos e compramos uma casa, onde começamos a morar juntos. Uma coisa que anos antes parecia um absurdo para mim, naquele momento era uma certeza indiscutível. Eu aprendi da maneira mais difícil que precisava parar de evitar as coisas por medo. Eu perdi muito tempo da minha vida hesitando e nunca mais faria isso outra vez.

Depois de terminar a faculdade, trabalhei por quase dois anos numa empresa de moda, boa parte do tempo como estagiária. Não foram tempos fáceis, já que o salário era pequeno e eu me recusava a receber ajuda dos meus avós e do Armin. Passei um bom tempo gastando dinheiro apenas com o necessário e guardei o máximo que pude para investir num projeto louco com Alexy e Rosalya. Com muito esforço, tiramos os planos do papel e conseguimos criar nossa própria marca! Ainda não era algo muito grandioso, mas já estávamos começando a crescer pela França.

 

Armin me levava a cada convenção de jogos em que precisava marcar presença... e eu o levava a todos os desfiles de moda possíveis. Para quem não gostava de viajar, meu marido estava passando tempo demais em aviões.

Os gêmeos vieram um pouco mais tarde. Para minha sorte, Samantha e Marty não eram idênticos, o que facilitou um pouco o meu trabalho. Caso contrário, eu não hesitaria em pintar o cabelo de um deles de azul para diferenciar. Eu e Armin pensamos em fixar nossas raízes, pelo menos até as crianças crescerem, mas elas ficaram espertas muito rápido! Mal tivemos tempo para descansar e eles mesmos começaram a insistir dizendo que também queriam ir nas festas de cores do papai e da mamãe. Eles adoravam ver os vídeos e as fotos das convenções e dos desfiles... lugares cheios de luzes, tecidos coloridos, músicas, telas gigantes e jogos: era o paraíso para eles.

Eu suspirei e cruzei os braços, admirando a paisagem à minha frente. Aquele lugar não havia mudado muito desde que eu havia visitado-o da última vez... bem, pelo menos as estrelas estavam no mesmo lugar.

—Ei, cunhadinha.—Alexy se aproximou, carregando Samantha no colo.—A princesa caiu no sono.

Eu me aproximei, surpresa.

—Sério? Ela não dorme com ninguém além do pai dela. O que você fez?

—Acha mesmo que eu vou te contar?  É um segredo de família.

Eu sorri e caminhei em direção ao carro. Armin já havia preparado o colchão inflável ali no interior, sabendo que as crianças logo iriam se cansar. Eu pedi à Alexy que deitasse Samantha ali, a cobri com o cobertor e dei um beijo em sua testa.

Quando me afastei, parei para olhar meus amigos ao redor da fogueira conversando e rindo. Havia um homem de cabelos esverdeados que não tirava os olhos de Alexy.

—Ele parece bem legal...

—Quem? Jade?—Alexy deu de ombros.—É... ele é legal. Normal.

—E você gosta dele?

—N-não! Quer dizer, nós estudamos juntos no colégio e agora estamos apenas... saindo. Não é nada demais.

Eu esbarrei em seu ombro.

—Você gosta dele!

—Claro que não! Não viaja, Annya!

Eu conti uma risada e olhei para as minhas unhas, fingindo desinteresse.

—É uma pena... porque ele não para de olhar para você.

—Você acha?—Notei uma faísca de esperança brilhar em seus olhos. Eu ri, fazendo-o revirar os olhos.—Tudo bem, talvez eu goste dele... um pouquinho.

—E o que está fazendo aqui comigo? Vá falar com ele!

—M-mas...

Eu abanei a mão, expulsando-o dali. Ele me olhou e deixou cair os ombros, cansado, mas sorridente. Assim que ele se afastou, senti algo segurar minhas pernas na altura dos joelhos. Olhei para baixo, assustada, e encontrei uma menininha adorável de vestido lilás sorrindo para mim. Eu sorri de volta.

—Oi, tia Annya!

—Oi, Claire!—Eu me ajoelhei.—O que você está fazend...

—Ah! Eu preciso correr!

Eu mal terminei de falar e ela disparou para perto da mãe, se escondendo. Só então entendi que ela e Marty pareciam brincar de pique-pega. Rosalya abraçou a filha e Leigh acenou para mim de longe. Eu retribui.

Estava faltando alguém ao redor daquela fogueira...

Eu estava prestes a me virar para procurar pelo meu marido, quando ele surgiu atrás de mim, cantarolando, segurou minha mão e me girou, devagar. Eu dei risada.

—O que estava olhando?—Ele me abraçou pelas costas e sussurrou suavemente ao meu ouvido.

—Hum... coisas.

—E essas coisas são mais interessantes do que o seu querido marido?

—Qualquer coisa é mais interessante do que você.—Afirmei, me virando. Ele riu.

—Seus olhos dizem o contrário, ma chérie.—Ele arqueou a sobrancelha com uma expressão terrivelmente provocante. Por um segundo, me arrependi de não ter cedido à esse olhar pela manhã.

—E o que meus olhos dizem?—Perguntei, me aproximando.

—Que você me ama.—Sussurrou, depositando um selinho na ponta do meu nariz. Eu sorri.

Meus olhos não mentem.

Eu fiquei na ponta dos pés e o beijei, entrelaçando minhas mãos nas suas. Eu continuava me surpreendendo com o fato de que, mesmo após anos, ainda sentia arrepios com seu toque. Eu me inclinei para trás para encerrar nosso beijo, mas ele se inclinou para frente para continuar, segurando minha cintura para que eu não caísse. Senti seus lábios se curvarem num sorriso e me afastei, rindo. Ele piscou para mim e eu bati em seu ombro.

—Engraçadinho, eu estava sem ar.

—Oh, então eu faço você perder o ar? Interessante.

—Não foi o que eu quis dizer...

—Mas foi o que eu entendi.

Eu o olhei, balançando a cabeça.

Como eu podia amá-lo tanto?

—Eu sei o que está pensando. Vá em frente: pode falar.—Disse, convencido.

Eu apontei para mim.

Eu? Eu não quero falar nada.

—Eu já disse, Annya: seus olhos não mentem.

—Eu não tenho nada a diz... Armin, me ponha no chão!—Berrei, quando ele me segurou e me girou no ar.—Armin!!

Ele se sentou na grama e me acomodou em seu colo, rindo. Eu descansei a cabeça em seu ombro e respirei fundo.

—Certo. Eu amo você. Era isso que eu estava pensando.

—Eu sei. E eu também te amo, chérie.

Ele acariciava minha bochecha com a ponta do nariz, como um gatinho pedindo carinho.

—Onde está o Marty?

—Com os tios.

—Tem certeza?

—Veja você mesma.—Falou, abaixando a cabeça. Eu espiei por sobre os seus ombros: Samantha continuava dormindo e Marty brincava com Leigh. Estava tudo tranquilo. Eu me virei para frente e me sentei entre suas pernas, apoiando minhas costas em seu peitoral. Armin me abraçou e pegou minha mão, brincando com a aliança em meu dedo. Ele cantarolava "That's amore" e me balançava suavemente.

—Ei, você viu aquilo?—Ele apontou para o céu, de repente.

—O quê?

—Acho que era uma estrela cadente!

—Ah... legal. Você nunca havia visto uma?

Ele balançou a cabeça e deixou os ombros caírem, desanimado.

—Você não vai fazer um pedido?

—Eu já fiz da última vez. Pode ficar com essa para você.

Ele ficou em silêncio por alguns segundos.

—E o seu desejo se realizou? A... estrela... te deu o que você queria?

Eu olhei ao redor: meus amigos conversavam e riam, distraídos; meu filho brincava; minha filha adormecia, segura. Por fim, olhei para o meu marido: o homem mais gentil, divertido e apaixonante de todo o mundo. O mar em seus olhos me observava de volta, ansioso por uma resposta.

Eu havia pedido felicidade.

—Sim. Ela me deu exatamente o que eu pedi, ma vie.


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Notas finais do capítulo



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