Série Lobos II - O Clã da Lua escrita por M Schinder


Capítulo 19
Décima Nona Caçada: O Grupo


Notas iniciais do capítulo

Nada a declarar, ainda mais porque as coisas estão começando a ferver!

Boa leitura!



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Já faziam alguns dias da partida de Hidetaka e Shino. Eu torcia para que os dois estivessem vivos e com Ailee e sua família em segurança. Muitos me julgaram por confiar em um lobo quase cego, mas eu conhecia meu antigo professor o suficiente para saber que ele colocaria a própria vida antes da família Tsukiko. Ele queria que nosso feudo estivesse tão bem quanto antes.

— Katsuo, olha aquilo.

Seiji, que estava sentado ao meu lado, apontava para o centro de um círculo formado pelos aldeões comuns de nossa casa. Há dias eles tentavam, sem muito sucesso, manter sua forma original. Bem no centro do espaço aberto, havia um lobo sentado naturalmente – ele já estava daquele jeito há algumas horas e não parecia que se moveria. Não era tão grande, mas os olhos amarelados e a pelagem marrom fizeram um sorriso surgir em meus lábios.

— Seu irmão é o melhor deles.

— Acho que ele tem motivos suficientes para ser.

Saki fora me procurar um dia antes, querendo saber exatamente o que estava acontecendo. Não pude mentir depois que ouvi que minha mãe estava muito mais doente. Contei sobre nosso pai; os planos dele; e meu irmão foi a única pessoa para quem tive coragem de confessar o que teria que fazer. Ele ficou horas sem falar comigo e, quando voltou, apenas avisou que iria se dedicar e que eu deveria fazer o mesmo.

Eu nunca fora próximo de meus irmãos – fosse porque eu gostasse de ser lobo em vez de humano; fosse porque eu passara mais anos da minha vida dentro do castelo do que com eles. Entretanto, estava aprendendo, bem devagar, que o sangue vinha antes de tudo.

— Se continuarmos assim, dentro do prazo estipulado por Hidetaka teremos tudo pronto — comentou Seiji parecendo satisfeito.

Meu companheiro descansava a perna machucada, sem tirar os olhos da cena que se desenrolava a nossa frente. Kriran tinha uma aptidão nata para ensinar e fiz questão de colocar aquilo na lista de coisas que precisava contar a Ailee quando a visse novamente.

— Por Tsukuyomi, espero que esteja certo.

***

Os dias eram vagarosos quando não se tinha nada para fazer. Ou assistia ao treinamento dos aldeões ou ficava jogado na madeira do chão fa cabana de Hidetaka olhando para o teto. Não eram opções muito boas, mas era o que eu tinha.

Tsukuyomi vinham assombrando meus sonhos com visões do passado e alguns relances do futuro – mas eram tantas versões de futuro que eu não sabia no que acreditar. Só ficava com mais raiva do deus por ele estar tentando provar que o futuro estava em minhas mãos e não nas dele. Resumindo: se eu falhasse, seria apenas culpa minha e de mais ninguém.

— Isso é tão maravilhoso — resmunguei para os céus como se aquilo fosse adiantar de alguma coisa. Já falei o quão ruim era ser um mortal?

— As coisas sempre ficam mais fáceis quando você tem um objetivo — olhei para cima curioso. Saki, meu irmão mais velho, estava em pé perto de minha cabeça. Parecia estar de cabeça para baixo, para mim. — Uma das coisas que nossa mãe nos ensinou enquanto você estava trancado naquele palácio.

— Ah é? — murmurei sentando-me. Ele ocupou meu lado, espaço vazio não era o que faltava ali. — Que tipo de objetivo?

— Qualquer um.

Encarei Saki sem saber o que pensar. Meu objetivo era devolver a vida a meus semelhantes – talvez até ensinar a importância de seu verdadeiro “eu”. Contudo, não parecia ser esse o objetivo a que ele se referia. Desviei o olhar com um sorriso triste.

— Querer que nossa família volte a ser como era, quando ainda éramos crianças, é muito, não é?

— Acho isso muito difícil de acontecer, Katsuo.

Mantive os olhos abaixados. Aquilo era um desejo muito profundo e infantil. A única outra coisa que vinha a minha cabeça parecia idiota demais para contar como algo que me faria sobreviver às garras de meu pai.

— Queria contar para ela o que eu sinto — murmurei sentindo-me o lobo mais perdido dentro todos. Era ridículo pensar que eu ainda conseguia parecer mais idiota que os outros.

— Então diga.

— Não posso, ultrapassaria todos os limites...

— Quais limites? — perguntou sério. — Nosso mundo já está completamente de cabeça para baixo. Não acho que esses limites sejam algo que deve lhe dar preocupação.

Encarei Saki chocado. Por que, quase sempre, os outros estavam certos e eu não? Aquilo fazia o completo sentido e eu tinha a chance de contar o que sentia para Ailee. Depois de todo aquele tempo seria possível. Entretanto, meu cérebro ainda insistia em lembrar desses limites, impedindo-me de imaginar qualquer resposta para minha confissão – sendo positivo ou negativa.

— Acho que se eu desconsiderar esses limites, meu mundo vai mudar completamente — expliquei com um sorriso triste. — E não estou pronto para isso. Não agora.

Saki colocou uma de suas mãos sobre meu ombro, sua expressão completamente neutra como se afirmasse que não deveria me preocupar com aquilo. Ele foi embora, deixando-me sozinho. Desde que eu fora escolhido para ser o Hogosha, com a exceção de Ailee e Issa, eu estava sozinho. Era dolorido lembrar disso, mas seria isso que eu usaria para continuar tendo forças – e arranjando-as de um lugar que nem mesmo eu sabia que existia.

***

Lembram-se daqueles treinos que os aldeões estavam fazendo para manter a forma lupina? Kriran se provou um verdadeiro gênio e conseguiu ensinar a maioria deles a manter sua forma original sem serem consumidos por seus instintos mais profundos.

Aquela era a coisa mais difícil e o jovem lobo parecia satisfeito consigo mesmo quando Seiji arrastou-se até o centro do círculo, sendo recebido com uivos felizes dos canídeos que o rodeavam. Era uma vista linda e arrependi-me de pensar que eles estavam perdidos, muitos meses antes.

— Amanhã é o dia em que precisaremos enfrentar nossos irmãos, nossa família — começou colocando a mão sobre o peito, como se tivesse uma garra. Discurso motivacional era algo que ele aprendera a fazer depois dos anos que passara como líder da caçada. — Não será a melhor tarefa, nem que a mais nos orgulharemos de completar. Porém, é algo que precisamos fazer. Nosso feudo precisa de nós, aquelas pessoas precisam de nós.

“Não estou pedindo para que lutem. Nunca. A vida de vocês é ainda mais preciosa que a minha. Apenas quero que vão até lá e comecem a uivar. Uivem por todas as pessoas que amam e estão dentro daquele castelo. Quero que eles vejam que vocês estão aqui, do nosso lado. Contra aquela tirania”.

Eu estava paralisado. Cada palavra que saia pelos lábios de Seiji era carregada de razão e sentimentos. Tantos que nem mesmo eu conseguia identificar o mais presente em seu discurso. Era como se ele nem tentasse procurar as palavras certas, elas vinham com uma naturalidade apavorante.

— Por isso, peço um pouco de coragem de confiança — continuava sem desviar o olhar. Todos os lobos prestando atenção. Por um lado, era engraçado, pois uma cena parecida vivia voltando a minha mente: Tsukuyomi falando, com o alfa sentado ao seu lado, e todos os outros ouvindo atentamente suas palavras. — Confiem que tudo irá dar certo e nossa querida princesa será coroada como deve acontecer.

Uivos de animação e concordância correram entre as fileiras. Era incrível como nenhum deles hesitava ou duvidava de suas palavras. Aquele era o verdadeiro sentimento de união que uma alcateia deveria ter? Se fosse, era muito maior do que eu vira entre a matilha. E isso era uma das coisas que eu gostaria de mostrar a Ailee e todos.

***

A noite chegara em seu tempo. A Lua brilhava com tanta força que imaginei que Tsukuyomi deveria estar mandando um sinal; mostrando o quão poderoso era e como os planos de meu pai falhariam.

Revirei meus olhos. Queria ver o deus descer de seu palácio e vir aqui, lutar e ganhar por mim. Eu sabia que não havia chance disso acontecer, mas ainda era bom poder sonhar com algo que não era a minha morte. A cicatriz em meu olho esquerdo ardia, uma lembrança nada boa do dia em que virara Hogosha. Será que ganharia outra marca por derrotar meu pai? Será que teria que perder algo para sair vencedor?

Eram ótimas perguntas, mas, sinceramente, eu não queria ter as respostas. Sabia que era ruim ser mantido no escuro, mas seria muito pior atirar-me em uma batalha quando os resultados já estavam decididos. Naquele momento, escolhi acreditar que não seria o destino quem comandaria aquele confronto, mas eu, como Tsukuyomi gostava de ressaltar.


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Notas finais do capítulo

Katsuo não está nada contente e não é para menos, não é? Se atirar em uma guerra contra seu pai arrastando tantas pessoas junto não é algo que um jovem quer fazer! Querem comentar? O que estão achando?



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