Bella
Recrutando Fujoshis!
–Com licença.-bati na porta entre aberta da sala de aula a qual me indicaram que era a minha.
–Oh, entre.-disse uma voz feminina calmamente.
De cabeça baixa, deixando os cabelos ondulados e achocolatados caírem sobre meu rosto e ombros, segurando firmemente uma folha de papel que me entregaram na diretoria, entrei. A sala estava vazia, claro, havia chegado cedo, cedo o bastante para ser a primeira.
–Bom dia!-a professora sentada em sua mesa me cumprimentou, sorrindo gentilmente, uma mão segurava uma caneca com café e a outra alguns papéis, ela me olhou por cima dos óculos que estavam caídos até a ponta de seu nariz, tinha os cabelos pretos presos em um coque com algumas mechas soltas, parecia ter prendido as pressas.
–B-Bom dia...Sou aluna nova.-falei a encarando e lhe entregando o papel.
–Bella?-ela leu o papel.-Seja bem-vinda.-soltou os papéis e me estendeu a mão, a apertei.-Não quis ficar lá fora antes das aulas começarem?
–Prefiro ficar aqui...-sorri sem graça.-Além disso...Não conheço ninguém, não vale a pena ficar lá com os alunos...
É, acabei de voltar para minha cidade natal, havia me mudado quando ainda era um bebê...É uma pena não conhecer ninguém, ter que se adaptar a uma nova escola...
Quem derá minha prima estudasse aqui...A Yuki. Por falar nela, combinamos de nos encontrarmos a tarde, nos veremos depois de tanto tempo!
Me sentei na fileira do meio, na penúltima carteira, colocando minha mochila sobre a mesa, remexendo nela, um pouco nervosa, pensando em como seria meu primeiro dia. Suspirei pesadamente pegando meu caderno.
A porta foi aberta de repente, era um garoto, com uma cara de tédio e sono, aparentava ser bem caladão, com fones de ouvido, o volume parecia estar no máximo, dali do meu lugar conseguia ouvir o som um pouco abafado, só vestia preto, coisa que achei raro, o observando atentamente.
–Drew? Sempre chega cedo, não é?-a professora sorriu gentilmente, mas foi completamente ignorada por ele.
Drew me olhou de soslaio, sentando-se na primeira carteira da fileira da janela, ficando bem no canto, deitando a cabeça sobre seus braços.
Olhei para a professora que suspirou e lentamente balançou a cabeça com desaprovação.
Certo...As pessoas daqui não parecem ser muito amigáveis...
Comecei a mexer em minha mochila incomodada, um pouco nervosa, a sala estava em total silêncio, o som do relógio passou a ecoar em minha mente de uma maneira torturosa.
–Professora!-chamei pigarreando.-P-Posso ir ao banheiro antes da aula começar?-me levantei.
–A vontade.-ela disse sem me olhar, concentrada agora em sua pasta, marcando algo a caneta.
Abri a porta e bastou por um pé para fora que acabei esbarrando em alguém, me fazendo cambalear para trás, entrando de volta na sala.
–Por acaso é cega?-era outro garoto, também com fones, mas estavam fora de seus ouvidos. Ele deu uma arrumada nos cabelos loiros, me olhando mortalmente, engoli em seco, depois disso simplesmente passou reto por mim.
–Gray, você poderia ter mais modos, não acha?-a professora bufou.
–Você poderia parar de se meter na minha vida...-Gray deu um sorrisinho cínico.
–Ela é aluna nova como você, a trate bem! Você está aqui faz só um dia, não ache que é melhor que os outros!-ela lhe deu uma bronca.
Gray revirou os olhos e sentou-se atrás de Drew.
Andei pelos corredores, insegura com os acontecimentos anteriores, aflita por ser meu primeiro dia e com um frio na barriga por causa do medo de não me encaixar.
A escola nem era tão grande, mas fui capaz de me perder, apenas encontrei o banheiro com a ajuda de uma inspetora.
Suspirei pesadamente me apoiando na pia e encarando meu reflexo no espelho.
–Tem que melhorar...Esse dia tem que melhorar...-sussurrei para mim mesma.
–Eu sou demais! Uhuu!-ouvi um grito vindo da última cabine, arregalei os olhos, assustada. Pensava estar sozinha!
Um barulho de jogo ecoava no banheiro, como se a pessoa estivesse marcando vários pontos.
Dei de ombros, abrindo a torneira e lavando meu rosto, tentando aliviar a tensão.
–É hoje que a gente dá uma lição na Danniely!-um grupo de garotas entrou no banheiro, pareciam bravas.
–Ela se acha só por ter aquela garota como guarda-costas! Quero ver se ela tem coragem de nos enfrentar aqui dentro onde não tem ninguém!-uma baixinha disse cruzando os braços e bufando.
–Onde você viu ela, Letícia?-a morena perguntou olhando para os lados.
–Eu já disse, ela sempre vem ao banheiro para jogar aqueles jogos bestas antes da aula!-uma ruiva respondeu revirando os olhos.
Essa mesma ruiva andou a passos silenciosos e curtos até a última cabine, colocando uma mão na cintura e usando a outra para bater na porta trancada.
Nenhuma resposta.
Ela bateu novamente.
Nada.
–Danniely, sabemos que está aí!-a baixinha gritou.
Eu estava de costas para elas, apenas ouvindo calada, vez ou outra as olhando de canto, com medo de permanecer, porém com medo de sair.
–Está com medo de por a cara no sol?!-a morena disse sarcástica se colocando na frente da porta.
–EU ESTOU AQUI MESMO! E DAÍ?-aquela voz de antes gritou.
–Pois que saía e nos enfrente, garota fujoshi!-Letícia disse séria.-Perto da sua amiguinha você é tão segura...Agora parece um rato se escondendo!
–Ei!-alguém tocou meu ombro, me assustando, arregalei os olhos, dando um pulinho e permanecendo no mesmo lugar. Era outra garota, essa tinha cabelos pretos, a mais alta do grupinho.-Não quer ficar aqui, né? Então porque não acha seu rumo?-me empurrou para que andasse.
–E-Eu...N-Não...-tinha medo de encara-la, desviei o olhar para a última cabine, Letícia estava chutando a porta com força.
–Que droga! Eu estou aqui!-a porta foi aberta bruscamente, revelando uma garota de cabelos curtos, os olhos fechados com força, os dentes e punhos cerrados.
–Maravilha.-Letícia deu um sorriso malvado. Eu não podia deixar aquilo prosseguir! Mas...Não sabia o que fazer!-Podemos ter uma conversinha?-estourou uma bola de chiclete, mascando de boca aberta logo em seguida, fazendo um barulho irritante, semelhante a uma vaca pastando.
–Não estou disponível nesse momento!-a garota disse rapidamente e correu dali, deixando seu videogame portátil cair, passou por mim e pela menina nos dando um empurrão. Eu praticamente fui jogada na parede, já a garota se manteu de pé.
–Danniely...Danniely...-Letícia balançou a cabeça com desaprovação, as mãos na cintura, mascando o chiclete. Pisou sem dó no jogo caído no chão, o esmagando, rindo com a maldade. Depois, andou até a porta, onde eu estava.-Tsc. Tsc. Tsc.-um sorriso diabólico se abriu em seus lábios.
–O que pretende fazer?-a baixinha perguntou curiosa.
–Não interessa a vocês. Lembre-se...Prefiro trabalhar sozinha.-Letícia estourou novamente uma bola de chiclete.-Ah, e você...-me olhou com desprezo, bocejando.-Não viu nadica!-me mandou uma piscadela e bateu com o indicador em minha testa.-São probleminhas entre colegas, hi hi...-sorriu meiga.-Agora vaza!-mudou de gentil para assustadora em segundos, dando um peteleco em minha testa.
Corri dali, tremendo, ainda assimilando as coisas e tentando registrar o que havia acabado de acontecer.
Coitada daquela tal de Danniely! Quem são essas garotas?
E essa Letícia...Cabelos ruivos e lisos, olhos verdes, as sardas espalhadas pelo rosto, o jeito irritante de mascar o chiclete, a blusa amarela, os tênis all star, a saia e jaqueta pretas...Com certeza, está tudo marcado! Isso vai me assombrar pelo resto do ano letivo! É melhor não me meter no caminho dela!
☆☆☆
Durante a aula, tive a surpresa de ver Danniely na mesma sala, então éramos da mesma classe...
Ela me parecia bem incomodada e tensa, não parava de se mexer em sua carteira. Eu só queria saber o por quê daquelas garotas mexerem com ela...
E a única daquele grupo que era da nossa sala era a baixinha.
–Após o intervalo, teremos um teste que a diretora ordenou que fosse aplicado hoje...-a professora suspirou olhando para a classe.-Não se preocupem, não há nenhuma matéria nova, são coisas que já aprenderam.
Não me preocupei como o resto da sala, procurei me manter calma, afinal, era apenas um teste.
–E lembrando que sempre faço mudança de lugares! Então vão se sentar em assentos diferentes!-a professora disse em alto e bom som.
E se a sala já não estava desesperada, ficou mais ainda...
☆☆☆
Prestes a sair da sala para o intervalo, reparei que Danniely se recusou a se levantar, permaneceu sentada de cabeça baixa, eu como uma das últimas a sair a observei, ela parecia não estar aberta para diálogos, então saí dali, indo para o banheiro. Achei os destroços de seu jogo, estavam jogados em um canto do banheiro, mordi o lábio inferior, balançando a cabeça, por fim suspirando e relaxando os ombros, pegando aqueles restos e os levando para a sala de aula, onde encontrei Danniely, sentada em sua mesa, apoiada com a cabeça na janela.
–A-Ah...-parei em sua frente, ela me olhou curiosa e um pouco incerta.-Isso aqui é seu, não é?-lhe entreguei os pedaços de seu jogo.
–É sim...-Danniely suspirou pegando o aparelho e franzindo a testa ao me encarar.-Você estava com elas, não estava?! Então o que quer comigo?-desceu da carteira e ficou frente a frente comigo, éramos da mesma altura, ela parecia brava.
–E-Eu não! Não as conheço! C-Cheguei aqui hoje! Ia te perguntar o que houve...-dei alguns passos lentamente para trás.
–O que houve é que...-Danniely suspirou pesadamente olhando para o lado.-Argh!-cerrou os dentes me olhando.-Elas vivem pegando no meu pé! Qual é! Só por eu...Só por...-hesitou.-Como posso mesmo saber que você não é uma daquelas falsas?!
–H-Hã...-me afastei lentamente, colocando as mãos na frente do corpo e as balançando negativamente, sem saber o que fazer, acabei tombando em uma carteira ao recuar alguns passos. Bati o cotovelo bem na beira, coisa que causou um choque.-Ai!-me assustei, massageando aonde estava arrepiada, reclamando da dor.
Danniely revirou os olhos e colocou as mãos na cintura, por fim dando um sorriso.
–Desastrada...-me fitou.
–E-Eu só...-olhei para baixo, deixando meu corpo cair em uma cadeira de modo desleixado.
–Será que posso confiar em você, hein?-Danniely cruzou os braços e torceu a boca.
–Isso seria bom...É sério, não tenho nada a ver com aquelas meninas...-a encarei.
–Hum, bem...-Danniely pareceu pensar.-Melhor não me trair...-suspirou, descruzou os braços e colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha.-Danny. E você é a...?-me estendeu o punho cerrado, uma sobrancelha arqueada, desconfiada.
–Bella.-dei um sorriso de canto tímido e toquei seu punho com o meu.-E então, quem são aquelas garotas?-arregalei os olhos ao me lembrar da ruiva.
–São umas idiotas!-Danny revirou os olhos e bufou.-Vivem pegando no meu pé, caçoando de mim, me isolando...-andou de um lado para o outro indgnada.
–Por?-me intrometi.
–Pfff...-Danny parou de andar, como estava de costas, olhou para trás por cima do ombro.-Digamos que eu tenha um gosto...Um tanto estranho para reles mortais simples cujo a cultura é reduzida e tem abominação pelo novo!
–Hã?-fiquei confusa.
–Já ouviu falar de uma coisinha chamada...Yaoi?-andou até mim, ficando na minha frente, me olhando de baixo para cima e depois fixando o olhar em meus olhos.
Me senti nervosa pelo fato dela estar me encarando, desviei o olhar e comecei a pensar.
O que seria aquilo?
–Não, nunca.-falei por fim.
–Então...-colocou a mão em meu ombro.-Não sabe o que é viver.-assentiu com a cabeça lentamente decepcionada e suspirando.
Fiquei com uma expressão de "ué".
–Bem, pequena gafanhota...Se quiser, posso te apresentar o lado negro...-ficou olhando suas unhas roídas até o talo e com um esmalte roxo bem escuro descascado, com um sorriso e ar superior.-Ou seria colorido?-levantou a cabeça confusa.-Ah, tanto faz...-deu de ombros.-Quer se juntar a essa força?-me encarou travessa.
Por que eu sentia que estaria me metendo em uma fria? Fiquei um pouco incerta.
–Só que...Depois que se entra, não há mais volta...-fez um ar de suspense.
–Okay...Eu estou assustada!-balancei a cabeça negativamente e coloquei as mãos em frente ao corpo.
–Tsc...-Danny sorriu e balançou a cabeça com desaprovação.-Vou te explicar como é...Seguinte...-quando ia falar, foi interrompida pela porta sendo aberta.
Era aquele garoto, o Drew, com a mesma expressão fechada, bufando, com a postura toda desleixada.
Ficamos o encarando, Danny franziu a testa.
–Esse daí é estranho, não liga...-sussurrou para mim discretamente.
Percebi.
–Acabou o intervalo, pra informação de vocês.-Drew disse fazendo pouco caso, andando até seu lugar e se sentando.
–EU ODEIO ESSA JOÇA!-aquele loiro entrou logo atrás batendo a porta atrás de si, parecia bravo.
–Pena que ninguém quer saber...Dá pra parar de gritar, seu oxigenado? Aqui não é nenhuma feira!-Drew disse franzindo a testa e encarando Gray mortalmente.
–E pena que ninguém pediu sua opinião, metidinho a lorde supremo das trevas!-Gray pegou seus materiais em cima da mesa e jogou em uma bem longe de Drew.-Então fecha essa boca, ninguém faz questão de te ouvir mesmo.
–Você menos ainda! Acha que alguém tá interessado na sua vida?-Drew rebateu.-Quem saber de lixo, basta ir no lixão...Simples!
–Querido, eu sou uma estrela! Todos querem saber!-Gray sorriu convencido.-Quer me chamar de lixo...Pfff. Olha primeiro sua vida e depois vem falar da minha, tá? Ah, não...Você não tem esse direito...Lixo não fala.
–É um ridículo isso sim!-Drew fez pouco caso.
Eu e Danny apenas estavamos observando a discussão, atentas e sem interromper.
–Sabe de uma coisa, Drew? Não ligo para o que você fala de mim, pois quem nasceu pra ser platéia, vai morrer me aplaudindo.-Gray colocou as mãos na cintura e deu um sorriso debochado.
Drew cerrou os dentes e punhos.
Os alunos começaram a entrar em grupos na sala de aula, reparando no clima, Gray apenas deu de ombros e se sentou, Drew ficou quieto no seu canto e eu e Danny voltamos para nossos lugares. A sala logo estava preenchida com alunos nervosos pelo teste surpresa, a professora foi a última a chegar, carregando um envelope grosso contra o peito.
–Certo.-ela ajeitou os óculos no rosto e colocou o envelope sobre a mesa.-Estarei fazendo a mudança de lugares.-olhou bem para a classe, todos viraram o rosto, se esconderam atrás de livros, ou se encolheram na carteira.-Fabiane.-apontou para a baixinha.
–É Bani, professora, Bani!-revirou os olhos.
–Eu não tenho culpa se esse é o nome que seus pais te deram.-a professora disse fazendo pouco caso.-Por favor, sente no lugar...-estreitou os olhos.-Da Bella.
Bani me olhou e franziu a testa, levantando de seu lugar na última carteira da última fileira e vindo para minha carteira.
–Bella, sente-se...No lugar do Drew.-a professora instruiu. Fiz isso, um pouco incomodada com o olhar pesado de Drew sobre mim.-Hum...Gray, atrás da Bella! E, Drew atrás de Gray.
–Eu me nego!-Gray protestou.
–Ou senta ali ou vai pra diretoria, Gray.-a professora repreendeu.-Eu estou com dor de cabeça, não me faça perder a paciência!-reclamou.
Gray bufou insatisfeito e sentou onde a professora mandou, Drew virou o rosto e sentou atrás dele.
A professora continuou a mudar os alunos de lugar, e finalmente a prova começou.
Estava consideravelmente fácil, apesar de exigir bastante atenção.
–Professora!-ouvi a voz da Danny do outro lado da sala, a olhei, ela estava com uma mão levantada, uma cara péssima.-Posso ir ao banheiro? Estou sentindo muita dor...-a outra mão estava pressionada contra o baixo ventre.
–Tem que ser agora, Danniely?-a professora revirou os olhos e a olhou por cima dos óculos.
Danny se levantou e correu até ela, sussurrando algo em seu ouvido.
–Por favor!-implorou, suas pernas pareciam bambas e ameaçava querer encostar os joelhos.
–Certo, vá, mas vá rápido!-a professora permitiu preocupada.
Danny agradeceu e saiu correndo dali.
Voltei a me concentrar em minha prova. Era impressão minha ou...Tinha alguém me observando? Por que eu sentia que meu teste estava a mostra?
Tive medo de olhar para os lados e conferir. Mas a sensação estava tão forte!
–Professora!-Bani gritou, se levantando de seu lugar e balançando uma das mãos desesperadamente.
–O que foi, Fabiane?-a professora revirou os olhos.
–Preciso urgentemente ir no banheiro!-Bani disse com pressa.-Eu estou a ponto de vomitar as tripas!-começou a ameaçar vomitar, se curvando e apertando a barriga, fazendo um som de nojo.-Me deixa ir!-colocou uma mão em frente a boca e ficou forçando.
–Quanto drama...-a professora suspirou decepcionada e balançou a cabeça com desaprovação.
Bani começou a babar, foi saliva pra tudo quanto é lado.
–Vai logo, então!-a professora se estressou.
–Valeu, fessora!-Bani saiu dali como um raio.
Minha cabeça deu um estalo, meus olhos se arregalaram. E se Bani fizesse algo contra a Danny?! Eu não podia deixar isso acontecer!
–Professora!-levantei a mão, aflita.
–Não, Bella, seja lá o que for pedir, você não vai sair desta sala.-a professora sequer olhou para minha cara.
–Mas, professora...-perdi a voz.
–Não é não, Bella.-disse dura.
–Tudo bem...-sussurrei decepcionada, abaixando a cabeça.
Eu espero que você esteja bem, Danniely.
☆☆☆
Passaram-se 10 minutos e as meninas não voltaram, comecei a me desesperar, a professora nem se importou, estava ocupada preenchendo alguns papéis.
Quanto ao teste, estava prestes a acabar, quando meu lápis caiu, ao me abaixar para pega-lo no chão, reparei que Gray estava olhando discretamente para minha folha em cima da carteira, parecia estar lendo minhas respostas e as anotando em sua prova.
Franzi a testa. Ele estava colando de mim?!
Me levantei rapidamente, o encarando brava.
–Licença, não estou conseguindo ver.-deu um sorriso debochado.
–Você não tem vergonha na cara?!-sussurrei.-Eu vou contar pra professora!
–Shhh, sua nerd!-Gray pressionou o dedo indicador na frente de seus lábios.-Facilita!
–Não!-eu disse indignada.
–Algum problema, senhorita Bella?-me arrepiei ao ouvir aquela voz, virando para frente assustada, arregalando os olhos e cerrando os dentes ao ver a professora ao meu lado.-Por que está virada para trás, posso saber?-cruzou os braços atrás das costas e arqueou uma sobrancelha.
–E-Eu...Eu...-tentei explicar, mas me embaracei.
–Eu vou considerar como cola! E você, Gray?!-olhou para Gray, brava.
–Ele está colando de mim, professora!-falei desesperada, tentando tirar meu corpo fora.
–Eu admito!-Gray fingiu uma cara de sofrimento.-O Drew me ameaçou!
Drew estava numa boa, quieto na dele, ficou incrédulo ao ouvir seu nome na conversa.
–Espera...Eu o que?!-arregalou os olhos.
–Ele me ameaçou! Disse que me pegava na saída se eu não passasse cola para ele! Eu fiquei com medo e fiz o que ele pediu! Eu não tenho como me defender dele e da tal gangue que ele disse que vai mandar atrás de mim!-Gray se levantou batendo as mãos na carteira.-Me desculpe por ser um fraco oprimido, professora!-ele fez uma cara de choro.
Confesso que a atuação dele foi convincente, fiquei de boca aberta.
–Isso é mentira!-Drew estava incrédulo.-EU VOU TE MATAR!-se alterou, levantando-se e indo pra cima de Gray.
–Tá vendo?! Viu, professora?! Ele me odeia! Ele quer me machucar! Vou ter que passar por uma psicóloga por ter traumas causados por ele!-Gray protegeu a cabeça com os braços, assustado.
–CHEGA!-a professora ficou furiosa.-Detenção para os três!-recolheu nossos testes com tanta raiva que quase os amassou.-Bella por ter permitido a cola! Gray por ter sido influenciado e colado! Drew por ameaçar um aluno e colar!-voltou para sua mesa, bufando.-E, na minha aula vocês não ficam!-nos encarou mortalmente.-PRA FORA!-apontou para a porta.
–Mas...!-eu e Drew tentamos, aflitos.
–SEM MAS! EU DISSE FORA!-gritou. A turma inteira se assustou e os cochichos começaram a se espalhar, todos lançando olhares para nós.
Nós três saímos dali derrotados, ficamos no corredor, esperando a aula acabar. Drew estava furioso, andando de um lado para o outro, murmurando amaldiçoamentos para Gray. Fiquei de braços cruzados, sentada em um banco, de cabeça baixa, tremendo as pernas pelo nervosismo.
Gray estava sorrindo vitorioso e debochado.
–Parabéns, Gray...-eu disse baixinho cerrando os dentes.
–O que você ganhou com isso?!-Drew ficou frente a frente com Gray, a diferença de altura visível.-Que história mais inacreditável! Como assim te ameacei?! Eu espero que você se ferre muito! Está amaldiçoado até a décima geração! Vai queimar no quinto dos infernos!-disse com ódio.-Eu te odeio.-deu as costas e se encostou em uma parede de cabeça baixa, com as mãos no bolso.
Me levantei sem dizer uma palavra, mordendo o lábio inferior, saindo dali, arrancando questionamentos de Gray, os quais não respondi, fui ao banheiro.
Tentei abrir a porta, mas estava trancada, cerrei os dentes e comecei a puxar a maçaneta desesperadamente, forçando para baixo, batendo na porta e gritando.
–Danny?! Você está aí?! Danny?! Bani?! Bani?!-gritei.
Devo ter ficado uns 5 minutos inutilmente tentando abrir a porta, suspirei pesadamente, me virei de costas e me permiti deslizar até cair sentada no chão, acabada.
–Danny...-sussurrei preocupada.
Abaixei a cabeça e abracei os joelhos, com medo de algo ter acontecido.
–Bella? Por que não está na sala?-ouvi aquela voz, levantei a cabeça automaticamente e encarei Danny com a mochila nas costas.
–Danny!-sorri esperançosa, me levantando rapidamente.
–O que foi?-tombou a cabeça para o lado, confusa.
–Pensei que tivesse acontecido algo!-inconscientemente a abracei.-Por que demorou? E a Bani?-a soltei sem graça, rindo nervosamente.
–Tive uns probleminhas...Vou pra casa descansar, minha mãe está vindo me buscar.-disse envergonhada apertando a alça da mochila.-E quanto a Bani...Não sei de nada!-franziu a testa, confusa.
–E por que o banheiro está trancado?-perguntei olhando para a porta.
–É dia de limpeza, fecharam para deixar a água secar e nenhuma aluna entrar enquanto não está completamente seco.-Danny explicou.-E por que está para fora da sala?-arqueou uma sobrancelha.
–Você não vai acreditar...-disse tristemente.
☆☆☆
Detenção!
Nem tive tempo de me explicar!
Meu primeiro dia de aula e já estou de detenção!
Minha mãe não reagiu muito bem quando a liguei e avisei porque demoraria para chegar, ela disse que quando eu chegasse em casa teríamos uma boa conversa, ela me pareceu decepcionada.
Eu estava sentada na frente da sala com o Drew, já o Gray estava a metros de distância de nós, isolado.
Estávamos trancados na sala de aula, a professora sequer estava lá.
–E...Como sua mãe reagiu, Drew?-tentei puxar assunto.
–Não te interessa.-Drew disse de modo frio, sem me olhar.-Ela nem vai saber.
–Hum...Bem...-abaixei a cabeça, desconfortável.-Estuda aqui há quanto tempo?
–Essa conversa vai mesmo fazer diferença na sua vida?-Drew me olhou de soslaio, desinteressado.
Calei a boca, passando a mão por meus cabelos, os alisando.
Ouvi um barulho de chave encaixando em uma fechadura, olhei imediatamente para a porta na esperança de ser a professora, mas me enganei, era um garoto e um cara.
–Licença!-o garoto acenou para nós.-Ei, Benson, quer que eu pegue o que mesmo?-olhou para o homem.
–O pen drive, deve estar no armário da professora, toma aqui a chave!-o homem entregou uma chave para o garoto.-Enquanto você procura, vou falar com a diretora, sim?
–De boas.-ele deu de ombros e andou até um armário no fundo da sala, assim que passou por nós deu uma boa olhada em mim e no Drew, parece ter fixado especialmente nele.
Ele era alto, cabelos e olhos castanhos, tinha um ar de ser popular e fazer sucesso, aparentava ser mais velho que eu.
Ficamos todos em silêncio o encarando remexer no armário.
–Não se incomodem comigo!-ele disse ao reparar que estávamos quietos.-Cadê essa coisa?-murmurou.
–Então...Quem é você?-Gray o olhou de baixo para cima.
–Brady.-ele respondeu ainda revirando o armário.-Nono ano, time de basquete.-sorriu para Gray, um sorriso galanteador. Gray piscou os olhos várias vezes surpreso e virou o rosto, calado. Impressão minha...Ou ele estava vermelho? Não! Deve ser coisa da minha cabeça...
–Encontrei!-Brady pegou um pen drive e fechou o armário.-Valeu, gente!-estalou os dedos e andou em direção a porta, notei que ele tinha uma corrente prata com um pingente de bola de basquete, porém ao invés de estar no pescoço estava amarrada no pulso.
☆☆☆
Meia hora se passou, eu estava completamente entediada, quieta no meu lugar, tendo tiques pelo nervosismo.
–Olhem só...-Gray comentou, Drew revirou os olhos e propositalmente aumentou o volume da música que estava ouvindo.-O festival de fim de ano...-olhou para o mural de avisos, apontando para um cartaz azul.-Todos os colégios tem...-suspirou.-Eu ia participar no meu antigo...
–O que tem nesse festival?-arqueei uma sobrancelha.
–Ah, apresentações, jogos, concursos, show, comida...E a noite tem uma espécie de baile, sei lá, você pode ir acompanhado ou só.-Gray deu de ombros.
–Você iria chamar alguém para ir ao baile? Ou alguém te chamou?-perguntei o encarando curiosa.
–É, algumas garotas me chamaram...-fez pouco caso, ajeitando os fios de cabelo que caíam sobre seus olhos.-Mas não queria ir com nenhuma. Pretendia chamar uma...Certa pessoa...Mas o medo de levar um fora foi maior e desisti.-simplesmente disse, suspirando pesadamente e relaxando os ombros.
–Uma garota em especial?-me intrometi.
–Quem disse que era garota?-Gray franziu a testa e colocou as mãos no bolso da jaqueta. Abri a boca incrédula. Ele arregalou os olhos e cerrou os dentes.-E-Eu quero dizer que...Que...N-Não era uma garota...E-Era uma...Adulta! É...E-Ela era minha t-tutora...Seria legal ir com ela, ela era super...G-Gata.-se embaraçou e engasgou todo.
Fiquei quieta, tentando registrar aquilo.
–Bem, de qualquer forma, não participarei desse festival besta, ele não tem graça sem essa pessoa.-cruzou os braços e olhou para o lado, incomodado.
–Estão liberados!-a porta foi aberta de repente, era a professora.
Drew imediatamente pegou sua mochila e saiu dali sem se despedir, com muita pressa.
Gray inclinou a cabeça para trás, e se espreguiçou.
–Liberdade!-murmurou pegando sua mochila.
Me levantei, peguei minha mochila e antes de sair, dei uma olhada debaixo de todas as carteiras, checando se não havia esquecido nada, afinal, sentei em tantos lugares diferentes. Encontrei um livro debaixo de uma carteira, porém, se não me engano, aquela era a carteira da Danny. O encarei, era um mangá, Yuki tinha vários daquele, mas...Nunca vi ela com um com aquela capa. Me assustei, arregalando os olhos. Guardei o mangá na mochila e balancei a cabeça negativamente, saindo dali, sendo a última. Eu devo ter me enganado quanto a imagem daquela capa! Devia estar com dor de cabeça e estava tendo alucinações! Sim, devia ser isso!
☆☆☆
Eu precisava ir ao centro comercial, combinei de encontrar com Yuki e minha tia em uma lanchonete e depois faríamos compras, elas combinaram de me dar um presente de boas-vindas. Peguei um ônibus para chegar lá, a viagem foi solitária, podia ler o mangá...Mas eu ficaria enjoada por estar em movimento. Cheguei a pegar no sono...Incrivelmente de pé. É, eu estava apoiada em uma daquelas barras amarelas, tão entediada e sem foco que peguei no sono ali mesmo. Sorte que uma idosa esbarrou em mim ao descer do ônibus, e era exatamente no meu ponto, acordei em um pulo, descendo junto, tentando assimilar as coisas enquanto andava pelas ruas um pouco bêbada. Estava olhando para cima, o céu estava azul, sem nenhuma nuvem, estava quente, sem nenhuma brisa. Me sentia uma sonsa.
Acabei trombando com dois garotos, arregalando os olhos e finalmente acordando pra valer.
–D-Desculpa!-falei baixinho.
Os dois se viraram para me olhar e surpreendentemente, um deles era o Gray!
–Parece que até aqui me assombra!-Gray disse fazendo pouco caso de mim.
–Quem é?-o outro me olhou de baixo para cima com uma sobrancelha arqueada.
–Beatriz.-Gray deu de ombros.
–Bella!-eu corrigi.
–Ah, tanto faz.-Gray colocou os fones no ouvido.-Vamos logo, Nathaniel.-puxou o garoto pelo braço.
–ESTAMOS ATRASADAS!-ouvi uma voz gritando perto de mim e passos apressados, talvez só tenha ouvido pelo local estar pouco movimentado.
Olhei para trás e vi duas garotas correndo desesperadas, as mochilas balançando de um lado para o outro em suas costas, as alças quase caindo de seus ombros, estavam extremamente apressadas, tanto a ponto de se trombarem comigo. Nós três caímos duro no chão, ambas em cima de mim, eu estava sendo esmagada.
–D-Desculpa!-a loira disse com os olhos arregalados se levantando imediatamente e me estendendo a mão.
–Não perca tempo se desculpando, Bárbara!-a outra bufou se levantando e batendo as mãos na roupa para tirar a sujeira.
–Fujoshi do busão!-Nathaniel disse animado.-É bom te ver!-pegou na mão de Gray e entrelaçou os dedos.
–Ah, Nathaniel...Muito bom ver você!-Bárbara revirou os olhos me puxando.-Se machucou?-com a outra mão ajeitou a alça de sua mochila no ombro.
–E-Estou bem...-eu disse soltando sua mão e sorrindo sem jeito. Eu estava dolorida!
–E, então fujoshi do busão, pretende matar aula?-Nathaniel deu um sorriso cínico.-Parece que, hum, você está atrasada...-tirou do seu bolso seu celular, usando a mão livre e encarando a tela.-Por uma hora. Acredita mesmo que a deixarão entrar?-guardou o aparelho e jogou a franja para o lado, ainda sorrindo.
–Vão ter que deixar!-a garota disse bufando.-Vamos!-puxou bruscamente Bárbara.
–Não...Ele tem razão, Nancy...Não vamos entrar!-Bárbara inclinou a cabeça para trás, acabada.
–O que aconteceu? O busão atrasou?-Nathaniel perguntou.
–Exato.-Nancy mordeu o lábio inferior.-Espera...-olhou para Bárbara desconfiada.-Quem são eles?-apontou para os garotos com a cabeça.
–Longa história...-Bárbara cruzou os braços.
–E quem é ela?-Nathaniel perguntou. Eu me sentia deslocada, perdidinha.
–Minha irmã.-Bárbara respondeu.-O que vamos fazer já que perdemos a aula?-olhou para Nancy.
–Matar tempo no centro, oras...-Nancy deu de ombros.-Ei, japinha.-me encarou com tédio.
–Quem? Eu?-olhei para os lados.
–Não vejo mais ninguém com os olhos puxados...-Nancy deu um sorriso amigável.-Desculpe pelo tombo...-revirou os olhos.
–N-Não foi nada!-sorri balançando as mãos e a cabeça negativamente.
–Bella? Bárbara? Nancy?
Minha cabeça deu um estalo, olhei automaticamente para o lado e vi Danny acenando, estava acompanhada de uma mulher.
–Ai, meu Deus, lá vem a outra...-Gray bateu a mão na testa e balançou a cabeça negativamente. Notei que o nome de Bárbara e Nancy haviam sido chamados, porém elas estavam mais interessadas em olhar fixamente para as mãos dadas dos garotos, seus olhos brilhavam como fogos de artifício e estavam babando...
–Melhorou, Danny?-perguntei quando ela se aproximou de nós.
–Sim...Bem, mais ou menos...Mamãe me deu um chá e uma bolsa de água quente...-olhou para a mulher que ficou para trás.-Vou ficar com ela no trabalho já que ela não me quer sozinha em casa...-massageou a nuca. Olhou para os garotos e deu um sorriso.-Então, Gray...Comprometido?-insinuou.
–Idiota.-Gray corou e largou imediatamente a mão de Nathaniel.
–E vocês duas?-olhou para as garotas sorrindo mais ainda.-Ah...-olhou para mim curiosa.-Se conhecem?
–Nos conhecemos agora.-Bárbara sorriu colocando as mãos na cintura.-Se conhecem?-olhou de Danny para mim e depois para Gray.
–Todos da mesma sala.-Danny falou dando de ombros.
–Mexeram com você hoje, Danny?-Nancy franziu a testa e estralou os dedos da mão como se estivesse se preparando para socar alguém.
Olhei para Danny, ela engoliu em seco e calmamente disse:
–N-Não! Ninguém! Foi tudo bem! Não se preocupe.
Por que será que ela mentiu?
–Ótimo.-Nancy suspirou cruzando os braços.
–E o que faz por aqui, Bella?-Danny mudou de assunto nervosa.
–Vim encontrar minha tia e minha prima.-sorri.-Por falar nisso...Tenho que ir, ou elas ficarão preocupadas.
–Também tenho que ir...-Danny murchou.
–Por que não fica conosco?-Nancy arqueou uma sobrancelha.-Vamos nos divertir!-sorriu.
–Se minha mãe deixar!-Danny disse sorrindo.-Podia vir com a gente, Bella! E trazer sua prima!
–Não é má idéia, bem...-pensei. De repente meu celular começou a tocar, o tirei do bolso e encarei o nome na tela, era a Yuki, atendi no terceiro toque.
—Bella?
–Oi, Yuki!
—Onde você está? Mamãe e eu estamos preocupadas!
–Desculpe meu atraso...-ri nervosamente.
—Mamãe foi ao banco, me pediu para te esperar em frente a um colégio...
–Colégio?-franzi a testa.-E, espera...Ela te deixou sozinha?!
–Tem um aqui perto! É onde eu estudava!-Gray se intrometeu.
–É verdade...-Bárbara pensou.
—Fica bem perto do ponto que sua mãe te disse para descer, sabe? E, não, Bella, não estou sozinha, há uma funcionária aqui fora me fazendo compainha.
–Acho que sim, sei onde fica esse tal colégio...Certo, menos mal, já que você é um pouco insegura quanto a isso.
—Então me encontre aqui, se precisar, me ligue! Até logo!
–Ér...-desliguei e guardei o aparelho.-Podem me mostrar onde fica esse colégio?-pedi sem jeito.
–Vamos!-Bárbara sorriu.
☆☆☆
Chegamos ao colégio, Yuki estava encostada no muro, distraída ao admirar uma flor em sua mão. Havia uma mulher ao seu lado, estava fumando, despreocupada com a vida, estava bem vestida, como se trabalhasse em um escritório, era realmente linda.
–Rose!-Gray disse animado indo em direção a moça.-A secretária que eu mais adoro!
–Gray, senti saudades!-a moça apagou o cigarro, porém continuou com ele entre os dentes incrivelmente brancos.-Como vão os estudos?-bagunçou os cabelos dele.
–Yuki!-a chamei, ela parecia desligada, mas acordou ao ouvir seu nome, abrindo um grande sorriso. Lhe dei um abraço bem apertado.-Nem me lembrava como você era...-a olhei de baixo para cima. Os cabelos pretos e extremamente lisos caíam sobre suas costas, vestia uma meia-calça preta debaixo do short jeans, a blusa azul estava com as mangas longas arregaçadas até o cotovelo, e tênis da mesma cor. Sempre tão bonitinha!
–Então essa é sua prima!-Danny se aproximou.-Danniely.-olhou para Yuki.
–Y-Yuki.-sorriu timidamente.
–Eles me trouxeram até aqui!-olhei para o grupo.
–Agora temos que ir encontrar a...-Yuki começou.
–LARGA!-ouvimos uma gritaria.
–Não, de novo não...-Rose revirou os olhos.
–Não me diga que...-Gray sorriu travesso.
–Lya e Leo!-abaixou a cabeça e relaxou os ombros decepcionada.
–Liçença!-Gray correu dali, Nathaniel o seguiu, Bárbara fez o mesmo, Nancy foi atrás da irmã, Danny quis se intrometer, não suportei a curiosidade e Yuki sem saber o que fazer foi comigo. Resultou que estávamos todos atrás de uma parede, espionando um garoto e uma garota muito semelhantes, aparentemente irmãos, cada um puxando de um lado uma mochila.
–Não são aqueles mesmos que você esbarrou no outro dia, Nancy?-Bárbara sussurrou.
–É MEU!-a menina gritou, em seguida xingando o garoto de tudo quanto é nome.
–NÃO! É MEU!-o menino retrucou puxando com força e também a xingando.
–SOLTA!-ela puxou com mais força ainda.
A mochila acabou rasgando, revelando o conteúdo...Eram mangás.
–VIU O QUE VOCÊ FEZ?!-um gritou para o outro se abaixando para recolherem, continuaram brigando, se xingando, dizendo palavrões e ameaças.
–Querem parar de infatilidade?-Gray foi até eles com as mãos na cintura.-Credo, gente!
–Ah, cala a boc...-a menina disse se virando com raiva, porém parou quando viu de quem se tratava.-Gray!
–Gray!-o garoto se levantou sorrindo.
Nathaniel se aproximou com cautela e ficou atrás de Gray, com os braços cruzados e uma expressão fechada. Então, rapidamente, se colocou ao lado dele, pegou em sua mão e entrelaçou seus dedos.
–Psiu.-Nancy sussurrou.-Vamos lá! Isso vai ficar interessante!-andou até lá com a mesma cautela que Nathaniel, acompanhada de Bárbara e Danny. Eu e Yuki ficamos escondidas atrás da parede, observando tudo.
O garoto olhou fixamente para Nathaniel e arqueou uma sobrancelha, então puxou o Gray para o seu lado e disse:
–Sorry, Nath, mas se eu não divido meu brilho, o que te faz pensar que divido meus amigos?
Nathaniel pareceu irritado.
–Gray, a gente não tinha compromisso, amorzinho?-Nathaniel puxou Gray pelo braço, o deixando atrás dele, como se entrasse na frente para separa-los.
–Amorzinho?!-os irmãos gritaram ao mesmo tempo, surpresos. O garoto parecia bravo.
–Para de viadagem, Nathaniel!-Gray revirou os olhos e saiu detrás dele.
Danny curiosa, se ajoelhou no chão e educadamente começou a juntar os mangás.
–Meu Deus!-Danny surtou, dando um gritinho histérico.-Eu tenho um desse!-mostrou a capa do mangá, era igual ao que eu guardei em minha mochila.-Não me diga que são fujoshi e fudanshi!-olhou para a garota e o garoto.
–O que? Isso não te interessa!-a menina ficou sem saída e estressada.
–Ótimo, mais descendentes de alienígenas...-Nathaniel balançou a cabeça com desaprovação.
–O único alienígena aqui é você, Nath! O anormal, que sequer pertence a esse grupo, você invadiu meu espaço e está tentando "abduzir" meu amigo!-o garoto disse recolhendo todos os mangás enquanto mandava um olhar mortal para Nathaniel. Os dois começaram a discutir.
–O que é fujoshi, Yuki?-sussurrei curiosa e confusa. Estava ouvindo aquela palavra desde que me juntei ao grupo e estava boiando.
–Hmm...Pelo que...Aprendi, são garotas...Que g-gostam de...A-Amor entre g-garotos ou...A-Algo assim!-Yuki se embaraçou um pouco, ruborizando.-Já que fujoshi pode significar algo como...Hum...Louca, p-pervertida, estressada...No s-sentido de ofender...Mas, a-acho que no caso, estão falando de garotas fãs de romances h-homossexuais!
Fiquei quieta um tempo, encarando a cara de Yuki, tentando registrar aquilo. Que?! O que vêem de legal em um romance homossexual?
–Lyandra e Leonardo...-Rose chegou com um olhar de tédio e uma postura de moça educada.-O motorista de vocês chegou, não demorem.-apontou com o polegar para o lugar de onde veio.-Quanto mais tempo longe daqui, menos problemas arranjam...-murmurou pegando um cigarro na caixinha que estava guardada no bolso da saia preta justa que ia até acima dos joelhos, levando a boca segurando apenas entre o indicador e o médio, e o acendendo com um isqueiro que tirou de dentro da camisa, parecia estar no meio do sutiã.
–Vamos!-Leonardo acabou de recolher tudo junto de Lyandra, eles olharam de maneira superior para as garotas e ao passarem por nós nem nos encararam.
–Espera!-Nancy gritou.-Não posso perder contato com uma fujoshi! E ainda por cima, algo raro de se ver...Um fudanshi!-correu atrás dos irmãos sem pensar, sendo seguida por Bárbara. Já Danny veio até mim e ficou comigo, apenas observando as meninas se afastando conforme corriam.
–Esses gêmeos...-Rose retirou o cigarro da boca e soltou a fumaça esbranquiçada pelo ar, como estava próxima a mim, me fez tossir e tampar o nariz com a mão de modo educado e discreto.-Desculpe-me o incômodo, garotinha.-me mandou um olhar, saindo de perto.
–Pffff, é por isso que eu odeio esse Leonardo Nathan! Viram o jeitinho superior?-Nathaniel revirou os olhos, bufou e cruzou os braços.
–Não fala mal dele!-Gray franziu a testa.
–Sabia que prefere ele do que eu! Fala sério!-Nathaniel deu as costas.-O que vê nele?!-colocou as mãos na cintura indignado.-Quem é seu melhor amigo?! Eu ou ele?!
–Quer saber?!-Gray bufou cerrando os punhos.-Pra mim ele não é meu melhor amigo!-gritou.-Porque você ocupa esse lugar...-isso fez com que a expressão e pose de Nathaniel se aliviassem.-Sabe? O Leo é bem mais pra mim! De um jeito que eu acho estranho ver um amigo!-gritou mais alto ainda, ficando todo vermelho.
–Ui! O que eu vejo aqui?! É paixão?! Um triângulo amoroso?! Um conflito romântico?!-Rose se intrometeu, sorrindo maleficamente e batendo palmas, deixando o cigarro entre os dentes.
–NÃO!-Gray gritou olhando pra ela, os olhos arregalados, os lábios tremendo.-Que droga!-esfregou o braço nos olhos como se os limpasse e correu dali.
–Ah, Gray...-Rose suspirou balançando a cabeça com desaprovação.-Está em uma fase que os sentimentos fluem fora do nosso controle...-sorriu de canto.-Nathaniel.-colocou as mãos na cintura e encarou o garoto com autoridade.-Não bote pressão, ouviu? Você é outro nessa fase!-franziu a testa.-Se me dão licença...-tragou mais uma vez.-Tenho que voltar para meu trabalho.-deu as costas e acenou para nós, seu jeito de andar era muito bonito, parecia uma modelo na passarela, o som de seu salto alto foi o único barulho ouvido após sua fala.
Nathaniel fechou a cara e saiu dali, sem nos olhar.
–M-Melhor irmos encontrar minha mãe!-Yuki disse baixinho.
☆☆☆
Eu, Yuki, minha tia e Danny ficamos andando pelo centro comercial, fomos em uma lanchonete, em uma loja de roupas, loja de presentes (Acabei ganhando uma pulseira prateada com o pingente da paz!), e nosso último ponto foi uma livraria, tinha até seções de mangás!
–Hum...-Danny começou a andar por entre as estantes de mangás.-É, eles não devem vender yaoi...-suspirou e balançou a cabeça com desaprovação.
–Ya...O que?-perguntei confusa.
–Nada!-Danny riu nervosamente coçando a nuca.
–Ei...-lembrei-me do mangá em minha mochila, o peguei e meio hesitante devolvi para ela.-Acho que isso lhe pertence...-desviei o olhar.
Danny encarou o mangá de boca aberta, rapidamente o pegou.
–Meu precioso!-o abraçou como se fosse um tesouro.-Obrigada mesmo! Pensei ter perdido!-arregalou os olhos.-Onde achou?-arqueou uma sobrancelha, o pressionando contra o peito.
–Debaixo da sua carteira...-falei sem jeito.
–Valeu! Isso é muito importante para mim!-Danny sorriu sem graça e deu um soquinho amigável em meu ombro, depois guardou o mangá em sua mochila.
–Então...Danny...Você é...Uma fujoshi?-arqueei uma sobrancelha, curiosa.
–E-Eu...-Danny engoliu em seco.-Bem...-sorriu nervosa.-Eu sou!-admitiu suspirando.
–Mas...Afinal, o que são fujoshis? O que é iaôí?-estava perdidinha.
Danny olhou de mim para Yuki.
–Vocês vão precisar andar muito comigo, com Nancy e Bárbara, pequenas gafanhotas...-Danny riu satisfeita colocando as mãos na cintura.-Amigas, fujoshis são garotas incríveis que tem muito bom gosto! Elas olham o mundo e relacionamentos de outro ângulo! Elas também tem o próprio mundo! Um mundo fantástico...Onde o yaoi reina! Yaoi...Relações entre homens, entendem?-jogou as mãos para o alto, alegre, saiu saltitando e cantarolando.
–O QUE?!-eu e Yuki nos entreolhamos surpresas.-Danny!-gritamos.
Danny já estava distante, apenas nos olhou por cima do ombro e nos mandou uma piscadela.
Corremos até ela, cada uma segurou em um braço seu, eu segurei bem firme, já Yuki com pouca força, parecia assustada com Danniely.
–Vocês estão precisando de um bom tratamento de choque, sabiam?-Danny estava contente, olhou para mim e depois para Yuki balançando a cabeça positivamente bem rápido.-Aqui!-se soltou, abriu sua mochila e de lá tirou dois mangás.-Um para você...-me entregou um.-E outro pra você...-entregou outro para Yuki.-MAS TOMEM CUIDADO, PELO AMOR DO SANTO YAOI! Não façam orelhas, não dobrem a capa, não rasguem as páginas, não deixem engordurado, não molhem, não queimem, não quero que espirrem em cima, não podem deixar jogado em qualquer lugar, não...-tagarelou a ponto de eu não prestar mais atenção e ficar encarando a capa do mesmo mangá que devolvi a ela.
–Mamãe não pode me ver com isso!-Yuki arregalou os olhos, estendendo os braços e deixando o mangá bem longe de seu corpo como se fosse um bicho.
–Ela não precisa saber!-Danny deu um sorriso maléfico.
–M-Mas...-Yuki tremeu os lábios.
–Hum...-encarei o mangá, pensativa.-Não é meu tipo de leitura, sabe...-ri sem graça.
–Vai ser, amiga, vai ser.-Danny suspirou dando tapinhas amigáveis em meu ombro.
–Meninas!-minha tia apareceu sorrindo carregando as sacolas da livraria, já havia pagado pelos livros que comprou.
Yuki deu um pulo de susto, se arrepiando e arregalando os olhos, virando-se para sua mãe e rapidamente escondendo o mangá atrás das costas, com uma expressão de culpa.
–O-Oi, m-mamãe...
Eu e Danny não evitamos a risada, nos entreolhamos e sorrimos maléficas.
☆☆☆
Estávamos novamente andando pelo centro comercial! Já se passava das quatro da tarde...
–Ei, aquelas ali não são a Nancy e a Bárbara?!-Danny sorriu avistando de longe as duas garotas.-Preciso falar com elas, com liçença!-sorriu para nós e correu até lá.
–Por que não vão lá também ver suas amigas?-minha tia sugeriu sorrindo e cruzando os braços ao sentar-se em um banco que fazia parte da pracinha.-Eu espero, podem ir.
Eu e Yuki nos entreolhamos, dei de ombros e a puxei até elas.
–Você não acredita o que encontramos!-Nancy disse usando os dedos para pentear para trás a franja que caia sobre seus olhos.
–Aquela garota! A Lyandra! Ela é uma fujoshi de primeira!-Bárbara disse animada.
–Sinto o cheiro de longe!-Nancy sorriu travessa.-Estamos tendo toda cautela de segui-la, ela entrou na pracinha!
Por isso as duas estavam feito espiãs atrás de um poste.
–Vamos atrás dela!-Bárbara sussurrou seguindo em frente com todo cuidado.
–Vocês vem?-Nancy colocou as mãos na cintura, sorrindo.
–Claro!-Danny respondeu por nós três nos puxando.
Encontramos Lyandra em cima de uma árvore, eu não teria a visto se Nancy não tivesse apontado.
–O que estamos fazendo aqui?-sussurrei e acidentalmente pisei em um graveto, o quebrando e fazendo aquele barulho de "CRECK", rapidamente retirei o pé e recuei alguns passos, assustada. Lyandra olhou para baixo e franziu a testa ao nos ver.
–Tratem de se esconder ou estão fritas!-sussurrou irritada.
Nancy se deitou no chão gramado, atrás de alguns arbustos e ficou por lá como se fosse um soldado na guerra. Bárbara se ajoelhou ao lado dela, assim como eu e Yuki, já Danny ficou atrás da árvore.
–Do que estamos nos escondendo?-Yuki disse baixinho.
–Daquilo!-Nancy apontou discretamente para frente. Encarei bem e vi que se tratava de dois garotos, parecia estar rolando um clima, a atmosfera estava bem romântica.
–Ah...-Yuki arregalou os olhos e abriu a boca.-I-Isso é invasão de p-privacidade!-cobriu os olhos com as mãos e virou o rosto.
–Dane-se.-Nancy sorriu tirando de seu bolso seu celular e tirando fotos.
–Ei! O que pensa que está fazendo?!-Lyandra desceu da árvore com muita habilidade, sem fazer nenhum som, bateu uma mão na outra tirando a poeira e as botou na cintura em seguida.-Esse OTP é propriedade MINHA! Não tem o direito de possuir imagens!-se ajoelhou junto a nós.
Nancy a olhou de cima a baixo, dando um sorriso irônico, a encarando nos olhos e tirou mais uma foto, estalando a língua.
–Foi mal, mas...Não pode possuir isso! Eles não estão com seu nome...Literalmente.-Nancy arqueou uma sobrancelha.
–Mas quem foi que os juntou?! Você está invadindo MEU território!-Lyandra a olhou mortalmente.-Se não fosse graças a mim, eles não estariam no maior love agora mesmo!-apontou para eles.
–Eu gosto do jeito que trabalha...Porque não nos juntamos?-Nancy guardou o celular e estendeu a mão para Lyandra.
–Porque eu trabalho sozinha.-Lyandra cruzou os braços, fazendo pouco caso de Nancy.
–Tsc...Um dia, Lyandra, ainda se juntará a A.U.F., se quer saber...-Nancy deu de ombros.
–A.U.F.?-Lyandra arqueou uma sobrancelha.
–A União Fujoshi!-Bárbara completou.
–Pfff...Não preciso de nenhuma união besta...-Lyandra revirou os olhos, mas me pareceu incerta quanto ao que disse, por fim bufou e voltou a encarar os garotos. Os encarei também e...UAU! Estavam se beijando! Fiquei perplexa com a cena. QUE?! DUAS PESSOAS DO MESMO SEXO SE BEIJANDO?!
Olhei para as garotas, estavam contendo os gritinhos de alegria, tinham um sorriso largo estampados em seus rostos, satisfação e animação, se entreolhando e afirmando com a cabeça. Apenas estranhei. Mas, ao voltar a encarar aquilo tudo...Eles...Sei lá...Por que eu gostei de ver aquilo? Por que me senti feliz por eles? Por que desejava não sair dali? Por que achava aquilo completamente normal? (Quando na verdade não é algo bem visto pela sociedade).
Sem me dar conta, um sorriso surgiu em meus lábios, eu estava admirada! O amor não é lindo?
Os garotos saíram dali de mãos dadas, pareciam super alegres.
Lya começou a dar pulinhos e gritinhos, toda felizinha, eu me levantei e bati em minha roupa tirando a poeira, então ela me estendeu a mão para dar um "toca aqui", e foi isso que eu fiz. Nos olhamos sorrindo, porém ela parece ter se tocado do que fez, então pigarreou e fechou a cara.
–Bom, isso não muda nada!-ela disse cruzando os braços e indo para trás da árvore, se encostando no tronco, suspirando satisfeita e tirando do bolso um caderninho e uma caneta verde daquelas fluorescentes. Concentrada escreveu algo em uma folha que se encontrava no meio do caderno. Discretamente me aproximei e espiei o que ela escreveu..."Concluído". Franzi a testa confusa.
–Ei!-ela me olhou de cara feia por eu estar espiando o que ela fazia.
–O que é isso?-as folhas da árvore farfalharam e caíram sobre nossas cabeças, de repente Nancy apareceu pendurada de cabeça para baixo em um galho como um vampiro, encarando ao caderno, levei um susto que me fez dar um pulinho e me afastar rapidamente.
–Não interessa!-Lyandra fechou o caderno na velocidade da luz e o guardou.-E...Eu já vou indo.-deu as costas.
Nancy pulou no chão, quase perdendo o equilíbrio, porém se estabeleceu e suspirou.
–Não vou perder seu rastro, ouviu?!-Nancy gritou.-Eu vou te achar a quilômetros de distância, ouviu, Lyandra?
–Boa sorte...Eu não deixo migalhas para marcar o caminho.-Lyandra a olhou por cima do ombro e deu um sorrisinho desafiador.
–Ah, você tá na minha mira...Espere só.-Nancy sussurrou sorrindo confiante.
–J-Já posso olhar?-Yuki sussurrou, estava deitada no chão, com os olhos fechados.
☆☆☆
Era noite de sexta-feira, no dia seguinte seria sábado e eu acompanharia Yuki até o treino de muay thai. Minha prima NUNCA gostou de ficar sozinha, ou andar por aí sem ninguém. Como minha tia e meu tio estariam ocupados, eu me ofereci para leva-la.
Estava em meu quarto após o jantar, deitada em minha cama, pensando em como era morar nessa cidade nova. Será que serei bem aceita nas próximas semanas de aula? Farei mais amigas? Será que vou me apaixonar?!
Suspirei pesadamente me espichando na cama, preguiçosa, virei para o lado e encarei a porta fechada, minha mochila estava pendurada atrás dela, o zíper aberto, revelando uma pontinha do mangá que Danny havia me emprestado.
–Não faz mal, faz?-dei de ombros me levantando, andando até a mochila e pegando o mangá.-Afinal...-observei a capa.-Não há nada demais...Né?-ri nervosamente.
Sentei-me na minha escrivaninha, de cabeça baixa, lendo o mangá iluminado pela lâmpada do abajur da Hello Kitty (não me julguem), com os fones conectados na caixa de som do computador, estava escutando música no YouTube, para ser mais exata, K-Pop.
–Jogos e Praia...-franzi ao testa ao ler o título.
A história se tratava da família de um garoto e seu amigo que foram para a praia e se hospedaram em um hotel, ocorre uma aposta entre os dois amigos: Quem perdesse em uma luta no videogame deveria levar a irmãzinha do garoto na praia. Acaba que o amigo perde e leva a garotinha na praia, então ele conhece outro garoto e se tornam BFF, nisso o primeiro garoto começa a se sentir enciumado e depois de uma conversa com sua melhor amiga, descobre estar apaixonado, mas se nega dizendo que garotos não podem amar garotos. Mas, enfim, o garoto acaba admitindo que ama o amigo, esse amigo corresponde, os dois começam a brincar na praia, rola beijo e climão, então eles voltam para o hotel para jogar videogame aproveitando que estavam sozinhos já que a família saiu e...O final é um tanto pervertido. Tive que cortar minha leitura quando papai bateu na porta para me desejar boa noite. Bem que Danny acrescentou que era uma versão especial, já que esse final foi revelado pela autora após a publicação. Uau...!
–Chega de ler por hoje! Já li demais!-falei fechando o mangá que nem havia acabado de ler.-Eu...-suspirei o encarando.-Isso é viciante...Mas bem errado! Errado demais!-arregalei os olhos.-Apesar de eu ter achado fofinho o romance...Ainda mais por serem garotos...-fiz uma voz meiga.-Não! Isso é do demônio, só pode!-fechei os olhos, cruzei os braços e virei a cara.-Hum...-abri um dos olhos e arqueei uma sobrancelha desconfiada.-Até que...-sorri.-Eu gostei!-dei um risinho de vergonha.
Estralei os dedos das duas mãos como se estivesse prestes a tocar piano, abri outra aba e digitei na barra de pesquisa do Google: "Yaoi".
Até fui a cozinha, fiz um cafézinho bem doce e voltei pro quarto.
–Hoje a noite vai ser longa...-eu disse concentrada segurando a caneca próxima a boca e dando um gole, séria ao levar a seta para um título de um post de um blog, clicando com um pouco de hesitação.-É apenas uma pesquisa...-disse calmamente suspirando.
Porta trancada. Okay.
Pais dormindo. Okay.
Cafeína. Okay.
Internet ilimitada. Okay.
Busca por conhecimento. Okay.
Coragem. O-O-Okay.
☆☆☆
Dia seguinte...
Assim que o despertador tocou, levei um susto ao acordar desesperada, deitada com a cabeça sobre os braços em cima da escrivaninha, olhei para os lados com os olhos arregalados, a boca aberta e com baba saindo. Eu estava com cheiro de café e saliva. Reparei que dormi em frente ao computador.
–P-Poxa...-falei bocejando e de modo sonolento esfregando um dos olhos com a costa da mão.-Madruguei?-peguei minha caneca, mesmo vazia a levei até a boca e dei um gole. Nada. Nenhuma gota.
–Bella?-mamãe bateu na porta.-Não se esqueça de ir buscar sua prima! Não se atrase!
–C-Certo...-me espreguicei retirando os fones, meus ouvidos doíam. Me levantei, cambaleei um pouco e andei vagarosamente até o guarda-roupa para pegar uma muda para tomar banho e me trocar.
–Ah...-estava dormindo em pé.-Que sonho estranho...-minha cabeça deu um estalo e me sentei na cama.-Eu era um garoto? E tinha um senpai? E a gente ficou junto no final? Eu, hein!-estava confusa, arregalei os olhos e bati em meu rosto, tentando me livrar da preguiça.-Tenho compromisso!-suspirei pesadamente relaxando os ombros e arrastando os pés no chão até chegar a porta. Eu estava um trapo!
☆☆☆
Fui até a casa da Yuki, tomei café da manhã por lá mesmo e cochilei sentada no sofá da sala enquanto ela arrumava sua mochila e se trocava. Eu tenho modos! Onde eles foram parar? Ai, ai...
Durante o caminho, puxei assunto:
–Leu o mangá que Danny lhe emprestou, Yuki?
–H-Hã...-Yuki virou o rosto.-N-Não tem noção de como a-aquilo é e-errado?-me encarou medrosa.-Mamãe não sentiria orgulho de mim!
–O que os olhos não vêem, o coração não sente!-falei feito uma bêbada alegre.
–Mamãe sente sim! Ela sabe de tudo! Tem olhos por toda parte!-Yuki começou a roer as unhas em sinal de nervosismo.-E-Eu...Não posso ficar com isso!-rapidamente pegou sua mochila, a abriu e me entregou o mangá.-Tire isso daqui, p-por favor!-me estendeu, se curvando, deixando os cabelos caírem sobre seu rosto.
–Certo, certo...Eu fico com isso.-eu disse, porém neguei tocar no mangá.-Mas, guarda...Eu não trouxe mochila!-sussurrei.
☆☆☆
Yuki já estava lutando, seu professor havia permitido que eu e outra garota, parente do adversário de minha prima ficassemos para assistir. A garota e o adversário ainda não haviam aparecido, eu apenas esperava sentada, desviei o olhar e arregalei os olhos ao ver Gray encostado em uma parede olhando na direção de Yuki com a testa franzida e cara de poucos amigos.
–Voltei!-o garoto apareceu. E...Uau! Era o mesmo daquele dia! O irmão da Lyandra! Acompanhado dela!-Desculpa se te fiz esperar, mas sabe como é...-se dirigiu a Yuki.
–Você...-Lyandra me encarou de cima a baixo.
–O-Oi.-eu disse baixinho.
Ela arqueou uma sobrancelha, depois deu as costas e foi até Gray, os dois começaram a conversar, mas ele se negava a tirar os olhos de Yuki e o garoto. Qual era mesmo o nome? Leonardo?
Os dois começaram a lutar, porém, eu cochilei novamente, só acordei mesmo quando ouvi um barulho de algo atingindo o chão, me assustei.
Yuki estava caída, ofegante. Leonardo estava de pé, vitorioso. Porém ele caiu do lado dela, sorriu e o ouvi dizer:
–Você é boa! Por um momento, pensei que eu seria derrotado!
Yuki deu um sorrisinho envergonhado e agradeceu baixinho, também o elogiando. Só senti o olhar de Gray sobre ela, tenso! Ele tinha uma cara de assassino!
Leonardo pegou uma toalhinha de rosto e gentilmente limpou a testa dela. Yuki sentou-se, ainda agradecendo e ficou ultra vermelha! Eu só observava.
Até senti a atmosfera mudar! Aquela clichê...De amor!
Mas foi desfeita quando Gray gritou:
–Leo, você não perdeu nada aí pra tá enrolando, porque pelo que eu saiba, a perdedora aqui foi essa garotinha de cabelo escorrido.
Gray estava visivelmente bravo.
–Vou indo.-Leo se levantou, mandando uma piscadela para Yuki e lhe estendendo a mão para ajuda-la.
–Vamos esperar ele lá fora, Gray!-Lyandra o puxou pelo braço. Não suportei e segui os dois, deixando Yuki e Leo lá.
–Lyandra!-corri até ela.
–O que você quer?-me olhou com tédio.
–Não devia me meter, mas...Acho que você devia entrar para a...A.U.F.!-falei empolgada.
–Eu? Entrar para aquela uniãozinha de fujoshis? Não, valeu, estou melhor sozinha!-Lyandra disse com um ar superior.
–Mas...M-Mas...Eu acho que elas precisam de você!-eu disse.
–O homem já chegou a Lua...Mas ele nunca chegará ao Sol...Muito menos um bando de garotas que não levam isso a sério.-Lyandra balançou a cabeça com desaprovação.
☆☆☆
O tempo passou...Danny foi falar com Lyandra, mas não deu em nada, ela simplesmente começou a cantarolar e deu as costa a ela. Bárbara também tentou, só que a Lyandra tampou os ouvidos e falou o óbvio: que não estava ''conseguindo escuta-lá".
Nancy foi assim como as outras, mas não desistiu fácil, Lyandra tinha seus jogos, mas ela tinha os seus também.
E eu, por fim, fui conversar com o Gray durante a saída do colégio, ele estava encostado no muro, com as mãos nos bolsos da calça, olhando para os lados despreocupadamente.
–Gray...Podemos conversar?-me aproximei. Ele virou o rosto e fingiu não me ouvir por estar com os fones.-Serei direta então...-respirei fundo.-Você...Gosta do Leonardo?
Gray engasgou e me encarou surpreso, a face corada.
–Eu andei notando!-admiti.
–E-Eu...-Gray vacilou na voz, seu rosto adquiriu uma expressão de choro.-NÃO TE INTERESSA!-cerrou os dentes.
–Gray, maninho!-ouvi uma voz atrás de mim, olhei por cima do ombro e encarei uma garota, pareciamos ter a mesma idade apesar da diferença visível de desenvolvimento, eu sentia como se tivesse nove anos perto de alguém de quatorze. Era loira, os cabelos lisos e longos presos em um rabo-de-cavalo, os olhos verdes, parecia semelhante a Gray.
–Grazi...-Gray cruzou os braços e arqueou uma sobrancelha.
–Quero lhe apresentar minha nova melhor amiga! Ela vai dormir lá em casa hoje!-ela sorriu empolgada.-Ei, Letícia!-chamou. Gelei e senti um arrepio quando encarei Letícia se colocar ao lado de Grazi com um rosto e postura angelicais.
–O-Oi, a Zi falou muito de você!-Letícia sorriu docemente encarando Gray.-Espero que nos demos bem!-desviou o olhar para mim.-Oi, Bella, tudo bem?
–Te adoro, Lety.-Grazi passou o braço pelos ombros de Letícia e a abraçou de lado.
–Também te adoro, Zizinha!-Letícia sorriu.
Arregalei os olhos e abri a boca, em choque, tudo ao meu redor ficou preto, a voz completamente gentil e dócil de Letícia (ao invés de assustadora e ameaçadora) dava replay em minha mente, tudo a minha volta começou a girar.
EU SÓ PODIA ESTAR EM UM PESADELO!
E, pela primeira vez...Eu e Gray trocamos olhares, esses desconfiados.
E agora...?