Lost Souls. escrita por FantasyJuli


Capítulo 1
Capítulo 1




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Chovia de mais naquela noite, mais do que em qualquer outra noite que eu possa me lembrar. A sala estava inundada e só havia ali, além dos moveis e outras coisas que boiavam, eu e o meu sofá velho. Metade do meu corpo estava submerso na água sentado no sofá, a outra parte tragava o resto do ultimo cigarro que tinha.

Palavras e frases passavam pela minha cabeça, palavras essas que serviam para descrever bem pelo momento que no qual estava passando, não eram gentis, mas se adaptavam bem à situação. Eram coisas do tipo:

No fundo do poço. Desiludido. Acabado. Destruído. Desesperado.

Mas meu cigarro ainda era o meu único parceiro, sendo isso a coisa mais triste ou não...Era verdade, se pudesse falar tenho certeza que diria algo como "levanta essa bunda daí e liga para ela, seu merda!" ou "você vai perder a sua casa seu estúpido! Por causa dela, liga pra ela!" (desculpe, mas penso no cigarro com uma personalidade forte, como um velho e casmurro artilheiro de guerra). Entretanto ele estava certo, ia perder a casa por causa dela, porque ela foi embora e, claro, chovia tanto lá fora porque ela havia ido embora. Por que ela foi embora?

Essa pergunta só pode ser respondida se voltarmos para o inicio da historia, o dia infame na minha vida em que a conheci. Porem, é de grande importância avisá-los que esse não é o final da nossa historia, na verdade, nunca saberemos.

Lá estava eu, correndo da polícia mais uma vez enquanto jogava as latas de spray de tinta na mochila, correr e fazer outras coisas ao mesmo tempo se tornou algo em que eu era realmente bom, mais por causa de necessidade que qualquer outra coisa.

Tentava terminar um grande grafitti pela terceira vez naquela semana e, claro, todos os seguranças já estavam ligados e corriam atrás de mim o tempo inteiro. Sentia-me correndo a duzentos e dez por hora pelas ruas da lapa, a adrenalina subia pelas minhas veias e eu sentia mais uma vez que podia voar, sem duvida a adrenalina era a droga que mais me agradava.

Procurei possíveis saídas, como um ônibus ou algo do tipo, mas nada próximo iria me ajudar e aqueles seguranças pareciam sem mais duros que os da semana passada. Acabei entrando em um bar, joguei a mochila e o casaco para de baixo de uma mesa e cobri rapidamente o rosto com o cardápio. Eles não entraram ali, passaram direto como em uma cena de um filme de Hollywood.

Senti o meu coração desacelerar e uma vontade imensa de rir tomou conta de mim, ao invés de rir feito um louco eu chamei o garçom para pedir uma cerveja. Enquanto ele não vinha, eu reparei na atmosfera ao meu redor. Tocava um típico samba carioca, varias pessoas dançavam e cantavam despreocupadas exibindo seus sorrisos calorosos, tudo aquilo era bem diferente do tipo de coisa que eu gostava.

Mas as cores e os sons me atraiam naquele lugar como se toda a atmosfera ao meu redor estivesse preparando o momento perfeito para que nos encontrássemos e no momento certo e milimetricamente preparado pelo destino, as coisas ficaram em câmera lenta. O som do pandeiro diminuiu a freqüência,as dezenas pés tocaram mais devagar o chão e num piscar de olhos nos segundos mais demorados daquela noite, nossos olhos se encontraram, na pausa caótica do momento seus olhos brilharam e os meus responderam. Foi naquele momento, eu tenho certeza, você também percebeu.

—boa noite, senhor. –o homem me tirou lentamente do meu transe. –o que deseja?

—uma Heineken bem gelada, por favor. –sorri um tanto desconcertado para o garçom a minha frente. Assim que ele saiu, eu voltei a procurá-la.

E lá estava, seus cabelos acompanhavam os movimentos do seu quadril e como se não bastasse o efeito que o tom da sua pele tinha quando as luzes fracas do bar a tocava, seus olhos envolviam qualquer público que os olhasse, como os de Capitu e uma cigana pronta para derrubar qualquer um com os seus mistérios.

Você atraia todos os olhares ao seu redor enquanto eu me esgueirava na cadeira com a minha camisa folgada e olhos um tanto avermelhados, não parecia o tipo que conseguiria levá-la para casa ou até mesmo paga-la uma Heineken, mas naquele momento eu me conformava apenas em observá-la dançar.

 

E foi assim, em questão de segundos da mesma forma que você surgiu, sumiu. Passei os olhos por todo o ambiente te procurando, mas era tarde de mais só vi os seus cabelos passando pela saída. Nossa história terminaria por ai, mas o destino não quis assim e não se discute com a força do universo, a gente tinha que se encontrar.

Minha vontade era de levantar e te procurar, mas como o bom aprendiz da vida que sou, sei que tudo tem seu tempo. Eu sabia lá no fundo que ainda nos encontraríamos e que isso seria a minha sina, mas eu terminei a minha cerveja, paguei o garçom, vesti o meu casaco, ascendi um baseado e caminhei pelas sombras como de costume até chegar em casa.

Umas das melhores sensações de morar sozinho é a normalidade, quando você chega em casa e tudo está do jeito que você deixou .Umas latas de spray em cima dos jornais que coloquei no chão enquanto não terminava a arte na minha parede, de repente desenhar os olhos daquela garota na minha parede se tornou algo incrivelmente plausível. Eles eram, de qualquer forma, obras de arte.    

Mas o que aconteceu foi algo que todos nós deveríamos saber e bem lá no fundo nós sabemos, só não aceitamos, "as vezes o que nós queremos não corresponde com o que o outro sente". Li isso em algum lugar e ficou impregnado na minha mente como uma forma de escudo então antes de me jogar lembro disso e de outras frases que citarei ao decorrer dessa história. Mas eu preferi, mesmo sofrendo, passar por isso. Valia a pena, toda experiencia vale a pena, fortalece o coração e o caráter. Era o que o meu pai me dizia.

Terminei de tomar banho e me joguei no sofá vestindo somente uma cueca, outra parte boa de morar sozinho: você faz o que quer quando quer. Ascendi um cigarro, observei a fumaça fina subir e desaparecer foi então que a ficha caiu:

Eu não quero ser como a fumaça do meu cigarro, eu não posso desaparecer sutilmente. Eu queria por uma única vez na minha vida ser como o olhar daquela garota, imortal. Mas parece que existem pessoas que nasceram para nunca serem esquecidas, outras apenas sobem e desaparecem.

Não quero ser como essas pessoas. Ela com certeza não era.

 

 


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